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3. POLÍTICA TRIBUTÁRIA GLOBAL: O INTERCÂMBIO INTERNACIONAL DE

3.2. Modalidades de Intercâmbio de Informações Tributárias

3.2.3 Intercâmbio Automático (Automatic Exchange of information)

O intercâmbio automático de informações entre administrações tributárias consiste em uma troca de dados regular ou sistemática, sem a necessidade de pedido prévio. Na visão de Bernard Plagnet, as trocas automáticas de informações estabelecem

que “os Estados contratantes transmitem, sem pedido prévio e de maneira periódica, as

163OECD (2006) Manual on the Implementation of Exchange of Information Provisions for Tax Purposes:

Module on Spontaneous Exchange of Information. Disponível em: http://www.oecd.org/tax/exchange-of- tax-information/36647823.pdf. Acesso em 18/6/2013. p. 5.

164Cf. OLIVEIRA, Maria Odete Batista de. O Intercâmbio de Informação tributária: Nova disciplina

comunitária, Estado actual da prática administrativa, Contributos para uma maior significância deste instrumento. Almedina: Coimbra, 2012. p. 203-206.

informações referentes a uma ou a diversas categorias de rendimentos cuja fonte se encontra num Estado e recebidas por residente do outro Estado”165.

Esta modalidade de intercâmbio acaba por aproveitar as formas domésticas de obtenção de informação, haja vista que a legislação prevê obrigações a que os sujeitos passivos devem dar cumprimento. Deste modo aflui à administração tributária um conjunto de informações que possibilitam o intercâmbio automático166.

A OCDE divide o processo de coleta, tratamento e compartilhamento automático das informações tributárias em sete passos essenciais167

: (i) o contribuinte informa sua identidade e outras informações fiscais a uma fonte pagadora ou instituição responsável, permitindo que suas informações fiscais possam ser coletadas ou que possam ser geradas outras informações a partir daquelas prestadas pelo próprio contribuinte; (ii) a fonte pagadora ou instituição responsável pelo pagamento reporta as informações dos contribuintes não residentes às administrações tributárias do país da fonte; (iii) a administração tributária do país da fonte consolida as informações recebidas de acordo com o país de residência; (iv) as informações são criptografadas e enviadas à administração tributária do país de residência do contribuinte; (v) a informação é recebida e descriptografada no país de residência do contribuinte; (vi) o país de residência do contribuinte inicia o processamento automático ou manual das informações recebidas; e (vii) o país de residência do contribuinte analisa os resultados e, se necessário, pode solicitar informações mais detalhadas à administração estrangeira ou, caso já possua as informações suficientes, adotar medidas para garantir o cumprimento das obrigações tributárias.

A OCDE sugere que o intercâmbio automático de informações pode ser utilizado em relação a dados sobre mudança de domicílio fiscal do contribuinte, identificar a propriedade e os rendimentos de bens imóveis, dividendos, juros, royalties, ganho de

165PLAGNET, Bernard. Droit fiscal internacional. Paris: Litec, 1986. p. 319. Apud BORGES, Antônio de

Moura; KHOURY, Laila José Antônio. O intercâmbio de informações aobre matéria tributária entre administrações estrangeiras:posição atual e especificidades do Brasil. In Sigilo Bancário e Fiscal – Homenagem ao jurista José Carlos Moreira Alves. Coord. Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho e Vasco Branco Guimarães. Belo Horizonte: Forum, 2011, p. 359.

166

OLIVEIRA, Maria Odete Batista de. O Intercâmbio de Informação tributária: Nova disciplina comunitária, Estado actual da prática administrativa, Contributos para uma maior significância deste instrumento. Almedina: Coimbra, 2012. p. 200.

167OECD (2012), Automatic Exchange of Information:what it is, how it works, benefits, what remains to be

capital, salários, pensões, vencimentos, comissões e outros pagamentos semelhantes168. Essas informações são, então, repassadas automaticamente ao Estado com o qual se mantém acordo de cooperação.

Em razão da evolução das tecnologias da informação e da comunicação, as potencialidades desta modalidade de intercâmbio são enormes. Ao mesmo tempo é necessário que haja alguma preocupação em padronizar a forma e o modo com que se transmitem os dados, uma vez que o simples envio de um enforme fluxo de informações não tratadas, sem um formato padrão e em diversos idiomas, torna pouco efetiva a aplicação dessas informações na atividade das administrações tributárias. Desse modo, a OCDE169 recomenda que alguns componentes sejam observados para que seja possível um efetivo intercâmbio automático de informações. Sob a ótica do país que recebe as informações, deve-se estabelecer quais as transações serão analisadas e quais informações dos contribuintes serão coletadas nessas transações. Também deve haver preocupação com a qualidade da informação coletada, os prazos para a coleta das informações, os formatos de utilização, encriptação e transmissão das informações. Por fim, o país receptor das informações deve preocupar-se com a avaliação dos riscos e ações para garantir o cumprimento das obrigações tributárias. Sob a perspectiva do país que envia as informações, deve-se atentar também para assegurar a confidencialidade das informações transmitidas, bem como buscar implementar mecanismos de reciprocidade, reconhecimento e feedback.

Embora nessa modalidade não haja recomendação em relação a informar o contribuinte acerca do intercâmbio de suas informações fiscais, a OCDE orienta os países para que acordem por meio de um Memorandum of Understanding os termos e condições da troca automática. Tal acordo estabelece os tipos de informações a serem trocadas automaticamente, detalhes sobre os procedimentos de envio, recebimento da informação e o formato adequado170.

168OECD (2006) Manual on the Implementation of Exchange of Information Provisions for Tax Purposes:

Module on Automatic Exchange of Information. Disponível em: http://www.oecd.org/tax/exchange-of-tax- information/36647823.pdf. Acesso em 18/6/2013. p. 4-5.

169

OECD (2012), Automatic Exchange of Information: what it is, how it works, benefits, what remains to be done. p. 21.

170OECD (2006) Manual on the Implementation of Exchange of Information Provisions for Tax Purposes:

Module on Automatic Exchange of Information. Disponível em: http://www.oecd.org/tax/exchange-of-tax- information/36647823.pdf. Acesso em 18/6/2013. p. 4.

O sucesso do intercâmbio automático de informações reside, portanto, mais em medidas para assegurar que as informações intercambiadas sejam úteis e possibilitem o aumento do cumprimento das obrigações tributárias, do que simplesmente em aumentar o fluxo de informações entre as administrações tributárias171. Para garantir resultados concretos em relação à troca automática, é essencial que o país receptor seja capaz de combinar as informações recebidas e utilizá-las dentro de sua atividade fiscalizatória. Para tanto, os governos precisam realizar investimentos em tecnologia a fim de que possam coletar, tratar e transmitir um grande fluxo de dados de forma segura e eficiente. Jeffrey Owens observa ser necessária a criação de uma plataforma operacional comum, o estabelecimento de um robusta estrutura tecnológica, bem como o comprometimento de recursos por parte das administrações tributárias e instituições financeiras. Uma vez que esses compromissos tiverem sido assumidos, o intercâmbio automático constitui uma

poderosa ferramenta para aumentar o nível de cumprimento das obrigações tributárias172.

Nesse sentido, a OCDE, no relatório Standard for Automatic Exchange of Financial Account Information: Common Reporting Standard, já propõe uma plataforma operacional comum a fim de estabelecer um padrão internacional para o intercâmbio automático de informações tributárias173.

Embora esse trabalho tenha sido desenvolvido em um cenário em que o intercâmbio a pedido ainda seja a modalidade mais comum para a realização de troca de informações tributárias, existe um grande esforço da OCDE para que a troca automática

constitua um importante complemento ao intercâmbio a pedido em um futuro próximo174.

Percebe-se, portanto, que se está diante de um momento de transição de modelos, conforme adverte Jeffrey Owens: It is clear we are moving into a new era of information exchange that is characterizad by being both automated and multilateral in nature175.

Instrumentos como o Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA) dos Estados Unidos, a Convenção Multilateral em Assistência Administrativa Mútua em

171OECD (2012), Automatic Exchange of Information: what it is, how it works, benefits, what remains to

be done. p. 23.

172

OWENS, Jeffrey. The long march towards tax transparency. In: Transparência Fiscal e Desenvolvimento: Homenagem ao Professor Isaias Coelho. Coord.: Eurico Marcos Diniz de Santi; Frederico Silva Bastos; Daniel Leib Zugman; Basile Georges Christopoulos. 1. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2013, p. 463.

173

OECD (2014), Automatic Exchange of Financial Account Information: Common Reporting Standard. Disponível em: http://www.oecd.org/ctp/exchange-of-tax-information/automatic-exchange-of-financial- account-information.htm>. Acesso em: 17/02/2014.

174Ibidem. p. 460. 175

Assuntos Tributários, o RUBIK da Suíça e a Diretiva n. 16/2011 da União Europeia já preveem o intercâmbio automático de informações tributárias. Além desses, a OCDE também tem trabalhado no desenvolvimento de um projeto piloto para a elaboração de modelo multilateral padrão, visando à realização do intercâmbio automático de informações de modo seguro, acessível financeiramente e de acordo com as características dos países176.

Essa modalidade de intercâmbio de informações tem alcançado números significativos. A União Europeia, por exemplo, já realiza o intercâmbio automático em 85% dos seus acordos internacionais. A Dinamarca é o país que realiza a troca automática

de informações com o maior número – setenta − de países. Uma pesquisa realizada pela

OCDE constatou que as transações e os valores reportados por meio do intercâmbio automático de informações variaram entre alguns milhões de euros até o pico de 200 bilhões de Euros177.

O acordo para troca de informações celebrado com os Estados Unidos não prevê a possibilidade de intercâmbio automático de informações, assim como os acordos para evitar dupla tributação celebrados pelo Brasil, salvo no caso do acordo entre Brasil e Portugal. Esse instrumento, assinado em 2001, prevê em seu artigo 26 a possibilidade de troca automática de informações178. Nesse sentido, a Convenção Multilateral sobre Assistência Mútua em Matérias Tributárias e o FATCA também preveem a troca automática de informações. Contudo, embora já tenha celebrado instrumentos

176

Cf. OECD (2013). A Step Change in Tax Transparency: Delivering a standardised, secure and cost effective model of bilateral automatic exchange for the multilateral context. Report for the G8 Summit.

177OECD (2012), Automatic Exchange of Information: what it is, how it works, benefits, what remains to

be done. p. 15.

178

Artigo 26, 3º, do Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e a República Portuguesa Destinado a Evitar a Dupla Tributação e a Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, celebrado em Brasília, em 16 de maio de 2000. 3. A autoridade competente de um Estado Contratante fornecerá à autoridade competente do outro Estado Contratante, anualmente, mediante prévia identificação dos contribuintes, ou poderá fornecer, mesmo sem a sua prévia identificação, as seguintes informações normalmente prestadas pelos contribuintes:

a) informações respeitantes aos lucros obtidos no seu território por pessoas jurídicas ou estabelecimentos estáveis aí situados, a remeter à autoridade competente do Estado Contratante onde esteja domiciliada a pessoa jurídica associada ou a matriz ou sede;

b) informações sobre os lucros declarados por pessoas jurídicas domiciliadas no primeiro Estado Contratante relativos às operações desenvolvidas no outro Estado Contratante por pessoas jurídicas associadas ou estabelecimentos estáveis;

internacionais que preveem o intercâmbio automático, o Brasil ainda não colocou em prática tal ferramenta179.

É preciso atentar para as ferramentas que prescrevem o intercâmbio automático de informações tributárias, uma vez que existem questões constitucionais que permeiam a transmissão de dados automaticamente pelo Brasil. Essas questões serão abordadas em momento específico deste estudo, sem a pretensão de esgotar todas as repercussões jurídicas desta modalidade de intercâmbio, haja vista que a falta de aplicação da troca automática no Brasil não permite uma análise mais aprofundada.

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