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O VPL depende dos fluxos de caixa, não do retorno contábil

O valor presente líquido depende apenas dos fluxos de caixa do projeto e do custo de oportu- nidade do capital. Mas quando as empresas divulgam relatórios financeiros aos seus acionistas, elas não se limitam a apresentar os fluxos de caixa, mas apresentam também os lucros e os ativos contábeis.

Os gestores financeiros utilizam por vezes esses números para calcular a taxa de retorno con- tábil de um investimento proposto. Em outras palavras, consideram os lucros contábeis espera- dos como uma proporção do valor contábil dos ativos que a empresa propõe adquirir:

Taxa de retorno contábil = lucros contábeis ativos contábeis

Os fluxos de caixa e o lucro contábil são, com frequência, muito diferentes. O contador, por exemplo, pode classificar algumas despesas como despesas de investimento e outras como despesas de custeio. As despesas de custeio são, é claro, imediatamente deduzidas do resul- tado de cada ano. As despesas de investimento são colocadas no balanço da empresa e depois depreciadas. A taxa de depreciação anual é deduzida dos ganhos anuais. Assim, o retorno contábil depende das rubricas que o contador tratar como imobilizado e da rapidez com que forem depreciadas.1

Agora, os méritos de um projeto de investimento não dependem de como os contadores clas- sificam os fluxos de caixa2 e, atualmente, há poucas empresas que tomam as suas decisões de investimento baseando-se apenas na taxa de retorno contábil. Mas os gestores sabem que os acionistas das organizações prestam bastante atenção aos indicadores contábeis de rentabilidade,

1 O minicaso deste capítulo contém exemplos simples do modo como são calculadas as taxas de retorno contábil e da diferença entre os lucros contábeis e os fluxos de caixa previstos. Leia o caso, se quiser refrescar a sua compreensão desses tópicos. Melhor ainda, faça os cálculos do caso.

2 Claro que o método da depreciação utilizado para efeitos fiscais tem consequências em termos de caixa que devem ser considera- das no cálculo do VPL. Trataremos das depreciações e dos impostos no próximo capítulo.

FIGURA 5.2

Evidências de pesquisas sobre a porcentagem de gestores financeiros que utilizam sempre, ou quase sempre, uma determinada técnica para avaliar projetos de investimento.

Fonte: Publicado por J. R.

Graham and C. R. Harvey, “The Theory and Practice of Finance:

Evidence from the Field”, Jour- nal of Financial Economics 61 (2001), pp. 187-243, © 2001 com autorização de Elsevier Science.

Índice de rentabilidade:

12%

Taxa de retorno contábil:

20%

Payback (período de recuperação):

57%

76%TIR:

VPL:75%

%

40 100

20 60 80

0

considerando e se preocupando com o modo como os principais projetos poderão afetar o retorno contábil. Os projetos que reduziriam o retorno contábil da organização poderão ser auditados mais cuidadosamente pelos gestores seniores.

Podem ser detectados alguns perigos nesse processo. A taxa de retorno contábil da empresa pode não ser um bom indicador da sua verdadeira rentabilidade, mas é uma média de todas as atividades da empresa. A rentabilidade média dos investimentos feitos anteriormente não é a melhor pista para novos investimentos. Pense em uma empresa que tenha sido excepcional- mente bem-sucedida e que tenha tido bastante sorte. Digamos que a taxa de retorno contábil é de 24%, duplicando os 12% de custo de oportunidade do capital dos acionistas. Será que a empresa deverá exigir que todos os novos investimentos ofereçam 24% ou mais? É claro que não: isso significaria rejeitar muitos investimentos com VPL positivo com taxas de retorno entre os 12% e os 24%.

Nos Capítulos 12 e 28, quando analisarmos mais de perto as medidas contábeis do desempe- nho financeiro, voltaremos a abordar a taxa de retorno contábil.

5.2

O período de recuperação (payback)

Suspeitamos que você já tenha ouvido diálogos como este: “Estamos gastando $6 por semana, ou em torno de $ 300 ao ano, na lavanderia local. Se comprássemos uma máquina de lavar rou- pas a $800, ela se pagaria dentro de três anos. Tal esforço valeria a pena”. Você acabou de ser apresentado ao método do payback.

O período de recuperação (ou payback) de um projeto é obtido calculando-se o número de anos que decorrerão até os fluxos de caixa acumulados estimáveis igualarem o montante do investimento inicial. No caso da máquina de lavar, esse período foi de somente três anos. O critério do período de recuperação determina que um projeto deve ser aceito se o seu período de recuperação for menor do que algum período-limite especificado. Se o período-limite for, por exemplo, de quatro anos, a máquina de lavar roupas cumpre seu objetivo; se for de dois anos, o objetivo não é cumprido.

EXEMPLO 5.1 A regra do payback Considere estes três projetos:

Fluxos de caixa ($)

Projeto C0 C1 C2 C3

Período de recuperação

(em anos) VPL a 10%

A –2.000 500 500 5.000 3 +2.624

B –2.000 500 1.800 0 2 −58

C –2.000 1.800 500 0 2 +50

O projeto A envolve um investimento inicial de $2 mil (C0 = −2.000), seguido de fluxos positivos de caixa nos próximos três anos. Suponha que o custo de oportunidade do capital seja de 10%.

Então, o projeto A tem um VPL de +$2.624:

VPL(A) 2.000 500 1,10

500 1,10

5.000

1,10 $2.624

2 3

= − + + + = +

O projeto B exige, igualmente, um investimento inicial de $2 mil, mas gera um fluxo positivo de caixa de $500 no ano 1 e de $1.800 no ano 2. Com o custo de oportunidade do capital de 10%, o projeto B tem um VPL de –$58:

VPL(B) 2.000 500 1,10

1.800 1,102 $58

= − + + −

O terceiro projeto, C, exige o mesmo investimento inicial dos outros dois projetos, mas o fluxo positivo de caixa no ano 1 é superior, uma vez que tem um VPL de +$50:

VPL(C) 2.000 1.800 1,10

500

1,102 $50

= − + + = +

A regra do valor presente líquido estabelece que devemos aceitar os projetos A e C, mas rejei- tar o projeto B.

Vejamos agora a rapidez com que cada projeto recupera o investimento inicial. Com o projeto A, são três anos para se recuperar o investimento inicial de $2 mil; com os projetos B e C, são apenas dois anos. Se a empresa utilizasse o critério do período de recuperação com um período- -limite de dois anos, aceitaria somente os projetos B e C; se utilizasse o critério do período de recuperação com um período limite de três anos ou mais, aceitaria todos os projetos. Sendo assim, independente da escolha do período limite, o critério do período de recuperação dá res- postas diferentes das do critério do valor presente líquido.

Podemos ver por que o critério do período de recuperação dá respostas enganadoras, con- forme ilustrado no Exemplo 5.1:

1. O critério do período de recuperação ignora todos os fluxos de caixa depois do período limi- te. Se o período limite for de dois anos, o critério rejeita o projeto A, independentemente da dimensão do fluxo de caixa positivo no ano 3.

2. O critério do período de recuperação dá pesos iguais a todos os fluxos de caixa que ocorrem antes do período limite. O critério determina que os projetos B e C são igualmente atraentes, mas como os fluxos de caixa gerados pelo projeto C ocorrem mais cedo, este tem um valor presente líquido mais elevado com qualquer taxa de desconto.

Para utilizar o critério do período de recuperação, a empresa tem de definir um período- -limite apropriado. Se utilizar o mesmo limite, independentemente do período de vida do pro- jeto, haverá uma tendência a aceitar muitos projetos menos interessantes de curto prazo e rejeitar muitos projetos interessantes com períodos de execução mais extensos.

Temos tido poucas coisas boas a dizer sobre o critério do período de recuperação. Sendo assim, por que tantas empresas ainda continuam a utilizá-lo? Os gerentes seniores efeti- vamente não acreditam que todos os fluxos de caixa após o período de recuperação são irrelevantes. Sugerimos três explicações para isso. Primeira, o critério do payback pode ser utilizado porque é o modo mais simples de divulgar uma noção da rentabilidade do projeto.

As decisões de investimento exigem discussão e negociação entre pessoas de todos os setores da organização, e é importante que tenhamos uma medida que qualquer um possa entender.

Segunda, os gestores de organizações de maior porte podem optar por projetos com curtos períodos de recuperação, pois eles creem que a obtenção mais rápida de lucros gera promo- ções mais rápidas. Isso nos remete novamente ao Capítulo 1, no qual discutimos a necessidade de se alinhar os objetivos dos gestores com os dos acionistas. Por fim, empresas de estrutura familiar com acesso limitado ao capital talvez se preocupem com sua capacidade futura de levantar recursos. Essas inquietações podem levar os seus membros a beneficiar projetos com período de recuperação curto mesmo que um empreendimento de prazo mais longo possa ter um VPL mais alto.

Payback descontado

Eventualmente, as empresas descontam os fluxos de caixa antes de calcularem o período de recu- peração. Os fluxos de caixa descontados para os nossos três projetos ocorrem da seguinte maneira:

Fluxos de caixa descontados ($)

Projeto C0 C1 C2 C3

Período de recuperação descontado

(em anos) VPL a 20%

A –2.000 500/1,10 = 455 500/1,102 = 413 5.000 /1,103 = 3.757 3 +2.624

B –2.000 500/1,10 = 455 1.800/1,102 = 1.488 _ –58

C –2.000 1.800/1,10 = 1.636 500/1,102 = 413 2 +50

No critério do período de recuperação com desconto pergunta-se: “Quantos períodos de tempo o projeto precisa durar para ser aceitável em termos de valor presente líquido?”. Você pode ver que o valor dos fluxos de caixa positivos do projeto B jamais excede o investimento inicial e sem- pre seria rejeitado sob o critério do payback descontado. Assim, esse critério jamais aceita um projeto com VPL negativo. Por outro lado, o critério do período de recuperação com desconto, continua a desconsiderar os fluxos de caixa que ocorrem após o período-limite, de modo que os projetos de longo prazo, como o projeto A, continuem a sofrer risco de rejeição.

Em vez de rejeitar automaticamente qualquer projeto de período de recuperação com des- conto longo, muitos gestores simplesmente utilizam o critério como sinal de advertência. Eles não rejeitam impensadamente um projeto com um período de recuperação descontado longo.

Em vez disso, procuram conferir se o proponente do projeto não é indevidamente otimista sobre a capacidade de ele gerar fluxos de caixa em um futuro distante. Eles se satisfazem com o fato de que os equipamentos têm vidas longas e que os competidores não entrarão no mercado para arrebanhar parte dos rendimentos do projeto.

5.3

Taxa interna de retorno (ou fluxo de caixa descontado)

Enquanto o período de recuperação e o retorno contábil são critérios ad hoc, a taxa interna de retorno tem antecedentes muito mais respeitáveis e é recomendada em muitos textos financeiros.

Se, por conseguinte, insistirmos mais nas suas deficiências, isso não se deve ao fato de serem mais numerosas, mas sim por serem menos óbvias.

No Capítulo 2, sugerimos que o valor presente líquido também poderia ser expresso em ter- mos de taxa de retorno, o que conduziria ao seguinte critério: “Aceite oportunidades de investi- mento que ofereçam taxas de retorno superiores ao seu custo de oportunidade do capital”. Essa afirmação, interpretada de maneira adequada, está absolutamente correta. Porém, sua interpre- tação nem sempre é fácil quando se trata de projetos de investimento de longo prazo.

Não existe nenhuma ambiguidade na definição da verdadeira taxa de retorno de um investi- mento que gera um único resultado no final de um período:

Taxa de retorno = resultado investimento – 1

Por outro lado, poderíamos especificar o VPL do investimento e calcular a taxa de desconto que torna o VPL = 0:

VPL = C0 + 1 + taxa de descontoC1 = 0 o que implica que:

Taxa de desconto C C1 1

0

=− −

É claro que C1 é o rendimento e –C0 é o investimento exigido; desse modo, as nossas duas equa- ções expressam exatamente a mesma coisa: a taxa de desconto que torna o VPL = 0 é também a taxa de retorno.

Como calculamos o retorno quando o projeto gera fluxos de caixa em diversos períodos? Res- posta: utilizamos a mesma definição que acabamos de desenvolver para projetos com período de um ano – a taxa de retorno do projeto é a taxa de desconto que fornece um VPL igual a zero.

Ela é conhecida como taxa de retorno do fluxo de caixa descontado (FCD) ou taxa interna de retorno (TIR) e é muito utilizada em finanças. Essa taxa pode ser um instrumento prático, mas, como veremos, pode também levar ao erro. Sendo assim, é importante que se saiba calculá-la e utilizá-la adequadamente.