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Mentoria e adesão à atividade física: o caso dos usuários da academia CHESF

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Academic year: 2017

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MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO EMPRESARIAL

MENTORIA E ADESÃO À ATIVIDADE FÍSICA:

O CASO DOS USUÁRIOS DA ACADEMIA CHESF

PAULO ERLICH

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MENTORIA E ADESÃO À ATIVIDADE FÍSICA:

O CASO DOS USUÁRIOS DA ACADEMIA CHESF

Dissertação apresentada ao Centro de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração da Faculdade Boa Viagem, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Gestão Empresarial.

Orientadora: Profª. Sônia Maria Rodrigues Calado Dias, Ph.D.

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MENTORIA E ADESÃO À ATIVIDADE FÍSICA:

O CASO DOS USUÁRIOS DA ACADEMIA CHESF

PAULO ERLICH

Dissertação submetida ao corpo docente do Mestrado Profissional em Gestão Empresarial (MPGE) do Centro de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração

(CPPA) da Faculdade Boa Viagem e aprovada em 01 de fevereiro de 2010.

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Aos mentores da minha formação moral e intelectual: meu pai, Jacob Erlich (in memoriam);

minha mãe, Elza Rotman Erlich; meu avô, Abram José Rotman (in memoriam).

À minha companheira, Suely, que revigora essa formação.

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A Sônia Calado Dias, pelas luzes da mentoria e novas visões sobre o ser humano que definitivamente marcaram minha vida;

Aos demais professores do Mestrado da FBV, que me proporcionaram grandes momentos de crescimento pelo desafio ao conhecimento;

A Ricardo De Marchi, referência pioneira, no país, em promoção da saúde corporativa, por me ter iniciado nessa área e pela oportunidade de entender, na prática, como a mentoria pode levar à amizade;

A Heloísa Nóbrega, que, como poucos, valoriza, conhece e pratica a promoção da saúde corporativa e desde cedo incentivou a realização deste trabalho no ambiente da Chesf;

A Benoni Guimarães, gestor da Academia Chesf, sem cujos esforços e entusiasmo a pesquisa não se viabilizaria;

A Horácio Frydman, pela contribuição para o levantamento bibliográfico, sem a qual não seria atingido o nível de aprofundamento que eu pretendia;

A todos os que foram por mim entrevistados, usuários e profissionais da Academia Chesf, pela disponibilidade e pela riqueza de dados que proporcionaram ao estudo;

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Esta dissertação se baseia em um estudo de caso que procurou verificar a presença de experiências de mentoria nos relacionamentos que influenciam indivíduos a aderir à atividade física. A literatura que traz associações entre mentoria e atividade física é escassa e, em relação à essência dos relacionamentos que estão em ação, é praticamente ausente. Dessa forma não se consegue distinguir se o que está sendo considerado como uma relação de desenvolvimento para ajudar o indivíduo a aderir à atividade física é realmente mentoria ou suporte social, que é conceitual e operacionalmente semelhante à mentoria. Através de procedimento qualitativo e exploratório, valendo-se de entrevistas em profundidade e análise de conteúdo, foram abordados usuários de uma academia de ginástica sediada em uma grande empresa. A análise de conteúdo revelou as fontes de suporte para mudança do hábito e gerou uma categorização de funções de suporte social no contexto da adesão à atividade física. A comparação dessa tipologia com a que é tradicionalmente adotada nos estudos de mentoria – gerada a partir do ambiente organizacional (KRAM, 1980, 1988) – revelou que, no novo contexto, algumas funções tradicionais se modificam, outras desaparecem e novas funções emergem. Mas o nível de correspondência entre as tipologias é muito relevante. Através do aprofundamento do estudo das funções também se alcançou uma distinção entre relações de mentoria e relações de suporte social, bem como se chegou a um conceito de mentor. Os profissionais de educação física constituem a categoria que se apresentou no estudo com o maior número mentores. Os resultados do estudo contribuem para o estudo teórico da mentoria e para o campo de mudanças de comportamento em saúde, especificamente em relação à atividade física. Estudos futuros sobre como a mentoria influencia indivíduos a se tornarem habitualmente ativos poderão revelar ainda mais as potencialidades desse recurso relacional e torná-lo reconhecidamente estratégico em ações de promoção de saúde e para o negócio das academias de ginástica.

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This thesis is based on a case study exploring the influence of mentoring experiences on people’s propensity to engage in physical activity. The literature on the association between mentoring and physical activity is scant, and practically non-existent so far as the nature of mentoring relationships. It is thus not possible to distinguish whether what is being considered as a development relationship helping individuals to engage in physical activity is truly mentorship or social support, which is conceptually and operationally similar to mentorship. Using qualitative and exploratory research and drawing on in-depth interviews and content analysis, we approached the users of a gym in a large company. Content analysis revealed the sources of support for physical activity behavior change and generated a categorization of the functions of social support regarding engagement in physical activity. Comparison of this typology with that traditionally adopted in studies of mentorship – in the context of organizations (KRAM, 1980, 1988) – revealed that, in the new context, some of the traditional functions are modified, some disappear and new ones emerge. Nevertheless, the degree of correspondence between these typologies is significant. More in-depth examination of these functions revealed a distinction between mentoring relationships and social support relationships and allowed a concept of the mentor to be drawn up. Physical education professionals were the category in this study that had the largest number of mentors. These results represent a contribution to the theoretical study of mentoring and to the field of health behavior change, specifically with regard to physical activity. Future studies of how mentorship influences individuals by making them habitually more physically active may reveal more about the potential of this relational resource and lead to its recognition as a strategic resource in health promotion interventions and for the fitness center industry.

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Quadro 1 – Tipologias de suporte social ... 24

Quadro 2: Estágios de mudança de comportamento em saúde ... 30

Quadro 3: Tipologia da mentoria ... 50

Quadro 4: Funções de mentoria segundo Kram ... 54

Quadro 5: Diferenças entre funções instrumentais e funções psicossociais segundo Kram ... 61

Quadro 6: Equivalência entre suporte social e mentoria segundo Giblin ... 66

Quadro 7: Integração entre mentoria e suporte social segundo O’Neill ... 67

Quando 8: Características da amostra ... 77

Quadro 9: Fontes e tipos de suporte na pré-adesão ... 94

Quadro 10: Fontes e tipos de suporte na adesão ... 108

Quadro 11: Correspondência entre os tipos de suporte social verificados na pesquisa e a classificação de suporte social encontrada na literatura ... 112

Quadro 12: Funções de suporte social no contexto da adesão à atividade física ... 123

Quadro 13: Correspondências entre a tipologia de funções de mentoria de Kram e as funções de suporte social encontradas no contexto da adesão à atividade física ... 125

Quadro 14: Tipologia das relações de suporte social ... 136

Quadro 15: Fontes de suporte mais significativas para a adesão dos entrevistados à atividade física ... 139

Quadro 16: Mentores autênticos identificados no estudo ... 140

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1 INTRODUÇÃO ... 13

1.1 Contexualização ... 13

1.2 Pergunta de pesquisa ... 17

1.3 Objetivo geral ... 17

1.4 Objetivos específicos ... 17

1.5 Justificativas ... 17

1.5.1 Justificativas teóricas ... 17

1.5.2 Justificativas práticas ... 19

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 21

2.1 Atividade física e suporte social ... 21

2.1.1 Influências sobre a prática de atividade física ... 21

2.1.2 Suporte social ... 23

2.1.3 Suporte social associado à atividade física ... 26

2.2 Mentoria ... 30

2.2.1 Síntese histórica ... 31

2.2.2 Conceito de mentoria ... 35

2.2.2.1 Visão tradicional sobre mentoria ... 35

2.2.2.2 Mentoria vista por novas lentes ... 36

2.2.3 Benefícios da mentoria ... 40

2.2.4 Tipos de mentoria ... 41

2.2.4.1 Quanto ao grau de formalização do relacionamento ... 42

2.2.4.2 Quanto à quantidade de mentores e mentorados envolvidos ... 43

2.2.4.3 Quanto aos níveis hierárquicos de mentor e mentorado ... 45

2.2.4.4 Quanto aos ambientes a que são vinculados mentor e mentorado ... 46

2.2.4.5 Quanto ao canal de comunicação ... 46

2.2.4.6 Quanto à evolução da experiência relacional ... 47

2.2.4.7 Quanto ao nível de satisfação do mentorado com o relacionamento ... 48

2.2.4.8 Quanto à distribuição dos benefícios transacionados no relacionamento ... 48

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2.2.6 Funções de mentoria ... 52

2.2.6.1 Primeiras referências teóricas sobre funções de mentoria ... 53

2.2.6.2 Funções de mentoria segundo Kram ... 54

2.2.6.2.1 Funções de carreira ... 55

2.2.6.2.2 Funções psicossociais ... 58

2.2.6.2.3 Outras considerações sobre funções de mentoria ... 61

2.2.6.3 Diferentes perspectivas sobre funções de mentoria ... 62

2.2.7 Mentoria e suporte social ... 65

2.2.7.1 Aproximação entre mentoria e suporte social ... 65

2.2.7.2 Distinção entre mentoria e suporte social ... 67

2.2.7.3 Provedores de suporte: mentores e não-mentores ... 70

3 METODOLOGIA ... 72

3.1 Delineamento da pesquisa ... 72

3.2 Seleção dos sujeitos ... 74

3.3 Coleta de dados ... 78

3.3.1 Processo ... 78

3.3.2 Instrumentos ... 79

3.4 Método de análise ... 81

3.5 Limites e limitações do estudo ... 82

3.5.1 Limites ... 82

3.5.2 Limitações ... 83

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO ... 85

4.1 Fontes e tipos de suporte no contexto da atividade física ... 85

4.1.1 Fontes e tipos de suporte antes da adesão ... 87

4.1.1. 1 Médicos ... 87

4.1.1.2 Colegas ... 88

4.1.1.3 Familiares ... 90

4.1.1.4 Pessoas externas à rede de relacionamentos do indivíduo ... 92

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4.1.2.2. Colegas ... 99

4.1.2.3 Médicos ... 102

4.1.2.4 Familiares ... 103

4.2.1.5 Pessoas externas à rede de relacionamentos do indivíduo ... 105

4.1.2.6 Empresa ... 105

4.1.3 Discussão ... 109

4.2 Relação entre tipos de suporte social e funções de mentoria no contexto da atividade física ... 114

4.2.1 Funções instrumentais ... 115

4.2.1.1 Conscientização ... 115

4.2.1.2 Coaching ... 115

4.2.1.3 Patrocínio ... 116

4.2.2 Funções psicossociais ... 117

4.2.2.1 Aceitação-e-confirmação ... 117

4.2.2.2 Encorajamento ... 120

4.2.3. Funções modelares ... 122

4.2.3.1 Modelagem positiva ... 122

4.2.3.1 Modelagem negativa ... 123

4.2.4 Discussão ... 124

4.3 Distinção entre relações de mentoria e relações de suporte social no contexto da atividade física ... 128

4.3.1 O que faz a diferença ... 129

4.3.2 Discussão ... 131

4.4. Mentores autênticos ... 138

4.4.1 Identificação dos mentores autênticos ... 138

4.4.2 Discussão ... 141

5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES ... 146

5.1 Conclusões ... 146

5.1.1 Fontes e tipos de suporte ... 146

5.1.2 Tipologia de funções nas relações de suporte social ... 149

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5.2.1 Sugestões de ação ... 155

5.2.2 Sugestões de pesquisa ... 157

REFERÊNCIAS ... 160

APÊNDICE A: QUESTIONÁRIO PARA SELEÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA (POR E-MAIL) ... 182

APÊNDICE B: QUESTIONÁRIO PARA SELEÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA (IMPRESSO) ... 184

APÊNDICE C: ROTEIRO DE ENTREVISTA ... 186

APÊNDICE D: FICHA DE ENTREVISTA ... 188

APÊNDICE E: GRÁFICO DOS ESTÁGIOS DA MUDANÇA – 1 ... 189

APÊNDICE F: GRÁFICO DOS ESTÁGIOS DA MUDANÇA – 2 ... 190

ANEXO A: Atividade física: recomendações para adultos ... 191

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1 INTRODUÇÃO

Inicia-se esta dissertação por uma abordagem que ressalta a importância da atividade física na composição do estilo de vida saudável e a necessidade de mudança comportamental em relação à atividade física. Introduz-se uma noção básica sobre mentoria e a possibilidade de relacioná-la com essa mudança. Em seguida se apresentam a pergunta de pesquisa, os objetivos e as justificativas deste trabalho.

1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO

Estilo de vida é um modo de viver baseado em padrões identificáveis de comportamento que são determinados pela interinfluência entre as características particulares do indivíduo, interações sociais e as condições de vida socioeconômicas e ambientais. (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1998). Segundo Nahas (2003, p. 19) estilo de vida é o “conjunto de ações habituais que refletem as atitudes, os valores e as oportunidades na vida das pessoas”.

Esse modo de viver, quando saudável, reduz o risco de estar seriamente doente, ajuda a usufruir a vida e contribui como modelo positivo para outras pessoas (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1999). Para De Marchi (2008), o estilo de vida é o mais importante fator determinante de uma vida mais saudável. Ele é representado pelas escolhas pessoais em relação aos fatores que podem incrementar ou prejudicar a saúde do indivíduo. Essas escolhas estão diretamente relacionadas com pelo menos 50% do estado pessoal de saúde e custos de assistência médica a ele associados (NOELDNER, 2006).

No ambiente organizacional, ressalta-se uma questão fundamental relacionada ao estilo de vida dos empregados: o conjunto de efeitos que as más escolhas individuais podem provocar sobre os resultados corporativos. Indivíduos com baixos níveis de saúde bem como os que adotam comportamentos de risco à saúde provocam, entre outras consequências, maiores desembolsos com assistência médica, absenteísmo mais frequente, presenteísmo1, aumento das limitações físicas e produtividade abaixo do possível (GOETZEL et al., 2008; SCHULTZ; EDINGTON, 2007; BOLES; PELLETIER; LYNCH, 2004).

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A atividade física é uma iniciativa presente entre as recomendações que configuram o chamado estilo de vida saudável. Adotada com regularidade, ela está associada a melhores níveis de saúde e redução de riscos de mortalidade (KAHN et al., 2002). Por outro lado, a vida sedentária é uma das principais causas de baixa qualidade de vida, incapacidade física e morte (MARCUS; FORSYTH, 2009).

São amplamente apresentados e discutidos na literatura os benefícios da prática de atividade física, não apenas associados à saúde física e à redução de riscos relacionados ao sedentarismo – predisponentes ao aparecimento e desenvolvimento de disfunções orgânicas. Focando-se em patologias específicas, há suporte científico para afirmar que a atividade física adequada, associada a uma dieta saudável, tem um papel importante na prevenção das cinco doenças crônicas não transmissíveis de maior incidência na população mundial: doença cardíaca, acidente vascular cerebral, câncer, doenças crônicas respiratórias e diabetes (WORLD HEALTH ORGANIZATION /WORLD ECONOMIC FORUM, 2008). Os exercícios físicos regulares, principalmente os aeróbicos, têm um papel marcante na prevenção e tratamento de doenças cardiovasculares degenerativas, tendo um efeito direto e independente e ajudando no controle de riscos como colesterol e pressão arterial, além de contribuir significativamente na redução de fatores de risco como a obesidade (NAHAS, 2003). Mas também há benefícios no campo psicoemocional, na medida em que níveis mais elevados de prática de atividade física habitual estão associados à conservação da autoestima e do autoconceito e melhoria do relacionamento interpessoal (GUEDES et al., 2001). A atividade física pode também relacionar-se com a melhora na qualidade de vida de dependentes químicos e depressivos (BARBANTI, 2006).

Em relação ao ambiente organizacional, benefícios da atividade física são reportados na literatura. Wilson, Griffin-Blake e DeJoy (2002) relatam estudos em que a atividade física pode ser relacionada, por um lado, negativamente com absenteísmo, rotatividade, custos médicos e produtividade; por outro lado, associa-se positivamente com desempenho no trabalho e motivação para o trabalho. Pesquisas de Proper e Van Mechelen (2007) indicam efeitos favoráveis da atividade física em relação ao absenteísmo por doença, duração do afastamento por doença, e, ainda, desempenho no trabalho.

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não alcançam esses benefícios à saúde (U.S. DEPARTMENT OF HEALTH AND HUMAN SERVICES, 2002). No Brasil, não se foge a esse perfil: pesquisas nacionais de larga abrangência, como as realizadas pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2005) e pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2009), atestam elevadas taxas de atividade física insuficiente e inatividade física na população.

Os estudiosos apontam justificativas diversas para essa incongruência. Para Ogata (2008, p. 5), ela ocorre talvez porque as pessoas “não tenham consciência dos malefícios desse comportamento, não saibam como mudar ou melhorar seus hábitos ou mesmo não consigam fazê-lo”. Aldana (2005) alega que algumas pessoas não mudam porque podem não ter tido a oportunidade de aprender como suas escolhas estão diretamente relacionadas com as causas de morte, doença e qualidade de vida insatisfatória. Mesmo quando as pessoas sabem por que deveriam mudar, a falta de motivação, de tempo, de suporte social e as pressões ambientais no sentido dos maus hábitos sobrepujam a habilidade pessoal de mudar.

Diante desse cenário, o grande desafio que se impõe é promover a mudança de comportamento dos indivíduos. Nesse sentido, a mentoria poderá exercer um papel importante. Tradicionalmente, a mentoria tem sido conceituada como “um relacionamento entre um adulto jovem e um mais velho e mais experiente que ajuda o mais novo a aprender a navegar no mundo adulto e no mundo do trabalho” (KRAM, 1988). Segundo esse escopo, a mentoria tem sido pesquisada principalmente em três campos: na educação de jovens, no ambiente acadêmico e nas organizações (EBY et al., 2008). Mas, para além das limitações do conceito e da aplicação tradicionais, a mentoria tem sido recentemente impulsionada para diferentes áreas de investigação. Kram e Ragins (2007) afirmam que uma visão mais abrangente sobre a mentoria também leva em conta um entendimento mais profundo sobre como ela afeta a transição para novas posições de desenvolvimento, crescimento pessoal e mudança. Além disso, a mentoria pode ser associada com uma gama de resultados positivos tanto psicológicos quanto fisiológicos relacionados com saúde física e mental e bem-estar (KRAM; RAGINS, 2007; BOYATZIS, 2007). Este último autor defende que nos processos de mudança de comportamento em adultos é essencial o suporte de mentores, sem os quais novos padrões de comportamento não ocorrem ou não são sustentáveis.

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Connor (1989) encontraram evidências de que a tentativa individual de mudar o comportamento em saúde, especialmente quanto à prática de exercícios e redução da ingestão de gorduras, pode ser positivamente influenciada por outros-significativos (familiares, amigos, colegas de trabalho) ao longo do processo de mudança. Ornelas, Perreira e Ayala (2007) encontraram uma relação positiva entre o suporte social dos pais e a conquista pelos filhos de padrões recomendados de atividade física.

Se, por um lado, referências de suporte social são amplamente reportadas, por outro lado são escassos os trabalhos que mencionam claramente a mentoria como recurso para a mudança comportamental no campo da atividade física. Entre elas, Dubois e Silverthorn (2005) reportam diversos resultados do impacto das relações de mentoria, quando incorporadas a outras intervenções, sobre o nível de atividade física de jovens. Um programa de mentoria de pares, relatado por Corbin (2006), buscou estimular pessoas com 50 anos ou mais a incorporar mais atividade física em suas vidas e resultou em significativo aumento do nível de atividade na grande maioria dos participantes. Os exemplos referidos pela literatura, porém, não esclarecem em que consiste a mentoria provida nesses casos. E, agravando a questão, como a literatura tem encontrado semelhanças entre suporte social e mentoria (GIBLIN, 2006; O’NEILL, 1997), não se consegue distinguir nesses estudos se o processo de ajuda à modificação do comportamento pode ser entendido como mentoria ou suporte social.

Isso posto, o presente estudo propõe verificar a presença de experiências de mentoria2 nos processos que estimulam os indivíduos a ser praticantes habituais de atividade física. Por essa perspectiva, indivíduos que tenham decidido adotar essa prática e os que nela se mantêm poderão ter passado – e/ou estar passando – por experiências de mentoria. Para tanto, foi desenvolvida pesquisa com um grupo de usuários da Academia Chesf, pertencente à Companhia Hidro Elétrica do São Francisco e localizada na sede da empresa, em Recife, Pernambuco. Os indivíduos participantes da pesquisa foram selecionados entre funcionários frequentadores da academia que decidiram, em algum momento da vida, praticar exercícios físicos dentro de um padrão de regularidade.

Com base no exposto, foi delineada a pergunta de pesquisa, que a seguir se apresenta, acompanhada pelo objetivo geral e objetivos específicos.

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1.2 PERGUNTA DE PESQUISA

De que modo experiências de mentoria estão presentes nos relacionamentos que influenciam os indivíduos a aderir à atividade física?

1.3 OBJETIVO GERAL

Verificar de que modo experiências de mentoria estão presentes nos relacionamentos que influenciam os indivíduos a aderir à atividade física.

1.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Objetivo específico 1: Identificar as fontes de suporte social que influenciaram os indivíduos a aderir à atividade física e os tipos de suporte providos por essas fontes.

Objetivo específico 2: Analisar de que modo os tipos de suporte social providos pelas fontes que influenciaram os indivíduos a aderir à atividade física correspondem à tipologia de funções de mentoria tradicionalmente adotada pela literatura.

Objetivo específico 3: Verificar de que modo se pode estabelecer distinção entre relações de mentoria e relações de suporte social enquanto experiências relacionais que influenciaram os indivíduos a aderir à atividade física.

Objetivo específico 4: Identificar, entre as fontes de suporte social que influenciaram os indivíduos a aderir à atividade física, aquelas que podem ser considerados como mentores.

1.5 JUSTIFICATIVAS

1.5.1 Justificativas teóricas

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principalmente em relação ao ambiente acadêmico brasileiro, no qual os estudos sobre o tema ainda estão em fase de evolução e o volume da produção literária ainda é pequeno. Faz-se necessário continuamente promover pesquisas que representem o fenômeno da mentoria no Brasil, em sua cultura específica. Chandler e Kram (2007) chamam atenção para a necessidade de, ao se discutirem as pesquisas, considerar os cenários nacionais em que são realizadas. Bozionelos (2006) acusa que há escassez de pesquisas de mentoria com amostras que não sejam relacionadas com a cultura anglo-saxã.

Uma questão teórica ainda não plenamente esclarecida pela literatura é a distinção entre mentoria e suporte social. Os construtos possuem fortes semelhanças (JACOBI, 1991; ALLEN; MCMANUS; RUSSELL, 1999; GIBLIN, 2006) e até já foi proposta uma integração entre eles (O’NEILL, 1997), porém há diferenças a considerar (GIBLIN, 2006; GOLDNER; MAYSELESS, 2008). Este estudo contribui para o clareamento desses limites e inclusive ajudar a construir algum consenso sobre o próprio conceito de mentoria, que ainda não alcança unanimidade entre os pesquisadores (CHANDLER; KRAM, 2007).

Uma contribuição também foi gerada para a pesquisa sobre os processos de mudança de comportamento em saúde. Mais especificamente, fica sugerida uma nova luz à pesquisa brasileira em processos que levam à adesão à atividade física, visto que a utilização da mentoria como suporte para esse fim é um aspecto sobre o qual não foram localizados trabalhos na literatura científica do país, ao longo dos estudos que embasaram este trabalho. No cenário internacional, a literatura diz pouco sobre o impacto da mentoria sobre a mudança comportamental (em geral), a sustentação dessas mudanças e os impactos de longo prazo sobre as aspirações da pessoa (BOYATZIS, 2007).

A pesquisa é, ainda, relevante para os estudos da promoção de saúde no ambiente de trabalho. Além de utilizar uma amostra composta de trabalhadores de uma empresa, verificou que a organização procura exercer uma influência marcante sobre o comportamento em saúde de seus funcionários, em sentido amplo, e, particularmente, sobre padrão de atividade física que praticam. Essa importância está alinhada com uma ideia proposta por Okie (2007): a empresa deve atuar como coach em relação à saúde dos trabalhadores. Coaching, como se

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1.5.2 Justificativas práticas

O foco prático desta pesquisa acompanha o ensinamento de Minayo (1996, p. 90): “nada pode ser intelectualmente um problema, se não tiver sido, em primeira instância, um problema na vida prática”. A autora defende que a escolha de um tema não surge de modo espontâneo, mas de interesses e circunstâncias socialmente condicionados e semeados na realidade. As justificativas a seguir se inserem nesse contexto.

Como as más escolhas comportamentais contribuem globalmente para uma proporção significativa de doenças crônicas, deveriam ser levadas em conta estratégias baseadas em evidências, como a atividade física regular, para ajustar esses comportamentos, nos mais diversos ambientes (QUINTILIANI; SATTELMAIR; SORENSEN, 2007). Este trabalho propôs verificar se a mentoria poderia ser entendida como um recurso presente nesse processo de ajuste de comportamento, sendo percebida como uma influência sobre o indivíduo.

A perspectiva prática deste trabalho é marcada pelo fato de o estudo ter abordado usuários de uma academia de ginástica vinculada a uma organização e ao seu programa de promoção de saúde. Segundo a Organização Mundial de Saúde, o local de trabalho é para muitas pessoas o contexto mais prático em que elas se podem tornar mais ativas, portanto pode ser o ambiente ideal para promover atividade física para adultos (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2006). Não obstante, um dos mais prementes desafios enfrentados pelos profissionais que estão à frente da gestão de programas de promoção de saúde no ambiente de trabalho é estimular os empregados a exercitar-se regularmente (CHENOWETH, 2007). Uma associação entre mentoria e adesão à atividade física poderá sinalizar para uma nova forma de promover a participação e manutenção dos empregados nos programas de exercícios.

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concomitante ênfase em bem-estar no ambiente de trabalho, os efeitos das relações de mentoria representam uma importante e promissora área de pesquisa. Assim sendo, outra perspectiva prática deste estudo está vinculada a benefícios que processos de mentoria possam gerar para as organizações. Se estudos futuros levantarem uma relação consistente entre o valor gerado em termos de saúde do empregado e a mentoria que lhes foi provida, a esta será conferido um valor estratégico, o que pode estimular a adoção de programas organizacionais de mentoria, com essa finalidade. Isso poderá ocorrer inclusive no âmbito da própria Chesf, com vistas ao incremento de resultados de seu programa de promoção de saúde e qualidade de vida.

Particularmente, no que se refere a academias de ginástica, um dos seus maiores problemas operacionais é o alto índice de desistência dos alunos. Corrêa e Ferreira (2009) se referem a casos de 30% a 50% por ano. A influência de relacionamentos de mentoria entre professores e alunos para promover uma maior aderência destes à prática de exercícios na academia é um fator que pode ser considerado como relevante para os resultados de negócios dessas organizações.

Enfim, numa perspectiva geral, com este trabalho se pretendeu contribuir, ainda que em um campo específico, para a redução da lacuna que Ragins e Kram (2007) apontam existir entre pesquisa e prática na área da mentoria.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A fundamentação teórica deste trabalho aborda as influências pessoais sobre a prática de atividade física, destacando-se o conceito de suporte social e, mais especificamente, o de mentoria.

2.1 ATIVIDADE FÍSICA

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E SUPORTE SOCIAL

2.1.1 Influências sobre a prática de atividade física

Conforme já foi destacado na contextualização (1.1), a mudança do comportamento é o grande desafio que se impõe diante dos baixos níveis de atividade física que predominam na população em geral e que, no contexto organizacional, podem estar associados a problemas de saúde dos empregados. É preciso, portanto, atentar aos fatores que influenciam as iniciativas dos indivíduos em relação à prática de atividade física e localizar entre esses fatores os que são objeto deste trabalho.

De um modo geral, as pesquisas apontam a influência de três contextos que são determinantes do comportamento que se pode chamar de “fisicamente ativo” (COMMITTEE ON PHYSICAL ACTIVITY, HEALTH, TRANSPORTATION, AND LAND USE, 2005), conforme ilustrado pela figura 1. Nesses contextos atuam diversos fatores de influência:

a) fatores do contexto social, como normas sociais, redes de suporte social, políticas públicas, fatores econômicos;

b) fatores do ambiente físico, como disponibilidade de infraestrutura para atividades, segurança pessoal, grau de facilidade de deslocamento para o local das atividades;

c) fatores do indivíduo, como características demográficas (como gênero, idade, etnia); características da família e do estilo de vida pessoal; cultura; características socioeconômicas(como níveis de educação e renda); atitudes, preferências, motivações e

3 Na prática diária dos profissionais de saúde, os termos atividade física e exercício são usados de modo intercambiável, não obstante haver distinções entre eles (MATSUDO et al., 2005). Também aqui será adotada essa liberdade. Atividade física é qualquer movimento que seja resultado de contração muscular voluntária que leve a um gasto energético acima do repouso. Por exemplo, andar, dançar, correr, pedalar, subir escadas, jardinar ou nadar. Exercício físico é uma subcategoria de atividade física, uma atividade mais organizada, que inclui duração, intensidade, freqüência e ritmo. Por exemplo,

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habilidades relacionadas com o comportamento; a própria capacidade física do indivíduo ou estado de saúde; demanda de tempo. Também aqui se pode considerar influências como sentimento de prazer e expectativas de resultados (e.g., melhoria da aparência, redução de peso) (BURTON et al., 2009);

Ambiente social Ambiente físico

Indivíduo

Atividade física

Saúde

Figura 1: Contextos determinantes do comportamento em atividade física.

Fonte: Adaptado de Committee on Physical Activity, Health, Transportation, and Land Use (2005).

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2.1.2. Suporte social

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Existe uma gama considerável de trabalhos científicos em que são criteriosamente apresentadas associações positivas entre o suporte social provido por outros-significativos e a prática de atividade física (referências em seção à frente) e até mesmo escalas que avaliam níveis de suporte social (e.g., PROCHASKA; RODGERS; SALLIS, 2002; SALLIS et al., 1987).

A literatura sobre suporte social é vasta. Apesar disso, o conceito de suporte social permanece confuso (SARASON; SARASON, 2009; WILLIAMS; BARCLAY; SCHMIED, 2004). Trata-se de um conceito multifacetado, com teorias que ora divergem ora se sobrepõem, o que dificulta uma formulação clara e definitiva (FINGFELD-CONNETT, 2005; HUPCEY, 1998; RASH, 2007; SARASON et al. 1987; WILLIAMS; BARCLAY; SCHMIED, 2004). Alguns exemplos de definições deixam patente essa dificuldade. Para Dunst e Trivette (1990), citados por Ribeiro (1999), suporte social refere-se aos recursos à disposição dos indivíduos e unidades sociais (tais como a família) em resposta aos pedidos de ajuda e assistência. Valla (1999) refere como suporte social qualquer informação, falada ou não, e/ou auxílio material oferecidos por grupos e/ou pessoas que se conhecem e que resultam em efeitos emocionais e/ou comportamentos positivos. Sarason et al. (1983) definem como a existência ou disponibilidade de pessoas em quem se pode confiar, pessoas que nos mostram que se preocupam conosco, valorizam-nos e gostam de nós. Já para Fingfeld-Connett (2005), suporte social corresponde a um processo interpessoal de apoio centrado na troca recíproca de informação, próprio de cada contexto.

Dada tamanha profusão de propostas, optou-se neste trabalho por seguir a recomendação de Pedro, Rocha e Nascimento (2008): diante da dificuldade conceitual sobre o tema suporte social, o pesquisador deve selecionar na literatura os aspectos relevantes para os objetivos a serem atingidos pela pesquisa. Nesse sentido, o pesquisador inicialmente tomou por base que suporte social se associa à ideia de um processo interpessoal de apoio (FINGFLED-CONNETT, 2005). Em seguida, valeu-se de Hupcey (1998), que relaciona cinco categorias em que as definições de suporte social se inserem – tipo (ou função) de suporte provido, percepções de suporte pelo beneficiário, intenções ou comportamentos do provedor de suporte, reciprocidade do suporte e a existência de rede social – e selecionou para o estudo

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a categoria tipo (ou função) de suporte provido. A escolha se deve ao fato de que o estudo dos tipos oferece um rumo razoavelmente claro para uma aproximação entre os construtos em análise, mentoria e suporte social, conforme se observará mais adiante, na abordagem sobre mentoria (2.2.7.1). Dessa forma ficou estabelecido para este trabalho que o relacionamento de suporte social é o processo de interação social em que algum tipo de suporte é provido. Esse conceito encontra apoio em Wills e Shinar (2000), para quem, de acordo com os vários tipos de problemas a serem atendidos, diferentes funções de suporte social são desempenhadas através das relações sociais. Assim, a relação de suporte social se realiza através de iniciativas de provimento de recursos materiais, cognitivos ou emocionais àquele que os necessita ou solicita.

São apresentadas e comentadas a seguir três tipologias de suporte que seguem esse critério. O quadro 1 apresenta em cada linha equivalências entre os tipos (ou funções). Foi verificado algum nível de equivalência entre os tipos ou funções que se encontram em uma mesma linha do quadro. Após o quadro, cada tipologia será abordada.

Autores House (1981) Wills e Shinar (2000) Cutrona e Russell (1990)

Suporte emocional Suporte emocional Suporte emocional Suporte de avaliação Suporte de validação Suporte de estima Suporte informacional Suporte informacional Suporte informacional Suporte instrumental Suporte instrumental Ajuda tangível Tipos/funções de

suporte social

– Suporte de companhia Integração social ou suporte de rede Quadro 1: Tipologias de suporte social.

Fonte: elaborado pelo autor, com base em Allen, McManus e Russell (1999); Wills e Shinar (2000); Giblin (2006).

A tipologia de suporte social proposta por House (1981) é referida por Allen, McManus e Russell (1999), McManus e Russel (1997) e Jacobi (1991). Segundo House, quatro tipos de suporte podem ser oferecidos: a) suporte emocional (e.g., estima, confiança, cuidado, escuta); b) suporte de avaliação (e.g., afirmação, feedback, comparação social); c)

suporte informacional (aconselhamento, sugestão, instrução, informação); d) suporte instrumental (e.g., bens e serviços, dinheiro, trabalho, tempo, mudanças no ambiente).

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baseia-se no conceito de que os relacionamentos sociais podem proporcionar informação sobre os comportamentos que são apropriados ou normatizados; c) suporte informacional – provimento de conhecimento para a solução de problemas, como informações a respeito de recursos da comunidade ou aconselhamento sobre alternativas de ação; d) suporte instrumental – ajuda prática, como assistência em transporte, em obrigações domésticas, como também contribuição material, tangível (e.g., dinheiro, ferramentas); e) suporte de companhia – disponibilidade para participar em atividades sociais e de lazer como viagens e festas, atividades culturais (e.g., ir a cinemas e museus) ou recreacionais, como eventos esportivos e caminhadas.

A tipologia de Cutrona e Russell (1990), colhida em Giblin (2006), descreve cinco dimensões: a) suporte emocional – ocorre quando o receptor do suporte recorre a outros durante episódios de estresse e recebe a garantia de que alguém se preocupa com ele; b) suporte de estima – aumenta o senso de competência da pessoa, através de, por exemplo, provimento de feedback sobre a sua capacidade de enfrentamento da situação; c) suporte informacional – oferece recomendação e orientação; d) ajuda tangível – refere-se a uma assistência instrumental concreta (como apoio financeiro); e) integração social – o provedor de suporte aumenta no outro o sentimento de pertença a um que participa em atividades compartilhadas. Cotejando-se esse esquema com o de Wills e Shinar, verifica-se que são muito semelhantes. Suporte de estima e ajuda tangível correspondem ao que esses autores rotulam, respectivamente, como suporte de validação e suporte instrumental. Já em relação a integração social, que se assemelha a suporte de companhia, Cutrona e Russel vão um pouco além, afirmando que o provedor desse tipo de suporte atua para melhorar no outro o sentimento de pertencer a um grupo com o qual compartilha atividades.

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comportamento em saúde. Por exemplo, Sorensen, Stoddard e Macario (1998) afirmam que pessoas que são isoladas têm maior probabilidade de incorrer em comportamentos de risco à saúde do que aquelas que estão envolvidas em uma rede de relacionamentos sociais. Esse processo é explicado por Wills e Shinar (2000): por modificar a avaliação cognitiva sobre os eventos, elevar a autoestima e melhorar as habilidades na resolução de problemas, o suporte social facilita a mudança de comportamento em saúde.

Saindo de uma visão mais generalizada sobre o papel do suporte social em relação à saúde, a próxima seção enfoca especificamente como o suporte social se associa à prática de atividade física.

2.1.3 Suporte social associado à atividade física

Os estudos que descrevem fatores associados à atividade física em crianças, adolescentes e adultos são muitos e essa literatura tem sido revisada por diversas vezes, conforme apontam Bauman et al. (2002). Em revisão de literatura, Anshel e Kang (2008) relatam um trabalho de Dunn, Andersen e Jakicic (1998) em que 50% dos novos praticantes de exercício desistiram dos programas em um prazo de 3 a 6 meses. A falta de suporte de outros-significativos é uma das causas alegadas para a desistência. De modo semelhante, Merrill et al. (2008) apontam que o nível de suporte social está entre os principais fatores determinantes da quantidade de recaídas entre os participantes de intervenções de atividade física.

Uma revisão publicada por Sallis e Owen (1999), citados por Bauman et al. (2002), em que diversas variáveis associadas com a atividade física foram levantadas, teorias usadas na pesquisa da atividade física foram relacionadas com as variáveis e foi atribuído um grau de associação – na literatura pesquisada – entre as variáveis e o comportamento em atividade física. Dentre as variáveis agrupadas sob o rótulo “fatores sociais e culturais”, o suporte social de amigos e pares, o suporte social do cônjuge e da família e a influência do médico foram, segundo o estudo, as mais repetidamente documentadas como positivamente associadas à atividade física.

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uma gama de fontes de suporte positivamente associadas à adesão à atividade física. A relação inclui familiares, cônjuge (referido separadamente de familiares), amigos, colegas (inclusive colegas de trabalho), vizinhos, conhecidos, empregadores, médicos e até mesmo cães de estimação. O suporte de amigos e familiares foi apontado por Sallis, Hovell e Hofstetter (1992) como fator associado à manutenção de mulheres por dois anos em atividade física rigorosa. Estudando a influência dos relacionamentos percebidos com os pais e colegas de jogo sobre a manutenção de jovens (10 a 14 anos) na prática de futebol, Ullrich-French e Smith (2009) verificaram a importância de relacionamentos sociais próximos para o comportamento de permanência na atividade.

Um papel específico que cabe ser analisado no contexto da prática de atividade física é o exercido pelo profissional que comanda a atividade, seja ele chamado instrutor, treinador ou professor, trabalhando para grupos ou dando assistência individualizada (caso dos chamados

personal trainers, treinadores pessoais). Em relação ao profissional que atende a grupos,

Loughead, Colman e Carro (2001) concluíram que comportamentos positivos desse indivíduo, como disponibilidade, atitude motivadora e demonstração de entusiasmo servem para produzir um senso de unidade em torno da tarefa que o grupo tem de desempenhar (a atividade que foi prescrita) e isso, por sua vez, contribui para aumentar o esforço e o comparecimento dos participantes. O atendimento individualizado oferecido pelo treinador pessoal é, segundo McClaran (2003), um método eficaz de mudar atitudes e aumentar a quantidade de atividade física de seus clientes. Sweet (2008) verificou que uma relação mais duradoura entre esse profissional e o cliente permite perceber fases, ao longo das quais, à medida que os clientes começam a perceber os resultados, o relacionamento se torna mais amistoso, como entre colegas. Com o passar do tempo e para estimular o cliente a acreditar no valor inerente da atividade física para toda a vida, o treinador se torna um coach de vida do

cliente.

O papel do médico pode ser fundamental no processo de adesão. Ribeiro, Martins e Carvalho (2007) ressaltam a importância do aconselhamento médico para mudar o comportamento do paciente e fazê-lo ser mais habitualmente ativo. Citando Sallis e Owen (1999), Hurtz e King (2004) revelam que há estudos demonstrando que até mesmo um breve aconselhamento de um médico pode ter uma influência positiva sobre o volume praticado de atividade física.

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quantidade de laços com amigos e membros da família e frequência das interações com essas pessoas foi significativamente associada com altos níveis de atividade física. Burton (2006) aponta que o contato com pessoas fisicamente ativas pode gerar motivação e encorajamento para as pessoas se envolverem com a prática.

A influência de um grupo também pode ter um papel importante na adesão. Annesi (1999) afirma que um importante achado das pesquisas é que a atração de um indivíduo para um grupo e a prática de exercício em grupo se associam com o aumento de adesão a um programa de exercícios. Jago et al. (2009) também concluíram que grupos de amigos influenciam tanto a iniciação quanto a manutenção de atividade física entre jovens. Um estudo qualitativo de Tahara, Schwartz e Silva (2003) encontrou, entre os principais fatores da aderência e manutenção em programas de exercícios físicos regulares realizados em academias, a influência de um grupo com expectativa homogênea: as pessoas sentem mais prazer e atração pela atividade proposta quando membros do grupo se identificam e são conhecidos entre si. O suporte de companhia também parece estar presente no longo prazo, na medida em que Loughead, Colman e Carro (2001) afirmam haver considerável evidência para concluir que a adesão tem melhor sustentação se a atividade é realizada em companhia de outros e que, quanto mais fortes os laços sociais entre os companheiros de exercício, major a possibilidade de manutenção.

Importa também mencionar o papel de exemplo ou modelo que pode ser exercido por umas pessoas sobre as outras. Burton (2006) salienta que alguns provedores de suporte, como familiares, amigos, cônjuge, vizinhos e empregadores, podem exercer o papel de modelo para a atividade física. Também Humbert et al. (2006) identificaram que adultos (pais, tutores, estudantes universitários, professores e treinadores) que servem de modelo exercem influência positiva sobre o nível de atividade física de jovens.

Uma peculiaridade sobre a percepção de suporte de outros-significativos foi encontrada por Kaewthummanukul et al. (2006), que analisaram um grupo de mulheres enfermeiras. Além de uma significativa influência da percepção do suporte proporcionado por membros da família, amigos, conhecidos ou colegas de trabalho, os pesquisadores descobriram existir percepção de suporte recebido dos pais não obstante as participantes viverem em um hospital, longe de sua família. Essa ideia de que o suporte para mudança de comportamento em saúde pode ocorrer a distancia já está aplicada na prática, em formato profissional, nos Estados Unidos, através de programas de coaching que utilizam

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O benefício (reverso) do suporte para o provedor foi verificado em estudo de Fechio e Malerbi (2004), que propuseram verificar se um programa de atividade física aumentaria a freqüência de exercitar-se em adultos sedentários portadores de diabetes. Uma parte dos indivíduos da amostra recebeu o apoio de familiares, que compareciam a reuniões em que se davam esclarecimentos, informações e se solicitava o apoio familiar. Esse grupo obteve o maior nível de adesão ao programa de atividade física, e dois dos familiares acabaram por aderir à atividade física.

Com as evidências aqui apresentadas, verifica-se uma diversidade de pessoas que podem exercer influência sobre a iniciação na atividade física e à permanência na atividade. Torna-se, porém, necessário, neste ponto, um esclarecimento conceitual. A literatura usa com muita liberdade os termos “adesão” e “manutenção”, na grande maioria das vezes não os definindo. Marcus et al. (2008) ressaltam que, no campo da mudança de comportamento em atividade física, é difícil definir “adesão”, pois o termo pode ser examinado de modo específico ou muito geral e pode ser aplicado a todas as fases de um contínuo, desde a iniciação do comportamento, passando pelo início da prática, até a fase de manutenção, além da retomada após uma fase de recaída. Ou seja, há muita inconsistência na literatura sobre como a adesão à atividade física é definida. Não foi outro o problema que o pesquisador encontrou, tendo várias vezes encontrado relatos em que a referência a “adesão” não permitia perceber claramente se o texto se referia ao início de um processo de mudança ou à confirmação da mudança ao longo do tempo. Além disso, independentemente do que se entenda como a adesão, há que considerar também fatores anteriores ao início da entrada em atividade que afetam esse comportamento.

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Estágios de mudança Comportamento

1. Pré-contemplação O indivíduo não pretende mudar seu comportamento em saúde no futuro próximo, usualmente mensurado como os próximos 6 meses.

2. Contemplação O indivíduo passa a ter algum nível de conscientização sobre a mudança e tem intenção de mudar nos próximos 6 meses.

3. Preparação O indivíduo pretende começar a mudar no futuro imediato (comumente mensurado como os próximos 30 dias) e planeja a mudança. 4. Ação A prática do novo hábito passa a ocorrer.

5. Manutenção

O novo hábito já é praticado há mais de 6 meses. Nesse estágio, o indivíduo se esforça para prevenir recaídas, mas já não recorre a processos de mudança tão frequentemente como fazem as pessoas no estágio de ação.

Quadro 2: Estágios de mudança de comportamento em saúde. Fonte: Adaptado de Prochaska, DiClemente e Norcross (1992).

Com a contribuição do esquema de estágios de mudança, ficou estabelecido para o presente estudo que se denomina de “adesão” o conjunto dos estágios de ação e manutenção. Os estágios anteriores são considerados como componentes de uma fase de “pré-adesão”.

Isso posto, enuncia-se a primeira questão norteadora.

Questão norteadora 1:

Quais foram as fontes de suporte social que influenciaram os indivíduos a aderir à atividade física e quais os tipos de suporte providos por essas fontes?

Apresenta-se, a seguir, a abordagem teórica sobre o tema mentoria.

2.2 MENTORIA

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2.2.1 Síntese histórica

Aqui se apresentará uma perspectiva histórica sobre a mentoria. Segue-se uma linha que parte das referências mais remotas ao tema e vai até o início da sistematização dos estudos de mentoria.

Segundo Santos (2007), a mentoria sempre esteve presente na história da humanidade sob formas variadas, manifestada através de conselheiros, educadores, orientadores e modeladores de conduta. “Desde a Antiguidade, reis e nobres contratavam mentores para cuidar do aprendizado e da educação de seus protegidos” (SANTOS, 2007, p. 271). Constitui quase uma referência básica da literatura remontar as origens da mentoria à Antiguidade Clássica. Na antiga Grécia, era costume dos homens jovens relacionarem-se com homens mais velhos, na esperança de aprender e imitar os valores destes, geralmente um amigo ou parente do pai do jovem. Os gregos presumiam que, através desses relacionamentos, as pessoas adquiriam habilidades, cultura e valores diretamente de outros humanos que eles admiram (MURRAY, 2001). Assim, o mentor era considerado como um pai adotivo, uma pessoa que era responsável pelo desenvolvimento físico, social, intelectual e espiritual de jovens (CARR, 1999).

É com esse pano de fundo que a literatura costuma vincular as origens da mentoria à “Odisséia”, de Homero (séc.VIII a.C.?). Colley (2001) oferece um resumo da história. Odisseu, rei de Ítaca, saiu para lutar na Guerra de Tróia, deixando sua esposa e seu filho criança, Telêmaco. Ele indicou o velho amigo Mentor como guardião de seu filho e da família real, sem dúvida antecipando uma rápida vitória e retorno. A guerra, contudo, durou dez anos e por mais dez anos Odisseu ficou vagando, como castigo por haver atraído a ira dos deuses. Nesse tempo, jovens nobres ocuparam seu palácio, roubaram bens e, na intenção de usurpar o poder, quiseram forçar sua esposa, Penélope, a casar novamente, argumentando que Odisseu deveria estar morto. Eventualmente a deusa Atena intercedia para garantir o retorno seguro de Odisseu. Porém parte de seu papel era preparar Telêmaco, para se reencontrar com seu pai. Ela apareceu para ele sob diversos disfarces, incluindo aquele em que assumia a forma de Mentor. Depois que Odisseu reencontrou o filho, rei e príncipe repeliram os usurpadores e retomaram o controle de Ítaca.

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relatos focam na figura do próprio Mentor. Ele é apresentado como uma pessoa mais velha, sábia e gentil, um pai substituto, conselheiro confiável, educador e guia; de outra parte, alguns autores identificam que não é Mentor, mas a deusa Atena (Minerva, para os romanos), disfarçada de Mentor, que atua em apoio a Telêmaco. Com efeito, na narrativa da Odisséia se encontram passagens que confirmam essa colocação: “...Minerva aproxima-se dele [Telêmaco] com a imagem e a voz de Mentor” (p. 42), “Então ela tomou a forma e a voz de Mentor e chamou Telêmaco...” (HOMER, 1921, p. 48).

Bem mais que alegar ter sido o papel de Mentor desempenhado por outro personagem, Roberts (1999) afirma que não há razão para conferir a Mentor as qualidades positivas que em geral a literatura da mentoria lhe atribui. O autor faz um levantamento de várias passagens da Odisséia sobre cujo conteúdo se baseia para evidenciar que Mentor fracassou na missão que Odisseu lhe delegara. Não proveu a Telêmaco os papéis de pai substituto, de conselheiro, de guia e, de uma forma geral, não protegeu a família de Odisseu. Turner (2004) concorda com essa alegação, apontando que Mentor falhou amplamente em suas obrigações, não cuidando da família de Odisseu nem, particularmente, de Telêmaco. Colley (2001, p. 184) se alinha a esses autores, enfatizando que Mentor “presidiu o caos” e que Homero o retrata como um velho bobo e objeto de piada: ele de nenhum modo significativo foi um mentor de Telêmaco.

Sendo assim, de onde teria surgido o sentido de mentor – como sábio, conselheiro, educador e guia – conceitualmente mais próximo da literatura da mentoria? Para Roberts (1999), a origem do uso moderno de “mentor” está ligada à obra “Les Aventures de Télémaque”, do francês François de Salignac de La Mothe-Fénelon, publicada em 1699. Embora hoje pouco conhecido, o livro teve a maior tiragem no século 18 e foi exaltado por pedagogos de todos os tipos. Fénelon era tutor do neto (e possível sucessor) de Luís XIV, o Rei Sol. Inspirando-se na Odisseia, Fénelon escreveu o livro em tom de alegoria, atacando o absolutismo de forma sutilmente velada, ao mesmo tempo em que propunha um método de instruir o jovem herdeiro sobre as responsabilidades da realeza. De acordo com Kuniz e Colby (1967), citados por Roberts (1999), o personagem Telêmaco é inserido em um contexto que ilustra como o monarca ideal deveria ser: um homem de paz, sabedoria e modos simples de vida. Roberts apresenta trechos do livro, retratando exemplos de como o personagem Mentor de Fénelon é diferente do Mentor de Homero, ressaltando naquele a sabedoria, o papel de educador, de guia, de provedor de ajuda, de capacitador.

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referido por Roberts (1999). Este argumenta que, em toda essa questão, o papel da Odisséia é o de ter apresentado pela primeira vez a palavra “mentor” e que a extrapolação dos atributos do Mentor de Homero são ilusórias. Foi graças a Fénelon que as modernas alusões da palavra “mentor” foram estabelecidas. Foi ele, não Homero, que dotou Mentor das qualidades, habilidades e atributos que se vieram a incorporar na abordagem da mentoria na atualidade.

Carr (1999) oferece uma outra visão histórica. Propõe fazer as origens da mentoria retrocederem ainda mais remotamente, afirmando que tais raízes podem volver mais de cinco mil anos, a um tempo em que, na África, guias cuidavam de mostrar aos jovens o “caminho correto”. O autor relata que algumas das primeiras universidades européias adotaram algum modelo de mentoria como um componente essencial da educação. A universidade de Oxford, por exemplo, designava tutores (ou “Dons”, professores, preceptores), que agiam como mentores, convivendo no ambiente acadêmico com os estudantes e instruindo-os nas áreas social, acadêmica e pessoal5. Com o surgimento das guildas, na Idade Média, e o posterior advento da Revolução Industrial, estabelece-se a relação mestre-aprendiz. A esse respeito, Carr (1999) insinua uma provável aproximação entre os papéis de mentor e mestre: segundo ele, os trabalhadores não aprendiam seus ofícios em escolas, mas a partir de mentores com quem estudavam frequentemente durante a maior parte de suas vidas.

A mentoria pode ser considerada uma “tradição” de cinco mil anos, mas a literatura sobre mentoria não se sobressaiu até o final dos anos 1970 (CARR, 1999). Entre os trabalhos que considera pioneiros na literatura acadêmica de mentoria, Kram (1980) confere destaque ao de Levinson et al. (1978), “Seasons of a Man’s Life”, ao de Kanter (1977), “Men and Women of the Corporation”, e ao de Dalton, Thompson e Price (1977), “The Four Stages of Professional Careers: A New Look at Performance by Professionals”6. Segundo Fowler (2002), essas três obras constituem a base do próprio trabalho realizado por Kram na busca das características essenciais das relações de mentoria. Comentários sobre a influência que

5 Há, entre outros, relatos de atividades de ensino em Oxford desde 1096, registro de uma leitura pública para os “dons” em 1188 e o reconhecimento do grupo de mestres como uma universidade em 1231 (UNIVERSITY OF OXFORD, 2009).

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elas exerceram sobre os estudos de Kram serão apresentados na seção que tratará das funções de mentoria (2.2.6.).

Uma das referências de pioneirismo citadas por Kram (1980) – uma entrevista publicada na Harvard Business Review (COLLINS; SCOTT, 1978) – merece uma observação específica. Nela, três executivos que presidiram uma mesma organização respondem a várias perguntas que se referiam claramente a práticas de mentoria. Ao longo dos depoimentos, ficam evidentes a presença de diversas funções de mentoria nos relacionamentos entre esses executivos, a consciência de ser mentor e a de ser mentorado, bem como a intenção de ser mentor. O que dá maior relevo histórico a esse registro é o fato de esses executivos se terem conhecido entre as décadas de 1940 e 1950 e exercido a presidência da empresa entre as décadas de 1940 e 1960. Verifica-se, dessa forma, que a prática da mentoria no ambiente organizacional (ao menos a prática espontânea) antecipou-se aos trabalhos acadêmicos pioneiros sobre o tema. Em termos de práticas programadas, formais, Chandler e Kram (2007) informam que, bem antes de existir um entendimento suficiente da mentoria e suas várias formas, as organizações já haviam começado a considerar como poderiam promover a mentoria para várias populações de empregados.

É a partir das primeiras pesquisas de Kathy Ellen Kram que a mentoria passa a ter um estudo mais sistematizado e se começa a utilizar um referencial teórico para pesquisa. De acordo com Bozeman e Feeney (2007), embora seja impossível identificar um único trabalho e dizer categoricamente que ele é o marco inicial da pesquisa de mentoria, a tese de doutorado de Kram (1980) e seu artigo sobre as fases da mentoria (KRAM, 1983) proporcionaram um início da tradição da pesquisa contemporânea na área. Fowler (2002) afirma que a pesquisa de Kram (1980) foi a primeira exploração sistemática de relações de mentoria e que o trabalho exploratório dessa autora pioneira forneceu os fundamentos sobre os quais uma considerável quantidade da pesquisa empírica tem sido elaborada. A consolidação do trabalho inicial de Kram se deu em 1985, com o lançamento do livro “Mentoring at Work: Developmental Relationships in Organizational Life”7. Diversos tópicos que serão abordados nas próximas seções, a exemplo da próxima, tomarão essa obra como uma referência fundamental.

Segue-se agora para uma abordagem sobre o que a literatura entende por mentoria.

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2.2.2. Conceito de mentoria

Serão apresentados a seguir aspectos que contribuem para uma visão conceitual sobre a mentoria. Inicia-se por uma perspectiva tradicional, vinculada aos primeiros estudos acadêmicos e a uma proposta de definição do construto. Em seguida, abordam-se os benefícios do relacionamento de mentoria e aspectos decorrentes de uma maior abertura e abrangência que o conceito vem alcançando em diversos contextos.

2.2.2.1. Visão tradicional sobre mentoria

Para um contato inicial com o conceito de mentoria, Ragins e Kram (2007) sinalizam com a seguinte referência:

Quando nos pedem para contemplar os relacionamentos que fizeram a diferença em nossas vidas – os relacionamentos que nos deram coragem de fazer as coisas que nós pensávamos que não podíamos fazer, relacionamentos que guiaram nosso desenvolvimento profissional ou até mesmo mudaram o curso de nossas vidas –, muitos de nós pensamos em relacionamentos de mentoria (RAGINS; KRAM, 2007, p. 3).

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desenvolvimento (BEARMAN et al., 2007). Em outras palavras, mentoria trata de transição, mudança e transformação (MEGGINSON et al., 2006).

Observando-se a estrutura mais simples (um a um) de uma relação de mentoria, estão presentes, de um lado, o mentor, que provê funções de mentoria, e, de outro lado, o mentorado, foco da atenção e ajuda do mentor. Em um sentido amplo, os verdadeiros mentores tendem a interessar-se pelo bem-estar geral de seus mentorados (ANDERSON; SHANNON, 1988). Um bom mentor tem qualidades várias:

“... é alguém de absoluta credibilidade cuja integridade transcende o que sobre ele se diga; conta para o mentorado coisas que este possa não querer ouvir, mas deixa-o sentindo que deveria ter ouvido; interage com o mentorado de maneira que o faz querer tornar-se melhor; faz o mentorado sentir-se seguro bastante para assumir riscos; dá ao mentorado confiança para superar suas dúvidas e medos; apoia os esforços do mentorado em estabelecer suas próprias metas e apresenta oportunidades e foca em desafios que o mentorado poderia não ter percebido por si mesmo” (DELONG; GABARRO; LESS, 2008, p. 4).

Diversos tipos de suporte, portanto, podem ser proporcionados pelo mentor, no processo de suporte ao desenvolvimento do mentorado. Porém uma questão fundamental no relacionamento de mentoria é a presença de dois fatores. Primeiramente, o mentor deve viver a experiência com compaixão (BOYATZIS, 2007). Compaixão, neste caso, compreende ao mesmo tempo três fatores: a) empatia, compreensão dos sentimentos do outro; b) dedicação à outra pessoa; c) vontade de agir em resposta aos sentimentos da pessoa (MCKEE; BOYATZIS, 2006; BOYATZIS; SMITH; BLAZE, 2006). Associando-se ao fator compaixão, uma atração mútua ou química interpessoal se desenvolve entre as partes (KRAM, 1980, 1988; FORRET; TURBAN; DOUGHERTY, 1997; OWEN; SOLOMON, 2006). Disso resulta um tipo de relacionamento específico.

Como visto acima, Ragins e Kram (2007) ressaltam a questão do desenvolvimento profissional como campo de influência da mentoria. Isso se prende ao fato de a pesquisa de mentoria ter sido inicialmente direcionada aos estudos no campo organizacional, sobre o qual as pesquisas são hoje abundantes. Com esse foco, a mentoria foi definida por Kram (1988, p. 2) como “um relacionamento entre um adulto jovem e um mais velho e mais experiente que ajuda o mais novo a aprender a navegar no mundo adulto e no mundo do trabalho”.

2.2.2.2 Mentoria vista por novas lentes

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um mesmo indivíduo e quem são esses mentores. O modelo tradicional prevê uma relação biunívoca, entre um mentor e um mentorado, porém, desde seus primeiros trabalhos, a própria Kram (1988) já sustentava que o indivíduo pode ir, ao longo da vida e da carreira, valendo-se de uma “constelação” de relacionamentos, que lhe vão provendo suportes distintos em épocas diversas. São indivíduos de várias esferas sociais, incluindo a família, amigos fora do trabalho e pessoas do ambiente organizacional (subordinados, pares e chefes). Mais tarde, Higgins e Thomas (2001) utilizaram a expressão “constelação de desenvolvimento” para designar o conjunto de relacionamentos que um indivíduo tem, ao longo da vida, com pessoas que assumem um interesse ativo e iniciativa em desenvolver a carreira daquele, através de assistência nas questões pessoais e profissionais. Em lugar de “constelação de desenvolvimento”, Higgins e Kram (2001) utilizaram a expressão “rede de desenvolvimento”. Para elas essa rede é formada pelo conjunto de pessoas que o indivíduo, em um determinado ponto da vida, entende como importantes, seja sob o ponto de vista do suporte para sua carreira, seja sob o ângulo do apoio psicossocial de que necessita.

Pode-se considerar, então, que os mentores não têm de ser necessariamente de maior status, grau hierárquico ou autoridade. Pares, por exemplo, podem agir como mentores (KRAM; ISABELLA, 1985; TODD, 2005). O mentor não é obrigatoriamente uma pessoa mais velha e de maior nível (DARLING et. al., 2002). O que importa é que o mentor tenha conhecimento e experiência confiável e relevante para compartilhar (PHILIP; HENDRY, 2000). Assim se pode chegar até o cenário de um relacionamento reverso em relação ao que apregoa a tradição conceitual da mentoria: em determinada circunstâncias, indivíduos mais novos servem de mentores aos mais velhos, em uma relação que gera resultados positivos (WINEFIELD, 1998, citado por MCDONALD, 2002; BUSEN; ENGEBRETSON, 1999; ENSHER; MURPHY, 2005; O’NEILL, 2006; SCANLON, 2008; HARVEY et al., 2009;).

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episódios de alta qualidade pode levar o relacionamento a um nível em que ele possa ser considerado um relacionamento de mentoria. Os episódios que o geraram foram episódios de mentoria. Assim, as autoras sugerem a visualização de um “contínuo de possíveis interações – de episódicas a contínuas” (FLETCHER; RAGINS, 2007, p. 381). As relações de mentoria caracterizadas por um elevado número de episódios que promovam crescimento mútuo seriam muito mais provavelmente experimentadas como relações de alta qualidade. McManus e Russel (2007) também tratam do conceito de episódios. Ratificam que, ao longo do tempo, mais e mais episódios de mentoria atingem um ponto em que fica caracterizada a relação de mentoria, com um nível mais elevado de intimidade, abertura e autenticidade. É, contudo, difícil saber quando ocorre esse ponto de inflexão.

Ensher e Murphy (2005) fazem menção a “mentores do momento”. Segundo elas, trata-se de pessoas que atuam em um análogo de uma amizade circunstancial. Ainda que a interação seja breve, ela pode significar uma oportunidade de mentoria capaz de promover mudança na vida do outro. Para que este usufrua do que um mentor do momento lhe pode oferecer, precisa desenvolver um sentido apurado de profunda atenção e abertura a essas oportunidades.

Outro aspecto digno de nota na atual visão sobre a mentoria é o sentido do fluxo de benefícios que o relacionamento proporciona entre mentor e mentorado. McManus e Russell (2007) afirmam que, na concepção tradicional, os benefícios gerados – para o mentorado ou para o mentor – são decorrentes de ações do mentor, em vez de algo que derive de iniciativas independentes do mentorado. É o que as autoras chamam de relação de complementaridade: a satisfação de um indivíduo advém do suprimento que ele faz da necessidade do outro. No caso, isso significa que o mentor também se beneficia pelo fato de beneficiar o mentorado. Mas há outras situações possíveis. McManus e Russell (2007) sustentam que, em relações de mentoria entre pares, eles são capazes de ajudar-se mutuamente, promovendo uma situação mais equilibrada, com cada um dos membros contribuindo para o desenvolvimento do outro. Essa situação é a mutualidade. Além disso, quando os membros percebem igual valor no que entregam e no que recebem, o relacionamento é de reciprocidade (que não deixa de ser uma mutualidade). As autoras propõem que a mutualidade é mais comum na mentoria de pares que na mentoria tradicional.

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do contínuo formado por esses extremos, situa-se o que as autoras chamam de “mentoria marginal”. É uma mentoria de mínimos resultados: não envolve uma disfunção grave, mas sua eficácia é reduzida. Numa visão que leva em conta também o lado do mentor, Scandura (1998) apresenta o conceito de “mentoria disfuncional”, aquela em que o relacionamento não é benéfico para o mentorado, para o mentor ou para ambos.

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2.2.3 Benefícios da mentoria

Os resultados positivos associados com os relacionamentos de mentoria podem ser agrupados em três linhas: benefícios para os mentorados, para os mentores e para o contexto em que ocorre o relacionamento. Como os relacionamentos são orientados no sentido do mentorado, há um maior volume de pesquisas nesse grupo (LOCKWOOD; EVANS; EBY, 2007). Apresenta-se a seguir uma síntese de benefícios, sob a perspectiva da mentoria organizacional.

Para Allen (2006), a mentoria promove aos mentorados resultados positivos de carreira divididos em: (a) resultados objetivos (maior rapidez na ascensão funcional e maiores salários; (b) resultados subjetivos (satisfação com o trabalho, satisfação com a carreira, maior envolvimento com a carreira, maior motivação pela carreira, maior planejamento de carreira, maior autoeficácia8 em relação à carreira, socialização, menor nível de estresse, maior sentimento de cidadania organizacional e menor interferência da família no trabalho. Lankau e Scandura (2002) acrescentam aos benefícios para o mentorado menor ambiguidade de papéis, aumento da confiança na habilidade de aprender, maior disposição para riscos e inovação, menor intenção de sair do emprego.

Pelo lado dos mentores, a literatura, segundo Allen (2006), tem indicado resultados como satisfação pessoal por passar conhecimento e habilidades para os outros, generatividade9, alegria gerada pela energia do mentorado, melhor desempenho no trabalho (por receber do mentorado novas perspectivas sobre a organização), melhor desempenho no trabalho em grupo, lealdade e apoio dos mentorados e reconhecimento organizacional. Kram (1988) aponta aumento de poder e satisfação com a carreira.

Para a organização, Allen (2006) aponta como benefícios a redução da rotatividade, melhora na produtividade do mentorado e maior retenção de mulheres e membros de grupos minoritários. Wilson e Elman (1990) ressaltam que a mentoria tanto pode proporcionar à organização um sistema estruturado que fortalece e assegura a continuidade da cultura organizacional, como pode ser útil quando é necessário redefinir a cultura (e.g., em tempos de mudança da liderança).

8 Convicção do indivíduo de poder realizar com êxito um comportamento necessário para atingir resultados (BANDURA, 1977) ou, em outras palavras do mesmo autor, a sua crença na própria capacidade de exercer controle sobre seu funcionamento e sobre os eventos que afetam a sua vida (BANDURA, 2004). É um conceito fundamental para o estudo da mudança de comportamento em saúde.

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Figura 1: Contextos determinantes do comportamento em atividade  física.
GRÁFICO DOS ESTÁGIOS DA MUDANÇA – 1
GRÁFICO DOS ESTÁGIOS DA MUDANÇA – 2

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