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Efeitos da greve:

No documento Direito Do Trabalho II - Romano Martinez (páginas 162-180)

III Conflitos coletivos de trabalho

8. Efeitos da greve:

a. Suspensão dos efeitos principais do contrato: nos termos do artigo 536.º,

n.º1 CT, em relação aos trabalhadores que tenham aderido à greve verifica- se a suspensão das relações laborais; isto é, as obrigações emergentes do contrato de trabalho ficam suspensas. No mesmo preceito exemplifica-se, determinando que ficam suspensos o direito à retribuição e os deveres de subordinação e de assiduidade. Apesar de os exemplos serem apresentados tendo em conta a posição jurídica do trabalhador, como o contrato de trabalho é sinalagmático, os correspondentes direitos e deveres do empregador também se suspendem. Perante a adesão a uma greve tem sido debatida a questão de saber como se explica a manutenção do contrato de trabalho. Quando se considerava que a greve era ilícita, se o trabalhador aderisse a uma greve haveria tão-só um incumprimento do contrato de trabalho e, como tal, sujeitava-se às consequências do incumprimento desse mesmo contrato, mormente à resolução (despedimento). Deixando de se considerar a greve como um facto ilícito surgem várias explicações para admitir que uma das partes, apesar de estar em greve, mesmo assim, não se encontre numa situação de incumprimento do contrato de trabalho. Mas, parece preferível, e é a ideia hoje predominante, que o contrato de trabalho

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se mantém, só ficando suspensos alguns dos seus efeitos. Concretamente, ficam suspensos os efeitos principais do contrato, como se deduz do n.º1 do artigo 536.º CT. Haverá outros efeitos do contrato, que subsistem mesmo durante o período de greve. Em primeiro lugar, a greve pressupõe a abstenção do trabalho e, portanto, um dos efeitos principais do contrato de trabalho, que é a prestação de uma atividade, deixa de ser devida. O trabalhador, durante a greve, não fica vinculado à realização de uma atividade, exceto se tiver de cumprir serviços mínimos. E, como não realiza a atividade, o trabalhador fica também desvinculado dos deveres de assiduidade e de subordinação. Dito de outro modo, o trabalhador, durante o período de greve, deixa de estar sujeito aos deveres que constam das alíneas b) e c) do n.º1 do artigo 128.º CT. Tendo em conta o elenco de deveres do trabalhador constante do artigo 128.º, n.º1 CT, importa averiguar quais deles se devem manter durante o período de greve. O trabalhador que aderiu à greve deixa de estar adstrito a promover ou a executar atos tendentes à melhoria da produtividade da empresa (artigo 128.º, n.º1, alínea h) CT), apesar de o artigo 536.º CT não o dizer. Os restantes deveres constantes do artigo 128.º, n.º1 CT parece que se deverão manter, não se justificando a sua suspensão durante a greve. Para além destes deveres poderia ainda justificar-se, eventualmente, a subsistência de outros deveres acessórios que existem numa relação laboral. Na eventualidade de o trabalhador, durante o período de greve, violar qualquer dos deveres indicados ou outros deveres acessórios, haverá um incumprimento que permite ao empregador agir, designadamente por via de um processo disciplinar. No polo oposto, o empregador não fica vinculado ao dever de pagar a retribuição ao trabalhador em greve (artigo 536.º, n.º1 CT). A obrigação principal do empregador, que é o pagamento do salário, não se mantém relativamente a trabalhadores grevistas, os quais perdem o direito à remuneração na proporção em que a atividade não tenha sido exercida. Ou seja, o empregador deixará de pagar a retribuição correspondente ao tempo em que o trabalhador esteve em greve. Esta perda de retribuição tem sido entendida como afetando tão-só a retribuição daquele mês, sem quaisquer repercussões nas restantes retribuições, designadamente não acarretando redução nos subsídios de Natal e de férias, que se mantêm por inteiro. Relativamente aos complementos retributivos, a redução terá de ser vista em função da situação concreta, tendo em conta se esse complemento salarial está ou não relacionado com a atividade. As formas de retribuição indireta que o empregador fornece ao trabalhador de molde a facilitar o exercício da sua atividade não serão devidas se ele, por estar em greve, não prestar essa atividade. Há, todavia, certos complementos da retribuição que não se justifica a sua redução em caso de greve. A suspensão do dever de retribuir o trabalhador não implica que não subsistam outros deveres do empregador durante o período de greve. Com base no disposto no artigo 127.º, n.º1 CT, importa verificar se no elenco de deveres da entidade patronal de justifica a manutenção de alguns deles numa situação de greve. Parece poder concluir-se que o empregador, em relação ao trabalhador grevista, e durante a paralisação, deixa de estar obrigado a pagar-lhe a retribuição (artigo 127.º, n.º1, alínea b) CT), a proporcionar-lhe boas

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elevação do seu nível de produtividade, nomeadamente dando-lhe formação profissional (artigo 127.º, n.º1, alínea d) CT). Mas, em contrapartida, manter- se-ão os deveres do empregador de tratar e respeitar o trabalhador com urbanidade e probidade (artigo 127.º, n.º1, alínea a) CT), de indemniza-lo relativamente a prejuízos resultantes de acidentes de trabalho e doenças profissionais (artigo 127.º, n.º1, alínea g) e artigo 536.º, n.º2 CT) e de facilitar- lhe o exercício de cargos que exerce em entidades relacionadas com a atividade laboral (artigo 127.º, n.º1, alínea f) CT). Importa esclarecer que o mencionado dever de indemnizar o trabalhador previsto no artigo 536.º, n.º2 CT relaciona-se com os acidentes de trabalho ou doenças profissionais que ocorreram ou foram contraídas em tempo de trabalho e não ocasionados durante a greve. Quanto aos acidentes de trabalho que tenham lugar durante a greve em relação aos trabalhadores que a ela aderiram não há responsabilidade do empregador. Concluindo, pode dizer-se que os deveres do empregador, constantes do artigo 127.º, n.º1 CT, manter-se-ão desde que não se relacionem com a prestação da atividade naquele momento. Para além disso, podem ainda subsistir deveres que advêm de regras de boa fé, no fundo, deveres acessórios da relação laboral que impendem sobre o empregador, independentemente de o trabalhador ter aderido à greve. Tendo em conta que, da parte do trabalhador em greve, subsistem certos deveres, designadamente deveres acessórios, é de concluir que, mesmo durante a greve, se mantém, relativamente ao empregador, o poder de disciplinar no que respeita às violações desses deveres. O mesmo se passa relativamente ao poder de direção; na medida em que subsistam deveres do trabalhador, também se mantém o correspondente poder de direção do empregador. Resta referir que a suspensão do contrato de trabalho durante a greve não prejudica a antiguidade do trabalhador e os efeitos dela decorrentes, como estabelece o artigo 536.º, n.º3 CT.

b. Dever de não substituição dos trabalhadores grevistas: para impedir o

sucesso de uma greve, o empregador poderia contratar a termo pessoas que estivessem desempregadas, com vista à substituição dos trabalhadores grevistas. Com base no aviso prévio o empregador é informado da existência da greve com alguma antecedência e avalia a probabilidade de os trabalhadores a ela aderirem; em função disso, poderia contratar a termo desempregados, para ocuparem, durante o período de greve, o posto de trabalho dos grevistas. Esta possibilidade foi inviabilizada no nosso ordenamento jurídico na medida em que o artigo 535.º CT impede que sejam substituídos os trabalhadores grevistas por pessoas que não trabalhavam no estabelecimento ou serviço onde foi declarada a greve, mas interessa fazer algumas explicações. A proibição de celebrar novos contratos de trabalho relativamente àquele estabelecimento ou serviço, que não foi consagrada em muitos sistemas jurídicos, não visa só a defesa do direito dos trabalhadores em greve, de molde a não serem os seus postos de trabalho ocupados por outrem. Esta limitação também tem em vista proteger a própria empresa, os eventuais trabalhadores contratados a termo, bem como o público em geral. De facto, caso se admitisse a substituição de trabalhadores grevistas por pessoas estranhas à empresa, tal permuta seria, em primeiro lugar, fonte de conflitos, possibilitando a existência de confrontos entre os trabalhadores

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grevistas e aqueles outros que fossem contratados especialmente para os substituir. Conflitos esses bem conhecidos historicamente, em particular noutros países. Além disso, os trabalhadores contratados para substituir os grevistas, em princípio, não teriam a necessária experiência, sobretudo quando se tratasse de funções relativamente às quais fosse imprescindível uma determinada preparação técnica, sendo muitas das vezes difícil encontrar rapidamente trabalhadores desempregados com a preparação técnica adequada para assegurar a normal prossecução das atividades em causa. Nestes termos, tal substituição poderia acarretar prejuízos ao próprio empregador, pois o funcionamento da empresa não seria idêntico e, além disso, constituiria uma eventual fonte de prejuízos para os próprios trabalhadores contratados a termo, designadamente por facilitar acidentes de trabalho, dado que eles não teriam a preparação técnica adequada para desempenhar a atividade, podendo também prejudicar terceiros, particularmente o público consumidor. Noutro plano, importa esclarecer que esta limitação respeita só ao âmbito da greve, pelo que nada impede que o empregador contrate novos trabalhadores para um estabelecimento ou secção da empresa onde não há greve, desde que por via desta contratação não se viabilize a substituição dos trabalhadores grevistas. Mas a regra constante do artigo 535.º CT não proíbe que o empregador faça adaptações na própria empresa, permitindo-lhe que mude trabalhadores de atividade e de local dentro do próprio estabelecimento ou setor da empresa. Perante uma determinada situação de greve, tendo em conta o número de trabalhadores não grevistas, o empregador pode utilizá-los noutra atividade, determinando o exercício de funções idênticas (artigo 118.º CT) ou recorrendo ao ius variandi (artigo 120º. CT). É necessário que essa atuação do empregador esteja no âmbito do poder de direção e caiba na atividade devida – contratada ou afim – (artigo 118.º, n.º1 e 2 CT) ou no ius variandi (artigo 120.º CT); deste modo, relativamente a um trabalhador que desempenha determinada atividade, o empregador, como ele não aderiu à greve, pode coloca-lo a realizar outra atividade diversa da habitual, desde que este trabalhador não grevista tenha a preparação técnica adequada para o exercício daquela atividade e a mudança se inclua na atividade devida ou não implique uma alteração substancial da sua posição. Esta adaptação depende, por conseguinte, da inclusão na atividade contratada no sentido amplo do artigo 118.º, n.º2 CT, ou do preenchimento dos pressupostos do ius variandi. Assim, se numa secção todos os trabalhadores fizeram greve e noutra nenhuma a ela aderiu, o empregador poderá deslocar alguns trabalhadores desta última secção para a primeira, de modo a que esta possa funcionar. Mas a mencionada adaptação tem limites. O empregador não pode deslocar trabalhadores de uma empresa para outra, nem sequer, dentro da mesma empresa, pode afetar trabalhadores de um estabelecimento ou serviço a realizarem a atividade de outro estabelecimento ou serviço. A dificuldade pode estar em determinar quando é que, numa empresa, as unidades constituem estabelecimentos ou serviços diferentes; é de pressupor que isso só ocorra se, pelo menos, existir uma autonomia económica e administrativa entre eles. Estes limites não podem constituir entrave a que, não existindo diferenciação de estabelecimento, o empregador

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contratação de serviços alternativos. O que o artigo 535.º CT proíbe é a substituição de trabalhadores grevistas mediante a celebração de contratos de trabalho. Mas importa explicar a regra constante do n.º2 do artigo 535.º CT. A norma incluída no n.º2 do citado preceito tem em vista evitar que a previsão do n.º1 seja defraudada por via indireta. Assim, o resultado da atividade pode ser substituído em caso de greve. Ou seja, não seria permitida a substituição na efetiva atividade desempenhada pelo trabalhador grevista, mas seria lícita a substituição quanto ao resultado da sua prestação. O limite constante do mencionado n.º2 deixa de ser atendido em caso de incumprimento dos serviços mínimos necessários à satisfação das necessidades sociais impreteríveis ou à segurança e manutenção de equipamento e instalações e na estrita medida necessária à prestação desses serviços. Pelo que, verificada qualquer das situações previstas nesta norma, os trabalhadores grevistas podem ser substituídos, mesmo do desempenho da sua tarefa, pelo serviço prestado por uma empresa especialmente contratada para esse fim. Não há qualquer impedimento quanto a contratar empresas para realizar a mesma tarefa que os trabalhadores grevistas desempenhavam. É até frequente e vantajoso para o público utente. Nos termos do artigo 535.º CT podem ajustar-se contratos de prestação de serviço, mas não contratos de trabalho. O problema pode residir na difícil delimitação e distinção entre contratos de prestação de serviço e de trabalho.

c. Dever de retribuir os trabalhadores não aderentes à greve: durante uma

greve pode haver trabalhadores que a ela não aderiram e se apresentam a trabalhar, permitindo que a empresa continue a laborar, mesmo que a menor ritmo. Porém, pode acontecer que, como consequência da greve, a falta de alguns trabalhadores impeça completamente a laboração na empresa e, nesse caso, os não grevistas estão materialmente impedidos de realizar qualquer tarefa. Põe-se, então, o problema de saber se, quando a atividade dos não grevistas deixa de poder der realizada, se justifica que continuem a receber a retribuição; de facto, eles apresentam-se para trabalhar mas não realizam qualquer atividade, porque é impossível o desempenho da prestação laboral. Em tal hipótese, há uma impossibilidade objetiva de realização da prestação. Os trabalhadores que não aderiram à greve, estando na sua disponibilidade de realizar a sua atividade, têm direito a receber a retribuição, pois o empregador suporta o risco contratual, devendo pagar a remuneração, desde que o trabalhador esteja na disponibilidade de efetuar a tarefa. Dito de outra forma, o dever de pagar a retribuição não é devido pela tarefa exercida, mas pela disponibilidade de a realizar. Esta asserção não é, contudo, totalmente certa. Apesar de no contrato de trabalho não haver uma obrigação de resultado, nem sempre a mera disponibilidade do trabalhador implica a obrigação de pagar a retribuição. A justificação do dever de pagar a retribuição aos trabalhadores não grevistas não pode ser explicada sem atender a algumas exceções à regra de que o risco contratual é suportado pelo empregador, principalmente tendo em conta o regime do lay off (artigo 298.º e seguintes CT). Como resulta do regime da suspensão do contrato, na relação laboral, nem sempre o empregador suporta o risco, pelo menos na sua totalidade. Quando uma empresa não pode laboral em razão do número de trabalhadores que aderiram à greve e estando outros trabalhadores

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dispostos a trabalhar, o empregador pode não lhes dar trabalho, porque há uma impossibilidade, objetivamente determinada, de estes prestarem a atividade. Em tal caso, não se pode aceitar que haja uma transferência do risco, nos termos do artigo 815.º CC, pois, apesar de o trabalhador não grevista estar disposto a trabalhar, se o empregador não aceitar a prestação, não há uma transferência do risco nos termos do artigo 815.º CC, porque, nesta hipótese, o empregador não se pode qualificar como credor em mora, que passa a suportar o risco e, nessa medida, devendo pagar a retribuição aos trabalhadores. Na realidade, não há uma transferência do risco, porque o empregador não aceita a prestação de trabalho por haver uma impossibilidade de a receber e o artigo 815.º CC só se aplica na eventualidade de o credor sem motivo justificado não aceitar a prestação (artigo 813.º CC). Neste caso, o empregador tem um motivo justificado – a empresa não pode laborar por razões objetivas (greve) – não se verificando, por isso, a previsão do artigo 813.º CC, isto é, não existe mora do credor (empregador). Esta situação enquadra-se numa hipótese de impossibilidade de cumprimento não imputável a qualquer das partes; trata-se de uma impossibilidade não imputável, mas depende de fatores que dizem respeito ao empregador. O empregador suspende a laboração na empresa, pois, perante aquela greve, considera que não há condições para laborar; portanto, os fatores que determinam a impossibilidade não se baseiam na culpa do empresário, mas estão na esfera de influência, ou seja, dizem respeito ao empregador. Há, por isso, similitudes com a figura da suspensão do contrato de trabalho do lay off, mais concretamente com a figura da suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador. Como dispõe o artigo 298.º, n.º1 CT, o empregador pode recorrer à suspensão dos contratos de trabalho em quatro hipóteses:

i. Razões conjunturais de mercado;

ii. Motivos económicos e tecnológicos;

iii. Catástrofes;

iv. Outras ocorrências que tenham gravemente afetado a atividade normal da empresa.

A greve poder-se-ia incluir nesta última, pois ela pode afetar gravemente a atividade normal da empresa. Caso se enquadrasse a greve na última das hipóteses previstas no artigo 298.º, n.º1 CT, então o empregador, justificando que a empresa não estava em condições de laborar normalmente, poderia recorrer à suspensão do contrato de trabalho, reduzindo a contraprestação a pagar aos trabalhadores não grevistas, nos termos do artigo 305.º, n.º1, alínea a) CT, preceito que permite reduzir a retribuição acordada ao montante do salário mínimo estabelecido para aquele setor. Não obstante subsistir o pressuposto de que o risco na relação de trabalho é suportado pelo empregador, em caso de suspensão do contrato (artigos 298.º e seguintes CT) admite-se uma atenuação desse risco, possibilitando a redução da retribuição. Cabe perguntar se uma situação de greve se pode enquadrar no regime da suspensão do contrato de trabalho, designado lay off. Apesar do disposto no artigo 298.º, n.º1 CT, não parece que a greve se possa incluir na parte da norma que alude às outras ocorrências que tenham afetado gravemente a atividade normal da empresa. Em primeiro lugar, na formulação ampla do

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permitem o recurso à figura do lay off. Subjacente à suspensão do contrato de trabalho, parecem estar as ocorrências que tenham afetado gravemente a atividade normal, prejudicando o funcionamento da empresa com continuidade. A suspensão do contrato de trabalho justifica-se dentro de uma lógica de perturbações que se protelam no tempo e, em princípio, não é isso que ocorre com a greve. A greve, normalmente, não ocasiona perturbações que se protelam no tempo; pressuposto em que assenta a suspensão do contrato de trabalho, relativamente moroso, com alguns entraves burocráticos, sendo difícil recorrer a esse processo em caso de alguns entraves na empresa, principalmente atento o curto período de aviso prévio (artigo 534.º CT). Não parece que o regime do lay off vise aplicar-se a situações esporádicas como a greve. Como o regime da suspensão do contrato de trabalho constitui uma exceção à assunção do risco por parte do empregador, admitindo uma redução do salário, e não sendo de incluir a greve nas hipóteses previstas no artigo 298.º, n.º1 CT, deve concluir-se que o empregador assume, na totalidade, o risco da retribuição dos trabalhadores não grevistas, os quais deverá receber os seus ordenados por inteiro. Todavia, não havendo laboração, a contrapartida usualmente percebida pelos trabalhadores não grevistas pode sofrer um decréscimo quando, em parte, a retribuição esteja relacionada com a produtividade, que será reduzida ou nula durante o período de greve.

d. Serviços mínimos:

i. Razão de ser: em relação às empresas que se destinem à satisfação de

necessidades sociais impreteríveis deve ser assegurada a prestação de serviços mínimos (artigo 537.º, n.º1 CT), o mesmo ocorrendo, em qualquer empresa, no que respeita aos serviços essenciais para segurança e manutenção do equipamento e instalações (artigo 537.º, n.º3 CT). O estabelecimento de serviços mínimos tem levantado vários problemas. Em primeiro lugar, aquando da aprovação da lei da greve original (1977) e, depois, com a revisão em 1992 e o alargamento dos serviços mínimos, levantou-se o problema da constitucionalidade dos mesmos. Alguma doutrina considerava inconstitucional impor serviços mínimos em determinadas empresas, porque isso violaria o artigo 57.º, n.º2 CRP. Esta tomada de posição baseava-se no facto de os serviços mínimos implicarem limites ao âmbito da greve, coartando os direitos dos trabalhadores no exercício do seu direito de greve e, nessa medida, haveria uma inconstitucionalidade. A opinião dominante, aceite pelo Tribunal Constitucional e reiterada na revisão constitucional de 1997 ao incluir o n.º3 no artigo 57.º CRP, não corrobora a opinião de inconstitucionalidade, essencialmente com base no argumento de se justificar a imposição de serviços mínimos, porque a greve não é um direito absoluto e o seu exercício deve ser conjugado com o de outros direitos, também consagrados na Constituição. Concretamente, do conflito entre o exercício do direito de greve e a satisfação de necessidades essenciais de uma comunidade, prevalece este último direito, admitindo-se, por isso, limites àquele exercício.

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ii. Fixação: tendo em conta o disposto no artigo 537.º, n.º1 CT importa,

primeiro, determinar quais as empresas que prestam atividade com vista à satisfação de necessidades sociais impreteríveis; sendo este um conceito indeterminado importa concretizá-lo, explicitando-o. O legislador, no artigo 537.º, n.º2 CT, exemplifica alguns dos setores onde considera que existam empresas prestando serviços para a satisfação de necessidades sociais impreteríveis. O caráter não taxativo da enumeração significa que, nos vários setores indicados, nem todas as empresas prestam serviços ou fornecem bens que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis. Admite- se que nesses setores, por vezes, haja empresas que não têm por finalidade a satisfação de tais necessidades. Por outro lado, não sendo a indicação taxativa, leva a que se possa admitir a existência de outros setores, não indicados no elenco do artigo 537.º, n.º2 CT, relativamente aos quais seja justificável o estabelecimento de serviços mínimos. Tendo-se mantido, quase inalterado, o elenco

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