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A cultura organizacional do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia: uma abordagem baseada nas contribuições de autores do pensamento social brasileiro

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ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO

A CULTURA ORGANIZACIONAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA: UMA ABORDAGEM BASEADA NAS CONTRIBUIÇÕES DE AUTORES DO

PENSAMENTO SOCIAL BRASILEIRO

DANIELLA MUNHOZ DA COSTA LIMA

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DANIELLA MUNHOZ DA COSTA LIMA

A CULTURA ORGANIZACIONAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA: UMA ABORDAGEM BASEADA NAS CONTRIBUIÇÕES DE AUTORES DO

PENSAMENTO SOCIAL BRASILEIRO

Tese apresentada à Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas como pré-requisito para obtenção do título de doutor em Administração

Orientadora: Fátima Bayma de Oliveira

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AGRADECIMENTOS

Por incrível que pareça, fazer os agradecimentos de uma tese não é tarefa fácil. São tantas pessoas que merecem ser lembradas por ter de alguma forma participado desta longa jornada, que se faz necessário um esforço de memória para que nenhuma injustiça seja cometida.

Gostaria de começar meus agradecimentos pela minha família que sempre foi meu porto seguro. Agradeço, assim, aos meus pais que sempre me apoiaram em todos os momentos da minha vida e aos meus filhos que foram compreensivos e generosos com minhas ausências, indisponibilidades, mudanças de humor e, mais do que isso, foram um importante conforto.

Agradeço especialmente à minha orientadora Professora Fatima Bayma, que me acolheu num momento delicado e agradeço, também, à Professora Valderez Fraga, que me co-orientou, pela acolhida, sensibilidade e paciência, além das preciosíssimas contribuições ao desenvolvimento deste trabalho.

A jornada do doutorado permitiu-me encontrar pessoas maravilhosas que não posso deixar de mencionar. Aos meus colegas de turma Anderson, Carlyle, Claudio, Edson, Leonardo, Oscar, Priscila e Tania, que estiveram junto comigo nos bons e maus momentos, o meu sincero agradecimento.

Agradeço, ainda, a Celene, o anjo da guarda da turma 2010, e a Alessandra Costa pelo importante apoio em momentos difíceis como o do ensaio teórico e ao longo de todo o processo.

Ao Professor Paulo Emilio Martins, que iniciou minha orientação e inspirou meus primeiros contatos com os autores do pensamento social brasileiro.

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RESUMO

O presente trabalho teve o objetivo de identificar os elementos da cultura organizacional do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) à luz das contribuições de autores do pensamento social brasileiro - representados neste estudo por Sergio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro, Darcy Ribeiro e Celso Furtado. O tema cultura tem recebido, nas últimas décadas, relativa atenção na área de estudos organizacionais. Apesar da atenção recebida, é possível perceber lacunas na produção acadêmica sobre o tema quanto à atenção dispensada ao contexto nacional e às instituições do setor público, especialmente no que se refere ao Poder Judiciário. Nesse sentido, o presente trabalho analisou a produção acadêmica nacional sobre cultura organizacional brasileira nos últimos vinte anos e buscou identificar possibilidades de utilização dos autores do pensamento social brasileiro numa abordagem de cultura organizacional que considerasse o contexto nacional. Na etapa de coleta de dados, foram realizadas trinta e sete entrevistas semiestruturadas com servidores do TJBA, no período de fevereiro a julho de 2013. A análise do corpus de dados foi feita pelo método de análise de conteúdo, com auxilio do software ATLAS.ti. A análise dos dados apontou para possibilidades de utilização das ideias dos autores do pensamento social brasileiro no estudo da cultura organizacional, principalmente na identificação da influência dos traços culturais nos valores e práticas sociais dos servidores. A análise apontou também para uma ausência de elementos baseados em valores gerencialistas na cultura organizacional desta instituição, buscando provocar uma reflexão sobre o alcance e a adequação do modelo de reforma adotado no Judiciário. Como contribuição, esta tese buscou realizar um mapeamento da cultura organizacional do TJBA, gerando uma contribuição empírica para um aprofundamento do conhecimento do Poder Judiciário sob o aspecto de universo organizacional e para os estudos que utilizam o pensamento social brasileiro, que em sua maioria têm se tratado de ensaios teóricos.

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ABSTRACT

This work had the objective of analyzing the organizational culture of the State of Bahia’s Tribunal of Justice(TJBA), from a perspective that considered the possibilities to utilize authors of brazilian social thinking – represented in this study by Sergio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro, Darcy Ribeiro and Celso Furtado. The culture theme has been receiving, in the last decades, relative attention in the area of organizational studies. Despite the attention received, it is possible to perceive gaps in academic production about the theme on the attention paid to the national context and to the institutions of the public sector, especially on what refers to the Judictiary Power. In this sense, this work has analyzed the national academic production on brazilian organizational culture in the last twenty years and seekes to identify possibilities to utilize the authors of brazilian social thinking in an organizational culture approach that considered the national context. In the data collection stage, were made thirty-seven semi-structured interviews with employees of the TJBA, in the period from

february to july of 2013. The data corpus’ analysis was made with the method of content

analysis, with the help of the software ATLAS.ti. The data analysis pointed towards possibilities to utilize the ideas of authors of brazilian social thinking in the study of organizational culture, mainly in the identification of the influence of cultural traces in the

workers’ values and social practices. The analysis also indicated an absence of elements based

on managerialist values in this institution’s organizational culture, seeking to provoke a reflection on the reach and adequation of the reform model adopted by the Judictiary Power.

For contribution, this thesis has seeked to realize a mapping of TJBA’s organizational culture,

creating an empiric contribution to the deepening of knowledge on the Judictiary Power on the aspect of organizational universe and to the studies that utilize brazilian social thinking, that has mostly been consisting of theoretical essays.

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LISTA DE ABREVIATURAS

CF – Constituição Federal

CNJ – Conselho Nacional de Justiça

MARE – Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado

NPM – New Public Management

PDRAE – Plano Diretor da Reforma do aparelho do Estado

STF – Superior Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

TJ – Tribunal de Justiça

TJBA – Tribunal de Justiça do Estado da Bahia

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Interseções entre os conceitos de cultura e de organização 29

Quadro 2: Exemplo de produção acadêmica nacional sobre cultura organizacional

brasileira 69

Quadro 3: Possibilidades de aplicação do pensamento de Faoro, Holanda, Ribeiro e

Furtado nos estudos organizacionais. 77

Quadro 4: Despesa da Justiça por habitante por Unidade da Federação 94

Quadro 5: Grade de categorias de análise e códigos 103

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SUMÁRIO

1 O PROBLEMA, 13

1.1 Introdução, 13

1.2 Objetivos, 16

1.3 Delimitação do estudo, 17

1.4 Relevância do estudo, 18

2 REFERENCIAL TEÓRICO, 20

2.1 As origens do conceito cultura, 20

2.2 Cultura organizacional: conceitos, perspectivas e polêmicas, 21

2.2.1 Homogeneidade ou heterogeneidade da cultura, 24

2.2.2 A possibilidade ou a impossibilidade de gerenciar a cultura organizacional, 28

2.2.3 Outras polêmicas que envolvem culturas nas organizações, 33

2.3 Cultura brasileira: a formação do Brasil, aspectos e traços na voz de seus intérpretes, 39 2.3.1 O homem cordial de Sergio Buarque de Holanda, 43

2.3.2 O pensamento político de Raymundo Faoro, 45

2.3.3 O povo brasileiro de Darcy Ribeiro, 50 2.3.4 Celso Furtado e o longo amanhecer, 54

2.4 O Pensamento Social Brasileiro nas Ciências Sociais, 59

2.5 Cultura organizacional brasileira: reflexões sobre a produção acadêmica nacional, 63 2.5.1. O Pensamento Social Brasileiro e a Cultura Organizacional Brasileira, 63

2.5.2. Reflexões sobre a produção acadêmica nacional sobre cultura organizacional Brasileira, 66

2.5.3. Possibilidades inexploradas do Pensamento social Brasileiro nos estudos sobre cultura nas organizações, 74

2.6 O Ambiente Público e a Crise e Reforma do Estado Brasileiro, 79

2.6.1 O New Public Management (NPM) e Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro, 79 2.6.2 O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Reforma do Judiciário Brasileiro, 85

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4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS, 95

4.1 Definição de Paradigma, 95 4.2 Desenho de Pesquisa, 97 4.3 Coleta de Dados, 98

4.4 Tratamento dos Dados, 100 4.5 Limitações do Método, 102

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS, 103 5.1 Categoria Organização do Trabalho, 104

5.2 Categoria Normas e Procedimentos de Trabalho, 110 5.3 Categoria Hierarquia e Equipe de Trabalho, 120 5.4 Categoria Crenças e Valores, 131

5.5 Síntese e comentários sobre os “achados” da análise, 137

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS, 141 REFERÊNCIAS, 145

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1. O PROBLEMA

Neste capítulo são apresentados a contextualização do problema, os objetivos finais e

intermediários, bem como, a delimitação e a relevância do trabalho.

1.1 Introdução

O estudo da cultura tem despertado maior interesse na área de ciências sociais aplicadas nas últimas décadas. Entre as razões deste crescente interesse está o entendimento de que as organizações são influenciadas pelos aspectos culturais em, praticamente, todas as suas dimensões.

Entretanto, apesar do crescente interesse no tema cultura, ainda existem lacunas a serem preenchidas. Entre estas lacunas podem-se destacar a pouca atenção dada às relações entre cultura organizacional e cultura brasileira e o tratamento homogêneo dado a organizações públicas e privadas.

As relações entre cultura organizacional e cultura brasileira foram abordadas por diversos autores (CALDAS, 1997; FREITAS, 1997; MOTTA, 1997; PRATES; BARROS, 1997; BAIARDI, 1995). Apesar do “boom” que o tema teve na década de 1990, ainda existem aspectos que não parecem suficientemente explorados.

Um destes aspectos é a utilização de autores do pensamento social brasileiro como expoentes de uma visão local para refletir a partir da realidade brasileira, ao invés de partir da visão de autores estrangeiros, que partem de uma realidade diferente da brasileira e apresentam propostas tidas como universais e generalistas e que, não necessariamente, são adequadas ao contexto local.

A preocupação com a predominância de autores estrangeiros em detrimento dos nacionais na produção acadêmica de estudos organizaionais já foi demonstrada anteriormente (SILVA; FADUL, 2008; FISCHER; MAC-ALLISTER, 2001; RODRIGUES; CARRIERI, 2001; VERGARA; PINTO, 2000; VERGARA; CARVALHO, 1995).

Esta postura é coerente com uma resistência ou oposição ao apontado como “colonialismo epistêmico”, que consiste em tratar o conhecimento diverso do eurocêntrico

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DUSSEL, 2002).

Outro aspecto pouco explorado na produção acadêmica nacional sobre cultura diz

respeito a cultura organizacional do setor público. Nesse sentido, Silva e Fadul (2008)

realizaram um levantamento nos principais periódicos nacionais entre 1997 e 2007 e

encontraram apenas 47 trabalhos sobre este tema.

Assim, esta tese pretende tratar destes dois destes aspectos: a pouca atenção dada a cultura organizacional do setor público, especialmente, no âmbito do Poder Judiciário. E a

baixa utilização de autores nacionais, especialmente os autores “clássicos” do pensamento

social brasileiro nos estudos desenvolvidos sobre o assunto.

O Poder Judiciário tem estado em evidência nos últimos anos por aspectos políticos e também devido ao seu processo de reforma, que teve início em 2004 com a aprovação da Emenda Constitucional nº45. Essa emenda implementou uma série de mudanças no Judiciário que abrangeram desde alterações nos procedimentos judiciais até mudanças na própria estrutura do Poder, com a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A criação do CNJ representou um verdadeiro “choque de gestão” no Judiciário, na

medida em que entre as atribuições deste órgão estão a fiscalização do trabalho dos magistrados e servidores e a modernização do Judiciário (SENA, 2012; NOGUEIRA, 2011). O CNJ passou, assim, a representar o local institucional das aspirações de um Judiciário mais célere e transparente guiado por práticas administrativas modernas e eficientes. (NALINI, 2006)

O CNJ está conduzindo o processo de reforma baseado em diretrizes como planejamento estratégico, controle, modernização tecnológica e ampliação do acesso à justiça, diretrizes estas que podem ser identificadas com o gerencialismo, ou com a chamada Nova Gestão Pública, que, também, foi a base para o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE) em 1995.

Os valores do gerencialismo estão associados com os próprios valores da livre

iniciativa, como: racionalidade, autonomia, iniciativa, criatividade, responsabilidade,

produtividade, eficiência e competitividade. (PAULA, 2005)

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resistências e dificuldades que enfretará, examinando o que ocorreu durante a implantação do PDRAE, que apesar de ter se dado em outra instância – o Executivo, também se tratou de um processo de reforma do setor público baseado nos mesmos princípios do gerencialismo.

Nesse sentido, autores como Sano e Abrucio (2008), Silva e Fadul (2008) e Martins (2005) e Rezende (2002) fizeram críticas ao modelo de reforma adotado, apontando a

necessidade da adequação do modelo de reforma às peculiaridades de cada país, considerando

as particularidades dos sistemas burocrático e administrativo e com afinidade com a cultura

brasileira. A preocupação com os aspectos culturais é relevante, ainda, se for considerado que

a Nova Gestão Pública pretendeu romper com os modelos tradicionais de administração dos

serviços públicos e introduzir uma nova cultura de gestão baseada em padrões desenvolvidos

para organizações privadas.

Entretanto, conforme afirmado anteriormente, apesar de todas as transformações que

estão ocorrendo na instituição Judiciário, a produção acadêmica, praticamente, não tem

tratado o tema. (NOGUEIRA, 2011) Pode-se afirmar assim, que um dos fatores motivadores desta tese foi o desejo de aprofundar o conhecimento sobre o Poder Judiciário.

Quanto à utilização do pensamento social brasileiro, esta tese parte da suposição de

que ideias e conceitos desenvolvidos por seus autores “clássicos” poderiam funcionar como

uma espécie de lente que permitiria uma maior reflexão e aprofundamento nos aspectos da cultura brasileira que de alguma forma influenciariam ou impactariam em práticas sociais nas organizações.

Não se pretendeu, assim, o aprofundamento na obra de nenhuma autor em específico,

e sim, algumas “visadas” a partir das reflexões de vários autores. Com este propósito, foram

abordados algumas ideias de Sergio Buarque de Holanda na obra Raízes do Brasil (1936 – 1ª edição), Raymundo Faoro nos livros Os Donos do Poder (1958 1ª edição) e A República Inacabada (2007), Darcy Ribeiro no livro O Povo Brasileiro (1995) e Celso Furtano em O longo amanhecer (1999). Estes autores são abordados ao longo deste trabalho por ordem cronológica da primeira edição de suas obras.

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classificado como institucionalista, na medida em que sua análise privilegia aspectos institucionais como Estado e burocracia. Furtado, por sua vez, pode ser enquadrado como materialista por partir suas análises de questões estruturais e econômicas. A inclusão de Darcy Ribeiro deu-se para complementar o quadro teórico com aspectos de regionalidade cultural, a partir do seu conceito de ilhas-Brasil.

Assim, a partir de alguns conceitos-chave destes autores pretendeu-se identificar

aspectos da cultura brasileira refletidos em práticas sociais nas organizações, mais

especificamente no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, órgão do Poder Judiciário, a partir

da visão de seus servidores.

1.2 Objetivos

A partir das constatações detalhadas na contextualização da situação problema no

item anterior, são apresentados, nesta seção, o objetivo final e os objetivos intermediários

desta tese.

1.2.1 Objetivo final

O objetivo final desta tese é identificar os elementos da cultura organizacional do

Tribunal de Justiça do Estado da Bahia à luz das contribuições de autores do pensamento

social brasileiro - representados por Sergio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro, Darcy

Ribeiro e Celso Furtado.

1.2.2 Objetivos intermediários

Visando alcançar o objetivo final desta tese, torna-se necessário atender aos seguintes

objetivos intermediários:

a) Identificar as principais vertentes teóricas sobre cultura organizacional;

b) Examinar as possibilidades de utilização do pensamento social brasileiro nas Ciências Sociais em geral e nos Estudos Organizacionais em específico.

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d) Descrever o espaço organizacional do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia;

e) Identificar as percepções dos servidores sobre a cultura organizacional do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia;

f) Analisar as percepções dos servidores sobre a cultura organizacional do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia à luz dos pensamentos de Sergio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro, Darcy Ribeiro e Celso Furtado;

É importante observar que o conceito de percepção está sendo considerado aqui de

forma subjetiva (WRIGTH, 1994), no sentido atribuído pela psicologia (MEYERS, 1999),

que entende que a percepção se dá a partir dos sentidos, está sujeita a fatores como atenção

seletiva, que implica em que apenas parte do que se experimenta seja percebido e, na

interpretação, o referido conceito apresenta-se como movimento no qual a antropologia e a

sociologia estão presentes a partir da cultura que molda esta percepção com base em

suposições e convicções implicadas em valores e postura ética (GEERTZ, 1989).

1.3 Delimitação do estudo

O estudo da cultura organizacional pode ser realizado sob diversas perspectivas

teóricas, muitas vezes mutuamente excludentes. Assim, ao partir de pressupostos que

entendem a cultura do ponto de vista do simbolismo organizacional, abre-se mão das

possibilidades de conhecimento e análise que outras perspectivas, como a de cultura

corporativa (DEAL; KENNEDY, 1982; BEYER; TRICE, 1986) ou a de cognição

organizacional (WEICK, 1973), permitiriam. Essa opção é necessária e reflete as escolhas

ontológicas que norteiam essa pesquisa, onde o conhecimento é entendido como socialmente

construído e a cultura como uma interdependência entre história, estrutura social, condições

de vida e experiências subjetivas das pessoas (AKTOUF, 1984).

Em relação à utilização do pensamento social brasileiro, o estudo está delimitado as

ideias de Sergio Buarque de Holanda na sua obra Raízes do Brasil (1936), de Raymundo

Faoro nas obras Os Donos do Poder (1958) e A República Inacabada (2007), de Darcy

Ribeiro na obra O Povo Brasileiro (1995) e nas de Celso Furtano no livro O Longo

Amanhecer (1999).

Finalmente, a pesquisa ficou delimitada quanto ao que concerne ao ambiente público,

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Bahia.

1.4 Relevância do estudo

A motivação deste trabalho partiu de uma indagação sobre a adequação da utilização

acrítica de teorias, técnicas e modismos gerenciais criados com base numa realidade

estrangeira e de ambiente privado às organizações do ambiente público brasileiro. Em outras

palavras, num momento em que cada vez mais os estudos organizacionais reconhecem a

importância do simbólico na dinâmica das organizações, é pertinente questionar se seria

razoável tratar indistintamente organizações públicas e privadas, ou ainda, considerar que

organizações brasileiras são regidas pela mesma lógica que organizações baseadas em países

eurocêntricos, dado que estas possuem valores, crenças, mitos e heróis tão distintos.

Um primeiro olhar sobre a produção nacional sobre o tema cultura organizacional

mostrou que as relações entre cultura nacional e cultura organizacional, a despeito do

interesse que o tema despertou na academia nas duas últimas décadas, ainda podem ser mais

bem exploradas. Assim, apesar dos inúmeros trabalhos que abordam esta relação, pode-se

verificar uma série de lacunas na produção acadêmica nacional.

Uma das principais lacunas apontadas é o tratamento homogêneo dado às

organizações, que não considera a pluralidade e a diversidade das mesmas. Um

desdobramento desta lacuna consiste em tratar indistintamente organizações públicas e

privadas.

Este tratamento homogêneo, também, tem sido estendido para a abordagem dos traços

culturais brasileiros, que costumam ser tratados como unitários e imutáveis. Nesse sentido,

uma das contribuições desta tese é uma proposta de abordagem dos traços culturais brasileiros

considerando tanto seus aspectos de unidade, de povo-nação, como suas particularidades

regionais de ilhas-Brasil.

A grande influência do estudo de Hofstede (1991) na produção nacional sobre cultura

organizacional seria outra lacuna, pois se trata da visão de um estrangeiro que utiliza seu

ponto de vista para realizar análises comparativas. Esta influência dos estudos de Hofstede na

produção acadêmica nacional é incompatível com a perspectiva pós-colonialista e remete à

reflexão sobre a contribuição que autores como Sergio Buarque de Holanda, Raymundo

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como uma resposta local ao pensamento hegemônico estrangeiro.

Esta tese também pretende contribuir para despertar interesse sobre os aspectos

culturais do Poder Judiciário, que a despeito das grandes mudanças institucionais e culturais

que vem sofrendo no seu processo de reforma, praticamente, não tem sido abordado pela

produção acadêmica de administração.

A pouca atenção dispensada pela academia ao Poder Judiciário foi abordada em trabalhos como o de Nogueira (2011) que analisou no período de 1995 a 2008 os trabalhos apresentados nos encontros do EnANPAD e do EnAPG nas seções referentes à Administração Pública e os artigos publicados nos periódicos Revista do Serviço Público e Revista de Administração Pública e verificou que do total de 2.485 artigos, apenas 0,8% eram trabalhos voltados ao estudo do Poder Judiciário e de sua gestão.

O presente estudo também intenciona gerar uma contribuição empírica para área, que

permita um aprofundamento do conhecimento do Poder Judiciário sob o aspecto de universo

organizacional e para os estudos que utilizam o pensamento social brasileiro, que em sua

maioria tem se tratado de ensaios teóricos.

Assim, a relevância deste trabalho, além da contribuição empírica, está na sua

intenção de aproximar-se do desenvolvimento de uma alternativa local com base em autores

do pensamento social brasileiro às abordagens tradicionais da cultura organizacional,

considerando as particularidades do Poder Judiciário brasileiro e que contribua para a

construção de um campo de estudos organizacionais coerente com o contexto da realidade

(20)

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Neste capítulo são selecionadas e apresentadas concepções teóricas em cultura e suas

polêmicas mais relevantes, buscando relações entre cultura organizacional e cultura brasileira

e contribuições de autores do pensamento social brasileiro que serviram de base para o

desenvolvimento deste trabalho, passando a seguir ao processo de reforma do Judiciário.

2.1 As origens do conceito cultura

Nesta seção, serão apresentadas, brevemente, algumas considerações sobre a origem

do conceito cultura.

O estudo da cultura é uma tarefa complexa, cercado de possibilidades e contradições

desde suas origens, o que se deve, em parte, a multiplicidade de abordagens e entendimentos.

O termo cultura, sem o intuito de reduzir o amplo e complexo conceito de cultura a

um termo, porém o examinando quanto à morfologia, deriva do latim colere, que significa

cultivar. Na Roma antiga, a origem etimológica do conceito tinha o sentido de agricultura. A

palavra cultura também é relacionada a formas ditas superiores de manifestação artística ou

técnica. Nesse sentido, o termo alemão Kultur estaria mais próximo desta definição. Nos

séculos XVIII e XIX, o termo kultur era utilizado para simbolizar aspectos espirituais de uma

comunidade enquanto que a palavra francesa civilization referia-se às realizações materiais de

um povo (LARAIA, 2001).

Edward Tyler (1832-1917) sintetizou estes dois termos no vocábulo inglês Culture e

foi o primeiro a formular o conceito do ponto de vista antropológico tal como é entendido

atualmente. Assim, segundo Tyler, cultura seria o todo complexo que inclui conhecimentos,

crenças, arte, moral, leis, costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo

homem enquanto membro de uma sociedade (LARAIA, 2001).

O conceito de cultura continuou sendo fruto de debates no campo da antropologia

assumindo aspectos diferentes entre as diversas escolas que interpretam este conceito:

evolucionista, funcionalista, estruturalista e interpretativa. Neste sentido, Carrieri (2008)

comenta que autores como Kroeber e Kluckhohn listaram em 1952 mais de duzentos e

cinquenta definições de cultura diferentes, que incluíam elementos como ideias, conceitos,

ideologias, valores, atitudes, normas, comportamentos, símbolos, ritos, rituais, costumes,

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Esta diversidade de formulações em busca de entendimentos sobre o conceito de

cultura, no campo da antropologia, tem reflexos no campo da administração, na medida em

que esta última parte dos conceitos antropológicos (MASCARENHAS, 2002).

Mascarenhas (2002) destaca, porém, que apesar da administração ancorar suas

discussões sobre cultura nos conceitos básicos da antropologia, o enfoque dos teóricos da

administração é distante do enfoque antropológico. A abordagem antropológica de cultura não

segue um caminho instrumental ou intervencionista e seus teóricos desenvolveram criativos

estudos para a compreensão e interpretação de sistemas simbólicos. Enquanto que no campo

da administração, o tema cultura organizacional é mais frequentemente abordado por muitos

pesquisadores por meio de estudos comparativos, esquemas classificatórios e metodologias de

intervenção e mudança.

Além disso, o enfoque dado ao tema pelo chamado mainstream é de inspiração

funcionalista e de perspectiva gerencialista. Grande parte da pesquisa em administração sobre

cultura organizacional tem uma abordagem pragmática, buscando uma instrumentalização do

conhecimento, onde o objetivo é entender a cultura como elemento de gestão em proveito de

uma maximização de resultados organizacionais (BARBOSA, 1996; JAIME JR., 2002;

MASCARENHAS, 2002; ROSA, TURETA e BRITO, 2006).

Na próxima seção, será abordado o conceito de cultura organizacional, apresentando o

surgimento do campo e suas principais polêmicas.

2.2 Cultura organizacional: conceitos, perspectivas e polêmicas

O interesse dos estudos organizacionais pelos aspectos culturais e simbólicos do

universo organizacional não é recente. Ainda que de forma incipiente, desde a primeira

metade do século XX, estudos em administração registram alguns autores que observaram a

influência dos aspectos culturais na gestão dos recursos humanos e materiais (BARBOSA,

1996). Por exemplo, podem-se encontrar indícios de um “protoconceito” de cultura

organizacional, entendida como sistemas ideológicos simbólicos, no Experimento de

Hawthorne realizado entre as décadas de 1920 e 1930 por Elton Mayo (AKTOUF, 1994).

Entretanto, é somente a partir da década de 1970 que a corrente da cultura

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e passa a formar uma área disciplinar específica (JAIME JR, 2002). E, a partir da publicação,

em 1983, de edições especiais sobre o assunto nas revistas Administrative Science Quaterly e

Organizational Dynamics, torna-se objeto cada vez mais frequente de pesquisas acadêmicas

(MASCARENHAS, 2002; TONELLI; ALCADIPANI, 2000; FREITAS, 1991).

Segundo Martin e Frost (2001), a maioria dos estudos atribui o interesse crescente pela

cultura no final da década de 70 ao sucesso do gerenciamento japonês e às falhas encontradas

nas revisões organizacionais tradicionais com foco quantitativo e apoiadas em modelos

racionais de comportamento humano, que seriam responsáveis por criar uma geração de

gerentes que conheciam mais as planilhas do que as pessoas.

As primeiras publicações culturais de importância surgiram neste contexto e foram

escritas do ponto de vista gerencial para o público leigo. Esses trabalhos foram denominados

posteriormente de engenharia de valor, pois os autores afirmavam que líderes culturais

eficientes poderiam criar culturas fortes em cima de seus próprios valores. As publicações de

Deal e Kennedy (1982) e Ouchi (1982) seriam exemplos desta abordagem.

De acordo com Barbosa (1996), durante as décadas de 1970 e 1980, o termo cultura organizacional recebeu inúmeras definições e abordou variados aspectos do universo organizacional, como valores, mitos, heróis, ritos, práticas e políticas administrativas e projetos de mudança.

O campo de estudos da cultura organizacional tem sido marcado, desde então, por

disputas pelo poder. E, a pesquisa nesse campo, pode ser descrita como “uma luta pelo

domínio intelectual entre proponentes das várias teorias, preferências metodológicas,

epistemologias e orientações políticas” (MARTIN; FROST, 2001, p.220).

Ainda, segundo Martin e Frost (2001, p.220), “a gravidade das divergências

intelectuais dificulta muito a revisão dos resultados das pesquisas nessa área, porque, em vez

de ordem, temos o caos, e há conflito em vez de consenso”. Esta falta de consenso nas pesquisas sobre cultura é vista com preocupação por alguns autores como Reed (1990),

enquanto outros pesquisadores como Burrel e Morgan (1979) encaram a proliferação de

paradigmas como uma forma de instigar a curiosidade e divulgar pontos de vistas antes

ignorados.

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substancial variação nos propósitos e profundidades dos estudos sobre cultura organizacional.

Pois, “essas diferenças nos propósitos e interesses de pesquisa, definições, focos e fundamentos filosóficos de investigação tornam impossível abordar a cultura organizacional

como uma bem definida e coerente área de estudo” (ALVESSON, 1995, p.2). O termo cultura organizacional seria assim, um “guarda-chuva” conceitual que engloba interessados em fenômenos culturais e simbólicos nas organizações. Além disso, o estudo da cultura é multidisciplinar, despertando o interesse de sociólogos, psicólogos e antropólogos entre outros, que têm orientações que vão do positivismo ao pós-modernismo (ALVESSON, 1995).

As discussões do campo articularam-se, entre outros aspectos, em torno de questões como: (1) a existência de uma cultura organizacional homogênea ou heterogênea; (2) a possibilidade ou não de gerenciamento da cultura organizacional; e (3) o questionamento sobre qual o método mais adequado – qualitativo ou quantitativo – para permitir um

“descortinamento” mais profundo do universo organizacional; (MARTIN; FROST, 2001; CAVEDON; FACHIN, 2002).

Essa questão sobre o método qualitativo ou quantitativo, que compõe a “arena” de

disputa pelo poder no campo de estudos sobre cultura organizacional, reflete uma falta de

consenso não apenas em termos metodológicos, mas também de paradigmas e metodologias.

Nesse sentido, autores como Beyer e Trice (1986) relacionam as abordagens

qualitati-vas e quantitatiqualitati-vas a duas correntes antropológicas. A abordagem quantitativa considera que

existem elementos universais na cultura, o que torna possível encontrar elementos comuns em

culturas de diversas organizações. A abordagem qualitativa, por sua vez, entende que esses

elementos da cultura possuem significado somente dentro do contexto cultural e, portanto,

não se podem fazer generalizações e comparações entre organizações.

Outros autores como Fischer e Mac-Allister (2001), porém, entendem que a polêmica

não procede, pois a natureza do objeto e a ancoragem do pesquisador determinariam a opção

de análise e o desenho da pesquisa. Nessa tese, adota-se um entendimento semelhante ao

apontado por esses autores.

Nas próximas seções, são tratados os questionamentos referentes à homogeneidade

versus heterogeneidade cultural e à possibilidade ou não de gerenciamento da cultura

(24)

2.2.1 Homogeneidade ou heterogeneidade da cultura

Em relação à questão de homogeneidade versus heterogeneidade cultural do contexto organizacional, Martin e Frost (2001) identificam três perspectivas possíveis para compreensão da cultura: (1) a da integração, que pressupõe que a organização como um todo possua uma única cultura; (2) a da diferenciação, que considera as diferenças entre as subculturas que compõem a organização; e (3) a da fragmentação, que entende que o que existe em termos de cultura organizacional são valores partilhados temporariamente por vários indivíduos da organização e a ambiguidade seria um aspecto inevitável desta cultura. (MARTIN; FROST, 2001)

Na perspectiva da integração, a cultura é definida como um pacote consistente de

manifestações culturais que geram o consenso de toda organização em torno de um conjunto

de valores compartilhados. Assim, para esta perspectiva, praticamente, não há ambiguidades

na cultura. Estas só ocorreriam, ainda assim de forma passageira, num momento de

transformação cultural da organização quando, então, uma antiga cultura seria substituída por

uma nova cultura. E as possíveis ambiguidades e conflitos são interpretados como uma prova

de deterioração da antiga cultura antes do estabelecimento de uma nova unificação.

Desse modo, o essencial para a integração seria que a homogeneidade, a harmonia e

a unificação da cultura podem ser alcançadas. Grande parte dos estudos desta perspectiva

adotou a engenharia de valor, considerando que a cultura pode ser administrada e que as

culturas fortes podem levar a um melhor desempenho. Autores como Beyer e Trice (1986)

podem ser incluídos nestes casos.

A perspectiva da diferenciação, por sua vez, em contraposição a perspectiva da

integração, não entende a cultura de forma unitária. Nos estudos da diferenciação, os

consensos só ocorreriam dentro de fronteiras subculturais e a existência de conflito de

interesses como, por exemplo, entre gerenciamento superior e demais empregados é

reconhecida, assim como se reconhece inconsistências entre políticas formais e práticasatuais

e entre posturas e comportamentos. Para esta perspectiva, ainda, as subculturas dentro de uma

organização podem refletir grupamentos culturais da sociedade.

As características principais das pesquisas de diferenciação seriam: inconsistência,

consenso subcultural e clareza subcultural. “Assim, do ponto de vista da diferenciação, a

(25)

ambientais, criando um conjunto de subculturas que se sobrepõe e se abriga dentro das fronteiras permeáveis da organização”. (MARTIN; FROST, 2001, p.227)

Apesar dos estudos de diferenciação compartilharem importantes características

comuns, possuem algumas diferenças significativas. Para Martin e Frost (2001, p.225) “os

estudos de diferenciação desenvolveram tópicos comuns, mas sem uma coordenação

intencional”. Dessa forma, podem-se identificar duas claras subdivisões nesta perspectiva: uma mais preocupada com o pluralismo no contexto cultural; e outra voltada para uma leitura

crítica e de antigerenciamento de dados.

Finalmente, a perspectiva da fragmentação surge como uma terceira opção diante das

discussões entre integração e diferenciação. Para esta perspectiva, as manifestações da cultura

são complexas e apresentam elementos de contradição. Não seriam, portanto, nem muito

consistentes, nem muito inconsistentes.

Para os estudos da fragmentação, a essência de qualquer cultura é a ambiguidade.

Assim, o consenso seria transitório e específico a alguma questão e as afinidades seriam de

curta duração e seriam substituídas à medida que novas questões surgissem. Desse modo, o

consenso não poderia abranger toda a organização, nem determinada subcultura. A

perspectiva da fragmentação também entende o poder como sendo difundido por todos os

níveis hierárquicos da organização e a mudança, como um fluxo contínuo. (MARTIN;

FROST, 2001)

Além destas três perspectivas, Martin (1992) propõe uma variante metateórica, que

busca de certa forma considerar as três perspectivas complementarmente. Para esta autora, as

três perspectivas apresentam problemas de tautologia metodológica, pois os pesquisadores da

integração, diferenciação e fragmentação definiriam a cultura e depois projetariam estudos

adequados ao que estivessem procurando. Além disso, qualquer cultura organizacional

contém elementos compatíveis com as três perspectivas e se uma organização fosse estudada

profundamente seriam encontradas algumas questões, valores e objetivos que poderiam gerar

consenso, consistência e clareza em toda a organização. As três perspectivas deveriam ser

utilizadas, assim, como espécies de “lentes”.

Neste sentido, Martin e Frost (2001, p.242) afirmam que nenhuma teoria sobre

(26)

o certo é adotar a estrutura de múltiplas perspectivas que afirma que, em qualquer contexto organizacional, existem certos valores, interpretações e práticas que geram consenso em toda a organização, outros que provocam conflitos e alguns que não são bem definidos. (MARTIN; FROST, 2001, p.242)

Para Martin e Frost (2001), a metateoria das três perspectivas englobaria e

transcenderia teorias menos abrangentes e permitiria uma compreensão mais profunda do

contexto cultural.

Esta versão metateórica também recebeu críticas por suas limitações. Entre elas

Martin (1992) aponta que essa metateoria estaria baseada em dicotomias, que colocariam as

perspectivas em posições opostas e ignorariam aspectos de teoria e estudos que

ultrapassassem as fronteiras entre as perspectivas.

Alvesson (1995), por sua vez, propõe uma abordagem múltipla alternativa que

denomina de Múltipla Configuração Cultural. Esta abordagem tem grande sinergia com a

proposta de Martin (1992), embora Alvesson (1995) tenha se preocupado em distinguir sua

proposta dessa visão.

Uma das grandes diferenças apontadas é o tratamento dado a questão das

ambiguidades. Alvesson (1995) argumenta que, em muitos casos, as ambiguidades apontadas por Martin (1992) poderiam ser interpretadas como diferenças entre subculturas e o encontro de uma ambiguidade seria uma espécie de dica ou de sinal da necessidade de examinar a multiplicidade de configurações culturais que estariam influenciando a organização em questão.

Alvesson (1995) coloca sua proposta como uma alternativa à visão da ambiguidade, que ofereceria outro caminho para lidar com as contradições da cultura organizacional, algo mais próximo de uma metodologia do que de uma perspectiva teórica e que, também, serviria como uma alternativa às visões da integração e diferenciação, porém, mais de forma complementar do que rival.

Desse modo, para Alvesson (1995, p117),

Uma alternativa possível para lidar com a ideia de ambiguidade é tratá-la como uma estratégia de pesquisa. Se a ambiguidade é tomada como um paradigma ou uma perspectiva teórica, a análise começará e terminará com ela. Enquanto que se for tratada como estratégia de pesquisa, poderia aprofundar o entendimento sobre a multiplicidade de configurações culturais da organização em estudo. (tradução livre)

(27)

culturais, dado que as organizações não são uma ilha e são influenciadas pela cultura da

sociedade. Neste sentido, sua abordagem assume “[...] que as organizações podem ser

entendidas em muitas formas como versões locais de manifestações culturais mais amplas

desenvolvidas local e societalmente.” (ALVESSON, 1995, p.118) (tradução livre).

Esta abordagem, ainda, assume que “[...] as pessoas estão conectadas em diferentes

graus com organização, unidade suborganizacional, profissão, gênero, classe, grupo étnico,

nação; as culturas se sobrepõem no ambiente organizacional e raramente se manifestam na

forma pura” (ALVESSON, 1995, p.118). (tradução livre)

Assim sendo, na abordagem de Múltipla Configuração Cultural, “[...] culturas

organizacionais são entendidas, não como totalidades unitárias ou como estáveis conjuntos de

subculturas, mas sim, como uma mistura de manifestações culturais de diferentes níveis e

tipos” (ALVESSON, 1995, p.118). (tradução livre)

Esta perspectiva de Múltipla Configuração Cultural proposta por Alvesson (1995),

entre todas as possibilidades apresentadas, é a de maior identificação com a proposta desta

tese. Pois, embora a organização esteja sendo entendida de forma múltipla e fragmentada

(perspectiva da fragmentação), reconhece-se a possibilidade da existência de consenso mais

amplo em algumas questões, como previsto pela perspectiva da integração e de contradições

em outras questões, conforme a perspectiva da diferenciação.

Além disso, na perspectiva de Múltipla Configuração Cultural reconhece-se a

importância dos fluxos culturais e da “permeabilidade” das organizações, que poderiam,

então, refletirem e serem influenciadas por aspectos locais e por aspectos mais amplos da

sociedade.

Este ponto está em sintonia com as suposições desta pesquisa e é coerente com os

objetivos deste trabalho de examinar a cultura em uma instituição (Tribunal de Justiça do

Estado da Bahia) com atenção especial para aspectos culturais que possam estar refletindo

aspectos mais amplos da cultura brasileira.

Cabe, também, mencionar que este entendimento está mais alinhado com a

abordagem de “cultura nas organizações” (CARRIERI; CAVEDON; LEITE-DA-SILVA, 2008) do que com a abordagem de uma unidade cultural implícita no termo “cultura

(28)

A abordagem de “cultura nas organizações” é entendida aqui como uma construção

teórico-metodológica que trata a cultura como uma construção e desconstrução social das pessoas que participam das organizações, o que significa que a realidade social e organizacional é compreendida a partir de aspectos históricos e em seus múltiplos significados. (CARRIERI; CAVEDON; LEITE-DA-SILVA, 2008)

Machado-da-Silva e Nogueira (2000, p.2), comentam nesse sentido que

Seguindo essa perspectiva teórica, as pesquisas sobre culturas na organização partiriam do pressuposto de que uma organização é também produto de um ambiente macrossocial, composto por sociedade, classes, setor industrial etc. Dessa forma, a organização não é um moto-contínuo capaz de criar cultura sozinha, mas é co-produtora, assim como o são as pessoas que nela trabalham. E essas, por sua vez, são socializadas diferentemente e são socialmente distintas e, por tudo isso tem percepções múltiplas acerca da realidade, do mundo em que vivem.

2.2.2 A possibilidade ou a impossibilidade de gerenciar a cultura organizacional

Outra abordagem sobre o desenvolvimento do campo da cultura organizacional é a tipologia elaborada por Smircich (1983) que discute, entre outros aspectos, a questão da possibilidade de gerenciar ou não a cultura organizacional.

Smircich (1983) atribui as diferenças de enfoques e abordagens sobre o tema cultura organizacional às diferentes premissas adotadas pelos pesquisadores sobre a natureza da cultura e da organização. A variedade de aplicações do conceito de cultura nos estudos

organizacionais, também, é atribuída ao “empréstimo” do conceito de cultura da antropologia,

onde não há consenso sobre seu significado. Ainda, de acordo com Smircich (1983), muitos

autores têm tentado clarificar as premissas que os teóricos organizacionais trazem na sua

subjetividade.

In large measure, these authors agree that work in organization theory can be characterized by a range of assumptions about the ontological status of social reality – the objective-subjective question – and a range of assumptions about human nature - the determinist-voluntarist question. (SMIRCICH, 1983, p.340)

(29)

Quadro 1 - Interseções entre os conceitos de cultura e de organização. Conceitos de cultura na Antropologia Temas de pesquisa nos

Estudos Organizacionais

Conceitos de organização nos Estudos Organizacionais

Cultura é um instrumento a serviço das necessidades humanas biológicas e psicológicas.

Cross-cultural ou Estudos comparativos

Organizações são instrumentos sociais para o cumprimento de tarefas.

Cultura funciona como um

mecanismo adaptativo e regulatório, que unifica o indivíduo nas estruturas sociais.

Cultura corporativa Organizações são organismos adaptativos que existem pelos processos de troca com o ambiente.

Cultura é um sistema de cognições compartilhadas. A mente humana gera a cultura pelo significado de um número finito de regras.

Cognição organizacional

Organizações são sistemas de conhecimento. A organização repousa na rede de significados subjetivos compartilhados que seus membros compartilham em vários níveis.

Cultura é um sistema de símbolos e significados compartilhados. A ação simbólica precisa ser interpretada, lida ou decifrada para ser entendida.

Simbolismo organizacional

Organizações são padrões de discurso simbólico. A organização é mantida por meio de formas

simbólicas como a linguagem que facilita o compartilhamento de significados e realidades.

Cultura é a projeção da infraestrutura inconsciente da mente.

Processos Inconscientes e Organização

As formas e práticas organizacionais são manifestações de processos inconscientes.

Fonte: Adaptado de Smircich (1983, p.342).

Nesta tipologia, os cinco temas de pesquisa apontados no Quadro 1 são agrupados por Smircich (1983) em duas grandes linhas de pesquisa: a primeira aborda a cultura como uma variável, como alguma coisa que a organização tem; e a segunda linha entende a cultura como metáfora da organização, algo que a organização é.

A linha de pesquisa que trata a cultura como variável engloba os estudos comparativos (cross-cultural) e os estudos sobre cultura corporativa. E, a segunda linha de pesquisa, que entende a cultura como metáfora abrange os temas de cognição organizacional, simbolismo organizacional e processos inconscientes.

(30)

situar seus trabalhos, embora desde que foi criada a disciplina tenha se tornado mais rica e complexa.

Apesar desta proposta de revisão sugerida por Cunliffe (2011), optou-se nesta tese pela utilização da tipologia de Smircich (1983), devido a esta última dar conta dos propósitos deste trabalho e ser ainda a tipologia mais utilizada e citada pela produção acadêmica nacional.

Assim, considerando a tipologia elaborada por Smircich (1983), na linha de pesquisa

que entende a cultura organizacional como variável, emergem duas perspectivas: a

cross-cultural e a cultura corporativa. Ambas as perspectivas derivam dos pressupostos de que o mundo social se expressa em termos de relacionamentos e as organizações são vistas como organismos. Essas duas perspectivas pertencem ao paradigma funcionalista e têm como interesse a busca de previsibilidade e o controle organizacional. A diferença entre as duas perspectivas deve-se ao caráter de dependência ou independência atribuído à cultura como variável.

A primeira perspectiva é a cross-cultural que trata a cultura como variável

independente a partir da qual as organizações são vistas como instrumentos sociais para a

realização de tarefas. A Cultura é considerada como um background, um quadro geral que

influência o desenvolvimento e o reforço de crenças. A cultura seria “importada” para a

organização por meio de seus membros e seria revelada nos padrões de atitudes e ações dos

membros da organização (SMIRCICH, 1983).

A segunda perspectiva é a da cultura corporativa, que trata as organizações como

instrumentos sociais que produzem bens e serviços e nesse processo de produção também produzem artefatos culturais. Porém, as próprias organizações estão inseridas num contexto cultural mais abrangente. O interesse dos pesquisadores, nessa perspectiva, é sobre as qualidades socioculturais que se desenvolvem dentro das organizações (SMIRCICH, 1983).

A perspectiva da cultura corporativa entende a cultura como uma espécie de “cola”

(31)

senso de identidade para os membros da organização. Então, cultura é vista como uma variável gerenciável que influencia o resultado da organização.

The belief is that firms that have internal cultures supportive of their strategies are more likely to be successful. Research and popular books tend to emphasize the symbolic devices can be used to mobilize and channel the energies of organization members. The task awaiting individual managers is to find ways to use stories, legends, and other forms of symbolism in their unique situations, for their particular ends. (SMIRCICH, 1983, p.346)

Entre as definições mais citadas e representativas desta abordagem da cultura

organizacional entendida como variável que existe para tornar a organização mais eficiente na

sua busca de resultados estão as definições elaboradas por Hofstede e Schein (SILVA;

FADUL, 2007).

Hofstede (1991) entende a cultura como um programa coletivo da mente que

distingue os membros de grupos ou categorias de pessoas e leva os indivíduos a se

comportarem em conformidade com padrões grupais. Para Schein (1989), a cultura

organizacional é definida como um conjunto de postulados e pressupostos básicos sobre a

ação coletiva, expressos como símbolos, mitos, tabus e ritos, que um dado grupo criou,

descobriu ou desenvolveu no processo de aprendizagem para lidar com problemas de

adaptação interna e integração externa, que são considerados válidos e ensinados para os

demais integrantes do grupo.

Na segunda linha de pesquisa da tipologia de Smircich, a cultura é vista como

metáfora e os mundos sociais e organizacionais existem como um padrão de relações

simbólicas e significados suportados pelos contínuos processos de interação humana. Essa

linha adota a ideia de cultura como um recurso epistemológico para estudar a organização

como um fenômeno social.

O foco da atenção de pesquisadores dessa linha está na linguagem, símbolos, mitos,

histórias e rituais. No entanto, aqui não são tidos como artefatos culturais, mas sim como

processos geradores que produzem e modelam significados que são fundamentais para a

própria existência da organização. Segundo Smircich (1983, p. 353), “quando a cultura é uma

metáfora, a atenção do pesquisador desvia-se de preocupações sobre o que as organizações

realizam e de como podem realizar com mais eficiência, para a forma como a organização

realiza e o que isso significa”. (tradução livre)

(32)

organizacional, a de simbolismo organizacional e a psico-estruturalista.

A primeira perspectiva, de cognição organizacional, entende a cultura como um

conjunto de crenças que norteia a ação dos indivíduos, como um sistema de cognições

compartilhadas. Para essa perspectiva, a cultura é gerada pela mente humana pelo significado

de um número finito de regras e os pesquisadores devem buscar, então, determinar quais são

as regras e descobrir como os membros de uma cultura veem e descrevem seu mundo. Desse

modo, na perspectiva de cognição organizacional, “an organization culture may be represented as a “master contract” that includes the organization’s self-image, as well as constitutive and regulative rules that organize beliefs and actions in light of the image”

(SMIRCICH, 1983, p.348).

A segunda perspectiva é o simbolismo organizacional, segundo o qual a cultura é

entendida como um sistema de significados compartilhados, que resultam das interações

sociais, devido à necessidade de interpretar a realidade e estabelecer critérios para as ações.

Quando essa perspectiva simbólica é aplicada na análise organizacional, a organização é vista

como um padrão de discurso simbólico, que precisa ser “lido”, “interpretado” e “decifrado”

para ser entendido. Assim sendo, o foco dessa forma de análise organizacional é como os

indivíduos interpretam e entendem suas experiências e como essas interpretações e

entendimentos estão relacionados com suas ações.

E, a terceira perspectiva é a psico-estruturalista, que considera a cultura como

expressão de processos psicológicos inconscientes. Esta perspectiva tem origem na

antropologia estruturalista de Levi-Strauss (1970) e seu propósito de estudo é revelar o oculto,

as dimensões universais da mente humana.

Nesta tese optou-se pela perspectiva socio-antropológica do simbolismo organizacional, que entende a cultura como metáfora e que o mundo social-organizacional existe como um padrão de relacionamento e de significado simbólico criado por um processo de interação humana. Assim sendo, parte-se de conceitos de cultura, que se aproximam da Antropologia Social, para traçar um conceito de cultura organizacional que traz uma

abordagem mais ao nível da exploração dos significados. A cultura é entendida como

implicando numa interdependência entre história, estrutura social, condições de vida e

experiências subjetivas das pessoas e seria um conjunto de elementos em relações dialéticas

(33)

2.2.3 Outras polêmicas que envolvem cultura nas organizações

A influência ou não do contexto cultural local e qual seu alcance na organização é

outra complexa polêmica que se coloca para os estudos sobre cultura nas organizações. Em

outras palavras, trata-se de uma discussão sobre se a cultura nacional prevalece sobre a cultura

da organização, se ocorre o inverso ou se ocorre uma troca.

O impacto das culturas nacionais nas organizações tem sido tratado em inúmeros estudos por diversos autores que desenvolveram uma diversidade de abordagens conceituais e esquemas classificatórios (Adler, 2002; Hall, 1977; Hofstede, 1991; Trompennars, 1994). Para autores como Schneider e Barsoux (2003), nos casos em que as práticas organizacionais são rígidas e fortes, a cultura organizacional prevaleceria sobre a nacional. Porém, para autores como Hofstede (1991) e Trompenaars (1994), a cultura nacional prevaleceria sobre a organizacional.

De acordo com Mascarenhas (2002), essa discussão sobre a relação entre cultura nacional e cultura organizacional é vista como uma tradição dentro dos estudos de cultura organizacional. E, dentro dessa tradição, um dos elementos mais importantes a marcar a cultura de uma organização seria a cultura nacional, e as características da cultura de uma

sociedade devem ser entendidas como fatores que influenciam a formação da cultura de uma

empresa.

Geert Hofstede (1991) foi um dos autores pioneiros na análise da influência das culturas nacionais sobre a cultura das organizações e é um dos autores mais citados sobre o tema, tanto na produção acadêmica internacional, como na nacional. Por esta razão, são apresentados a seguir os principais pontos do estudo deste autor.

Hofstede (1991) estava interessado na interação entre padrões de valores nacionais e

organizacionais e realizou um estudo intercultural entre os empregados de uma empresa

multinacional em mais de quarenta países, entre 1967 e 1973, com o objetivo de identificar

diferenças nos sistemas nacionais de valores a partir, inicialmente, de quatro dimensões: (1)

distância do poder; (2) aversão à incerteza; (3) individualismo versus coletivismo; e (4)

masculinidade versus feminilidade (HOFSTEDE, 2001; 1991). Posteriormente, os estudos de

Hofstede incorporaram uma quinta dimensão: orientação para o curto ou para o longo prazo

(34)

A dimensão distância do poder refere-se ao nível de tolerância dos membros menos

influentes de organizações e instituições em aceitar uma distribuição desigual do poder.

(HOFSTEDE; McCRAE, 2004; HOFSTEDE, 2001; 1991).

A dimensão aversão à incerteza está relacionada à tolerância da sociedade em relação

à ambiguidade. Indica até que ponto membros de uma cultura se sentem confortáveis ou

desconfortáveis em situações inesperadas e desconhecidas. Pessoas em países com alta

aversão à incerteza seriam mais emocionais e nesses países haveria uma tendência a tentar

minimizar a incerteza com a criação de leis e regras. Enquanto pessoas de países com baixa

aversão à incerteza seriam mais tolerantes com opiniões diferentes. (HOFSTEDE; McCRAE,

2004; HOFSTEDE, 2001; 1991)

A dimensão individualismo versus coletivismo trata do nível de integração dos

indivíduos a grupos. O termo coletivismo neste sentido não está relacionado a significados

políticos como o de Estado, e sim a grupo. Em sociedades individualistas, as pessoas estariam

mais propensas a preocuparem-se apenas consigo próprias e com quem estivessem

diretamente relacionadas. (HOFSTEDE; McCRAE, 2004; HOFSTEDE, 2001; 1991)

A dimensão masculinidade versus feminilidade diz respeito à distribuição dos papéis

emocionais entre os sexos. Enquanto a masculinidade está relacionada à competição e a

assertividade, a feminilidade está relacionada a um comportamento mais atencioso com

relação aos outros. (HOFSTEDE; McCRAE, 2004; HOFSTEDE, 2001; 1991)

No estudo de Hofstede (1991), o Brasil é apontado como um país com elevada

distância do poder, com predominância de atitudes voltadas para evitar incertezas, mais

coletivista do que individualista e com leve predominância de características típicas da

feminilidade.

Um dos pontos criticados do trabalho de Hofstede é sua visão da cultura

organizacional como uniforme. Nesse sentido, McSweeney (2002) que é considerado um dos

principais críticos da obra de Hofstede (1991), organizou seus argumentos na crítica de

pressupostos que considerou básicos para que a teoria deste autor fizesse sentido. O primeiro

destes pressupostos seria, justamente, supor uma programação coletiva da mente, o que

implicaria na premissa de uniformidade da cultura organizacional e de considerar que o

pequeno grupo que respondeu os questionários poderia representar o todo nacional.

(35)

desconsiderado toda uma literatura contraria a respeito.

Outro ponto criticado no estudo de Hofstede (1991) diz respeito a sua quinta

dimensão (dimensão cultural) ou orientação para o curto ou para o longo prazo. Fang (2003)

afirma que as primeiras quatro dimensões do estudo de Hofstede (1991) foram replicadas,

citadas e discutidas. Porém, a sua quinta dimensão não teria sido entusiasticamente recebida

pela comunidade acadêmica de pesquisas transculturais. Além disso, segundo Fang (2003,

p.350), “researchers in cross cultural communication who refer extensively to Hofstede avoid engaging in discussions about the fifth dimension”. O principal ponto envolvido na crítica desta dimensão é a adoção do Confucian dynamism como parâmetro para avaliação, que, por

sua vez, foi baseado na Chinese Value Survey, pesquisa sobre os valores da sociedade chinesa

realizada pelo Chinese Culture Connection em 1987.

Apesar das críticas, o estudo de Hofstede foi uma forte influência na produção

acadêmica nacional e na concepção de cultura brasileira desenvolvido no campo de teoria

organizacional. Grande parte dos artigos que referenciaram este estudo buscava explicar as

diferenças de estilos gerenciais por meio das diferenças nacionais destacadas por Hostfede.

Assim, o pioneirismo de Hofstede foi seguido nas duas últimas décadas no Brasil, pelo desenvolvimento de uma série de trabalhos relacionando traços da cultura brasileira e cultura organizacional (CHU; WOOD JR, 2008; ROSA; TURETA; BRITO, 2006; URDAN; URDAN, 2001; MOTTA; ALCADIPANI, 1999; MOTTA; CALDAS, 1997; PRATES, BARROS,1997; FREITAS, 1997).

Alcadipani e Crubellate (2003) ressaltam, porém, que a produção nacional sobre

cultura organizacional brasileira foi fortemente influenciados pela pesquisa de Hofstede

(1991), sem necessariamente questionar os pressupostos adotados pelo autor.

Desse modo, apesar do pioneirismo de Hofstede (1991), trata-se de um estudo

realizado a partir de uma perspectiva de um “estrangeiro” numa empresa multinacional, que impõe sua visão de mundo e as dimensões que considera importantes como formas de análise

e matriz de explicação. Além disso, a adoção acrítica da classificação de Hofstede (1991) é

ponto passível de crítica pela perspectiva pós-colonialista. Pois, o autor, ao analisar vários

países de acordo com as dimensões identificadas por ele, segundo sua visão de mundo, e os

classificar dentro de cada uma delas está realizando juízo de valor das diferentes culturas.

(36)

transpostos da realidade de um país específico, que explica a realidade de acordo com sua

visão e a impõe sobre outros países e realidades, não concorda com esta abordagem

(PRASAD; PRASAD, 2001).

Nos últimos anos a perspectiva pós-colonialista tem ganhado força na área das

ciências sociais aplicadas com discussões acerca da adequação da aplicação de conceitos e

teorias originados em realidades eurocêntricas tão diversas do contexto de países da ‘margem’ ou do ‘sul’ como o Brasil. O pós-colonialismo pode ser entendido como uma perspectiva crítica que trata as relações de dominação entre países desenvolvidos e países em

desenvolvimento e busca desvendar o etnocentrismo do pensamento ocidental denunciando

práticas de dominação (WOOD JR; TONELLI; COOKE, 2011).

Jack et al (2011) afirmam ainda que não se pode tratar o pós-colonialismo como uma

escola ou uma teoria, mas sim como um espaço interrogativo, uma sensibilidade interpretativa

condicionada por diferentes pensadores e posições que compartilham o compromisso de

questionar as ontologias, epistemologias e métodos hegemônicos do centro e que buscam

oferecer alternativas a estas perspectivas.

Autores como Santos (2007; 1994), Mignolo (2008; 2007), Dussel (2002), Escobar

(2004) e Ibarra-Colado (2007) têm abordado criticamente essa situação de hegemonia do

pensamento ocidental em diversos aspectos. Porém, um aspecto que tem sido enfatizado por

todos é o do “colonialismo epistêmico”, que consiste em tratar o conhecimento do sul visto como subalterno, particularista, ou atrasado e, por isso mesmo, menor.

Desse modo, considerando a produção nacional sobre cultura organizacional brasileira a partir de uma inspiração pós-colonialista pode-se questionar se não estaria faltando aos pesquisadores brasileiros sobre o tema, justamente, uma abordagem mais consistente da cultura brasileira. Guerreiro Ramos (1996) já havia apontado este aspecto na

sua redução sociológica.

A redução sociológica é um método destinado a habilitar o estudioso a praticar a transposição de conhecimentos e de experiências de uma perspectiva para outra. O que a inspira é a consciência sistemática de que existe uma perspectiva brasileira. Toda cultura nacional é uma perspectiva particular. Eis porque a redução sociológica é, apenas, modalidade restrita de atitude geral que deve ser assumida por qualquer cultura em processo de fundação (Ramos, 1996, p. 42).

Referências

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