• Nenhum resultado encontrado

Harry Markowitz e o nascimento da Teoria da Carteira

Por que o beta dos títulos determina o risco da carteira?

8.1 Harry Markowitz e o nascimento da Teoria da Carteira

CAPÍTULO

8 Teoria da carteira e modelo

Parte 2

rISCo CAPM de avaliação de ativos

No Capítulo 7

,começamos a abordar o problema de como medir o risco. Essa é a história até aqui.

O que torna arriscado um investimento no mercado de ações é a dispersão dos resultados possíveis. A medida habitual dessa dispersão é o desvio-padrão ou a variân- cia. O risco de qualquer ação pode ser dividido em duas partes. Existe um risco específico ou diversificável, que é inerente a essa ação, e existe o risco de mercado, que deriva das oscilações do próprio mercado. Os investido- res podem eliminar o risco específico, optando por uma carteira bem diversificada, mas não podem eliminar o risco de mercado. Todo o risco de uma carteira completamente diversificada é o risco do mercado.

A contribuição de uma ação para o risco de uma carteira completamente diversificada depende de sua sensibilidade às variações do mercado, a qual em geral é conhecida por beta. Um título com um beta de 1,0 tem um risco de mer- cado médio – uma carteira bem diversificada com esses títulos tem o mesmo desvio-padrão do índice do mercado.

Um título com um beta de 0,5 tem um risco de mercado in- ferior à média – uma carteira bem diversificada com esses títulos tende a oscilar metade dos movimentos do merca- do e tem também metade do desvio-padrão do mercado.

Neste capítulo, vamos lançar mão desses conheci- mentos recentemente adquiridos. Apresentaremos as teorias mais importantes que relacionam o risco com retorno em uma economia competitiva e mostraremos como utilizar essas teorias para estimar o retorno que os investidores exigem dos diferentes mercados de ações.

Começaremos pela teoria mais utilizada, o modelo CAPM (capital asset pricing model), que se baseia diretamente nos conceitos desenvolvidos no último capítulo. Também abordaremos outra categoria de modelos, conhecidos como teoria da avaliação por arbitragem (arbitrage pricing theory – APT) ou modelo de fatores. Depois, no Capítulo 9, veremos como esses conceitos podem ajudar o gestor financeiro a lidar com o risco em situações práticas de decisões de investimento.

tado é típico: quando medidas em curtos intervalos, as taxas de retorno históricas de quase todas as ações se aproximam muito de uma curva de distribuição normal.2

Uma distribuição normal pode ser completamente definida por dois números. Um é o retorno médio ou esperado e o outro, a variância ou o desvio-padrão. Agora é possível perceber por que discutimos, no Capítulo 7, o modo de calcular o retorno esperado e o desvio-padrão. Não são meras medidas arbitrárias: se os retornos forem normalmente distribuídos, o retorno esperado e o desvio-padrão são as únicas duas medidas que um investidor precisa levar em consideração.

A Figura 8.2 ilustra a distribuição dos possíveis retornos de três investimentos. A e B oferecem um retorno esperado de 10%, mas A tem um leque mais amplo de resultados possíveis. O seu desvio-padrão é de 15%; o desvio-padrão de B é de 7,5%. A maior parte dos investidores detesta a incerteza e, por isso, preferiria B a A.

Agora, compare os investimentos B e C. Dessa vez, ambos têm o mesmo desvio-padrão, mas o retorno esperado é de 20% para a ação C e de apenas 10% para a ação B. A maior parte dos investidores gosta de taxas de retorno elevadas; por isso, preferiria C a B.

Formação de carteiras

Vamos imaginar que você esteja indeciso entre investir em ações da Campbell Soup e da Boeing.

Você sabe que a Campbell Soup oferece um retorno esperado de 3,1% e a Boeing, um retorno esperado de 9,5%. Após a análise da variabilidade histórica das duas ações, você considera que o desvio-padrão do retorno é de 15,8% para a Campbell Soup, e de 23,7% para a Boeing. Esta última oferece um retorno esperado superior, mas consideravelmente mais arriscado.

Nada obriga você a possuir apenas uma ação. Por exemplo, na Seção 7.3 analisamos o que aconteceria se você investisse 60% do seu dinheiro na Campbell Soup e 40% na Boeing. O retorno esperado dessa carteira é de cerca de 5,7%, simplesmente a média ponderada dos retor- nos esperados das ações individuais. E quanto ao risco dessa carteira? Sabemos que, por causa da diversificação, o risco da carteira é inferior à média dos riscos das ações individuais. De fato, com base na experiência passada, o desvio-padrão de tal carteira é de 14,6%.3

2 Se medíssemos o retorno em intervalos longos, a distribuição seria distorcida. Por exemplo, seriam encontradas taxas de retorno superiores a 100%, mas nenhuma inferior a –100%. A distribuição dos retornos em um período de, digamos, um ano seria apro- ximada de uma distribuição lognormal. A distribuição lognormal, assim como a normal, é totalmente especificada pela média e pelo desvio-padrão.

3 Na Seção 7.3, explicamos que a correlação entre os retornos da Campbell Soup e da Boeing tem sido de cerca de 0,18. A variância de uma carteira que investiu 60% na Campbell e 40% na Boeing é:

Variância x x 2x x

[(0,6) (15,8) ] [(0,4) (23,7) ] 2(0,6 0,4 0,18 15,8 23,7) 212,1

12 12

22 2 2

1 2 12 1 2

2 2 2 2

= σ + σ + ρ σ σ

= × + × + × × × ×

=

O desvio-padrão da carteira é de 212,1 14,6%= .

FIGURA 8.1

As variações diárias de preço da IBM têm uma distribuição aproximadamente normal. Essa linha representa o período entre 1988 e 2008.

–5,6

–7 –4,2 –2,8 –1,4 0 1,4 2,8 4,2 5,6 7 7,7

0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4

Percentual de dias

Variações diárias de preço (%)

A curva cinza na Figura 8.3 exibe o retorno esperado e o risco que se pode obter por meio de diferentes combinações das duas ações. Qual dessas combinações seria melhor? Depende da sua atitude diante do risco. Querendo apostar tudo, na esperança de enriquecer depressa, você deve investir todo o seu dinheiro na Boeing. Mas se você preferir uma vida mais tranquila, deverá investir a maior parte de seu dinheiro na Campbell Soup. No entanto, faça pelo menos um pequeno investimento na Boeing.4

4 A carteira, com o risco mínimo, tem 73,1% na Campbell Soup. Presumimos, na Figura 8.3, que não se pode ser detentor de posi- ções negativas de quaisquer das ações, isto é, excluímos as vendas a descoberto.

FIGURA 8.2

Os investimentos A e B têm um retorno esperado de 10%, mas como o investimento A tem uma dispersão maior de retornos possíveis, ele traz mais risco do que o investimento B. Podemos medir essa dispersão por meio do desvio-padrão.

O investimento A tem um desvio-padrão de 15% e o B, de 7,5%. A maioria dos investidores preferi- ria B a A. Os investimen- tos B e C têm o mesmo desvio-padrão, mas o C oferece uma taxa de retorno mais elevada. A maioria dos investidores preferiria C a B.

–56,0 –50,0

Retorno (%) Probabilidade

Probabilidade

Probabilidade

Investimento A

–44,0–38,0 –32,0–26,0–20,0–14,0 –8,0 –2,0 4,0 10,0 16,0 22,0 28,0 34,0 40,0 46,0 52,0 58,0 64,0 70,0

–56,0 –50,0

Retorno (%)

Investimento B

–44,0–38,0–32,0–26,0–20,0–14,0 –8,0 –2,0 4,0 10,0 16,0 22,0 28,0 34,0 40,0 46,0 52,0 58,0 64,0 70,0

–56,0 –50,0

Retorno (%)

Investimento C

–44,0–38,0–32,0–26,0–20,0–14,0 –8,0 –2,0 4,0 10,0 16,0 22,0 28,0 34,0 40,0 46,0 52,0 58,0 64,0 70,0

Vimos, no Capítulo 7, que o ganho com a diversificação depende do grau de correlação entre as duas ações. Felizmente, com a experiência do passado, há somente uma pequena correlação positiva entre os retornos da Campbell Soup e da Boeing (ρ = +0,18). Se as duas ações varias- sem simultaneamente (ρ = +1), não haveria quaisquer ganhos com a diversificação. É possível constatar isso pela linha verde-clara pontilhada na Figura 8.3. A linha verde-escura pontilhada da figura mostra um segundo caso extremo (e igualmente irrealista) em que os retornos das duas ações têm uma correlação perfeitamente negativa (ρ = 11). Se fosse esse o caso, sua carteira não teria nenhum risco.

Na prática, é improvável que você se veja limitado a investir em apenas dois tipos de ações.

Por exemplo, você poderia decidir escolher uma carteira de 10 ações listadas na primeira coluna do Quadro 8.1. Depois de ter analisado os prospectos de cada uma das empresas, você obtém

QUADRO 8.1 Exemplos de carteiras eficientes escolhidas de dez ações.

Carteiras eficientes – porcentagens alocadas a cada ação

Ação Retorno esperado Desvio-padrão A B C

Amazon 22,8% 50,9% 100 10,9

Ford 19,0 47,2 11,0

Dell 13,4 30,9 10,3

Starbucks 9,0 30,3 10,7 3,6

Boeing 9,5 23,7 10,5

Disney 7,7 19,6 11,2

Newmont 7,0 36,1 9,9 10,2

Exxon Mobil 4,7 19,1 9,7 18,4

Johnson & Johnson 3,8 12,5 7,4 33,9

Campbell Soup 3,1 15,8 8,4 33,9

Retorno esperado da carteira 22,8 10,5 4,2

Desvio-padrão da carteira 50,9 16,0 8,8

Nota: Os desvios-padrão e as correlações entre os retornos das ações foram estimados de janeiro de 2004 a dezembro de 2008 com base nos retornos mensais. As carteiras eficientes são calculadas presumindo que as vendas a descoberto não sejam permitidas.

FIGURA 8.3

A curva ilustra a forma como o retorno esperado e o desvio-padrão mudam ao investir em combi- nações diferentes das duas ações. Por exemplo, se você investir 40% do seu dinheiro na Boeing e o restante na Campbell Soup, seu retorno espe- rado será de 12%, o que constitui 40% de diferença entre os retornos espe- rados das duas ações. O desvio-padrão será de 14,6%, o que fica abaixo dos 40% de diferença en- tre os desvios-padrão das duas ações. Isso acontece porque a diversificação reduz o risco.

Boeing

Campbell Soup 40% na Boeing

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

25 20

15 10

0 5

Retorno esperado, r (%)

Desvio-padrão, σ (%)

as previsões de seus retornos. Você se mostra mais otimista sobre a perspectiva das ações da Amazon e prevê que esse investimento lhe fornecerá um retorno de 22,8%. No outro extremo, fica cauteloso sobre os prospectos da Johnson $ Johnson e prevê, para essas ações, um retorno de 3,8%. Foram utilizados dados dos últimos cinco anos para estimar o risco de cada uma das ações e as correlações entre os retornos de cada par de ações.5

Agora, passemos à Figura 8.4. Cada diamante representa a combinação do risco e do retorno oferecidos, individualmente, pelos títulos. Por exemplo, a Amazon tem tanto o desvio-padrão como o retorno esperado mais elevado. Ela está representada pelo diamante no canto superior direito da figura.

Ao deter diferentes proporções dos dez títulos, é possível obter uma seleção ainda mais ampla de riscos e de retornos; de fato, em qualquer das posições assinaladas pela área sombreada da Figura 8.4. Mas qual é a melhor posição? Bem, qual é o seu objetivo? Em que direção você pretende seguir? A resposta deve parecer óbvia: você pretende ir para cima (para aumentar o retorno esperado) e para a esquerda (para reduzir o risco). Vá o mais longe que puder até obter uma carteira da linha delimitadora. Markowitz as chama de carteiras eficientes. Elas oferecem o retorno esperado mais elevado para qualquer nível de risco.

Não calcularemos aqui esse conjunto de carteiras eficientes, mas você pode estar interessado em saber como se faz isso. Lembre-se do problema de restrição de capital da Seção 5.4. Preten- díamos distribuir ali um investimento limitado de capital em uma série de projetos para obter o VPL mais elevado possível. Aqui, queremos distribuir os fundos de um investidor para obter o máximo retorno esperado, dado um determinado desvio-padrão. Em princípio, cada um dos problemas pode ser resolvido por tentativas – mas apenas em princípio. Para resolver o problema da restrição de capital, podemos empregar as técnicas de programação linear; para resolver o problema da carteira, é possível empregar uma variante da programação linear, conhecida como programação quadrática. Considerando tanto o retorno esperado como o desvio-padrão para cada uma das ações, bem como a correlação entre cada par de ações, podemos então utilizar um software de programação quadrática para calcular uma série de carteiras eficientes.

Três delas estão marcadas na Figura 8.4, e suas composições estão resumidas no Quadro 8.1. A carteira B oferece o retorno esperado mais elevado: o investimento é inteiramente em uma ação, Amazon. A carteira C oferece o mínimo risco possível, o que pode ser constatado no Quadro 8.1, que tem seus maiores investimentos na Johnson & Johnson e na Campbell Soup, com os respectivos menores desvios-padrão. No entanto, a carteira também é composta de uma participação considerável na Newmont, apesar de ela ser, individualmente, muito arriscada.

5 Há 45 coeficientes de correlação diferentes, de modo que não os listamos no Quadro 8.1.

FIGURA 8.4

Cada diamante representa o retorno esperado e o desvio-padrão de uma das dez ações do Quadro 8.1. A área sombreada representa as combinações possíveis entre os retornos esperados e os desvios-padrão, caso se invista em uma combinação dessas ações.

Gostando de retornos elevados, e não gostando de desvios-padrão elevados, são preferíveis as ações situadas ao longo da linha cheia. Essas são as carteiras eficientes.

Assinalamos as três carteiras eficientes descritas no Quadro 8.1 (A, B e C).

A

0 5 10 15 20 25

20 10

0 30 40 50 60

Desvio-padrão, σ (%) C

B

Retorno esperado, r (%)

A razão? Com base nas evidências passadas, as fortunas de ações de mineradoras de ouro, tais como a Newmont, praticamente não guardam qualquer correlação com as de outras ações e, portanto, proporcionam uma diversificação extra.

O Quadro 8.1 ainda exibe as composições de uma terceira carteira eficiente com níveis inter- mediários de risco e de retorno esperado.

É claro que os fundos de investimento de grande porte podem escolher entre milhares de ações e, portanto, atingir uma seleção mais ampla de risco e de retorno. Essa escolha está representada na Figura 8.5 pela área sombreada no formato de um ovo quebrado. O conjunto de carteiras eficientes está de novo marcado pela curva.