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O regime brasileiro de tributação de lucros auferidos por controladas e coligadas no exterior : um estudo empírico sobre as suas causas e efeitos

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Academic year: 2017

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ESCOLA DE DIREITO DE SÃO PAULO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ROBERTO CODORNIZ LEITE PEREIRA

O REGIME BRASILEIRO DE TRIBUTAÇÃO DE LUCROS AUFERIDOS POR CONTROLADAS E COLIGADAS NO EXTERIOR:

Um estudo empírico sobre as suas causas e efeitos

MESTRADO EM DIREITO

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ROBERTO CODORNIZ LEITE PEREIRA

O REGIME BRASILEIRO DE TRIBUTAÇÃO DE LUCROS AUFERIDOS POR CONTROLADAS E COLIGADAS NO EXTERIOR:

Um estudo empírico sobre as suas causas e efeitos

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas como requisito parcial para a obtenção de título de MESTRE no Programa de Mestrado Acadêmico em Direito e Desenvolvimento.

Professor Orientador: Eurico Marcos Diniz de Santi

Linha de pesquisa: Direito e Desenvolvimento Econômico e Social

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PEREIRA, Roberto Codorniz Leite.

O Regime Brasileiro de Tributação de Lucros Auferidos por Controladas e Coligadas no Exterior: Um estudo empírico sobre as suas causas e efeitos / Roberto Codorniz Leite Pereira. - 2012 fls. 257

Orientador: Eurico Marcos Diniz de Santi.

Dissertação (mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas.

1. Direito tributário - Brasil. 2. Direito internacional privado - Impostos. 3. Política tributária - Brasil. 4. Concorrência. I. SANTI, Eurico Marcos Diniz de. II. Dissertação (mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. III. O Regime Brasileiro de Tributação de Lucros Auferidos por Controladas e Coligadas no Exterior: Um estudo empírico sobre as suas causas e efeitos

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ROBERTO CODORNIZ LEITE PEREIRA

O REGIME BRASILEIRO DE TRIBUTAÇÃO DE LUCROS AUFERIDOS POR CONTROLADAS E COLIGADAS NO EXTERIOR:

Um estudo empírico sobre as suas causas e efeitos

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas como requisito parcial para a obtenção de título de MESTRE no Programa de Mestrado Acadêmico em Direito e Desenvolvimento.

Professor-orientador: Eurico Marcos Diniz de Santi

Linha de pesquisa: Direito e Desenvolvimento Econômico e Social

O presente trabalho foi realizado com o apoio da Fundação Getulio Vargas, por meio da bolsa Mário Henrique Simonsen de ensino e pesquisa.

Data da aprovação: ___/___/___

Banca examinadora:

Prof. Dr. Eurico Marcos Diniz de Santi (Orientador)

Prof. Dr. Carlos Ari Sundfeld

Prof. Dr. Luis Eduardo Schoueri

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, ao Professor Eurico Marcos Diniz de Santi, orientador deste trabalho, por todos os conselhos e pelo direcionamento dado por ele à presente pesquisa. Certamente, o seu papel foi fundamental para que eu pudesse mergulhar no universo empírico no qual se respalda esta pesquisa. Nunca me esquecerei das suas lições, sobretudo, a mais importante delas: Mudar o Brasil! Sim, nós podemos!

Agradeço aos meus queridos pais, Rosana e Roberto, que sempre me apoiaram e acreditaram no meu sucesso profissional e acadêmico. Aos meus irmãos, Christian, Tiago e Isabella, que eu tanto amo, sem dúvida o seu apoio foi fundamental. Aos meus amados avós, aos quais dedico este trabalho, que sempre me trataram como um filho. Aos meus tios, em especial Carmen e Adão, e aos meus primos.

Agradeço a todos os meus amigos com quem discuti este trabalho e que certamente me ajudaram em muito na sua elaboração dando as suas ideias e sugestões de discussões. André Janjácomo Rosilho, obrigado pela revisão, dicas e amizade de quase 17 anos. Os pesquisadores do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getulio Vargas (NEF-FGV), Frederico Bastos, Basile Christopoulos, Mariana Pimentel, Guilherme Bandeira, Daniel Zugman, Eduarda Monteiro, Vanessa Rahal e Isaias Coelho (nosso amado profeta), do qual tenho a honra de fazer parte, em especial, muito me auxiliaram. Devo fazer um agradecimento em especial ao meu amigo, companheiro de mestrado, pesquisador do NEF e coordenador, juntamente comigo, do Grupo de Estudos de Tributação Internacional do NEF-FGV, Dalton Yoshio Hirata que muito me ajudou com as suas opiniões e a sua tranquilidade inabalável.

Agradeço a todos os meus colegas de mestrado, por toda a força, pelo espírito de equipe e pela amizade que jamais será esquecida por mim.

O Professor Carlos Ari merece também os meus mais sinceros agradecimentos, não apenas por compor a minha banca, mas, sobretudo, por ter sido um grande mestre na minha vida, desde a graduação até as aulas do mestrado. Já se passaram 7 anos desde a sua primeira aula na graduação da Direito GV. Espero, sinceramente, continuar aprendendo com as suas lições.

(7)

Agradeço, também, ao Professor Marco Aurélio Greco pelas conversas, dicas e pela entrevista. Em relação às entrevistas que me foram concedidas para a elaboração deste trabalho, merecem o meu agradecimento todos os entrevistados, em especial Everardo Maciel, Simone Dias Musa e Marcos Vinícius Néder.

Agradeço aos Professores Ronaldo Porto Macedo Jr., Salem Hikmat Nasser, Maíra Machado, Oscar Vilhena Vieira, Bruno Salama, José Girardi Garcez, Luciana Gross e todos os outros professores da Direito GV pelas aulas, ensinamentos e pela dedicação à nossa escola.

(8)

RESUMO

O presente trabalho é o resultado de uma pesquisa empírica que buscou reconstruir toda a trajetória percorrida pela política pública que orienta o atual regime de tributação de lucros auferidos no exterior por controladas e coligadas de empresas brasileiras com o objetivo de compreender as razões que levaram o Brasil a adotar uma norma de antidiferimento demasiadamente ampla, quando comparada às normas de natureza similar adotadas na experiência internacional. Além disso, buscamos identificar a real extensão dos efeitos econômicos ensejados pelo regime brasileiro, em especial, frente ao processo de internacionalização produtiva que vem se fazendo cada vez mais presente na realidade de diversas empresas de capital nacional. Partimos da hipótese de que o regime vigente afeta negativamente às empresas que buscam internacionalizar parte da sua atividade produtiva. Os resultados da pesquisa são de grande importância e nos ajudaram a compreender melhor as causas de muitas das questões jurídicas que atualmente ocupam grande parte do debate acadêmico no direito tributário brasileiro. Defendemos a ideia de que, se os efeitos do regime brasileiro afetam negativamente a internacionalização produtiva, o regime poderá afrontar a Ordem Econômica Constitucional.

(9)

ABSTRACT

This thesis presents the conclusions of an empirical legal research that remade the path followed by the public policy adopted by Brazilian government to tax corporate foreign income in order to understand precisely the reasons that led Brazil to adopt an antideferral rule that is broader that the Controlled Foreign Company (CFC) rules adopted world wide. Besides, our objective was also to identify the economic effects on Brazilian transnational companies arising from Brazilian CFC rules, regarding the increasing internationalization process that Brazilian firms are making through in the past decade. We adopted the hypothesis that Brazilian tax regime affects negatively transnational companies that aim to internationalize part of their production. The outcomes of the present research are of a great value to achieve a better understanding about the causes of many legal questions that are currently being discussed among legal practitioners and scholars and faced by courts. Our opinion is that, if the economic effects arising from Brazilian tax regime affects the internationalization process of Brazilian firms, that may go against, in certain cases, the economic order settled by our Constitution.

(10)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 13

I. Delimitação temática da pesquisa 13

II. Premissas metodológicas 17

III. Estrutura do trabalho 22

CAPÍTULO 1: TRAJETÓRIA DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO

REGIME DE TRANSPARÊNCIA FISCAL INTERNACIONAL 25

1.1. Notas introdutórias 25

1.2. A globalização e a mudança de concepção do Estado 26

1.3. O debate norte-americano: as origens históricas das CFC rules 30

1.3.1. Primeiras tentativas e alterações legislativas pré-1962 31

1.3.2. A alteração legislativa de 1962 (subpart f) 33

1.3.3. Subpart f: tendências posteriores a 1962 39

1.3.4. As exceções criadas às Foreign Sales Corporations (FSC) 41

1.4. O debate internacional: a concorrência fiscal danosa e as CFC rules 44

1.4.1. O projeto da OCDE sobre concorrência fiscal danosa 45

1.4.2. A concorrência fiscal danosa no direito comunitário europeu 55

1.5.Bases conceituais e teóricas do regime de transparência fiscal internacional 62

1.6.Conclusões da trajetória da evolução histórica do regime de transparência

fiscal internacional 66

CAPÍTULO 2: TRAJETÓRIA DA EVOLUÇÃO NORMATIVA DO REGIME DE TRIBUTAÇÃO DE LUCROS AUFERIDOS

NO EXTERIOR NO DIREITO BRASILEIRO 69

2.1.Notas introdutórias 69

2.2. A evolução do regime de tributação de lucros auferidos no exterior no

direito brasileiro 70

2.2.1. 1º Momento: territorialidade 70

2.2.2. 2º Momento: a Lei nº 9.249 72

2.2.2.1. O processo legislativo 72

2.2.2.2. Conclusões parciais – Lei nº 9.249/95 81

2.2.3. 3º Momento: a IN SRF nº 38/1996 82

2.2.4. 4º Momento: a Lei nº 9.532/1997 84

2.2.4.1. O processo legislativo 84

2.2.4.2. Conclusões parciais Lei nº 9.532/97 90

2.2.5. 5º Momento: a Lei Complementar nº 104/2001 92

2.2.5.1. O processo legislativo 92

2.2.5.2. Conclusões parciais Lei Complementar nº 104/2001 97

2.2.6. 6º Momento: a Medida Provisória nº 2.158-35/2001 98

2.2.6.1. O processo legislativo 98

2.2.6.2. Conclusões parciais Medida Provisória nº 2.158-35/2001 101

2.2.7. 7º Momento: a IN SRF nº 213/2002 102

2.3. Quadro-resumo dos 7 momentos 103

(11)

2.4.1. A primeira hipótese 106

2.4.2. A segunda hipótese 108

2.4.3. Conclusões parciais das duas hipóteses 109

2.5. Participação dos grupos de interesse na formulação da política tributária 111

2.6. Conclusões da trajetória da evolução normativa do regime de tributação de

lucros auferidos no exterior no direito brasileiro 112

CAPÍTULO 3: OS EFEITOS DO REGIME DE TRIBUTAÇÃO DE

LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR NA INTERNACIONALIZAÇÃO

PRODUTIVA DAS EMPRESAS DE CAPITAL NACIONAL 114

3.1. Notas introdutórias 114

3.2. Premissas conceituais do fenômeno da internacionalização 115

3.3. Internacionalização produtiva e desenvolvimento nacional 122

3.4. O diagnóstico da internacionalização produtiva no Brasil 126

3.5. A internacionalização é um objetivo buscado pelo Estado? 131

3.5.1. A internacionalização nas políticas industriais brasileiras 131

3.5.2. O papel do BNDES no financiamento da internacionalização produtiva 134

3.5.3. Conclusões parciais da internacionalização nas políticas de governo 136

3.6. A pesquisa empírica: os efeitos do regime vistos da perspectiva dos

contribuintes e do fisco 137

3.6.1. Notas metodológicas 137

3.6.2. Resultados da pesquisa 140

3.6.2.1. Importância e motivações da internacionalização produtiva 140

3.6.2.2. Efeitos econômicos do regime brasileiro de tributação de lucros

auferidos no exterior 141

3.6.2.2.1. Perspectiva dos contribuintes 141

3.6.2.2.2. Perspectiva do fisco 147

3.7. Conclusões dos efeitos do regime de tributação de lucros auferidos no exterior na internacionalização produtiva das empresas de capital nacional:

o regime visto em dois contextos distintos 151

CAPÍTULO 4: ANÁLISE JURÍDICA CRÍTICA DO REGIME DE

TRIBUTAÇÃO DE LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR 153

4.1. Notas introdutórias 153

4.2. Uma questão preliminar 153

4.2.1. A primeira linha doutrinária: O regime brasileiro não é de transparência fiscal

internacional 154

4.2.2. A segunda linha doutrinária: O regime brasileiro é de transparência fiscal

internacional 158

4.2.3. Observações críticas sobre as duas linhas doutrinárias 161

4.3. O regime de tributação de lucros auferidos no exterior e o direito interno 162

4.3.1. 1º momento de debate da validade jurídica do regime: a questão

da disponibilidade dos lucros e o conceito constitucional de renda 162

4.3.1.1. A ADI nº 2.588 162

4.3.1.2. As posições doutrinárias 166

4.3.1.3. Os efeitos fiscais do Método da Equivalência Patrimonial (MEP) 171

4.3.1.4. Demais questões jurídicas presentes no 1º momento de debate 175

(12)

com os resultados positivos apurados no Brasil 175

4.3.1.4.2. O regime de tributação de lucros auferidos no exterior e as

regras de preços de transferência 177

4.3.2. 2º momento de debate da constitucionalidade do regime:

a Ordem Econômica Constitucional e a internacionalização empresarial 179

4.3.2.1.Constituição, ordem econômica e desenvolvimento nacional 180

4.3.2.2. Internacionalização empresarial e a Ordem Econômica Constitucional: Quais são os limites jurídicos que o Estado deve observar ao criar uma

política industrial de internacionalização produtiva? 184

4.3.2.3. O regime de tributação de lucros auferidos no exterior e a Ordem

Econômica Constitucional 186

4.4. O regime de tributação de lucros auferidos no exterior e o direito

internacional 189

4.4.1. A compatibilidade das normas de transparência fiscal internacional

com os tratados celebrados pelos países para evitar a dupla

tributação segundo a OCDE 192

4.4.2. A compatibilidade do regime brasileiro de tributação de lucros

auferidos no exterior com os tratados celebrados pelo Brasil

para evitar a dupla tributação 199

4.5. Conclusões da análise jurídica crítica do regime brasileiro de tributação

de lucros auferidos no exterior 207

CAPÍTULO 5: CONCLUSÕES FINAIS 210

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 222

APÊNDICE A 231

(13)

INTRODUÇÃO

I. Delimitação temática da pesquisa

As questões de direito tributário internacional vêm ocupando posição central nos debates entre tributaristas, economistas, formuladores de políticas públicas e acadêmicos especialmente em um contexto em que o Brasil vem sofisticando, progressivamente, a sua legislação fiscal de modo a criar instrumentos jurídicos, cada vez mais eficazes, para proteger

– e, em certos casos, reforçar – a sua arrecadação tributária nacional. Soma-se a este cenário o

fato de o Brasil ter celebrado diversos tratados destinados a evitar a dupla tributação e a promover a maior troca de informações com diferentes jurisdições fiscais ao redor do mundo.

Este diagnóstico está intimamente relacionado ao fenômeno da internacionalização da

economia brasileira que não é apenas um reflexo de um fenômeno econômico mais amplo – a

globalização –, mas, sobretudo, uma consequência advinda da adoção de uma política

econômica mais aberta, através da qual o Brasil deixou de se pautar pela estratégia de substituição de importações e passou a firmar a sua presença no mercado internacional de forma mais expressiva, desde o governo Collor e, principalmente, com o sucesso do Plano Real1.

Dentre os diversos instrumentos jurídico-tributários adotados pelo Brasil para se deparar com esta nova realidade econômica, está o regime de tributação de lucros, ganhos de capital e rendimentos auferidos no exterior por sociedades controladas, coligadas, filiais e sucursais de pessoas jurídicas residentes no Brasil. Trata-se do regime brasileiro de tributação

das pessoas jurídicas em bases universais – ou mundiais – no direito tributário brasileiro.

De fato, as pessoas físicas já vinham sendo tributadas pela universalidade dos seus rendimentos auferidos tanto no Brasil quanto no exterior à época em que foi introduzido semelhante regime para as pessoas jurídicas. É importante esclarecer, no entanto, que este trabalho tratou apenas incidentalmente do regime de tributação aplicável às pessoas físicas, de modo que o seu foco foi a tributação das pessoas jurídicas. É claro que, ao se fazer menção ao

1 Este diagnóstico de alteração da política econômica brasileira, que caracterizou a Nova República, pode ser

(14)

regime jurídico como de “tributação de lucros auferidos no exterior”, o presente estudo está se referindo não apenas ao lucro, mas, igualmente, à integralidade dos rendimentos e ganhos de

capital auferidos pelas empresas residentes no Brasilatravés das suas coligadas, controladas,

filiais e sucursais residentes no exterior.

Quando o Brasil introduziu o regime de tributação de lucros auferidos no exterior no seu ordenamento jurídico, ele passou a determinar que todos os lucros, rendimentos e ganhos

de capital auferidos no exterior passariam a ser imputados automaticamente – i.e.

independentemente da sua efetiva disponibilização jurídica ou econômica – na base de cálculo

da sua controladora ou coligada residente no Brasil. A evolução normativa do regime brasileiro foi caracterizada por constantes mudanças no seu desenho, ora permitindo o diferimento da tributação nacional, ora reprimindo-o, mas, ao final, prevaleceu um desenho normativo semelhante ao inicialmente concebido (regra de antidiferimento ampla).

À época em que o Brasil introduziu tais regras no seu ordenamento jurídico, diversos países já haviam adotado semelhante regime de tributação sob a orientação da OCDE (Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico) e com base na experiência

bem sucedida de outros países pioneiros na sua adoção (e.g. EUA)2. Na experiência

internacional, as regras que permitem a tributação em bases mundiais dos rendimentos auferidos por pessoas jurídicas independentemente da sua efetiva disponibilização econômica

ou jurídica são denominadas de CFC rules (Controlled Foreign Corporation rules) ou de

regime de transparência fiscal internacional.

A discussão sobre se as normas brasileiras são propriamente as CFC rules consagradas

pela experiência jurídica internacional será abordada em momento oportuno do presente trabalho. Por ora, é importante chamar atenção para o fato de que o Brasil optou por um regime de tributação de lucros auferidos no exterior que difere da experiência internacional. No plano internacional, a utilização do regime de transparência fiscal internacional está orientada para combater práticas abusivas de elisão fiscal internacional, denotando-lhe nítida natureza antiabuso ou antielisiva. No Brasil, o regime de tributação de lucros auferidos no exterior aparentemente não possui natureza antielisiva na medida em que se aplica de forma irrestrita a qualquer tipo de rendimento oriundo de qualquer jurisdição fiscal do mundo.

2 Analisaremos, no capítulo 1 deste trabalho, o debate legislativo norte-americano, que antecedeu a adoção das

(15)

O regime brasileiro de tributação de lucros auferidos no exterior foi inicialmente introduzido no ordenamento jurídico pelos artigos 25 a 27 da Lei nº 9.249/95, tendo-se seguido diversas alterações legislativas (IN SRF nº 38/96, Lei nº 9.532/97 e LC nº 104/2001) até que o regime atual estivesse finalmente consagrado através do artigo 74 da MP 2.158-35/2001 e da IN SRF nº 213/2002 que o regulamentou.

Na sequência da publicação da medida provisória e da sua regulamentação, surgiram diversos questionamentos quanto à validade jurídica do critério de disponibilização

automática –também denominado de “disponibilização ficta” –, previsto no artigo 74 da MP,

frente ao disposto no caput do artigo 43 do Código Tributário Nacional (CTN) e ao conceito

constitucional de renda que, segundo argumentou-se, dependia da efetiva disponibilização jurídica ou econômica da renda para que sobre ela houvesse incidência tributária.

A segunda questão que foi levantada diz respeito à adequação do regime brasileiro com os tratados celebrados pelo Brasil com outros países para evitar a dupla tributação internacional da renda. Vale ressaltar que o Brasil seguiu em grande medida a convenção modelo da OCDE. Esta é uma questão ainda mais complexa e que requer uma análise muito mais cuidadosa porque as consequências do posicionamento que o Brasil vier a adotar referente à temática poderão repercutir nas relações mantidas pelo Brasil no plano internacional. De fato, este tema é muito controvertido não apenas no Brasil, como também em outros países, tendo a OCDE, conforme demonstraremos neste trabalho, adotado distintos posicionamentos ao longo do tempo.

Há, ainda, outras questões secundárias, mas que não deixam de possuir a sua importância no debate atual, tais como os limites legais impostos à compensação de prejuízos incorridos no exterior com os lucros auferidos no Brasil e a potencial sobreposição das normas de preços de transferência brasileiras com o regime de tributação de lucros auferidos no exterior.

O debate, como se viu, já está posto e muitos autores têm se empenhado em formular

interpretações jurídicas – muitas delas muito coerentes outras nem tanto – para se posicionar

neste debate que divide opiniões e interesses em dois polos distintos: fisco e contribuintes.

(16)

brasileiro de tributação de lucros auferidos no exterior. Além disso, identificamos os efeitos econômicos do regime sobre um fenômeno econômico maior que é a internacionalização

produtiva3 das empresas de capital nacional4 para que pudéssemos, na sequência, fazer o juízo

de adequação do regime com a Ordem Econômica Constitucional, com precisão e fundamento empírico.

Através do recurso à pesquisa empírica5, procuramos identificar, por um lado, quais

são as causas, o momento histórico e os interesses que estavam envolvidos no debate legislativo que orientaram o desenho do regime brasileiro, e, por outro lado, os efeitos que o regime provoca no processo de internacionalização produtiva das empresas brasileiras, sobretudo no momento da decisão de constituir unidades produtivas no exterior e na competitividade das suas unidades no exterior com os seus competidores locais.

Assim, a compreensão mais profunda do tema, através do recurso a fontes empíricas e não apenas à literatura especializada, nos permitiu chegar a um posicionamento qualificado sobre as causas que levaram aos debates atuais, os interesses em jogo, os efeitos do regime e como tais efeitos podem ter repercussões jurídicas. Com isso, pretendemos abrir novas frentes de discussão jurídica sobre o regime brasileiro de tributação de lucros auferidos no exterior que vão além daquelas já existentes.

3 Conforme será demonstrado em maiores detalhes adiante neste trabalho, há diversas formas distintas de

internacionalização empresarial. Optou-se, no entanto, por analisar as repercussões econômicas sob a óptica da internacionalização produtiva por razões que serão demonstradas adiante.

4 Entende-se, para os propósitos do referido trabalho, que “empresa de capital nacional” seja a sociedade

empresária cujo acionista com maior capital votante seja, direta ou indiretamente, pessoa física ou jurídica domiciliada no Brasil.

5 Tanto a literatura nacional quanto a literatura internacional apontam para o fato de que as pesquisas empíricas

(17)

II. Premissas metodológicas

Conforme mencionamos no tópico anterior, este estudo se propôs a analisar dois problemas relativos ao regime brasileiro de tributação de lucros auferidos no exterior. O

primeiro deles possui natureza conceitual6 e diz respeito à identificação dos interesses, razões

e condicionantes históricos que determinaram a política tributária que estabeleceu o desenho normativo do regime jurídico objeto do presente estudo. Buscamos compreender porque o Brasil optou por um modelo diverso do modelo consagrado pala experiência internacional. O

segundo deles possui natureza prática7 e refere-se à investigação dos eventuais efeitos

econômicos deste regime no processo de internacionalização produtiva das empresas nacionais e, principalmente, na sua competitividade em mercados externos.

Consideramos que esta abordagem do tema do regime de tributação em bases universais é relevante para os propósitos de uma pesquisa jurídica e merece uma investigação empírica minuciosa, pois, conforme sustentamos no tópico anterior, procuramos compreender de forma aprofundada as razões que teriam levado às críticas e ao debate que se tem hoje sobre o tema. Uma compreensão mais aprofundada sobre o tema, respaldada em fontes empíricas, nos permite não apenas identificar corretamente as linhas que estão sendo defendidas como também os interesses que estão por trás delas.

Por um lado, diante do diagnóstico de que o regime brasileiro destoa sensivelmente dos modelos de tributação em bases universais adotados pela maioria dos países, torna-se relevante um estudo que se destine a compreender porque as normas brasileiras são diferentes. Compreender o porquê da diferença de orientações implica investigar quais foram os condicionantes que determinaram a política tributária que orientou a criação do regime brasileiro em todas as suas distintas etapas: (i) desde a sua proposição inicial no interior do Poder Executivo, (ii) passando pelas alterações propostas pelo Poder Legislativo, (iii) até a atribuição dos seus últimos condicionantes impostos pelo controle judicial ou por influência de outros órgãos regulatórios. Este é o caminho percorrido pelas políticas públicas desde a sua propositura até a sua aplicação no campo prático no Brasil. Reconstruir este percurso

6 Cf. BOOTH, Wayne, COLOMB, Gregory G. e WILLIAMS, Joseph. The Craft of Research. 3ª Edição

(18)

legislativo, contextualizando-o e trazendo à baila os interesses envolvidos, consiste em um trabalho de “engenharia normativa”.

Por outro lado, identificar quais são os impactos do referido regime na realidade prática, sobretudo do ponto de vista do processo de internacionalização produtiva das empresas de capital nacional, é importante diante da constatação de que as empresas brasileiras estão em um processo crescente de internacionalização produtiva, conforme será devidamente demonstrado no decorrer deste trabalho. Trata-se de um diagnóstico que não deixa de possuir repercussões importantes do ponto de vista do desenvolvimento econômico brasileiro. Analisar, portanto, se as normas possuem consequências sobre este fenômeno, bem como sobre a competitividade das empresas nacionais no mercado internacional, foi relevante

para determinar, com precisão, os suas efeitos econômicos8. O resultado deste diagnóstico nos

permitiu ponderar em que medida os efeitos advindos do regime brasileiro possuem repercussões jurídicas, indo ou não de encontro à Ordem Econômica Constitucional.

Os dois problemas, embora em um primeiro momento pareçam independentes entre si, estão, na verdade, interligados. Isso porque um dos objetivos da identificação da política tributária que orientou a criação do regime atual de tributação de lucros auferidos no exterior foi observar, até que ponto, houve a devida ponderação dos seus impactos sobre a atividade econômica das empresas nacionais em fase de internacionalização produtiva. Assim, foi possível identificar em que medida a internacionalização produtiva e a competitividade das empresas nacionais nos mercados internacionais foram uma condicionante sopesada pelo formulador de políticas públicas na engenharia normativa do regime tributário estudado.

Em relação ao primeiro problema, as questões centrais que nos serviram de guia de pesquisa foram: Qual foi a política tributária que orientou a criação do regime de tributação universal da pessoa jurídica no direito brasileiro? Quais razões poderiam justificar a opção brasileira por um regime diverso da prática mundial? Há, em relação a este tema, questões secundárias: Quais foram os debates e interesses em cada um dos momentos da evolução normativa do tema? Como o setor privado e a Administração Pública fazendária se

8 Em relação ao segundo problema, foi preciso recorrer a um estudo que, até certo ponto, ultrapassou as

(19)

articularam no Congresso Nacional para fazerem valer seus interesses? Qual era o contexto histórico envolvido em cada debate? Em que medida as justificativas apresentadas estão em consonância com o desenho da norma? Caso negativo, quais razões poderiam justificar tais idiossincrasias?

Quanto ao segundo problema, as questões centrais orientadoras foram: O regime jurídico brasileiro de tributação de lucros auferidos no exterior interfere no processo de internacionalização produtiva das empresas brasileiras? Há impactos do regime na competitividade das empresas nacionais no mercado internacional? Caso positivo, eles se operam na prática? Em que medida, os eventuais impactos advindos do regime no processo de internacionalização produtiva afrontam a Constituição Federal (em especial a Ordem Econômica Constitucional)?

Houve, ainda, uma questão que estabeleceu a conexão entre os dois problemas tratados nesta pesquisa: Ao longo da evolução da disciplina normativa do regime de tributação de lucros auferidos no exterior, foram ponderados os seus possíveis efeitos sobre a atividade industrial brasileira, sobretudo do ponto de vista da internacionalização produtiva das empresas de capital nacional?

Nesta pesquisa, testamos três hipóteses centrais. A primeira delas consiste na ideia de que, ao longo da evolução normativa do regime de tributação em bases universais, não houve a ponderação adequada dos seus possíveis efeitos sobre o processo de internacionalização produtiva das empresas de capital nacional. Assim, segundo esta hipótese, a política tributária que resultou da evolução legislativa do regime no tempo levaria a crer que esta questão teria sido pouco relevante, ou mesmo, menosprezada. A segunda hipótese é de que o regime brasileiro difere da prática internacional, pois as autoridades fazendárias estavam, desde o início, muito mais preocupadas com o aumento da arrecadação federal do que com a dissuasão de práticas de elisão fiscal internacional. A terceira hipótese parte da ideia de que o regime brasileiro não interfere no processo de internacionalização produtiva de empresas de capital nacional, mas o seu desenho relativamente amplo possui efeitos econômicos no processo de conquista de novos mercados. Com isso, adotamos também a hipótese de que o regime pode afrontar a Ordem Econômica Constitucional.

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que pertencessem a órgãos da administração fazendária e que tivessem participado no processo de formulação do regime de tributação de lucros auferidos no exterior ou, ainda, que atuassem diretamente com o mesmo; (ii) entrevistas com empresas brasileiras que já tivessem

internacionalizado parte da sua atividade produtiva; e (iii) o processo legislativo9 referente a

todos os diplomas legais que caracterizaram a evolução normativa do regime (Lei nº 9.249/95, Lei nº 9.532/97, Lei Complementar nº 104/2001 e Medida Provisória nº 2.158-35/2001).

Nesta pesquisa, tivemos a pretensão de responder às perguntas relativas ao primeiro problema (política tributária) através da análise do processo legislativo e por meio de entrevistas com autoridades públicas pertencentes à Administração Pública que tiveram participação na concepção inicial do regime. As perguntas que dizem respeito ao segundo problema (internacionalização produtiva e competitividade no mercado internacional) foram respondidas através dos resultados das entrevistas realizadas com administradores, economistas, diretores e consultores tributários de grandes empresas de capital nacional que já tivessem internacionalizado parte da sua atividade produtiva e das entrevistas feitas com autoridades fiscais de modo geral.

As estratégias de coleta de dados definidas acima foram escolhidas a partir da natureza

das questões propostas10. Optou-se, portanto, por uma estratégia de levantamento de dados

empiricamente obtidos11 submetidos, posteriormente, a uma análise qualitativa de conteúdo.

As entrevistas foram guiadas através de roteiros com perguntas amplas e abertas. Neste sentido, optamos por não se utilizar questionários nas entrevistas, mas sim perguntas abertas que tinham como objetivo central captar as percepções e a experiência pessoal dos

entrevistados sobre o tema tratado12. Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas na sua

íntegra, ressalvado o direito de sigilo da identidade dos entrevistados. A maior parte das entrevistas foi realizada de forma presencial tendo algumas delas sido feitas, no entanto, por

9 Em relação à pesquisa realizada a partir do processo legislativo, esclarecemos que os autos referentes a cada

um dos diplomas normativos indicados foram obtidos junto ao Departamento de Processo Legislativo da Secretaria de Assuntos Legislativo do Ministério da Justiça. Eles foram analisados na sua íntegra.

10 Cf. WEBLEY, Lisa. Qualitative approaches to empirical legal research. In: CANE, Peter e KRITZER,

Herbert M. (org). The Oxford Handbook of Empirical Legal Research. Oxford University Press, p. 932- 936. 11 Cf. YIN, Robert K. Estudo de Caso: Planejamento e Métodos. Tradução: Daniela Grassi. Porto Alegre:

Bookman, 2005, p. 19-38.

12 Há diversos autores que sugerem a utilização de roteiros com questões abertas em pesquisas empíricas sujeitas

(21)

telefone ou videoconferência. No momento oportuno deste trabalho daremos maiores detalhes metodológicos relativos às entrevistas.

Alertamos que esta pesquisa não teve a intenção de criar uma amostra representativa de entrevistas com empresas de capital nacional já que este não é o propósito de uma pesquisa cuja estratégia de análise de dados é qualitativa que, por sua vez, atribui maior importância ao conteúdo de cada um dos relatos do que à sua representatividade amostral. As pesquisas qualitativas são pautadas na qualidade dos relatos e na capacidade de interpretação do

pesquisador que, a partir daí, poderá obter conclusões satisfatórias13. Com isso, enfatizamos

que o nosso objetivo foi, tão somente, colher percepções e impressões que nos foram transmitidas pelos entrevistados para, a partir delas, construir, com o devido cuidado,

informações e fatos relevantes para a presente pesquisa14.

Apesar desta pesquisa ser em grande medida empírica, em momento algum deixamos de analisar a literatura jurídica (e econômica) especializada. Neste diapasão, a literatura

teórica – fonte secundária de coleta de dados– teve a importante função de complementar a

pesquisa empírica – fonte primária de coleta de dados– e de reconstruir os debates jurídicos

aos quais nos reportamos anteriormente. Reconstruímos os debates para não apenas chamar atenção para os problemas jurídicos ensejados pelo regime, como também para chamar atenção para os interesses envolvidos nos debates jurídicos.

Ao final deste trabalho, esperamos poder contribuir para o debate acadêmico atual sobre o regime de tributação de lucros auferidos no exterior através da demonstração de como a política tributária modulou o regime de tributação de lucros auferidos no exterior, bem como quais são os seus efeitos sobre o setor privado, sobretudo diante do fenômeno da internacionalização produtiva das empresas nacionais e como tais efeitos podem afrontar a constituição federal. Toda a presente investigação científica foi guiada pela esperança de que os resultados desta pesquisa empírica possam sensibilizar formuladores de políticas públicas para a futura elaboração de políticas tributárias.

13 Trata-se do enfoque epistemológico interpretativista que é geralmente associado às pesquisas submetidas à

análise qualitativa. O enfoque interpretativista afasta a pretensão de pura objetividade que alguns autores atribuem à análise quantitativa, valorizando-se a capacidade de o pesquisador obter resultados válidos através da sua interpretação dos dados obtidos. Em relação a esta abordagem, veja-se: WEBLEY, Lisa. Qualitative approaches to empirical legal research. In: CANE, Peter e KRITZER, Herbert M. (org). The Oxford Handbook of Empirical Legal Research. Oxford University Press, p. 929-931.

14 Informamos que nós tomamos os devidos cuidados no sentido de afastar eventuais interesses e outros

(22)

A pesquisa empírica no direito tem muito a contribuir para a formulação de políticas públicas especialmente porque, de acordo com a literatura especializada, os resultados empíricos podem revelar “brechas” na lei ou fraquezas na forma como a norma funciona, apontando para desafios futuros que deverão ser levados em consideração na formulação de

novas políticas15. No entanto, a grande contribuição da pesquisa empírica no direito é

justamente demonstrar que o direito visto a partir do ordenamento jurídico (perspectiva estática) difere sensivelmente do direito observado a partir da sua aplicação prática

(perspectiva dinâmica) 16. O que se precisa é, tão somente, facilitar os canais de acesso entre o

cientista do direito e o formulador de políticas públicas para que a pesquisa empírica passe a

representar um verdadeiro referencial de formulação – e reformulação – de políticas. Esta é a

função deste estudo.

Fica claro, portanto, que o presente estudo também está alinhado com o estudo do “direito e desenvolvimento” o qual busca compreender a relação causal que existe entre a

engenharia do sistema jurídico e o fenômeno do desenvolvimento17. Neste sentido, possuímos

a esperança de que os resultados obtidos a partir do presente estudo possam servir de inspiração para um regime de tributação de lucros auferidos no exterior que favoreça o desenvolvimento brasileiro e que seja benéfico tanto para o fisco quanto para o contribuinte.

III. Estrutura do trabalho

Delimitado o tema eestabelecidos os pressupostos metodológicos, detalhamos, abaixo,

o que trata cada uma dos capítulos que compõem o presente trabalho de forma a demonstrar qual foi a abordagem adotada em cada um deles, a sua importância (ou função) no contexto do trabalho e a natureza das fontes utilizadas. Este trabalho está dividido em cinco capítulos.

15 Cf. PARTINGTON, Martin. Empirical Legal Resarch and Policy-Making. In: CANE, Peter e KRITZER,

Herbert M. (org). The Oxford Handbook of Empirical Legal Research. Oxford University Press, p. 1.003. 16 Ibid., p. 1.021-1.022.

17 Em relação a este tema, vale chamar atenção para a tese elucidativa defendida por David Trubek e Álvaro

(23)

O capítulo 1 analisa a trajetória da evolução histórica do regime transparência fiscal

internacional (CFC rules) no mundo. O foco do capítulo foi a reconstrução do caminho

percorrido pelo instituto ao longo do tempo bem como as razões que foram determinantes no seu desenvolvimento e adoção em escala mundial. Atribuímos especial relevância ao papel

dos EUA como país pioneiro na implantação de CFC rules e ao papel da OCDE e da

Comunidade Europeia no período pós-segunda guerra mundial no debate referente ao

combate às práticas de concorrência fiscal danosa18. As fontes pesquisadas compreendem

desde a literatura teórica até artigos e livros publicados pela OCDE e por instituições pertencentes à Comunidade Europeia.

O capítulo 2 enfrenta o primeiro problema indicado na seção anterior (identificação da política tributária). Nele, reconstruímos a trajetória da evolução normativa do regime de tributação de lucros auferidos no exterior, sob a perspectiva de um estudo empírico, de forma a abordar cada um dos sete momentos que caracterizaram a sua evolução normativa.

Este capítulo abrange a reconstrução do contexto histórico presente à época, os debates legislativos, os interesses em jogo e as razões que foram determinantes no desenho do regime jurídico em estudo. Para tanto, utilizamos as seguintes fontes de pesquisa: o processo legislativo relativo à Lei nº 9.249/95, Lei nº 9.532/97, LC nº 104/2001 e MP nº 2.158-35/2001, os diplomas normativos legais e infralegais que caracterizaram cada um dos momentos de legalidade do regime de tributação em análise (além dos diplomas já mencionados, a IN SRF nº 36/98 e a IN SRF nº 213/2002); entrevistas com autoridades públicas que participaram no seu processo de formulação; e material explicativo de fonte governamental em que foram detalhados os objetivos buscados com a instituição do regime. Como se vê, neste capítulo, a pesquisa se concentrou em material fundamentalmente empírico.

O capítulo 3 enfrenta o segundo problema exposto no tópico anterior desta Introdução

– internacionalização produtiva e competitividade no mercado internacional – a partir dos

resultados das entrevistas feitas com administradores, economistas, diretores e consultores tributários de grandes empresas de capital nacional que já tenham internacionalizado parte da sua atividade produtiva. O foco, neste tópico, foi a análise dos efeitos econômicos gerados pela aplicação do regime no plano prático. Expusemos alguns postulados teóricos da

18 Este trabalho abordará o tema da concorrência internacional em dois sentidos distintos. O primeiro deles

(24)

internacionalização produtiva, bem como o diagnóstico do recente movimento de internacionalização produtiva das empresas de capital nacional com dados econômicos e empíricos. Posteriormente, as entrevistas foram analisadas qualitativamente para que fossem identificados os efeitos econômicos ensejados pela aplicação do regime.

O capítulo 4 se debruça sobre as repercussões jurídicas ensejadas pelo desenho normativo do regime de tributação de lucros auferidos no exterior no direito tributário brasileiro. Foram feitos breves comentários sobre alguns aspectos teóricos e práticos da sua

aplicação – entre eles, discutimos como poderiam ser conceituadas as normas adotadas pelo

Brasil (e.g. se teriam a mesma natureza do instituto da transparência fiscal internacional) –

seguidos da exposição dos problemas que a aplicação do regime jurídico enseja no direito brasileiro. Entre os problemas, abordamos, em especial, a discussão sobre a validade jurídica do regime, patrocinada nos autos da ADI 2.588, a questão da sua compatibilidade com os tratados celebrados pelo Brasil para evitar a dupla tributação, a atribuição de efeitos fiscais ao Método da Equivalência Patrimonial (MEP), os limites legais impostos à compensação de prejuízos incorridos no exterior com os lucros auferidos no Brasil e a potencial sobreposição das normas de preços de transferência brasileiras com o regime de tributação de lucros auferidos no exterior. Esta análise não teve a pretensão de ser exaustiva, mas sim de apontar os problemas jurídicos ensejados pelo desenho normativo do regime brasileiro.

Defendemos, neste capítulo, que o debate relativo à validade jurídica do regime deverá assumir novas frentes futuramente. A principal delas diz respeito ao confrontamento dos efeitos econômicos advindos do regime brasileiro com a Ordem Econômica Constitucional. Neste sentido, ao confrontar os efeitos econômicos regime brasileiro de tributação de lucros

auferidos no exterior – identificados em nossa pesquisa empírica – com a Ordem Econômica

Constitucional, restou comprovado que, em determinadas circunstâncias, o regime brasileiro será inconstitucional por desincentivar a internacionalização produtiva. Em outras, será constitucional. Este debate não exclui, no entanto, o debate quanto à disponibilização automática e do conceito de renda, mas vem a se somar a ele, conforme demonstraremos.

(25)

1. TRAJETÓRIA DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO REGIME DE TRANSPARÊNCIA FISCAL INTERNACIONAL

1.1.Notas introdutórias

O presente capítulo tem como objetivo central identificar, através de uma perspectiva internacional, as origens históricas e interesses envolvidos na criação do regime de

transparência fiscal internacional – também denominado, internacionalmente, como CFC

rules (Controlled Foreign Corporation rules) – ao mesmo tempo em que busca conectar tais origens com os temas que ensejam grandes debates atuais, como é o caso da concorrência fiscal danosa e da elisão fiscal internacional.

A importância que os temas mencionados adquiriram ao longo do tempo legitimou a

atuação de órgãos internacionais e supranacionais – tais como a OCDE e a Comissão

Europeia – no combate às práticas da concorrência fiscal danosa incorridas por diversas

jurisdições fiscais no mundo. Estes problemas encontram as suas raízes em um cenário de integração econômica e do fenômeno da globalização que caracterizou parte significativa do século XX, em especial, as suas últimas décadas.

O debate sobre a função e a importância das CFC rules passou por uma evolução

desde a sua positivação no direito norte-americano, em 1962, até a sua utilização atual patrocinada pela Comissão Europeia, no âmbito do direito comunitário da União Europeia, e pela OCDE, na esfera internacional.

(26)

1.2.A globalização e a mudança de concepção do Estado

O direito vem passando, desde as últimas décadas do século XX, por um processo de transformação no qual a norma jurídica, muito embora continue sendo aplicada a um território específico onde o respectivo ordenamento jurídico possui jurisdição, conforme prevê a maior parte dos ordenamentos jurídicos, não restringe mais os seus efeitos aos seus limites territoriais. Cada vez mais, as normas aplicadas por uma determinada jurisdição possuem repercussões não apenas no plano interno, como também no plano global, de modo a afetar o comportamento de outras jurisdições, alterando expectativas normativas e ensejando reações no plano do direito.

Este diagnóstico pode ser observado com facilidade no âmbito do direito tributário quando se constata que a aplicação de algumas das suas normas possui repercussão internacional, seja no comportamento de operadores privados no exterior, seja no comportamento de outras jurisdições fiscais. Alguns autores conceituam este fenômeno como

sendo a “extraterritorialidade” da lei tributária19.

No entanto, a razão para esta transformação do direito está intimamente relacionada ao fenômeno da globalização que, por sua vez, deve ser compreendido em uma moldura conceitual ampla como um fenômeno que diz respeito não apenas à esfera econômica, mas também à política, cultural, social, jurídica, entre inúmeras outras.

Do ponto de vista econômico e político, no final da década de 1990, houve um processo de integração de mercados motivado por esforços de diversas instituições internacionais no sentido de promover a liberalização dos mercados. Assim, surgiu uma economia global que, de acordo com Manuel Castells, consiste em “uma economia cujos componentes centrais têm a capacidade institucional, organizacional e tecnológica de

trabalhar em unidade e em tempo real, ou em tempo encolhido, em escala planetária”20.

Segundo o referido autor, a economia global não foi criada pelos mercados, mas pela interação entre mercados, governos e instituições financeiras agindo em nome dos mercados

19 Entre eles: HUCK, Hermes Marcelo. Evasão e elisão: rotas internacionais do planejamento tributário. São

Paulo: Saraiva, 1997, p. 228.

20 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede:a era da informação: economia, sociedade e cultura. São Paulo:

(27)

ou de sua ideia do que devem ser os mercados21. Dentre as estratégias usadas pelas empresas para aumentar a sua produtividade, chama atenção a estratégia de internacionalização da sua produção. A internacionalização produtiva, por sua vez, depende de três aspectos centrais: (i)

o aumento de investimento estrangeiro direto (Foreign Direct InvestmentFDI); (ii) o papel

decisivo dos grupos empresariais multinacionais como produtores na economia global; e (iii)

a formação de redes internacionais de produção22.

Quanto à formação das redes internacionais de produção, esclarecemos que elas são compostas por empresas transnacionais que se combinam de forma estratégica com empresas de menor porte, incluindo, ainda que de forma limitada, redes de produção de empresas de países em desenvolvimento. Castells afirma que essas redes produtivas transnacionais,

“ancoradas pelas empresas multinacionais, distribuídas pelo planeta de maneira desigual, dão

forma ao padrão de produção global e, por fim, ao padrão de comércio internacional”23.

Do ponto de vista geopolítico, a globalização alterou a concepção de Estado que era reconhecida até então; o Estado-nação. Esta transição do modelo de Estado-nação para o

modelo de Estado-transnacional foi abordada por Marco Aurélio Greco24 ao analisar, entre

outros autores, Ulrich Beck. A transição dos modelos consiste, sobretudo, na redefinição do próprio conceito de soberania política, econômica e fiscal que se tinha no passado.

De acordo com a referida abordagem, o Estado-nação – visão da figura do Estado

adotada durante séculos – era visto como uma entidade independente em que o exercício da

sua soberania era concebido como o exercício de um poder independente sobre o povo de um determinado território. Os ordenamentos jurídicos se contrapunham em algumas relações internacionais e, por vezes, entravam em conflito. Tratava-se do exercício de uma soberania

exclusiva25. Na esfera do exercício do poder de tributar, os elementos de conexão utilizados

pelos sistemas tributários se fixavam em elementos clássicos da soberania, tais como o povo e o território.

A crise da visão do Estado-nação ocorreu a partir da segunda metade do século XX na medida em que a globalização avançou e as relações econômicas passaram a ocorrer em

21 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede:a era da informação: economia, sociedade e cultura. São Paulo:

Paz e Terra, 2011, Volume I, p. 176. 22 Ibid., p. 158.

23 Ibid., p. 164.

24 GRECO, Marco Aurélio. Globalização e tributação da renda mundial. Revista Fórum de Direito Tributário

(RFDT). Belo Horizonte: Fórum, ano 1, nº 2, 2003, p. 75-90.

25 Cf. BECK, Ulrich. O que é globalização? São Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 230 e ss apud GRECO, Op. Cit., p.

(28)

caráter transnacional – e não mais limitadas ao um único território – na figura da economia global definida por Castells anteriormente. As tecnologias da informação e a sociedade conectada em rede acentuaram a crise deste modelo de estado, transnacionalizando as relações interpessoais e, em especial, as relações econômicas.

Diante deste novo contexto, os Estados não mais poderiam formular as suas políticas públicas sem se atentarem para as suas repercussões no comportamento e nas expectativas de outros Estados. A própria noção de soberania foi recontextualizada pela globalização,

acenando com modelos democráticos que prenunciavam um novo equilíbrio de forças26. O

processo de compreensão do direito passou por uma profunda alteração. De acordo com

Marco Aurélio Greco, neste novo contexto, “compreender a legislação interna não é apenas

verificar a sua adequação formal ou material a uma norma superior, mas também verificar a

sua adequação funcional ao contexto ‘glocal’ (global/local) que visa regular”27.

No que diz respeito à esfera do direito tributário, a emergência de um Estado-transnacional impôs desafios significativos ao alcance da capacidade contributiva e aos elementos de conexão usados até então. Com mercados liberalizados e com recursos tecnológicos de ponta, o capital ganhou mobilidade expressiva. Passou a ser muito fácil alocar

rendimentos – em especial os rendimentos passivos - em outras jurisdições fiscais que se

apresentavam de forma mais vantajosa, principalmente do ponto de vista tributário.

Tornou-se mais difícil, portanto, alcançar a capacidade contributiva na medida em que as operações econômicas transnacionais facilitavam o esvaziamento das bases imponíveis em nível local. O desenvolvimento de novas tecnologias apenas acentuou este efeito perverso; afinal, com novos meios de pagamentos e de transferência de capitais através de sistemas eletrônicos, o capital ganha mais mobilidade e o seu controle se torna ainda mais difícil pelas

autoridades monetárias e fiscais. Este fenômeno pode ser denominado de “volatilização dos

elementos da hipótese de incidência tributária”28.

O mundo começou a se deparar com questões, tais como a concorrência fiscal danosa (ou lesiva) propiciada pela existência dos paraísos fiscais e de regimes fiscais privilegiados, que passaram a demandar soluções globais advindas da cooperação de diversos países. No

26 Cf. HELD, David. Democracy and global order: from the modern state to cosmopolitan governance. Stanford:

Stanford University Press, 1995, p. 80 e ss.

27 GRECO, Marco Aurélio. Globalização e tributação da renda mundial. Revista Fórum de Direito Tributário

(RFDT). Belo Horizonte: Fórum, ano 1, nº 2, 2003, p. 80.

28 Cf. ANDRADE, André Martins de. A tributação universal da renda empresarial: uma proposta de

(29)

mesmo sentido do cenário descrito até o presente momento, Maria Eduarda Azevedo aponta também, com precisão, para a transição do papel das políticas tributárias do passado para o presente:

No passado, a política tributária respondia a preocupações nacionais e tinha repercussões que só escassamente ultrapassavam o âmbito doméstico, acabando os aspectos internacionais, conquanto presentes, por não serem os mais relevantes. Todavia, na actualidade, não obstante a política fiscal dos Estados continuar a ser moldada por objetivos tradicionais, a crescente mobilidade de pessoas e capitais, que conduz à globalização da economia potenciada pelas novas tecnologias, faz com que a política fiscal de um país tenha repercussões inevitáveis nos demais parceiros. Deste modo, qualquer medida tomada por uma jurisdição fiscal no sentido de diminuir a tributação é susceptível de justificar que outra reaja, promovendo uma igual baixa de impostos a fim de não perder vantagens competitivas e assim sucessivamente.29

Este cenário impôs forte pressão sobre os elementos de conexão tradicionalmente

utilizados o que culminou na sua sofisticação e adequação a esta nova concepção de Estado –

o Estado-transnacional –, pois, somente dessa forma, é possível garantir eficácia à legislação

tributária local frente ao ambiente internacional. Assim, os elementos de conexão, reformulados em vista desta nova realidade, passaram a ser vistos como protetores da arrecadação tributária nacional.

Diante da necessidade de garantia de eficácia às leis tributárias nacionais, não é incomum a adoção de normas que, embora aplicadas em bases territoriais, irradiam os seus efeitos no ambiente global. Este é o pano de fundo no qual se insere toda a evolução histórica das normas de direito tributário internacional, em especial, do regime de transparência fiscal no mundo. Não é por acaso que, embora as suas raízes datem do início do século XX, o referido regime tributário tenha assumido especial importância a partir da segunda metade do século, em especial, nas duas últimas décadas. A seguir, serão descritas as suas origens no direito norte-americano.

29 AZEVEDO, Maria Eduarda. A concorrência fiscal prejudicial. Revista Fórum de Direito Tributário (RFDT),

(30)

1.3.O debate norte-americano: as origens históricas das CFC rules

Os EUA foi o país que concebeu originalmente o regime de transparência fiscal

internacional – ou CFC rules, conforme a doutrina norte-americana convencionou chamar –

através do qual os rendimentos auferidos em bases universais seriam submetidos à tributação no país de residência do investidor (empresa controladora) ainda que os referidos rendimentos não tivessem sido econômica ou juridicamente disponibilizados (disponibilização automática) pela pessoa jurídica residente no exterior (empresa controlada ou coligada).

Seguindo-se a lógica da tributação em bases universais (princípio da universalidade), o regime tributário que permite a tributação dos rendimentos auferidos no exterior apenas no momento em que jurídica ou economicamente disponibilizados pode ser denominado de regime de diferimento (tax defferal regime) da tributação devida sobre eles no país de residência da sociedade investidora. Por outro lado, o regime tributário que sujeita os

rendimentos à tributação independentemente de sua efetiva disponibilização – através da sua

disponibilização automática – pode ser denominado de regime antidiferimento (tax

antidefferal regime). Nestes casos, os elementos de conexão tradicionalmente utilizados são a residência ou a nacionalidade do contribuinte submetendo todos os rendimentos por ele auferidos à tributação nacional independentemente do local da sua fonte produtora (elemento de conexão subjetivo).

O regime de tributação em bases territoriais (princípio da territorialidade), em contraposição ao regime de tributação em bases universais, exclui do campo de incidência da norma tributária todo rendimento auferido fora de um determinado território, pois o elemento de conexão usado é a fonte de produção dos rendimentos e não a residência ou nacionalidade da sociedade investidora (elemento de conexão objetivo).

(31)

1.3.1. Primeiras tentativas e alterações legislativas pré 1962

No início do século XX, logo nos primeiros anos de vigência do Internal Revenue

Code (código do imposto de renda norte-americano), o investidor norte-americano que desejasse investir no exterior através da internacionalização dos seus fatores de produção dispunha, do ponto de vista societário, de duas estratégias (vigentes até os dias de hoje) que consistiam na constituição de: (i) filial ou sucursal desprovida de personalidade jurídica (foreign branch); ou (ii) subsidiárias com personalidade jurídica própria (foreign subsidiary). Até 1913, vigia no direito americano o princípio da territorialidade da tributação, segundo o qual os EUA não poderiam tributar rendas, rendimentos e ganhos de capital auferidos fora do seu território, ainda que através de uma subsidiária ou filial de uma empresa norte-americana.

Em 1913, o Governo norte-americano instituiu o regime de tributação em bases universais, permitindo, no entanto, o diferimento da tributação norte-americana na medida em que submetia os rendimentos auferidos por subsidiárias residentes no exterior à tributação apenas no momento em que os mesmos fossem repatriados (disponibilizados jurídica ou economicamente), ficando resguardado o direito de crédito relativo ao imposto pago no exterior para compensação com o imposto devido nos EUA.

O regime de tributação em bases universais com permissão para o diferimento do imposto norte-americano ensejou diversas estratégias de planejamento tributário nos EUA

cujo objetivo central era elidir30 o fisco norte-americano. Entre elas, estava a tradicional forma

de elisão fiscal internacional que ocorria através da criação de subsidiárias – verdadeiras

30 A elisão fiscal consiste, fundamentalmente, em subtrair o ato praticado ou o conjunto de atos praticados do

(32)

sociedades holdings31 – em paraísos fiscais com a subseqüente transferência de ações e valores mobiliários que, por sua vez, produziam rendimentos passivos que permaneciam ali

por prazo indeterminado, evitando-se a tributação norte-americana (foreign subsidiaries as

incoporated pocketbooks)32.

Como reação a esta modalidade de elisão fiscal internacional, o Congresso

norte-americano aprovou, em 1934, um regime jurídico especial aplicável às companhias holding

residentes no exterior denominado de Foreign Personal Holding Company regime o qual

determinava que houvesse a desconsideração da personalidade jurídica, para fins exclusivamente fiscais, das subsidiárias norte-americanas no exterior que se qualificassem

como foreign personal holding companies.

Apesar dos esforços para coibir a prática de elisão fiscal internacional, o regime não logrou êxito na coação da maior parte das práticas já que o seu campo de aplicação era relativamente restrito. O regime só se reputava aplicável com o preenchimento de dois requisitos: (i) o capital social da subsidiária residente no exterior deveria ser detido por até 5 pessoas norte-americanas; e (ii) até 60% dos rendimentos brutos da subsidiária deveriam corresponder a certas classes de rendimentos passivos.

Conforme aponta Keith Engel, o condicionamento de aplicação deste regime ao fato de a subsidiária ser controlada por até 5 pessoas norte-americanas limitava o campo de aplicação da norma, excluindo-a de quase todas as empresas com capital aberto nas bolsas de

valores norte-americanas ou que auferissem, preponderantemente, rendimentos ativos33.

Alberto Xavier sustenta que esta tentativa norte-americana caracterizou um movimento de combate unilateral à prática de acumulação de rendimentos em paraísos

fiscais34. Neste sentido, as medidas adotadas, já neste momento inicial, podiam ser

caracterizadas como:

As medidas adotadas traduzem-se essencialmente em, por ficção legal, “desconsiderar” a personalidade jurídica das sociedades cuja constituição ou funcionamento tenha sido ou seja inspirada predominantemente por razões de ordem fiscal, considerada transparente (pass-throught entity) em termos de permitir a

31 Trata-se de sociedades empresariais cujo objeto social é deter participação societária de outras sociedades

empresariais.

32 Cf. ENGEL, Keith. Tax Neutrality to the Left, International Competitiveness to the Right, Stuck in the Middle

with Subpart F. Texas Law Review, Texas, v. 79, 2001, p. 1.532. 33 Ibid., 2001, p.1.534.

(33)

tributação dos respectivos sócios, como se tivessem auferido diretamente os lucros, sem aguardar pelo momento da distribuição dos lucros entretanto acumulados.35

O mecanismo descrito acima promovia a transparência fiscal das subsidiárias

norte-americanas residentes no exterior de modo a permitir a tributação dos rendimentos nelas acumulados independentemente da sua efetiva disponibilização. Este foi o primeiro regime antidiferimento criado no mundo. Embora o seu campo de aplicação tivesse suas limitações, o mecanismo foi posteriormente aperfeiçoado de modo a ampliar, sensivelmente, o seu campo de incidência. Este passo fundamental foi dado, posteriormente, em 1962.

1.3.2. A alteração legislativa de 1962 (Subpart F)

O contexto histórico que antecedeu à introdução do regime de transparência fiscal internacional nos EUA, vigente até os dias de hoje com algumas alterações que serão tratadas mais adiante, era um contexto de grande déficit fiscal no qual o ritmo de crescimento da economia norte-americana havia diminuído sensivelmente. Muitos estudiosos e funcionários da administração fiscal norte-americana acreditavam que os investimentos em subsidiárias no

exterior – especialmente nos casos em que o regime de antidiferimento introduzido em 1934

não era aplicável – contribuía para o déficit fiscal constatado e que a sua tributação poderia

gerar receitas suficientes para equilibrar novamente as contas públicas36.

Diante deste contexto, a Administração Kennedy propôs, em 1961, a larga eliminação do regime anterior que permitia o diferimento de parte dos rendimentos auferidos no exterior. Sob a égide do novo regime proposto, a regra geral passaria a ser o antidiferimento para a maior parte dos investimentos feitos pelas companhias americanas no exterior, o que se traduziria pela aplicação, quase que irrestrita, do regime de transparência fiscal internacional. Este regime foi visto como uma alternativa normativa que favoreceria o maior ganho possível de arrecadação ao fisco norte-americano.

Visto sob outra perspectiva, o que a Administração Kennedy pretendia era a promoção da neutralidade na exportação de capitais, muito embora ela não estivesse disposta a restituir a

35 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 285.

36 Cf. ENGEL, Keith. Tax Neutrality to the Left, International Competitiveness to the Right, Stuck in the Middle

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