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Transparência fiscal internacional e administração tributária em rede : o sistema regulatório e prático do intecâmbio de informações tributárias no Brasil e os direitos e garantias fundamentais dos contribuintes

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Academic year: 2017

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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE DIREITO DE SÃO PAULO

FREDERICO SILVA BASTOS

TRANSPARÊNCIA FISCAL INTERNACIONAL E ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EM REDE:

O SISTEMA REGULATÓRIO E PRÁTICO DO INTECÂMBIO DE INFORMAÇÕES TRIBUTÁRIAS NO BRASIL E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

DOS CONTRIBUINTES

SÃO PAULO

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FREDERICO SILVA BASTOS

TRANSPARÊNCIA FISCAL INTERNACIONAL E ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EM REDE:

O SISTEMA REGULATÓRIO E PRÁTICO DO INTECÂMBIO DE INFORMAÇÕES TRIBUTÁRIAS NO BRASIL E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

DOS CONTRIBUINTES

Dissertação apresentada para fins de obtenção do grau de Mestre em Direito e realizada com o apoio da Fundação Getúlio Vargas, por meio da bolsa Mario Henrique Simonsen de Ensino.

Instituição Sede do Projeto: Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (Direito GV). Orientadora: Prof.ª Dr.ª Luciana Gross Cunha Coorientadora:Prof.ª Dr.ª Heloísa Estellita

SÃO PAULO

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Silva Bastos, Frederico

Transparência Fiscal Internacional e Administração Tributária em Rede: O Sistema Regulatório e Prático do Intercâmbio Internacional de Informações Tributárias no Brasil e os Direitos e Garantias Fundamentais dos Contribuintes / Silva Bastos, Frederico. 2014.

328 f.

Orientadora: Luciana Gross Cunha

Corientadora: Heloísa Estellita

Dissertação (mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas.

1. Direito tributário - Brasil. 2. Cooperação internacional. 3. Globalização. 4. Relações tributárias. I. Cunha, Luciana Gross. II. Estellita, Heloísa. III. Dissertação (mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. IV. Título.

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FREDERICO SILVA BASTOS

TRANSPARÊNCIA FISCAL INTERNACIONAL E ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EM REDE:

O SISTEMA REGULATÓRIO E PRÁTICO DO INTECÂMBIO DE INFORMAÇÕES TRIBUTÁRIAS NO BRASIL E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

DOS CONTRIBUINTES

Dissertação apresentada à Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas como requisito para obtenção do título de Mestre em Direito e Desenvolvimento.

Campo de conhecimento: Direito dos Negócios e Desenvolvimento Econômico e Social.

Apoio: Bolsa Mário Henrique Simonsen

Data de aprovação: 08/04/2014.

Banca Examinadora:

____________________________________ Prof.ª Dr.ª Luciana Gross Cunha

(Orientadora)

____________________________________ Prof.ª Dr.ª Heloísa Estellita

(Coorientadora)

____________________________________ Prof. Dr. Eurico Marcos Diniz de Santi

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AGRADECIMENTOS

A rotina de estudo, pesquisa e reflexão necessária à elaboração e conclusão deste trabalho dependeu da ajuda e compreensão de muita gente. A essas pessoas devo meus sinceros agradecimentos, observando que essas modestas linhas são insuficientes para demonstrar a gratidão devida a todos que contribuíram de alguma forma para essa pesquisa.

Primeiramente, agradeço aos meus pais, a quem também dedico este trabalho, por serem diretamente responsáveis por qualquer virtude que eu eventualmente tenha e também pelos diversos sacrifícios realizados para que eu nunca achasse que um sonho era impossível. À toda a família, que mesmo longe sempre esteve próxima.

Agradeço à Fundação Getúlio Vargas, pelo voto de confiança dado ao meu trabalho, expresso por meio da Bolsa Mário Henrique Simonsen, sem a qual esse trabalho não teria sido imaginável.

Agradeço também a todos os professores do programa de mestrado da DireitoGV pelo comprometimento e disponibilidade. Dentre esses, devo um agradecimento especial às minhas orientadoras: à Professora Luciana Gross Cunha, pelo respeito e confiança e à Professora Heloisa Estellita, pela amizade, lições e parcerias acadêmicas, bem como pelo estímulo e sincera atenção ao longo de todo o trabalho.

Ao Professor Eurico Marcos Diniz de Santi, por me acolher como aprendiz e por ser o principal responsável pelo meu ingresso na vida acadêmica, sou eternamente grato por todo o aprendizado, transformação e crescimento que me proporcionou.

Ao Professor Sergio André Rocha, agradeço a disponibilidade e a generosidade em compartilhar seus estudos e conhecimentos sobre o tema dessa pesquisa.

(6)

RESUMO

(7)

ABSTRACT

(8)

SUMÁRIO

RESUMO ... 6

ABSTRACT ... 7

1.INTRODUÇÃO, OBJETO DE ANÁLISE E METODOLOGIA ... 10

1.1. Do Tópico ao Tema, ao Problema e à Hipótese ... 10

1.2. Materiais, Método e Percurso de Pesquisa ... 12

1.3. Limitações do Objeto de Estudo ... 19

2. GLOBALIZAÇÃO, DIREITO TRIBUTÁRIO E DESENVOLVIMENTO ... 21

2.1. Globalização, Sociedade em Rede e o Direito Tributário ... 21

2.2. O Planejamento Tributário Globalizado, a Internacionalização de Empresas e a Modernização das Administrações Tributárias ... 24

3. POLÍTICA TRIBUTÁRIA GLOBAL: O INTERCÂMBIO INTERNACIONAL DE INFORMAÇÕES ... 34

3.1. O Intercâmbio Internacional de Informações em Matéria Tributária ... 34

3.2. Modalidades de Intercâmbio de Informações Tributárias ... 41

3.2.1. Intercâmbio de Informações a Pedido (Exchange of Information on Request) ... 42

3.2.2 Intercâmbio Espontâneo (Spontaneous Exchange of Information) ... 48

3.2.3 Intercâmbio Automático (Automatic Exchange of information) ... 51

3.2.4 Fiscalizações Simultâneas (Simultaneous Tax Examinations) ... 56

3.2.5 Fiscalizações no Exterior (Tax Examinations Abroad) ... 60

3.2.6. Intercâmbio sobre setores econômicos (Industry-wide Exchange of Information) ... 64

3. 3. Instrumentos Internacionais de Intercâmbio de Informações Tributárias .... 66

3.3.1. Convenção Multilateral em Assistência Administrativa Mútua em Assuntos Tributários ... 66

3.3.2. Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA) ... 68

3.3.2.1. Intergovernmental Agreement (IGA) ... 71

4. O SISTEMA REGULATÓRIO E PRÁTICO DO INTERCÂMBIO DE INFORMAÇÕES TRIBUTÁRIAS NO BRASIL ... 73

4.1. A Moldura Regulatória do Intercâmbio de Informações Tributárias no Brasil73 4.1.1 A Constituição Federal e os Direitos e Garantias Fundamentais dos Contribuintes Brasileiros em Relação ao Intercâmbio de Informações Tributárias ... 74

4.1.2 O Código Tributário Nacional e a Cooperação Internacional ... 78

4.1.3 Os Acordos Internacionais em Matéria Tributária no Ordenamento Brasileiro .... 81

4.1.3.1. A Origem dos Acordos para Troca de Informações em Matéria Tributáriae a Escolha do Modelo Brasileiro ... 84

4.1.3.2. As Questões Jurídicas Envolvendo a Ratificação do Acordo para Troca de Informações Tributárias entre Brasil e Estados Unidos ... 88

4.1.4. O Manual de Troca de Informações com o Exterior da Receita Federal, a Lei de Acesso à Informação e a Postura da Administração Tributária Brasileira ... 93

4.2. A Moldura Prática do Intercâmbio de Informações Tributárias no Brasil ... 99

(9)

4.2.2. A Disponibilidade, o Acesso às Informações Tributárias dos Contribuintes Brasileiros e a Eficácia da Cooperação Internacional para Intercâmbio de Informações

... 105

4.2.2.1. A Disponibilidade de Informações Fiscais e Contábeis e o Banco de Dados da Administração Tributária Brasileira ... 106

4.2.2.2. O Acesso às Informações Tributárias dos Contribuintes Brasileiros e a Efetividade dos Meios Coercitivos para que o Estado possa obter outras Informações Necessárias à Atividade Fiscalizatória. ... 110

4.2.2.3. Eficácia da Cooperação Internacional para Intercâmbio de Informações no Brasil ... 114

5. FRICÇÕES ENTRE O INTERCÂMBIO DE INFORMAÇÕES TRIBUTÁRIAS E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DOS CONTRIBUINTES BRASILEIROS ... 123

5.1. O Intercâmbio de Informações Tributárias e a Necessária Procedimentalização Administrativa ... 127

5.1.1. O Modelo Uruguaio de Procedimentalização Administrativa do Intercâmbio de Informações Tributárias... 131

5.2. A Atuação Fiscalizatória da Administração Tributária e o Direito do Contribuinte de ser Informado ... 133

5.3. O Intercâmbio de Informações Tributárias e o Direito ao Contraditório e à Ampla Defesa ... 137

5.4. O Intercâmbio de Informações Tributárias, o Devido Processo Legal e o Tratamento Isonômico dos Contribuintes ... 140

5.5. O Dever de Confidencialidade das Informações Fiscais e a Obsolescência do Sigilo Bancário ... 146

5.6. A Vinculação da Atividade Fiscalizatória da Administração Tributária à Legalidade e a Inadmissibilidade dos Meios de Provas Ilícitos e Ilegítimos ... 156

5.7. A Irretroatividade da Lei Tributária, o Intercâmbio de Informações e a Extinção do Direito de a Administração Tributária Constituir o Crédito Tributário na Legislação Tributária Brasileira ... 162

5.8. Novos Paradigmas da Administração Tributária e a Necessidade de Incrementar o Diálogo entre Fisco e Contribuinte ... 171

CONCLUSÕES ... 177

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 184

(10)

1. INTRODUÇÃO, OBJETO DE ANÁLISE E METODOLOGIA

“Caminante, no hay camino, al andar se hace camino.”

(Antonio Machado)

1.1. Do Tópico ao Tema, ao Problema e à Hipótese

A seguir são apresentados o tópico, o tema, o problema, a hipótese da presente pesquisa e os materiais utilizados, o que permitirá compreender os caminhos metodológicos trilhados ao longo do percurso de pesquisa desenvolvido neste estudo.

Há aproximadamente dois anos venho exercendo a função de pesquisador no Núcleo de Estudos Fiscais (NEF/FGV) da Escola de Direito de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas (DireitoGV), período em que tive a oportunidade de realizar pesquisas

empíricas na área do Direito Tributário1, mais especificamente nas linhas de Reforma

Tributária, Modernização das Administrações Tributárias, Transparência Fiscal e Acesso à Informação. O NEF/FGV surgiu em 2009, com o desafio de investigar a relação entre tributação e desenvolvimento, bem como analisar as instituições jurídicas relacionadas ao

sistema tributário brasileiro e sua influência no desenvolvimento do país2. Alinhado à

agenda internacional, o NEF tem centrado suas atividades de pesquisa no debate sobre transparência fiscal e acesso à informação como ferramentas para solucionar problemas concretos de Direito Tributário e também para promover o estreitamento do diálogo entre

fisco e contribuinte3.

No mesmo período, deu-se a oportunidade de frequentar os encontros realizados pelo Grupo de Estudos em Tributação Internacional (GETI), vinculado ao NEF/FGV. Em um desses encontros, evidenciou-se a temática da troca de informações entre administrações tributárias e como esse intercâmbio institucional dos fiscos impõe a transição de um modelo de administração tributária calcada em políticas domésticas para um modelo que atua em face de um mundo globalizado e informacional.

1

(11)

O debate sobre o intercâmbio de informações envolve, necessariamente, uma nova postura da administração tributária e também uma mudança cultural em favor de maior transparência internacional. Sob essa ótica, percebeu-se a existência de um ponto de contato entre o estudo do intercâmbio de informações tributárias e as temáticas já desenvolvidas enquanto pesquisador do NEF/FGV. Vislumbrei assim a possibilidade de estudar o tema ainda pouco explorado por pesquisadores e juristas da área do Direito Tributário brasileiro. Contudo, o estudo abstrato do fenômeno da troca de informações entre administrações tributárias no âmbito internacional consistia em um horizonte muito genérico, fazendo-se necessário delimitar a pesquisa.

No exercício de apreender o melhor recorte para a realização do estudo, optou-se por recorrer à doutrina e a relatórios internacionais que pudessem apontar tensões acerca do tópico de estudo. A partir dessas leituras, percebeu-se que a falta de informações sobre a procedimentalização do intercâmbio de informações no Brasil tem sido um obstáculo para o debate jurídico sobre essa forma de cooperação internacional. Ademais, o tema da troca de informações entre administrações tributárias demonstrou-se sensível a questões relacionadas aos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, tais como o direito à intimidade, à privacidade, à ampla defesa, ao sigilo de dados, ao devido processo legal, ao contraditório, à isonomia e à irretroatividade da lei tributária. Essas constatações direcionaram este estudo no sentido de mapear o sistema brasileiro para a realização do intercâmbio de informações com administrações tributárias estrangeiras e, ao final, apontar pontos de fricção entre essa modalidade de cooperação internacional e os direitos e garantias fundamentais assegurados na Constituição Federal.

Com efeito, após a delimitação do tópico e do tema, foi preciso demarcar qual problema seria enfrentado ao longo do trabalho. Para tanto, foram realizadas pesquisas

exploratórias4 sobre o tema da troca de informações tributárias na doutrina e nos sites do

Ministério das Relações Exteriores5 (MRE), Ministério da Fazenda6 (MF) e Receita

Federal do Brasil7 (RFB). A pesquisa constatou que não existe, no Brasil, nenhuma

regulamentação pública da prática administrativa realizada pela RFB para a realização do intercâmbio de informações com administrações tributárias estrangeiras. Conta-se apenas

4A pesquisa foi realizada através das “abas” disponíveis em cada um dos portais, bem como mediante os termos “troca de informações”; “exchange of information” “intercâmbio de informações” e “informações tributárias” em campos de busca específicos de cada um dos sítios eletrônicos.

5Disponível em:<http://www.itamaraty.gov.br> Acesso 11/10/2012. 6Disponível em:<http://www.fazenda.gov.br> Acesso 11/10/2012. 7

(12)

com previsões genéricas na legislação e outras acordadas em instrumentos internacionais, que não explicitam nem detalham os trâmites a ser adotados pelos agentes fiscais na concretização do intercâmbio de informações. Essa lacuna é preocupante, pois a falta de regulamentação e de transparência da administração tributária brasileira em relação aos ritos adotados na troca de informações com outros Estados impede a sociedade de confrontar a adequação dessas atividades à proteção que o sistema jurídico confere aos direitos e garantias fundamentais assegurados aos contribuintes brasileiros por meio da Constituição Federal.

O problema identificado dá suporte à hipótese de que o exercício da atividade de fiscalização tributária não pode ocorrer à revelia dos direitos e garantias constitucionalmente assegurados. A ausência de regulamentação específica somada à falta de transparência dos trâmites administrativos não permite aferir se há uma procedimentalização das atividades administrativas referentes ao intercâmbio de informações tributárias. Ademais, as diversas modalidades de intercâmbio de

informações8 que serão apresentadas ao longo do trabalho possuem particularidades que,

dependendo do procedimento adotado pela administração fiscal brasileira, podem ensejar ou não a violação dos mencionados direitos e garantias fundamentais. Portanto, justifica-se a análijustifica-se do sistema regulatório e prático do intercâmbio de informações no Brasil.

1.2. Materiais, Método e Percurso de Pesquisa

Com o intuito de conhecer e mapear a instrumentalização adotada pela administração tributária brasileira em relação ao intercâmbio de informações com outros países, dividiu-se o trabalho em três etapas.

Na primeira fase, realizou-se uma pesquisa exploratória para a coleta e a análise de doutrina relativa à Troca de Informações em Matéria Tributária; Transparência Fiscal

(13)

Internacional; Planejamento Tributário; Modernização das Administrações Tributárias,

Direito em Rede e Direitos e Garantias Fundamentais9.

Em um segundo momento, com o intuito de compreender o cenário brasileiro e internacional sobre o intercâmbio de informações tributárias, realizou-se o estudo de relatórios elaborados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), quais sejam: (i) Global Forum on Transparency and Exchange of Information for Tax Purposes − Peer Review: Brazil 2012: Phase 1; (ii) Global Forum on Transparency and Exchange of Information for Tax Purposes − Peer Review: Brazil 2013: Phase 2; (iii) Manual on the Implementation of Exchange of Information

Provisions for Tax Purposes e; (iv) Addressing Base Erosion and Profit Shifting – 2013.

A opção de analisar principalmente relatórios da OCDE é fruto da maior participação e contribuição dessa organização no debate sobre o tema, bem como do fato de o Brasil ter sido avaliado por esta organização e recebido relatório individualizado e com a colaboração de autoridades fazendárias brasileiras sobre sua estrutura para a realização do

intercâmbio de informações10.

Também foram alvo de análise os acordos para evitar bitributação celebrados pelo

Brasil11 e o acordo para troca de informações tributárias concluído com os Estados

Unidos e regulamentado pelo Decreto n. 8.003/201312. Embora o Brasil tenha celebrado

acordos específicos para o intercâmbio de informações com outros países, apenas este encontra-se vigente, o que justificou sua escolha como um dos referenciais da pesquisa. Utilizou-se também o Manual de Intercâmbio de Informações com o Exterior da Receita

9Pesquisa realizada através das ferramentas de busca JSTOR e HEIN Online entre os dias 20/8/2012 a 23/8/2012, utilizando como referência de pesquisa os seguintes termos: “Exchange of information”; “Tax Information”; “EOI”; “Taxation, Cooperation”; “Taxpayer information”. Também foram consultados os bancos de dados da Biblioteca da Direito GV e de editoras especializadas na busca de obras específicas sobre o tema.

10

Para a realização do relatório Global Forum on Transparency and Exchange of Information for Tax Purposes − Peer Review: Brazil 2013: Phase 2, foram entrevistados: o Coordenador-Geral de Relações Internacionais da Receita Federal do Brasil – RFB, agentes fiscais da CORIN-RFB, Coordenadores da COPES e COFIS − RFB, especialistas das Coordenações de registros de contribuintes pessoas físicas e jurídicas-RFB e representantes da Advocacia-Geral da União, membros do Banco Central do Brasil, do Ministério das Relações Exteriores, da Comissão de Valores Mobiliários e do Departamento Nacional de Registro do Comércio. Cf. OECD (2013), Global Forum on Transparency and Exchange of Information for Tax Purposes Peer Review: Brazil 2012: Phase 2. p. 133.

11

Disponível

em:http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/AcordosInternacionais/AcordosDuplaTrib.htm Acesso em: 17/5/2013.

(14)

Federal do Brasil (RFB) para compreender as diretrizes e orientações adotadas pela administração tributária brasileira em relação ao tema.

Na terceira e última etapa do estudo, vislumbrou-se a realização de algumas entrevistas, não estruturadas, de autoridades que seriam importantes para complementar o estudo da doutrina e as informações extraídas dos relatórios da OCDE, tais como: o Coordenador-Geral de Relações Internacionais da RFB, o Chefe de Divisão da Coordenação-Geral de Administração Aduaneira da RFB, o Superintendente da RFB e a Analista de Políticas Tributárias do Global Forum on Transparency and Exchange of Information for Tax Purposes − OECD. As autoridades foram selecionadas a partir de suas funções dentro da administração tributária e também em razão do seu envolvimento com a temática do intercâmbio de informações. O objetivo das entrevistas era conhecer como a administração tributária brasileira se organiza e como ocorre a troca de informações com outros Estados.

Ao longo da pesquisa procurou-se estabelecer contato com as referidas

autoridades, tanto por meio pessoal13 como por correio eletrônico e meio telefônico.

Embora todas as autoridades tenham sido localizadas e contatadas, pouca foi a contribuição desses agentes para o desenvolvimento do presente estudo. Isto porque, nessa fase da pesquisa, o maior obstáculo foi a indisponibilidade e o desinteresse do fisco brasileiro em oferecer informações sobre as práticas de cooperação internacional com outros Estados.

Tendo em vista a grande dificuldade em extrair da administração tributária brasileira dados a respeito das práticas administrativas adotadas para a realização do

intercâmbio de informações, optou-se por utilizar a Lei n. 12.527/2011 − Lei de Acesso à

Informação (LAI)14, para efetivar o direito de acesso às informações públicas, previsto na

Constituição Federal15. Assim, realizou-se pedido de acesso à informação16, em nome

13 Nenhuma das autoridades se disponibilizou a realizar uma entrevista pessoal.

14 A Lei de Acesso à Informação orienta-se pelos princípios básicos de “observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção (art. 3º, I); divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações (art. 3º, II); utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação (art. 3º, III); fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública (art. 3°, IV); desenvolvimento do controle social da administração pública (art. 3°, V)”.

15Constituição Federal, art. 5°, XIV − é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.

(15)

próprio, com as mesmas questões respondidas insatisfatoriamente via correio eletrônico por uma das autoridades contatadas. A resposta apresentada pelo fisco limitou-se a fazer referência à sucinta mensagem eletrônica enviada pelo Coordenador-Geral de Relações Internacionais da RFB e que, portanto, as informações solicitadas já haviam sido

disponibilizadas, não havendo nada a acrescentar17.

Em paralelo, o NEF/FGV desenvolvia pesquisa sobre a importância da

Transparência Fiscal e da Lei de Acesso à Informação18. Foram realizados eventos para

comemorar o aniversário de um ano da vigência da LAI, e também, instaurar o Conselho Social de Transparência da Administração Tributária (CONSTAT). O Conselho é formado por professores e pesquisadores da DireitoGV, servidores públicos, advogados e empresários que têm tido uma atuação de destaque em defesa da transparência fiscal. A partir dos debates travados ao longo dos eventos do CONSTAT, tomou-se conhecimento da existência do documento interno da RFB denominado “Manual do Sigilo Fiscal da Receita Federal do Brasil”. O documento, criado por meio da Portaria n. 3.541/2011, da RFB, é um guia de orientação de como os servidores do fisco devem proceder diante de informações sigilosas. O NEF/FGV, por fontes não oficiais, teve acesso ao referido documento, que se encontra disponível apenas na intranet da administração tributária.

Nele, fazem-se inúmeras referências a um outro documento interno da RFB, o “Manual

de Troca de Informações com o Exterior”19

. Trata-se de instrumento pelo qual a

a) Existe algum diploma legal (lei, decreto, IN, portaria, resolução etc.) que discipline o intercâmbio de informações tributárias entre o Brasil e outros países ?

b) Há alguma área ou setor dentro da RFB para lidar especificamente com pedidos de trocas de informações em matéria tributária ?

c) Como ocorre o processo de intercâmbio de informações desde a chegada do pedido da informação até a disponibilização da informação?

d) Quando o Brasil pleiteia uma informação junto a outra administração tributária, qual é o setor da RFB responsável por elaborar e enviar o pedido ?

17 Em atenção à reclamação direcionada à Autoridade de Monitoramento do Ministério da Fazenda, Sr. Carlos Augusto Moreira Araújo, cumpre-nos informar que a Secretaria da Receita Federal, por meio dos servidores Flávio Antônio Gonçalves Martins Araújo e Talmon Paulo Freitas, enviou as informações solicitadas no dia 3/4/13 para o seguinte endereço eletrônico "frederico.bastos@outlook.com"

18“Criação do Conselho Social de Transparência na Administração Tributária –NEF/FGV” 19/3/2013 e “Um ano de vigência da Lei de Acesso à Informação e instauração do Conselho Social de Tranparência na Administração Tributária –NEF/FGV” 16/5/2013.

19

(16)

administração tributária brasileira norteia suas atividades e serviços em relação à troca de informações tributárias com outros Estados.

Novamente, por meio da Lei de Acesso à Informação, solicitou-se, em nome

próprio, o acesso ao referido documento20. A RFB, intempestivamente, respondeu ao

pedido de acesso à informação, negando acesso ao documento, sob o argumento de que, à luz do artigo 13, II, do Decreto n. 7.724/2012 e do artigo 15, II, da Portaria MF n. 233/2012, o pedido formulado era desproporcional e desarrazoado.

Em razão da decisão denegatória, foi elaborado recurso de primeira instância ao Ministério da Fazenda, contestando o indeferimento de acesso ao documento. A decisão

do recurso, também intempestiva21, foi proferida pelo Secretário-Adjunto da Secretaria da

Receita Federal e, segundo a decisão, o documento solicitado teria sido classificado como “reservado” pela Coordenação-Geral de Relações Internacionais (CORIN), sob o argumento legal de que o artigo 23 da Lei n. 12.527, de 2011, determina o acesso restrito às informações consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado que “possam comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações”22

.

Tendo em vista a constatação de pesquisa do Núcleo de Estudos Fiscais de que a

RFB não é isonômica no atendimento às solicitações de informação23, buscou-se acesso

Juliano Meira Ricci (ASAIN), Luiz Henrique Casemiro (ASAIN), Maria Cristina Tancredo Galloti (ASAIN) e Milton Mathias Diniz Júnior (COPEI).

20Sistema Eletrônico do Serviço de Informações ao Cidadão E-sic, sob o n. SIC-MF 16853000694201315, data de abertura 17/4/2013, data de resposta 5/6/2013: Gostaria de solicitar o acesso ao documento "MANUAL DE INTERCÂMBIO DE INFORMACOES COM O EXTERIOR" da Receita

Federal do Brasil.

Segundo tive informações, o respectivo documento pode ser encontrado na intranet da Receita Federal,

através do seguinte atalho:

INTRANET> SUBSECRETARIAS> SUARI> COORDENACOES GERAIS > CORIN> SERVICOS> TROCA DE INFORMACOES

21O Recurso de Primeira Intância foi interposto na data de 10/6/2013. O prazo legal para decisão do recurso era 17/6/2013, todavia, apenas em 19/7/2013 o recurso foi decidido.

22Lei n. 12.527/2011 − Art. 23. São consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado e, portanto, passíveis de classificação as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possam:

[...]

VIII − comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações.

(17)

ao mesmo documento em nome do NEF/FGV24. A resposta apresentada pela RFB, também negativa, alega que o documento solicitado “contém normas, procedimentos e formulários aplicáveis à execução” da troca de informações tributárias e que as “orientações nele estabelecidas estão ligadas ao tratamento da matéria em âmbito interna corporis”, impossibilitando, portanto, a disponibilização do documento25. Do mesmo

modo, foi elaborado recurso ao Ministério da Fazenda, que também intempestivamente26

indeferiu o pedido de acesso ao Manual de Troca de Informações com o Exterior da RFB, sob o mesmo argumento de que o documento se encontra classificado como “reservado”, tendo acesso restrito.

Em um primeiro momento, indeferiu-se o acesso ao documento sob a justificativa de que o pedido era desproporcional e desarrazoado. Em momento posterior, surge argumento novo, o de que tal documento teria sido classificado como “reservado”, visto que a ele se aplicaria o artigo 23 da Lei n. 12.527, de 2011, que determina o acesso restrito às informações consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado que “possam comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações”27

.

Diante da classificação que impõe restrição ao acesso do documento, interpôs-se recurso de segunda instância, em nome próprio e do NEF/FGV, ao Ministério da

Fazenda, que sob a chancela do Secretário da Receita Federal do Brasil28 reiterou o sigilo

24

Sistema Eletrônico do Serviço de Informações ao Cidadão – E-sic, sob o n. SIC-MF 16853000944201317, data de abertura 4/6/2013, data de resposta 17/6/2013: Gostaria de solicitar o acesso ao documento "MANUAL DE INTERCÂMBIO DE INFORMACOES COM O EXTERIOR" da Receita

Federal do Brasil.

Segundo tive informações, o respectivo documento pode ser encontrado na intranet da Receita Federal,

através do seguinte atalho:

INTRANET> SUBSECRETARIAS> SUARI> COORDENACOES GERAIS > CORIN> SERVICOS> TROCA DE INFORMACOES

25

Chama a atenção nas solicitações encaminhadas à administração tributária o fato de que a negativa do protocolo n. 16853000694201315 teve resposta, ainda que negativa, veio em duas páginas, em laudas oficiais e ratificada pelo Chefe de Gabinete da Secretaria da Receita Federal do Brasil. Já o protocolo n. 16853000944201317 teve a argumentação restrita a quatro parágrafos, sem laudas oficiais nem identificação do servidor responsável.

26O Recurso de Primeira Instância foi interposto na data de 27/6/2013. O prazo legal para decisão do recurso era 2/7/2013, todavia, apenas em 19/7/2013 o recurso foi decidido.

27Lei n. 12.527/2011 − Art. 23. São consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado e, portanto, passíveis de classificação as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possam:

[...]

VIII − comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações.

28

(18)

do documento e a falta de cooperação da administração tributária brasileira para o desenvolvimento deste estudo.

A frustração diante da RFB levou a cabo a interposição de recurso diretamente à Controladoria-Geral da União (CGU), conforme autorizado pelo artigo 16 da Lei n.

12.527/201129. A finalidade do recurso foi a desclassificação do Manual de Troca de

Informações com o Exterior como documento de natureza “reservada”. A CGU confirmou o recebimento do recurso em 26/8/2013 e se prestou ao levantamento de

esclarecimentos adicionais devido à complexidade do caso30. Em 11/12/2013, a CGU

informou “que o prazo para julgamento do mencionado recurso foi prorrogado até 10 de

janeiro de 2014, a fim de viabilizar a conclusão da análise diante da complexidade da matéria”. Na referida data, a CGU, por meio da sua ouvidoria-geral, apresentou decisão determinando à RFB que fornecesse, no prazo máximo de dez dias, o “acesso à parte não

29Lei n. 12.527/2011 − Art. 16. Negado o acesso a informação pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal, o requerente poderá recorrer à Controladoria-Geral da União, que deliberará no prazo de 5 (cinco) dias se:

I − o acesso à informação não classificada como sigilosa for negado;

II − a decisão de negativa de acesso à informação total ou parcialmente classificada como sigilosa não indicar a autoridade classificadora ou a hierarquicamente superior a quem possa ser dirigido pedido de acesso ou desclassificação;

III − os procedimentos de classificação de informação sigilosa estabelecidos nesta Lei não tiverem sido observados; e

IV − estiverem sendo descumpridos prazos ou outros procedimentos previstos nesta Lei.

§ 1° O recurso previsto neste artigo somente poderá ser dirigido à Controladoria-Geral da União depois de submetido à apreciação de pelo menos uma autoridade hierarquicamente superior àquela que exarou a decisão impugnada, que deliberará no prazo de 5 (cinco) dias.

§ 2° Verificada a procedência das razões do recurso, a Controladoria-Geral da União determinará ao órgão ou entidade que adote as providências necessárias para dar cumprimento ao disposto nesta Lei.

§ 3° Negado o acesso à informação pela Controladoria-Geral da União, poderá ser interposto recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, a que se refere o art. 35.

30

Prezado(a) Senhor(a),

Cumprimentando-o(a) cordialmente, confirmamos o recebimento do recurso apresentado a esta CGU em referência ao pedido de acesso à informação n. 16853.000694/2013-15.

Em conformidade com o art. 23, §1º, do Decreto 7.724/2012, procederemos ao levantamento de esclarecimentos adicionais sobre o caso. Tão logo obtidos tais esclarecimentos, encaminharemos e-mail a Vossa Senhoria informando o prazo limite para o julgamento deste recurso.

Convém esclarecer que o prazo para julgamento é calculado com fundamento no artigo 59 da denominada Lei do Processo Administrativo (Lei 9.784/99), o qual estabelece:

“Art. 59. Salvo disposição legal específica, é de dez dias o prazo para interposição de recurso administrativo, contado a partir da ciência ou divulgação oficial da decisão recorrida.

§ 1º Quando a lei não fixar prazo diferente, o recurso administrativo deverá ser decidido no prazo máximo de trinta dias, a partir do recebimento dos autos pelo órgão competente.

§ 2º O prazo mencionado no parágrafo anterior poderá ser prorrogado por igual período, ante justificativa explícita.”

Assim, o prazo máximo de análise e julgamento conferido à CGU é de sessenta dias, contados do recebimento dos esclarecimentos adicionais (que, em média, são encaminhados após dez dias de nossa solicitação).

Por fim, faz-se necessário esclarecer que o tempo de análise e julgamento, dentro do limite legalmente fixado, está diretamente relacionado com a complexidade da matéria objeto do recurso.

Atenciosamente,

(19)

sigilosa por meio de certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo” do “Manual de Intercâmbio de Informações com o Exterior”. A fundamentação da decisão da CGU baseia-se no fato de que o Termo de Solicitação de Classificação (TSC) de documentos é datado de 5 de julho de 2013, enquanto a data de produção do documento ocorreu em abril de 2008. Ou seja, a RFB solicitou a classificação do documento como sigiloso após a realização do pedido de acesso. Esse fato levou a CGU a concluir que, em relação ao manual, “não seria possível classificá-lo em 5 de julho de 2013 na qualidade de ‘reservado’, uma vez que a proteção de 5 (cinco) anos conferida pela LAI teria se exaurido há pelo menos dois meses”.

Por fim, na data de 23/1/2014, após nove meses, a RFB, intempestivamente, cumpriu a decisão, encaminhando uma cópia do documento com a ocultação das partes sob sigilo. O relatório completo sobre o processo para a disponibilização do documento bem como a cópia do Manual de Troca de Informações com o Exterior podem ser encontrados nos anexos deste estudo.

1.3. Limitações do Objeto de Estudo

O estudo do intercâmbio de informações tributárias tangencia diversos direitos e garantias assegurados aos contribuintes brasileiros, tais como o direito à intimidade, à privacidade, ao sigilo de dados, ao devido processo legal, à ampla defesa, ao

contraditório, à isonomia e à irretroatividade da lei tributária31. O tema é complexo e

possibilitaria análises sobre diversos aspectos legais. Contudo, o presente estudo não se propõe a realizar uma análise detalhada de cada um dos direitos e garantias fundamentais que se relacionam com a temática do intercâmbio de informações. Optou-se por mapear o sistema brasileiro para a realização do intercâmbio de informações com administrações tributárias estrangeiras e, ao final, apontar pontos de fricção entre essa modalidade de cooperação internacional e os direitos e garantias fundamentais assegurados na Constituição Federal brasileira.

Deste modo, esclarece-se que a partir do diagnóstico do sistema brasileiro serão levantadas possíveis repercussões jurídicas em relação ao intercâmbio de informações tributárias e os direitos e garantias fundamentais, ainda que outros debates jurídicos possam tangenciar o tema da troca de informações. Iniciativas, por exemplo, como o

31

(20)

Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA) e a Convenção Multilateral em

Assistência Administrativa Mútua em Assuntos Tributários serão abordados neste estudo sem a pretensão de esgotar a análise acerca dessas ferramentas de cooperação

internacional32. A análise de tais ferramentas será realizada na medida da participação

brasileira e dos impactos no sistema jurídico brasileiro. Outros instrumentos de cooperação internacional para fins de intercâmbio de informações como o RUBIK e a Diretiva n. 16/2011 da União Europeia não serão abordados neste estudo, uma vez que não se relacionam diretamente com o Brasil e com a administração tributária brasileira.

Assim, a análise específica de apenas determinados direitos e garantias fundamentais, a rigor, ocorre pelo fato de que não se examinam neste estudo os bens jurídicos que se situam fora da relação jurídica estabelecida pelo intercâmbio internacional de informações tributárias.

Também não se pretende analisar e exaurir todo o debate em relação à fricção entre os direitos e garantias fundamentais e o intercâmbio de informações no Brasil. O que se deseja é que, a partir do mapeamento do panorama regulatório e prático à disposição da administração tributária brasileira, seja possível apontar questões jurídicas relevantes para a proteção dos contribuintes em hipóteses de cooperação tanto passiva como ativa, ou seja, quando o Brasil figura como Estado solicitado e solicitante,

respectivamente33.

Para tanto, nos próximos capítulos analisa-se a doutrina nacional e estrangeira, relatórios de organizações internacionais e a moldura regulatória e prática da troca de informações tributárias no Brasil, para, ao final, apontar questões que estimulem o debate em relação à cooperação internacional para o intercâmbio de informações tributárias e a proteção de direitos e garantias dos contribuintes no sistema jurídico brasileiro.

32Em relação às análises empreendidas neste estudo, observa-se que o trabalho foi desenvolvido em um ambiente onde o intercâmbio de informações é a modalidade mais utilizada para a cooperação entre fiscos. No entanto, é preciso assinalar que a comunidade internacional tem caminhado no sentido de intensificar a prática do intercâmbio automático de informações, modalidade essa que pode apresentar algumas reflexões e consequências jurídicas diferentes daquelas apresentadas neste estudo.

(21)

2. GLOBALIZAÇÃO, DIREITO TRIBUTÁRIO E DESENVOLVIMENTO

“A tecnologia não é perversa; aumenta as tendências perversas da sociedade ou as tendências positivas da sociedade. As duas coisas. Bem ou mal, ela potencializa tudo”.

(Manuel Castells)

2.1. Globalização, Sociedade em Rede e o Direito Tributário

O fenômeno caracterizado pela integração dos países em razão da redução dos custos de comunicação e transporte, e do aumento do intercâmbio de produtos, serviços,

capital, pessoas e conhecimento, é denominado globalização34. Esse termo compreende

um conjunto de processos em que os Estados “veem a sua soberania, sua identidade, suas redes de comunicação, suas chances de poder e suas orientações sofrerem a interferência cruzada de atores transnacionais”35

.

A integração econômica, social, informacional, cultural e política da comunidade

internacional36, viabilizada através desse processo, é um reflexo da necessidade da

dinâmica do capitalismo de alcançar novos mercados37, possibilitando que as fronteiras

geográficas se enfraquecessem, as distâncias se aproximassem e as informações se

disseminassem em um fluxo inédito38. Atribui-se a esse panorama uma conotação de

transfronteirização39, caracterizada pela derrubada de fronteiras comerciais, industriais e

econômicas entre as nações do mundo inteiro40. Thomas Lauren Friedman entende a

globalização como “The loose combination of free-trade agreements, the internet and the integration of financial markets that is erasing borders and uniting the world into a

single, lucrative, but brutally competitive, marketplace”41.

34STIGLITZ, Joseph. E. A globalização e seus malefícios: a promessa não cumprida de instituições globais. Tradução de Bazán Tecnologia e Linguística. São Paulo: Futura, 2002.

35

ULRICH, Beck. O que é globalização? Equívocos do globalismo: respostas à globalização. São Paulo, Paz e Terra, 1999. p. 30.

36ULRICH, Beck. op. cit. p. 41-49.

37Cf. AVI-YONAH, Reuven S. Globalization and tax competition: implications for developing countries. Cepal Review n. 74. 2001.

38International Monetary Fund (2007). Global Capital Flows: Defying Gravity. Disponível em: <http://www.imf.org/external/pubs/ft/fandd/2007/03/picture.htm>. Acesso em: 12/3/2013.

39ARNAUD, André-Jean; JUNQUEIRA, Eliane Botelho (Org.). Dicionário da Globalização: Direito, Ciência Política. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. XI.

40ARNAUD, André-Jean; JUNQUEIRA, Eliane Botelho op. cit. p. XI.

(22)

Ernesto Lozardo42, sucintamente, divide o processo evolutivo da globalização em quatro fases. A primeira ocorrida durante os anos de 1870 a 1914, notadamente com a abertura dos Canais de Suez e Panamá, gerando redução de custos e das barreiras comerciais, bem como significativos avanços nos sistemas de transporte marítimo. A segunda fase abarcou os anos de 1950 até 1980, em razão da integração econômico-comercial entre países ricos, tais como Japão, Estados Unidos e países da Europa. A terceira fase tem início a partir de 1980, com os avanços nos sistemas de comunicação, o comércio eletrônico internacional, a abertura comercial entre países ricos e emergentes e do ambiente institucional aos investimentos internacionais. A quarta e atual fase está em seu início e, segundo o autor, é a era do conhecimento. Esse referencial histórico, ainda que breve, é significativo para que se possa compreender e pensar os problemas que nos circundam a partir do estágio em que vivemos. Afinal, não há texto sem contexto.

Essa era do conhecimento43 é percebida por Manuel Castells como um fenômeno

que se apresenta de maneira informacional, global e em rede:

É informacional porque a produtividade e a competitividade de unidades ou agentes nessa economia (sejam empresas, regiões ou nações) dependem basicamente de sua capacidade de gerar, processar e aplicar de forma eficiente a informação baseada em conhecimentos. É global porque as principais atividades produtivas, o consumo e a circulação, assim como seus componentes (capital, trabalho, matéria-prima, administração, informação, tecnologia e mercados) estão organizados em escala global, diretamente ou mediante uma rede de conexões entre agentes econômicos. É em rede porque, nas novas condições históricas, a produtividade é gerada, e a concorrência é feita em um rede global de interação entre redes empresariais44.

Tais transformações refletem diretamente na sociedade e em suas instituições, na economia e no próprio direito. Implicam, portanto, a necessidade de uma reorganização da vida social a fim de lidar com essa veloz e efêmera realidade. Especificamente no campo do direito, conceitos jurídicos que foram construídos no passado e acompanharam

ROBERTSON, Roland; KHOUDR, Habib Haque. Discourses of Globalization. International Sociology, vol. 13/1, 1998. p. 27, apud ARNAUD, André-Jean; JUNQUEIRA, Eliane Botelho (Org.). Dicionário da Globalização: Direito, Ciência Política. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 221.

42LOZARDO, Ernesto. Globalização: a certeza imprevisível das nações. São Paulo, Ed. do autor, 2007. p. 25.

43Cf. BANDEIRA, Guilherme Villela de Viana. Sociedade informacional, direito e democracia: Pensando o direito tributário para além da dogmática. Disponível em: http://www.fiscosoft.com.br/a/5ozy/sociedade- informacional-direito-e-democracia-pensando-o-direito-tributario-para-alem-da-dogmatica-guilherme-villela-de-viana-bandeira. Acesso em: 5/3/2013.

(23)

o direito até a modernidade, permitindo a construção de vários sistemas jurídicos45− tais como soberania do Estado, cidadania, território e jurisdição − são desafiados por essa sociedade em rede, que envolve e reduz os limites geográficos, amplia as conexões e

constantemente inova científica e tecnologicamente46.

Marco Aurélio Greco chama a atenção para o fato de que, no passado, os Estados (Estado-nação) restringiam-se a suas esferas econômicas, políticas, sociais e jurídicas. O mesmo autor acusa uma crise desta concepção de Estado a partir do século XX, e principalmente a partir do século XXI. Esta mudança de perfil trouxe reflexos em muitos campos e se caracteriza pela introdução da variável “global” numa relação que era originariamente “local”. Faz surgir uma nova feição de Estado47

, dotado de uma postura transnacional, de modo a incorporar à sua soberania questões e interesses de feição internacional.

Essas observações são relevantes para o Direito Tributário, pois, no âmbito global, a percepção da capacidade contributiva dos contribuintes torna-se cada vez mais difícil em razão dos diversos atores envolvidos, bem como devido às múltiplas e complexas atividades realizadas pelos contribuintes. As administrações tributárias acostumadas a planejar suas políticas sob o paradigma doméstico passam a ter de atuar à luz de contribuintes e operações compreendidas em âmbito internacional. Repensar a forma de atuação das administrações tributárias sob esse novo cenário é fundamental para que essas instituições possam de fato promover políticas tributárias coerentes e eficientes ao momento histórico atual.

Repensar a forma de atuação das administrações tributárias sob uma nova perpectiva é importante, uma vez que as instituições são responsáveis pelo grau de evolução e pelos limites em que os atores de uma sociedade operam, tornando inteligível

a conexão entre as regras do jogo e o comportamento dos diversos atores sociais48. Tendo

em vista o papel central das instituições para o desenvolvimento de uma nação, a administração tributária é instituição estratégica do sistema tributário nacional, responsável pela aplicação, interpretação da legislação, fiscalização e cobrança do crédito tributário. Deste modo, ao se repensar a atuação institucional da administração tributária,

45RODOTTÀ, Stefano, Conferência: Globalização e Direito. Procuradoria-Geral do Município do Rio de Janeiro – PGM, 11 de março de 2003, p. 1.

46Idem, p. 1.

47GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. São Paulo: Dialética, 2011. p. 425.

(24)

estar-se-á propondo não só um aprimoramento institucional, mas também um enriquecimento na aplicação do Direito.

Assim, a globalização vem impondo ao Direito novos desafios de adaptação, evolução e modernização de seus mecanismos, instituições e conceitos. O Direito Tributário − e, consequentemente, as administrações tributárias − não está imune a este desenvolvimento e deve adaptar-se à sociedade em rede.

2.2. O Planejamento Tributário Globalizado, a Internacionalização de Empresas e a Modernização das Administrações Tributárias

O processo de integração dos mercados e de internacionalização dos sistemas econômico-produtivos trouxe desafios e perspectivas em face dos diferentes sistemas

econômicos, políticos e jurídicos49 ao redor do mundo. Um dos grandes desafios desse

processo é a enorme mobilidade do capital50. A esse respeito, o Fundo Monetário

Internacional (FMI), em seu relatório Liberalizing Capital Movements: some analytical issue, aponta que: “The explosive growth of international financial transactions and capital flows is one of the most far-reaching economic developments of the late twentieth

century51. No entanto, esse significativo aumento no volume de transações internacionais e no fluxo de capitais deve ser observado com cautela, como bem pontua

Jagdish Bagwhati: “(...) capital flows, it’s like fire. Fire can be used to turn raw meat into

a wonderful steak. But it can also burn your house down52.

Essa cautela é justificada, uma vez que, nesse novo contexto mundial, as operações podem ser realizadas de maneira instantânea através de meios eletrônicos que também não se limitam às fronteiras geográficas de um único Estado, facilitando assim práticas como o planejamento tributário agressivo e a evasão fiscal. No campo do Direito Tributário, esse cenário permite a ação de agentes erosivos das bases tributáveis que o

49GRECO, Marco Aurélio et al. Manual de Direito Tributário Internacional. São Paulo: Dialética, 2012. p. 27.

50

Cf. AVI-YONAH, Reuven S. Globalization and tax competition: implications for developing countries. Cepal Review n. 74. 2001 e OECD (2013). Addressing Base Erosion and Profit Shifting. Disponível em:<http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/taxation/addressing-base-erosion-and-profit-shifting_9789264192744-en#page1>. Acesso em: 10/12/2013.

51

International Monetary Fund (1999). Liberalizing Capital Movements: Some analytical Issues. Disponível em: <http://www.imf.org/external/pubs/ft/issues/issues17/index.htm#1>. Acesso em: 13/3/2013.

(25)

economista Vito Tanzi convencionou nomear de “cupins fiscais” (fiscal termites)53, os quais, segundo o autor, seriam inerentes ao processo de globalização e responsáveis por fazer “ruir os pilares dos sistemas tributários”54

em todo o mundo. Tanzi defende a

existência de oito fiscal termites55: (i) Comércio e Transações eletrônicas – operações

virtuais são difíceis de ser rastreadas pelas administrações fiscais, principalmente em âmbito global, o que torna conceitos tradicionais para a definição da competência

tributária insuficientes, como, por exemplo, “estabelecimento permanente”. Nesse mesmo

sentido, destaca-se o comércio de músicas, fotografias e serviços oferecidos através do

ambiente virtual; (ii) Operações entre empresas relacionadas – empresas multinacionais

que atuam em diversos países e que possuem outras empresas relacionadas ao mesmo grupo econômico seriam um problema para os sistemas tributários dos países, ao buscarem alocação de custos e lucros de maneira potencialmente abusiva, como ocorre, por exemplo, nos casos de preço de transferência (transfer pricing); (iii) Centros

Financeiros Offshore e Paraísos Fiscais – a grande mobilidade do capital, a facilidade de

transmissão de informações, a flexibilidade regulatória e a falta de transparência oferecida nesses centros financeiros e paraísos fiscais estimulam a lavagem de dinheiro e

a evasão fiscal; (iv) Fundos de Cobertura (Hedge Funds) e Derivativos – esses

instrumentos financeiros, em geral localizados em paraísos fiscais, usufruindo da pouca regulação e transparência, seriam responsáveis pela grande dificuldade dos sistemas tributários de outros países em identificar os beneficiários e as transações realizadas

através desses instrumentos; (v) Ineficiência da tributação do capital financeiro – em

razão da maior integração dos mercados financeiros e da mobilidade dos capitais, a tributação desses capitais seria ineficiente, bem como ficaria limitada a seguir um padrão global, haja vista que uma alta carga tributária sobre o capital serve de incentivo para que os contribuintes busquem outras jurisdições com menores encargos; (vi) Moeda

eletrônica – a utilização do que o autor denomina e-cash substituindo a moeda real seria

uma tendência que dificultaria às administrações fiscais rastrear operações comerciais, principalmente as realizadas através da internet; (vii) Crescimento de operações

internacionais – é cada vez mais comum indivíduos que transacionam e preservam seus

patrimônios e reservas em diferentes países, a fim de evitar ou reduzir a carga tributária;

53Cf. TANZI, Vito. Globalization and the work of fiscal termites. Finance and Development. v. 38. n. 1. 2001. Disponível em:< http://www.imf.org/external/pubs/ft/fandd/2001/03/tanzi.htm>. Acesso em: 3/3/2013.

54Cf. Ibdem. p. 2. One can detect what may be called “fiscal termites” gnawing away at the foundations of their tax system.

(26)

(viii) Comércio exterior informal – intensa comercialização de commodities em países em que a tributação sobre esses produtos é menor, como, por exemplo, na negociação de tabaco e bebidas alcoólicas na fronteira entre Brasil e Paraguai.

A erosão da base tributável e a transferência de lucros é uma questão significativa e que, mais recentemente, também tem recebido a atenção do grupo de países que compõem o G20 e a OCDE, como se observa no relatório Addressing Base Erosion and Profit Shifting de 2013. Segundo o relatório, as atuais normas tributárias internacionais

talvez não tenham conseguido acompanhar as mudanças e o ritmo do ambiente de negócios globalizado. Com efeito, regras domésticas em matéria de tributação internacional e regras internacionalmente acordadas continuam a ser fundamentadas em um ambiente econômico caracterizado por um menor grau de integração econômica, em vez de considerar o atual ambiente de contribuintes globais, caracterizado pela mobilidade do capital e pela constante evolução das tecnologias da informação e

comunicação56.

Essa assimetria entre regras tributárias domésticas, internacionais e as práticas comerciais reflete diretamente no poder arrecadatório dos Estados, pois os agentes erosivos apresentados constituem variáveis que fornecem aos contribuintes oportunidades

para a evasão fiscal e para um planejamento tributário agressivo57. Sob a ótica de Marco

Aurélio Greco, isso ocorreria em razão:

(i) da dificuldade de apurar e, portanto, tributar os rendimentos provenientes de capitais extremamente voláteis, o que implica, também, desigualdades em relação a outros tipos de rendimento, mais ligados à dimensão terrena (como rendimentos imobiliários e aqueles de trabalho; (ii) da concorrência das legislações de favorecimento, aptas a atrair a alocação de atividades produtivas; (iii) da utilização dos meios de comunicação, em especial, a internet e o e-mail: permitiram o off-shore eletronicc commerce, que pode escapar do controle do Fisco e, portanto, da tributação58.

56OECD (2013). Addressing Base Erosion and Profit Shifting. Disponível em:< http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/taxation/addressing-base-erosion-and-profit-shifting_9789264192744-en#page1. Acesso em: 10/12/2013. p. 5-7.

57SLEMROD, Joel; YITZHAKI, Shlomo. “Tax avoidance, evasion, and administration”, Handbook of Public Economics, in: A. J. Auerbach & M. Feldstein (ed.), Handbook of Public Economics, edition 1, volume 3, chapter 22, Elsevier, 2002. p. 5.

58

(27)

Como observa Vito Tanzi, os sistemas tributários de muitos países foram desenvolvidos em uma época em que o comércio entre países era limitado e o fluxo de capitais era praticamente inexistente, de maneira que uma tributação estabelecida em

bases territoriais (territorial income taxation) era satisfatória59. No entanto, como forma

de adaptar-se à mobilidade do capital e aos planejamentos tributários que extrapolam as fronteiras dos Estados, muitos países deixaram de adotar o sistema tributário em bases territoriais, para adotar um sistema tributário em bases universais (worldwide income taxation).

O Brasil é um dos países que adotava o princípio da territorialidade para a tributação sobre a renda, ou seja, nenhuma renda cuja fonte de produção se localizasse no exterior era tributada para efeitos de incidência do imposto sobre a renda das pessoas jurídicas (IRPJ), nos termos do artigo 63 da Lei n. 4.506/1964 e do artigo 11 do Decreto-Lei n. 2.429/1988. Adequando-se à mobilidade do capital, a tributação das pessoas jurídicas pelo imposto sobre a renda em bases estritamente territoriais foi extinta pela Lei

n. 9.249/199560, inaugurando-se assim o princípio da universalidade da renda auferida

pelas pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, à luz do que já acontecia em relação às

pessoas físicas61. Segundo o princípio da universalidade, a renda da pessoa física ou

jurídica deve ser tributada no país de sua residência, incluindo as rendas auferidas no exterior. Ambas as formas de tributação são possíveis com base nos elementos de

conexão62: (i) povo e/ou; (ii) território. Esses elementos são essenciais para a limitação do

poder de tributar de um Estado, porquanto, se o Estado estiver de algum modo vinculado a uma dessas duas variáveis, poderá submeter o contribuinte à sua autoridade. Daí o surgimento de regras prevendo a tributação da renda auferida pelos residentes no respectivo território (qualquer que seja o local em que obtida) ou então a renda gerada no

59TANZI, Vito. Globalization, Tax Competition by the future: In: UCKMAR, Victor. Curso de derecho tributário internacional. Temis: Bogotá, 2003. t. 1. p. 9. Apud. ZILVETI, Fernando A.; TORO, Carlos Eduardo Costa M. A.; BRITTO, Bianca Maia. Interpretação de tratados internacionais. IN: SANTI, Eurico Marcos Diniz de; ZILVETI, Fernando A.; MOSQUERA, Roberto Quiroga. Direito Tributário: Tributação Internacional. Coord. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 38.

60Modificada parcialmente pela Lei n. 9.532/1997.

61No ordenamento jurídico brasileiro, o princípio da universalidade é aplicado às pessoas físicas desde o Decreto-Lei n. 1168, de 22/3/1939. O princípio também se encontra presente na Lei n. 7713/1988, em seu artigo 3º, parágrafo 4º, e no Regulamento do Imposto de Renda – RIR 99, em seu artigo 38.

(28)

respectivo território (qualquer que seja a pessoa que a obtenha)63. Dessa forma, a administração fiscal aumenta sua base de cálculo e interage melhor com a realidade globalizada das operações comerciais.

A Constituição Federal brasileira garante o direito fundamental à livre-iniciativa

em seu artigo 1º, IV64. Esse direito é reiterado pelo artigo 170, também da CF, que

determina a livre concorrência como um dos princípios gerais da atividade econômica65.

Além disso, o princípio da legalidade é um dos princípios constitucionais tributários e estabelece a noção de liberdade negativa, ou seja, na atividade privada tudo aquilo que

não é proibido por lei, é permitido66. Posto isso, acredita-se que o contribuinte tenha

plena liberdade para conduzir os seus negócios do modo que lhe aprouver. O combate ao planejamento tributário agressivo, à evasão e à elisão fiscais não significa, necessariamente, o impedimento à atividade de planejamento tributário. O contribuinte é livre para optar pela estruturação dos seus negócios e pela formatação de sua empresa de

modo que lhe permita a economia do tributo. Como ensina J. Hey, “não há nenhum dever

patriótico que leve alguém a pagar o imposto mais alto”67

. Assim, à luz dos dispositivos constitucionais apresentados, o planejamento tributário é aceito como forma de economizar tributos, desde que não incidam as hipóteses positivadas no parágrafo único

do artigo 11668 e artigo 14969, VII, ambos do Código Tributário Nacional (CTN)70, pois,

como bem alerta Marco Aurélio Greco, cometer ilícito não é planejar71.

63ZILVETI, Fernando A.; TORO, Carlos Eduardo Costa M. A.; BRITTO, Bianca Maia. Interpretação de tratados internacionais. IN: SANTI, Eurico Marcos Diniz de; ZILVETI, Fernando A.; MOSQUERA, Roberto Quiroga. Direito Tributário: Tributação Internacional. Coord. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 164. 64Constituição Federal de 1988 - Artigo 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: IV − os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa;

65

Constituição Federal de 1988 - Artigo 170 A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IV − livre concorrência;

66Constituição Federal de 1988. Artigo 5º − Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

II − ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

67Spezialgesetzliche missbrauchsgesetzgebung aus Steuersystenatischer, verfassungs und Europa-rechtlicher sicht. Steuer und Wirtschaft 2008 (2):169. Apud TORRES, Ricardo Lobo. Planejamento Tributário: elisão abusiva e evasão fiscal. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. p. 10. Ver também: Helvering v. Gregory, 69 F.2d 809, 810-11 (2d Cir. 1934). “Any one may so arrange his affairs that his taxes shall be as low as possible; he is not bound to choose that pattern which will best pay the Treasury; there is not even a patriotic duty to increase one's taxes”.

68Código Tributário Nacional de 1966. Artigo 116 − Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:

(29)

Contudo, a ponderação sobre os limites do planejamento tributário não é um

debate sobre fórmulas matemáticas72. Em razão disso, a delimitação das hipóteses

previstas e protegidas pelo ordenamento constitui um constante desafio ao aplicador das normas, haja vista que, no plano dos fatos, ocorrem múltiplas e distintas condutas praticadas pelos contribuintes, cada qual com perfis e interesses únicos. Logo, o critério exclusivo de subsunção das condutas realizadas pelos contribuintes às hipóteses

positivadas não garante uma diferenciação segura entre evasão e elisão fiscal73. Pois,

ainda que se defina a legalidade como o divisor de águas entre essas duas variáveis, na

prática, essa fronteira é turva, permitindo diferentes interpretações74. Esse problema se

potencializa quando pensamos em diversos sistemas tributários, cada um com suas limitações e conceitos, atuando de maneira interligada.

A atuação de empresas internacionais, como já apontado anteriormente, é uma

realidade, bem como a enorme concorrência para a conquista de novos mercados75. A

esse respeito, Ulrich Beck observa que se está a lidar com “empresas [que] podem

produzir em um país, pagar impostos em outro e exigir investimentos públicos sob a

forma de aprimoramento da infraestrutura em um terceiro”76. Essa realidade tem tornado

o planejamento tributário agressivo e a evasão fiscal internacional77 fenômenos cada vez

mais significativos para as atividades das administrações tributárias78. Isto porque as

empresas aptas a competir nesse cenário global acabam por explorar lacunas nas II − tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. 69Código Tributário Nacional de 1966. Artigo 149 − O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: VII − quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;

70

Cf. GRECO, Marco Aurélio. op. cit. p. 85. 71Cf. GRECO, Marco Aurélio op. cit. p. 89. 72Cf. GRECO, Marco Aurélio. op. cit. p. 88.

73Observa-se que a maioria da doutrina brasileira reconhece apenas dois campos de atuação do contribuinte: a elisão (conduta lícita) e a evasão (conduta ilícita). Cf. GRECO, op. cit.

74SLEMROD, Joel; YITZHAKI, Shlomo. "Tax avoidance, evasion, and administration," Handbook of Public Economics, in: A. J. Auerbach & M. Feldstein (ed.), Handbook of Public Economics, edition 1, volume 3, chapter 22, Elsevier, 2002. p. 18.

75

Ver Ranking das Transnacionais Brasileiras: os benefícios da internacionalização. Fundação Dom Cabral, 2012.

76ULRICH, Beck. op. cit. p. 18.

77Cf. GRECO, Marco Aurélio, op. cit. p. 85. Às vezes encontramos textos ou exposições de autores que procuram defender intransigentemente que o correto é dizer elusão e não elisão, ou então elisão e não evasão lícita etc. Esta preocupação terminológica é útil, desde que não se transforme em mera discussão de palavras.

Referências

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