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REGIME JURÍDICO DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA Estudo sobre as normas de fiscalização da obrigação tributária e dos deveres instrumentais MESTRADO EM DIREITO

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Academic year: 2018

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

MARIANA ARITA SOARES DE ALMEIDA

REGIME JURÍDICO DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA Estudo sobre as normas de fiscalização da obrigação tributária

e dos deveres instrumentais

MESTRADO EM DIREITO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

MARIANA ARITA SOARES DE ALMEIDA

REGIME JURÍDICO DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA Estudo sobre as normas de fiscalização da obrigação tributária

e dos deveres instrumentais

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, como exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE EM DIREITO TRIBUTÁRIO, sob a orientação do Professor Paulo de Barros Carvalho.

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BANCA EXAMINADORA

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AGRADECIMENTOS

A finalização de uma etapa muito importante, concretizada com a presente dissertação, jamais seria possível sem a participação de pessoas muito especiais, que merecem o meu “muito obrigada”! Agradeço:

Ao meu orientador, Paulo de Barros Carvalho, cuja escola me ensinou uma extraordinária maneira de estudar.

Aos professores Fabiana Del Padre Tomé e Robson Maia Lins, pelas fundamentais considerações e sugestões tecidas na banca de qualificação.

Aos demais professores do curso, José Artur Lima Gonçalves, Regina Helena Costa e Silvio Luis Ferreira da Rocha, que contribuíram inestimavelmente para a ampliação dos meus horizontes.

Às minhas muito admiradas e estimadas chefes, Maria Leonor Leite Vieira, Sandra Cristina Denardi e Maria Ângela Lopes Paulino Padilha, por terem enfrentado de maneira tão participativa todo o desenvolvimento deste trabalho.

Às queridas amigas, revisoras, debatedoras e críticas, Viviane Camara Strachicini, Daniele Souto Rodrigues, Semíramis Oliveira e Luisa Cristina Miranda Carneiro.

Aos meus pais, Ana Cleonice Arita e Marcelo Soares de Almeida, à minha irmã, Carolina Arita Soares de Almeida, e à minha avó, Anna Maria Ferreira Santos, pelo incentivo aos estudos e ao desfrute da vida.

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RESUMO

Essa dissertação tem como eixo central de estudo a fiscalização das obrigações tributárias e dos deveres instrumentais realizada pela Administração. Sob um viés crítico-reflexivo, serão analisadas questões atinentes ao momento que se inicia com uma investigação ampla e abrangente, eventualmente desdobrada num específico procedimento que culmina com a positivação de normas que afirmam o fato jurídico tributário, ou infirmam ou confirmam a atividade do particular, emanadas de normas primárias precedentes ou derivadas punitivas ou não punitivas. Mediante a análise das regras e princípios que devem nortear a atividade fiscalizatória, busca-se o estudo pormenorizado de cada critério informador da norma estrutural de competência que outorga poderes investigativos aos agentes fiscais.

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ABSTRACT

The central axis of this dissertation is studying the surveillance activity about tax obligations and instrumental duties performed by the Executive. Under a critical and reflective review, it´s going to be analyzed the moment which begins with a broad and comprehensive inspection, possibly originating a specific procedure that culminates with application of norms that assert the tax legal fact, or invalidate or endorse the activity held by the particular, branched from norms sorted as primary precedent or derived punitive or non-punitive. Through the analysis of rules and principles that should guide the surveillance activity, we are going to accomplish a detailed study of each criterion that informs the structural standard of the investigative competence of tax agents.

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LISTA DE ABREVIATURAS

CADIN Cadastro de Informações dos Créditos de Órgãos e Entidades Federais Não Quitados

CARF Conselho Administrativo de Recursos Fiscais

CF Constituição Federal

CPMF Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira

CTN Código Tributário Nacional

DIMOB Declaração Informações sobre Atividades Imobiliárias

ICMS Imposto Incidente sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação

ISS Imposto Sobre Serviços

ITR Imposto Territorial Rural

MPF Mandado de Procedimento Fiscal

RFB Receita Federal do Brasil

RE Recurso Extraordinário

RESP Recurso Especial

RIR Regulamento do Imposto sobre a Renda

SINTEGRA Sistema Integrado de Informações sobre Operações Interestaduais com Mercadorias e Serviços

SF Secretaria das Finanças

SPED Sistema Público de Escrituração Digital

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STJ Superior Tribunal de Justiça

STF Supremo Tribunal Federal

TDPF Termo de Distribuição do Procedimento Fiscal

TEAF Termo de Encerramento de Ação Fiscal

TIAD Termo de Intimação para Apresentação de Documento

TIAF Termos de Início de Ação Fiscal

TIT Tribunal de Impostos e Taxas

TJ Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1 PREMISSAS METODOLÓGICAS E DELIMITAÇÃO DO OBJETO ... 15

1.1 O conhecimento e o constructivismo lógico-semântico ... 16

1.2 O estudo do Direito a partir das premissas metodológicas do constructivismo lógico-semântico ... 21

1.2.1 Construção de sentido do Direito ... 23

1.2.2 Norma jurídica completa ... 27

1.2.3 Processo de positivação do Direito ... 30

1.3 A delimitação do objeto de estudo ... 32

1.3.1 Relações jurídico-tributárias ... 34

1.3.2 Fiscalização tributária ... 39

2 NOÇÕES FUNDAMENTAIS... 45

2.1 A organização do Estado Brasileiro e a competência tributária ... 45

2.1.1 Competência fiscalizatória ... 52

2.2 A fiscalização tributária e o dever de colaborar ... 60

2.3 A fiscalização tributária: processo ou procedimento? ... 65

2.4 Os princípios que regem a atividade fiscalizatória tributária ... 71

2.4.1 Supremacia do interesse público sobre o interesse privado ... 72

2.4.2 Legalidade ... 74

2.4.3 Eficiência ... 77

2.4.4 Publicidade ... 82

2.4.5 Proporcionalidade ... 84

2.4.6 Verdade jurídica ... 86

3 ELEMENTOS DA NORMA DE COMPETÊNCIA FISCALIZATÓRIA ... 91

3.1 O critério pessoal – Sujeito competente para aplicar as normas de fiscalização tributária e para figurar no polo ativo da relação jurídica fiscalizatória ... 94

3.1.1 Agentes fiscais e particulares: privatização da atividade fiscalizatória? ... 96

3.1.2 Definição do sujeito ... 102

3.1.3 Permuta de informações ... 104

3.2 O critério pessoal – Sujeito passivo da relação jurídica fiscalizatória ... 112

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3.2.2 Não incidência, isenção, imunidade e fiscalização ... 117

3.3 O critério espacial – âmbito territorial da competência fiscalizatória ... 123

3.4 O critério temporal – limites temporais do exercício da competência fiscalizatória ... 126

3.5 O critério procedimental – forma do exercício da competência fiscalizatória... 129

3.5.1 Espontaneidade no Direito Tributário ... 134

3.5.2 Refiscalização ... 138

3.6 O critério prestacional – matérias em torno das quais podem ser instaurados procedimentos fiscalizatórios ... 140

3.6.1 Direito ao silêncio e fiscalização ... 140

3.6.2 Quebra de sigilo bancário ... 148

CONCLUSÕES ... 155

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INTRODUÇÃO

A positivação1 do Direito Tributário para a regulação dos casos concretos não é ato espontâneo; muito pelo contrário, pressupõe a interpretação dos enunciados prescritivos, bem como dos dados factuais e a subsunção da versão do fato ao conceito descrito na hipótese normativa. Nesta senda, a atividade fiscalizatória é expediente imprescindível para a incidência e aplicação das normas tributárias impositivas de exações fiscais, constitutivas de sanções administrativas e homologatórias da conduta dos administrados, pois, mediante o seu exercício, torna-se possível a específica reconstrução dos acontecimentos do “mundo da vida”2, traduzindo-os juridicamente e imputando-lhes efeitos legais.

Essa complexa tarefa de construção dos fatos tipificados no antecedente das prescrições tributárias é composta por uma série de atos administrativos que pressupõem a colaboração dos contribuintes, responsáveis tributários e terceiros. Esses sujeitos – aqueles que produzem os atos administrativos, os contribuintes, responsáveis e terceiros – estão intricadamente relacionados em direitos e deveres.

Sob o rótulo Regime Jurídico da Fiscalização Tributária, o que se pretende é oferecer uma argumentação sólida e consistente, contribuindo para o desenvolvimento teórico e pragmático da atividade que precede a produção de normas individuais e concretas que afirmam o fato jurídico tributário ou infirmam ou confirmam a atividade do particular. O estudo das normas de fiscalização da obrigação tributária e dos deveres instrumentais cinge-se à análise de diferentes aspectos da produção normativa pela prática das três

1 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos Jurídicos da Incidência. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 36.

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funções de órgãos que compõem o Estado, quais sejam, a legislativa, executiva e judiciária.

Para cumprir esse mister, no Capítulo 1, serão fixadas as premissas metodológicas que permeiam todo o raciocínio desenvolvido no trabalho, já desenhando a utilização dessas categorias na específica tratativa do tema, bem como delimitando o objeto do estudo, de modo a oferecer o sentido adotado para o conceito de fiscalização tributária.

Em seguida, no Capítulo 2, serão apresentadas noções essenciais para a configuração das linhas mestras da atividade fiscalizatória: serão fixadas ideias construídas a partir dos enunciados prescritivos postos no sistema jurídico pelo Legislador, conferindo as notas fundantes da atividade fiscalizatória exercida pelo Executivo. Além do mais, serão analiticamente contextualizados peculiares princípios que devem nortear a fiscalização tributária em todos os seus planos de expressão.

No Capítulo 3, será proposto o estudo dos elementos que compõem a norma de competência fiscalizatória dos agentes fiscais, isto é, dos critérios que informam a norma que atribui legitimidade a determinados sujeitos para concretizarem atos fiscalizatórios e introduzirem no sistema jurídico enunciados prescritivos que vinculam indivíduos de direitos e deveres em função de situações constituídas juridicamente. A importância da estrita atenção à norma de competência fiscalizatória se revela na circunstância de que eventuais vícios dos atos fiscalizatórios afetam diretamente os atos que lhe seguem, mormente o ato de lançamento, bem como a lavratura de Auto de Infração e a homologação da atividade do particular3. No decorrer deste

3 Ressalta à obviedade que o procedimento, enquanto sucessão de atos administrativos,

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capítulo, selecionados temas afetos à atividade fiscalizatória serão estudados em constante cotejo com a produção normativa dos Tribunais Administrativos e Judiciais.

“O vício jurídico de um ato anterior contamina o posterior, na medida em que haja entre ambos um relacionamento lógico incindível” (MELLO, Celso Antonio Bandeira.

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1 PREMISSAS METODOLÓGICAS E DELIMITAÇÃO DO OBJETO

O método é o expediente adotado pelo sujeito cognoscente para se aproximar do objeto de estudo e sobre ele emitir juízos. É por intermédio da adoção de uma metodologia específica que se estabelece um contato entre o objeto de conhecimento e o indivíduo que se propõe conhecê-lo.

Com efeito, as propostas metodológicas são inúmeras, e não existe um instrumento exclusivo para a investigação e exploração de cada objeto, de modo que a escolha de cada método está relacionada com a proposta cognoscitiva do intérprete. A título exemplificativo, podemos nos utilizar da via racional dedutiva, alcançada pela lógica, para analisarmos sintaticamente a linguagem, perquirindo as relações entre os signos organizados em um discurso. Esse estudo lógico dos textos é apenas um ponto de vista sobre o conhecimento, não o contemplando, portanto, na sua totalidade, pois negligencia os planos semântico e pragmático da fala, circunstância reveladora de que a aproximação do objeto em toda proposta cognoscitiva implica, inevitavelmente, um corte metodológico4.

A apresentação das premissas metodológicas assumidas no desenvolvimento de um trabalho confere a possibilidade de controle e vigilância da coerência do raciocínio construído acerca do objeto cognoscitivo. Isso porque, a partir do domínio das ideias primeiras que fundamentam todo argumento, é possível a verificação da uniformidade e procedência das conclusões construídas.

Tão importante quanto a fixação das premissas metodológicas que serão utilizadas em qualquer trabalho é a delimitação do objeto que se propõe estudar. Nos dizeres de Paulo de Barros Carvalho:

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[…] o saber científico dos tempos atuais é enfático em um ponto: todos entendem que não há como abrir mão da uniformidade na apreciação do objeto, bem como da rigorosa demarcação do campo sobre o qual haverá de incidir a proposta cognoscitiva.5

Neste capítulo, vamos expor a metodologia adotada para a elaboração desta dissertação e, uma vez fixadas as ferramentas de que nos utilizaremos para a aproximação do tema, delimitaremos o nosso objeto de estudo, apontando o sentido que atribuímos à expressão fiscalização tributária.

1.1 O conhecimento e o constructivismo lógico-semântico

Desde Crátilo de Platão, destacava-se a filosofia da consciência, segundo a qual o ato de conhecer consistia na reprodução do real por meio da linguagem. Essa concepção defendia o sentido ontológico do mundo refletido pelas palavras, isto é, partia do pressuposto de que o homem, por intermédio da língua, representava a realidade que existia em si mesma. Nesse contexto, as proposições eram consideradas verdadeiras quando presente a correspondência entre a reprodução do real e o objeto referido.

Ocorre que não foram (e ainda não são) raros os momentos em que o estudo dos objetos acabou por infirmar teorias já construídas e difundidas por longas décadas, revogando as verdades dantes defendidas6. Justificando esse contínuo

5 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2008, p. 6.

6 Exemplificando, é a situação de “Plutão, ‘o nono planeta’, que acaba de ser inapelavelmente desqualificado pelos “avanços” da Astronomia. Pequena substituição na camada de linguagem que outorgava àquela esfera celeste a condição de planeta foi o suficiente para desclassificá-lo, oferecendo à comunidade das Ciências outro panorama do nosso sistema solar” (ibid., p. 159).

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surgimento de novas conjecturas acerca do mundo real, surgiu o movimento do giro-linguístico, cuja obra percussora é o Tractatus logico-philosophicus, de Ludwig Wittgenstein.

De acordo com essa escola filosófica, o conhecimento é um processo interpretativo que empresta inteligibilidade às coisas, sendo o mundo da vida

submetido à nossa percepção sensível (olfato, visão, audição, tato e paladar), num “caos de sensações”7 organizado no nosso intelecto e interpretado na forma de linguagem, ingressando, então, no plano da realidade.

Nesse contexto, o movimento pelo qual o indivíduo se propõe a conhecer algo (ato de conhecer) se motiva na tentativa de estabelecer uma ordem ao mundo da experiência, sendo a evolução do conhecimento (como forma e conteúdo) concretizada por meio de uma sedimentação gradativa em três etapas apresentadas por Leonidas Hegenberg8: primeiramente, por meio da percepção, o indivíduo sabe de, identificando os objetos e os distribuindo em classes, o que o torna capaz de dirigir suas ações futuras, garantindo-lhe a possibilidade de sobrevivência9. Em seguida, em razão das atividades que os homens são compelidos a executar, sabe-se como os objetos funcionam, compreendendo a matéria, o comportamento e as transformações do mundo à sua volta. E, por fim, atinge-se o saber que, decorrente da aplicação de diversas teorias que permitem a construção de inferências atributivas de lógica ao mundo. Desse modo, o conhecimento se aperfeiçoa em três estágios: primeiramente, tem-se a

concretiza” (VILANOVA, Lourival. A teoria dos valores em Nietzsche. Diário de

Pernambuco, 27 abr. 1947).

7 KANT, Immanuel apud CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2008, p. 7.

8 HEGENBERG, Leonidas. Saber de e saber que: alicerces da racionalidade. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 19 et seq.

9 Neste sentido, Vilém Flusser sugere a ideia de uma constante conversação entre os planos da experiência e da realidade, na medida em que são estabelecidas relações no interior de um único intelecto, aprimorando o conhecimento acerca de determinado evento, como explica o filósofo: “os dados são formados como pasta caótica, as palavras vêm organizadas em frases. Os dados brutos vêm, por exemplo, na forma das seguintes palavras: dói, duro, marrom, quatro pernas, igual a: bati contra a mesa […] o intelecto em conversação conserva e aumenta o território da realidade” (FLUSSER, Vilém. Língua e

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apreensão dos objetos na forma de ideias, que passam a ser associadas com outras formulações, em juízos, que, por fim, servem para a construção de raciocínios.

Observa-se que, em qualquer dessas formas de manifestação do conhecimento, jamais podemos deixar o campo da linguagem, porque os objetos manifestados no plano da experiência representam meros eventos que, exclusivamente por intermédio do homem, que lhes atribui nomes, passam a integrar o plano dos fatos, a respeito dos quais se formulam proposições10. Sem adentrar no mérito da existência ontológica das coisas, “existindo ou não existindo tais entidade em si, elas somente entrarão para o âmbito do conhecimento quando vierem a fazer parte da intersubjetividade do social, ‘inteiramente’ tecida pela linguagem”11. Noutros termos, os dados brutos que não são captados pela percepção humana ou que, embora captados, não conseguem ser traduzidos em linguagem para que sobre eles o sujeito possa emitir qualquer juízo, deixam de ingressar no plano da realidade.

Partindo dessa ênfase conferida ao abismo entre os mundos real e ideal, a escola da filosofia da linguagem aponta a irredutibilidade do objeto às palavras, em flagrante contraposição às ideias fundantes da filosofia da consciência. Explicando a percepção do novo paradigma filosófico são as lições de clareza ímpar de Aurora Tomazini de Carvalho:

Exemplo disso pode ser observado quando buscamos o sentido de um termo no dicionário, não encontramos a coisa

10 Os objetos, por si só, somente terão um significado se caracterizados por palavras, pela língua falada, para ingressar na realidade perceptível do sujeito cognoscente. A realidade é constituída pelas coisas do mundo da experiência interpretadas e compreendidas pela língua (FLUSSER, Vilém apud TOMÉ, Fabiana Del Padre. Vilém Flusser e o constructivismo lógico-semântico. In: HARET, Florence; CARNEIRO, Jerson. Vilém Flusser e juristas. São Paulo: Noeses, 2009). Neste sentido, a realidade é o produto de “uma atitude dialética, uma vez que se trata de inter-relação entre sujeito e objeto, um elemento se adequando concomitantemente ao outro para que se ponha “in” o ato de conhecimento”(REALE, Miguel. Cinco temas do culturalismo. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 6).

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em si (referente), mas outras palavras. Deste modo, podemos afirmar que a correspondência não se dá entre um termo e a coisa, mas entre um termo e outros, ou seja, entre linguagem. A essência ou a natureza das coisas, idealizada pela filosofia da consciência, é algo intangível.12

Com fundamento no corte feito por Kant entre os planos do ser e do dever ser, foi abandonada a ideia de subsunção do objeto em si ao juízo formulado a respeito dele, passando a ser defendido o conhecimento como uma relação entre linguagens que estão em constante mutação.

Assim, o conhecimento não é mais a mera tradução do objeto pela língua, mas o estudo dos termos que o homem emprega para referir-se ao objeto. Como se pode notar, a linguagem tornou-se essencial expediente para a própria construção dos objetos encontrados no mundo da experiência, captados pelos nossos sentidos e organizados no intelecto com os demais elementos cognoscitivos13.

Por causa da então reconhecida impossibilidade de acessarmos o mundo pelo emprego da linguagem para meramente refletirmos a natureza do dado bruto, o conhecimento passou a consistir numa “correlação transcendental subjetivo-objetiva”14: atribuindo, na visão dessa corrente filosófica, um caráter dialético ao processo de conhecer, em que há uma relação de interdependência entre o sujeito e o objeto, que apenas existem concomitantemente. Em outros termos, “o sujeito só o é perante um objeto e o objeto só o é objeto em face de um sujeito”15, visto que é por meio do processo de conhecimento do dado bruto que se constrói o sujeito e a sua concepção a respeito do objeto, sendo que

12 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito: o Constructivismo Lógico-Semântico. São Paulo: Noeses, 2009, p. 15.

13 “Os relatos – ou, já podemos assim dizer, os fatos se articulam sempre uns com outros construindo uma realidade, tal como os fios se juntam para formar um tecido” (LINS, Robson Maia. A reiteração e as normas jurídicas tributárias sancionatórias – a multa qualificada da Lei 9.430/96. In: SOUZA, Priscila de. VII Congresso Nacional de Estudos

Tributários. São Paulo: Noeses, 2011, p. 1107).

14 REALE, Miguel. Teoria Tridimensional do Direito. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 79. 15 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Vilém Flusser e o constructivismo lógico-semântico. In:

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tanto o homem quanto o dado bruto não têm sentido se não interpretados. Sobre esta relação dialética entre sujeito e objeto, cumpre-nos reproduzir as lições de Paulo de Barros Carvalho, in verbis:

[…] o processo de conhecimento dos objetos do mundo não se completa sem transitar, obrigatoriamente, pela subjetividade do ser cognoscente, quer os do mundo exterior como os de seu próprio universo interior, fazendo-se presentes em sua consciência por uma das formas […].16

Essas ponderações acerca da imprescindibilidade da linguagem para a expressão do conhecimento carregam justamente a noção que serviu de fundamento para a escolha do método proclamado neste trabalho – o constructivismo lógico-semântico – para o fim de nos aproximarmos e construirmos um discurso consistente a respeito do tema investigado. De acordo com essa técnica hermenêutica, o sujeito intervém na “con-formación del objeto conocido”17 e amarra a construção de sentido nos planos lógico, semântico e pragmático, numa intensa tentativa de, abrangendo esses três campos do conhecimento, construir, da maneira mais acurada possível, o sentido do objeto.

O conhecimento dos objetos pelas construções linguísticas do intelecto humano é alcançado por meio do estudo dos signos que compõem o discurso cognoscível, levando em consideração a “significação das palavras tal como elas existem numa língua”18. Em contraposição aos ideais defendidos por Kelsen em sua Teoria Pura do Direito, encontra-se aqui uma levíssima impureza metodológica, que admite uma espécie de interdisciplinaridade de elementos para a construção de sentido dos enunciados linguísticos.

16 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2008, p. 14.

17 MUÑOZ, Jocobo (Dir.). Diccionário Espasa. Madrid: Espasa, 2003, p. 107.

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Enfim, acrescentando às premissas do paradigma metodológico que realça a importância do dado linguístico para o conhecimento, a construção de sentido da realidade é concretizada pelo estudo da sintaxe e da semântica da linguagem, imprescindivelmente perpassando pelo aspecto pragmático da língua, analisando-se as mensagens com o emprego da técnica hermenêutico-analítica – decompondo o objeto em unidades simples – a fim de facilitar a compreensão do fenômeno estudado e construir a unicidade do objeto por meio de seu detalhamento, sem deixar de lado um “culturalismo sadio”19, que confere sentido aos enunciados em cotejo com fatores históricos e axiológicos20.

1.2 O estudo do Direito a partir das premissas metodológicas do constructivismo lógico-semântico

Num primeiro momento, é importante apontarmos a advertência quanto aos diversos planos de abordagem que podem ser objeto de estudo.

Com fundamento nas premissas expostas no item precedente, já podemos falar na existência de dois domínios distintos, cuja diferença repousa no dado linguístico: âmbitos dos eventos e dos fatos. Aquelas manifestações que não são submetidas à intuição sensível do homem, verificadas apenas no campo

19 Ao se referir ao jusfilósofo Lourival Vilanova, cujos trabalhos foram decisivos para o desenvolvimento do constructivismo lógico-semântico, Paulo de Barros Carvalho emprega a expressão culturalismo sadio como uma convivência ao mesmo tempo comedida e harmoniosa deste paradigma filosófico com a escola culturalista, evitando qualquer crítica que aponte para o sincretismo metodológico (CARVALHO, Paulo de Barros (Coord.).

Constructivismo Lógico-Semântico. São Paulo: Noeses, 2014, p. XI).

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fenomênico, ou que, apesar de sujeitas à apreciação do indivíduo, não são captadas pelo seu intelecto, são meros eventos; ao passo que, quando construída a significação dos fenômenos, podemos falar em fatos sociais, isto é, em conceitos de eventos relatados através da língua.

Acrescentemos que, na tessitura da facticidade social, emerge a linguagem do direito positivo, que seleciona parcelas factuais, relacionando-as a consequências jurídicas, com o intuito de regular as condutas intersubjetivas numa sociedade. A linguagem do direito positivo manifesta-se na forma eminentemente prescritiva, orientando o agir dos indivíduos, por meio da descrição de critérios informadores de uma hipótese factual ou de determinadas situações delimitadas no tempo e espaço, imputando-lhes relações jurídicas.

Essa tradução dos fatos para a construção da linguagem jurídica é realizada exclusivamente por meio do código e procedimento reputados competentes pelo sistema jurídico, morando, nesse aspecto, uma importante diferença entre os planos do fato e do direito positivo21.

Há, ainda, o campo da ciência do direito positivo, à qual cumpre elaborar proposições crítico-descritivas a respeito dos enunciados prescritivos que compõem o direito positivo. Mediante o estudo do seu objeto, a ciência cria teorias para aprofundar o conhecimento a respeito da legislação e traduz o direito positivo para a sua língua predominantemente descritiva.

Por essas ligeiras, porém relevantes, ponderações, ressalta aos olhos a circunstância de que todos esses planos têm um “quantum de referenciabilidade”22, de modo que a linguagem social se reporta ao evento,

21 Sobre a linguagem jurídica: “a construção do fato jurídico nada mais é que a constituição de um fraseado normativo capaz de justapor-se como antecedente normativo de uma norma individual e concreta, dentro das regras sintáticas ditadas pela gramática do direito, assim como de acordo com os limites semânticos arquitetados pela hipótese da norma geral e abstrata” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos Jurídicos da Incidência. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 148).

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assim como a linguagem prescritiva jurídica aos fatos sociais, e a ciência do direito aos enunciados prescritivos. Elucidando essa relação, podemos citar o seguinte exemplo: o nascimento de uma criança é um evento; a comunicação do pai aos parentes de que a criança nasceu é um fato que, uma vez registrado em cartório, dá ensejo a um fato jurídico, sendo, por seu turno, passível de estudo do cientista do direito, elaborador de proposições crítico-descritivas a respeito dos direitos e deveres dos cidadãos.

No presente trabalho, é nosso objeto de estudo o conjunto de enunciados prescritivos que compõem o direito positivo vigente, mormente os dispositivos legais que tratam da fiscalização tributária, sobre os quais lançaremos as luzes do pensamento hermenêutico e analítico.

1.2.1 Construção de sentido do Direito

Porque a fiscalização tributária é instituto criado no bojo do direito positivo, seu regime é pautado, exclusivamente, em normas jurídicas, e a sua concretização culmina, obrigatoriamente, com a construção, também, de uma proposição normativa. Nesse contexto, é imprescindível delimitarmos o sentido que atribuímos à expressão norma jurídica.

Partindo das premissas do constructivismo lógico-semântico, o cumprimento da função de orientar as ações dos indivíduos na sociedade pelos enunciados prescritivos não decorre de uma “norma jurídica previamente dada no âmbito do ordenamento jurídico coesa, que fosse aplicável por meio do silogismo”23. Isso porque admitimos ser imprescindível a atuação de um intérprete, em contato com as marcas de tinta do papel, para atribuir-lhes significação.

Noutras palavras, os dispositivos legais, por si só, assemelham-se ao dado bruto apresentado no item precedente, sendo que as normas são as significações

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construídas na mente do sujeito cognoscente a partir da apreensão da linguagem prescritiva institucionalizada. Reforçando esta distinção entre os enunciados prescritivos e normas jurídicas, são as palavras de Ricardo Guastini:

[…] a distinção entre disposição e norma não pretende ser uma distinção ontológica entre enunciados e alguma coisa distinta dos enunciados. Trata-se, mais modestamente, da distinção entre duas classes de enunciados. […] a disposição é um enunciado que constitui o objeto da interpretação. A norma é um enunciado que constitui o produto, o resultado da interpretação24.

Com efeito, o exegeta não entra em contato direto com uma norma posta, tampouco extrai ou descobre o sentido da legislação, mas constrói a sua significação, permeada de fatores históricos e axiológicos que influenciam o sujeito cognoscente. Nessa trajetória interpretativa, o estudioso trilha o percurso gerador de sentido proposto por Paulo de Barros Carvalho25, que se completa em quatro etapas, assim discriminadas: S1 (plano dos enunciados); S2 (plano das proposições); S3 (plano das normas); S4 (plano da sistematização).

Nesse modelo, há, primeiramente, o estabelecimento de um contato entre o intérprete e o conjunto de enunciados prescritivos (S1). Ao ler o texto, o sujeito dá início a um processo de atribuição de significações ao objeto, construindo proposições isoladas acerca do que estuda (S2), que, “embora proposicionais, não são suficientes, em si, para a compreensão da mensagem legislada”26, sendo necessária a estruturação das significações na fórmula lógica hipotético-condicional (“Se o antecedente, então deve ser o consequente”: H → C), para que passem a ser proposições normativas em sentido completo, possibilitando a apreensão da mensagem prescritiva (S3). Depois de estruturadas, as normas

24 GUASTINI, Riccardo. Das fontes às normas. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 28. 25 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos Jurídicos da Incidência.

São Paulo: Saraiva, 2007, p. 83 et seq.

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devem ser situadas no sistema de significações atribuídas às demais prescrições legais, vinculadas por relações de subordinação e coordenação (S4).

Assim, numa acepção estrita27, as normas jurídicas são as significações de sentido deôntico completo, estruturadas na forma lógica hipotético-condicional, construídas a partir da linguagem prescritiva do direito, verificadas nos estágios S3 e S4 do percurso gerador de sentido. Essas unidades que compõem o direito positivo são classificadas arbitrariamente pelos estudiosos, a depender do estudo que pretendem empreender, agrupando em categorias os elementos submetidos à sua análise, sobre o fundamento de diferença que distancia os conceitos que os designam28.

27 Esta unidade do sistema, que chamamos de mínimo irredutível de manifestação do deôntico, depende, costumeiramente, da reunião de uma série de significações construídas a partir de diferentes enunciados prescritivos. Em que pese à circunstância de reconhecermos força prescritiva aos enunciados positivados isoladamente, “este teor de prescritividade não basta, ficando na dependência de integrações em unidades normativas, com mínimos deônticos completos. Somente a norma jurídica, tomada em sua integridade constitutiva, terá condão de expressar o sentido cabal dos mandamentos da autoridade que legisla” Com efeito, a ordem pague a quantia de x reais prescinde de outras informações, tais como pagar para quem, quando, por quê? (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito

Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2008, p. 189-190).

Observe-se que, numa acepção ampla, a expressão norma jurídica designa diferentes unidades do sistema jurídico em seus quatro planos de expressão: “se pensarmos no direito positivo, levando-se em conta seu plano de expressão (S1), as unidades do sistema são enunciados prescritivos; se avaliarmos o plano das significações construídas a partir dos enunciados (S2), as unidades do sistema são proposições jurídicas; e se tomarmos o direito como o conjunto de significações deonticamente estruturadas (S3), que mantêm relações de coordenação e subordinação entre si (S4), as unidades do sistema jurídico são aquilo que denominamos de normas jurídicas em sentido estrito. Neste sentido, considerando a expressão ‘norma jurídica’, quando utilizada para apontar indiscriminadamente as unidades do sistema jurídico, podemos denotar: (i) enunciados do direito positivo; (ii) a significação deles construída; ou (iii) a significação deonticamente estruturada, dependendo do plano em que o intérprete trabalha” (CARVALHO, Aurora Tomazini de.

Curso de Teoria Geral do Direito: o Constructivismo Lógico-Semântico. São Paulo:

Noeses, 2009, p. 266).

28 Neste sentido: “é sabido que toda classificação revela certa arbitrariedade, porque os critérios utilizados são relativos (nunca absolutos), sendo algumas das convenções estabelecidas pelo próprio intérprete. Por essa mesma razão, não são as classificações certas ou erradas, válidas ou inválidas. São simplesmente úteis ou inúteis, dependendo da função que lhes possa ser atribuída pelo sujeito cognoscente, para efeito de verificação e identificação das espécies analisadas” (MARQUES, Márcio Severo. Classificação

(28)

Numa proposta classificatória cuja discriminação radica no grau de conotação axiológica, há as regras e os princípios. Conquanto objeto cultural, as significações construídas a partir dos enunciados prescritivos sempre estarão permeadas de valores, porém os princípios detêm elevada relevância valorativa, sendo que influenciam fortemente na construção de outras normas jurídicas.

As normas podem ser, ainda, classificadas como de conduta ou de estrutura29: em que pese a legitimidade de afirmar que todas as normas se dirigem à regulação das relações intersubjetivas e, portanto, se enquadram na categoria de regras de conduta, determinados enunciados veiculam disposições relacionadas à construção de outras normas jurídicas, a justificar a outorga do nome de normas de estrutura. Um exemplo de norma de conduta é se não cumprir a obrigação tributária, então deve ser a cobrança forçada do débito, acrescido dos devidos consectários legais, bem como a aplicação de multa administrativa pelo descumprimento de disposição normativa, enquanto que é norma de estrutura o juízo hipotético-condicional que regula a produção de norma individual e concreta derivada da aplicação de normas pertinentes à fiscalização tributária.

Outra proposta classificatória enumera normas abstratas ou concretas e gerais ou individuais. Serão abstratas quando construídas a partir de enunciados que descrevem características que permitem identificar a classe de fatos que podem vir a ocorrer, e serão concretas quando os dispositivos legais mencionarem um fato que já se consumou em determinadas coordenadas de tempo e espaço. Por seu turno, serão normas gerais quando a relação jurídica prescrita no consequente da regra não individualiza os sujeitos ou o objeto da relação, e

(29)

individuais quando identificadas as partes que compõem o vínculo jurídico. A partir da combinação dessas espécies de enunciados normativos, são construídas as normas gerais e abstratas, gerais e concretas, individuais e abstratas e individuais e concretas.

1.2.2 Norma jurídica completa

Cumpre-nos observar que, no sistema jurídico, caracterizado pela sua coercitividade, as normas vêm relacionadas logicamente a outras, no sentido de que para cada direito e dever material corresponde uma sanção aplicável pelo Estado quando não observadas as obrigações imputadas pela legislação. Expliquemos:

Todos os conjuntos normativos são dotados de força coativa, isto é, para que as regras não sejam mantidas como meras expectativas, são-lhes relacionadas sanções no caso da sua não observância (e.g., leis da Igreja: se cometer pecado, então deve ser a punição no juízo final). A diferença primordial entre o ordenamento jurídico e as demais normas está na forma como a coação é exercida: no Direito, a aplicação e execução de sanções é realizada por intermédio do Estado-juiz30.

Nesse sentido, podemos falar numa norma jurídica na forma completa, composta de duas normas em sentido estrito: uma norma primária, que estatui direitos e deveres materiais, e outra secundária, que sanciona o inadimplemento da primeira31. Para o enfrentamento do tema que nos propomos estudar, são de

mister importância alguns esclarecimentos acerca dessa estrutura normativa plena.

30 Esta é uma ponderação relevantíssima apontada por grandes vozes do Direito, entre elas, a de Hans Kelsen: “As sanções estatuídas por uma ordem jurídica são – diferentemente das sanções transcendentes – sanções socialmente imanentes e – diversamente daquelas, que consistem na simples aprovação ou desaprovação socialmente organizada” (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 23).

(30)

Relembrando, todas as normas em sentido estrito estão organizadas na forma lógica hipotético-condicional, de modo que o antecedente (hipótese) implica o consequente (tese). Observe-se que essa relação implicacional está articulada no interior de cada proposição normativa é deonticamente modalizada: se o antecedente, então deve ser obrigatório (O), proibido (V) ou permitido (P) o consequente, nisso se diferenciando o direito positivo, regido pela causalidade jurídica, das leis naturais, regidas pela lógica da causalidade natural (se..., então é)32.

A norma primária contém, no seu antecedente, a descrição de um fato hipotético, prescrevendo, no seu consequente, uma relação entre sujeitos com direitos e deveres materiais correlatos.

Adotando o esforço classificatório das normas empreendido por Aurora Tomazini de Carvalho33, podemos fracionar as normas primárias, que possuem no seu consequente uma relação jurídica exclusivamente diádica (entre dois sujeitos), não fazendo qualquer referência à providência jurisdicional, em normas primárias precedente, derivada punitiva e derivada não punitiva.

A norma primária precedente prescreve, na sua hipótese, um fato lícito e, na sua consequência, uma relação jurídica entre sujeitos com direitos e deveres. Exemplo típico dessa espécie normativa são as normas que instituem o dever instrumental de suportar a fiscalização, descritivas de fatos jurídicos ensejadores da fiscalização, indicando seus critérios material, espacial e

32 “Tanto o ‘mundo do ser’ como o ‘mundo do dever ser’ constituem corpos de linguagem, nos quais atuam, respectivamente, a causalidade natural e a causalidade jurídica” (PAULINO, Maria Ângela Lopes. A teoria das relações na compreensão do Direito Positivo. In: CARVALHO, Paulo de Barros (Coord.); CARVALHO, Aurora Tomazini (Org.). Constructivismo Lógico-Semântico. São Paulo: Noeses, 2014, p. 388). Enquanto a causalidade natural tem essência eminentemente descritiva, a causalidade jurídica não só descreve fatos, mas, mediante um ato de valoração, modaliza positiva ou negativamente a conduta.

(31)

temporal caracterizadores, e prescritivas de relações obrigacionais entre o sujeito ativo e passivo, em torno de uma prestação.

A classe das normas primárias derivadas se funda no discrímen de o antecedente do juízo implicacional pressupor a existência de uma prescrição contida em outra norma, qual seja, na norma primária precedente.

Dentro dessa proposta, as normas primárias derivadas punitivas descrevem um ilícito decorrente do inadimplemento da obrigação constituída pela incidência e aplicação da norma primária precedente e prescrevem uma relação jurídica sancionatória entre os mesmos sujeitos que se relacionam na norma primária precedente não observada. A multa de ofício, constituída pela Administração Tributária em decorrência da constatação, mediante o desenvolvimento de procedimento fiscalizatório, da constituição inadequada do crédito tributário e do consequente não recolhimento do tributo dentro do prazo previsto na regra-matriz de incidência tributária, caracteriza este tipo normativo34.

Por sua vez, a norma primária derivada não punitiva pressupõe, assim como a norma primária derivada punitiva, a norma primária precedente, contudo não descreve o inadimplemento desta última no seu antecedente, mas o seu cumprimento, prescrevendo, no seu consequente, uma relação jurídica sem as notas da punibilidade. A título exemplificativo, podemos mencionar as normas individuais e concretas eventualmente expedidas ao término da atividade fiscalizatória, que homologam a atividade desempenhada pelo contribuinte ao constituir o crédito tributário35.

Em remate, a norma secundária prescreve uma providência coercitivo-sancionatória aplicável pelo Estado-Juiz na hipótese de descumprimento das

34 Minuciosamente explicando: Se prestar serviço, deve ser o pagamento do ISS (norma primária precedente). Dado que X prestou serviço e não pagou ISS, então deve ser a aplicação da multa punitiva (norma primária derivada sancionatória).

(32)

normas primárias. Obrigatoriamente, esta categoria normativa descreve no seu antecedente um fato ilícito, representado pela inobservância de uma norma primária, e institui, no seu consequente, uma relação entre o sujeito ativo da relação jurídica não adimplida e o órgão judicial, que atuará coercitivamente, forçando o sujeito passivo da obrigação prescrita na norma primária a satisfazê-la. São exemplos de normas secundárias aquelas que prescrevem o direito de o ente político promover a Execução Fiscal de tributo não adimplido, bem como aquelas que garantem o direito de o administrado impetrar Mandado de Segurança em razão de conduta arbitrária da Administração em sede de procedimento fiscalizatório.

1.2.3 Processo de positivação do Direito

Apresentado o processo de construção de sentido dos enunciados prescritivos, bem como a estrutura das unidades que compõem o direito positivo, convém explicarmos o modo como a norma produz seus efeitos (eficácia pragmática), regulando as condutas intersubjetivas.

A doutrina tradicional, cujo expoente precursor é Pontes de Miranda, defende a teoria da incidência do direito positivo como operação automática e infalível. Negando a existência de qualquer distinção entre os planos factual e jurídico, a “incidência das regras jurídicas independe de que alguém, ainda os interessados, conheçam a regra jurídica”36, de modo que a lei, por si só, regularia as situações factuais verificadas no seio da sociedade: uma vez ocorrido um fato que se subsome ao conceito previsto no antecedente de uma previsão legal, ocorreria a incidência da norma, posteriormente aplicada ao caso concreto, pelo Estado-Juiz, na hipótese da sua não observância.

(33)

Partindo do referencial teórico que adotamos, o mero acontecimento factual de uma situação que se enquadra àquele conceito previsto na hipótese de uma norma jurídica não basta, por si só, para a incidência normativa e o nascimento do vínculo obrigacional. Isso por causa de duas razões fundamentais: a primeira, conforme já tratado no item 1.2.1. Construção de sentido do Direito, não há norma dada no sistema jurídico, de modo que esta significação deve ser, obrigatoriamente, construída por um intérprete; a segunda, o direito positivo é sintaticamente fechado e regula a sua reprodução, permitindo a inserção de novos elementos exclusivamente pelos sujeitos autorizados no sistema, mediante o relato em linguagem competente, empregando o código previamente habilitado pelo sistema e o procedimento previsto na lei.

Com efeito, a atividade de aplicação e construção do direito impõe a existência de um intérprete, que desempenha, fundamentalmente, duas funções: interpreta

o direito positivo, construindo e escolhendo a norma aplicável ao caso concreto, segundo a versão que ele próprio desenha do fato social com base em enunciados que o relatam37.

Assim, na nossa concepção, a incidência e a aplicação do Direito ocorrem num único momento, que pressupõe a construção de uma norma a partir do direito posto, a cuja hipótese se subsome a enunciação de um fato jurídico. É o ato de aplicação do intérprete que faz a norma incidir.

(34)

Nesse complexo processo de incidência e aplicação do Direito, ao qual outorgamos o nome de positivação38, a previsão geral e abstrata ganha concretude com a produção de normas individuais e concretas, que daquelas derivam.

A título ilustrativo, para a incidência e aplicação das prescrições tributárias impositivas, sancionatórias (leia-se normas que preveem sanções administrativas) e homologatórias da atividade do administrado, é pressuposta a compreensão do agente fiscal, pautada na orientação da Administração Pública, acerca das características que tipificam a hipótese de cada espécie normativa. Pois que esse mesmo sujeito competente, por meio da atividade fiscalizatória, deve lançar os seus olhos sobre os documentos que relatam a atividade desempenhada pelos administrados e, mediante um ato valorativo, traduzir juridicamente os fatos, subsumindo-os às normas que afirmam o fato jurídico tributário ou infirmam ou confirmam a atividade do particular.

Frise-se: para a positivação do Direito Tributário, tão importante quanto a formulação da norma jurídica geral e abstrata é a construção do desenho dos fatos concretizados pelos sujeitos de direito, mediante a atividade fiscalizatória.

1.3 A delimitação do objeto de estudo

Partindo da metodologia do constructivismo lógico-semântico, sobressai a relevância dos signos para conhecermos os objetos. Isso porque, para nos referirmos ao mundo da experiência, somos compelidos a empregar signos que os representam. Em estudo aprofundado, Edmund Husserl estabeleceu que essa entidade (signo) é uma relação triádica entre um suporte físico, um significado e uma significação, sendo que o suporte físico é a parte material do signo, apreendida pelas nossas sensações (e.g., marcas de tinta no papel, gesto com as

(35)

mãos, ondas sonoras), que se refere ao seu significado, consistente na sua representação individualizada, que, por sua vez, suscita na mente do intérprete uma ideia, que é a sua significação39.

Nesta senda, observe-se que as palavras são signos da espécie símbolos

arbitrariamente construídos, não guardando, em princípio, qualquer ligação com o objeto do mundo que significam 40. Partindo dessa premissa e contextualizando-a com a estrutura triádica dos signos proposta por Husserl, temos que o conceito de determinado termo é justamente a significação suscitada na mente do intérprete, é a ideia manifestada na consciência do sujeito cosgnoscente a respeito do signo, não do objeto em si, portanto. A definição, por seu turno, é o conceito demarcado linguisticamente, consiste no ato de “eleger critérios que apontem determinada forma de uso da palavra, a fim de introduzi-la ou identificá-la num contexto comunicacional”41

. A definição pode ser realizada de diversas formas, de modo que, exemplificativamente, podemos falar em definição denotativa, enumerando os objetos que pertencem à classe, ao grupo, ou melhor, que são abarcados por um

39 Estas ponderações reforçam a ideia de que não somos capazes de falar a respeito dos objetos em si, mas dos signos que utilizamos para nos reportar ao mundo da experiência. Acerca da distinção entre a ideia que temos dos objetos e dos objetos em si mesmos, são as palavras de Paulo de Barros Carvalho: “É comum a confusão entre ‘objeto’ do conhecimento e o ‘objeto’ que vemos ali, concretamente existente no mundo real. O que está em nossa consciência é o conteúdo da forma, não o objeto mesmo, tomado na sua contextura físico-material. Os filósofos separam de maneira clara essas duas situações, referindo-se a ‘objeto’ em sentido amplo: a coisa-em-si, percebida por nossos órgãos sensoriais, e ‘objeto’ em sentido estrito, vale dizer, em sentido epistêmico: conteúdo de uma forma de consciência. Efeito prático imediato dessa distinção é a lembrança de William James de que ‘a palavra ‘cão’ não morde’” (CARVALHO, Paulo de Barros.

Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2008, p. 14).

40 “Um símbolo é um signo que perderia o caráter que o torna um signo se não houvesse um interpretante. Tal é o caso de qualquer elocução de discurso que significa apenas por força de compreender-se que possui essa significação” (PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2005, p. 74). Para o autor, os signos podem ser classificados segundo o tipo de associação mantida entre o suporte físico e o significado. Os sintomas patológicos são índices, uma vez que mantém conexão física com o objeto que indicam e o significado; os desenhos figurativos, porque procuram reproduzir os objetos a que se referem, são ícones e, por fim, as palavras, que são arbitrariamente construídas, são um exemplo de símbolo.

(36)

mesmo suporte físico; e, conotativa, trazendo critérios que permitem identificar todos os objetos que podem ser denominados por determinado vocábulo, trazendo as notas necessárias para que o significado enquadre-se ao suporte físico42.

Nos tópicos subsequentes, pretendemos esclarecer o nosso conceito da expressão fiscalização tributária, de modo a delimitar o objeto que nos propomos a estudar nesta dissertação.

1.3.1 Relações jurídico-tributárias

Para a devida compreensão do nosso objeto de estudo, são imprescindíveis algumas breves anotações a respeito das relações jurídico-tributárias.

Em sentido estrito, a relação jurídica é um vínculo interpessoal contido no consequente das normas jurídicas individuais e concretas e instaurado em razão da incidência jurídica, manifestada em “direitos, faculdades, autorizações, poderes, pretensões, que se conferem a um sujeito-de-direito (estão) em relação necessária com condutas de outros sujeitos-de-direito”43.

Da incidência e aplicação da legislação tributária podemos falar no nascimento de duas espécies de relações jurídicas, que dão ensejo ao nascimento do dever: (i) de recolher determinado montante aos cofres públicos a título de impostos,

42 Ao esclarecer acerca dos institutos da definição denotativa e conotativa, elucidam Ricardo Guiborg, Alejandro Gigliani e Ricardo Guarinoni: “El conjunto de todos los objetos o entidades que caben en la palabra ‘ciudad’ se llama la denotación de esta palabra. […] Es conjunto de estos requisitos o razones, es decir, el criterio de uso de una palabra de clase (determinante y demostrativo del concepto correspondiente) se llama designación de esa palabra” (Introducción al conocimiento científico. Buenos Aires: Eudeba, 2000, p. 26). Em termos ordinários, portanto, a denotação é uma espécie do gênero conotação, isto é, é

um núcleo forte do sentido ao qual se somaria uma área confusa e tonalizada da conotação.

Por isso, um texto denotativo transmite uma mensagem inequívoca, com menores possibilidades de interpretação, visando a suscitar uma única significação, e os textos conotativos são ambíguos e plurissêmicos, carregando diversas formas de interpretação e, consequentemente, de significações.

(37)

taxas, empréstimos compulsórios, contribuições gerais e contribuições de melhoria, e (ii) de praticar determinadas condutas sem expressão patrimonial, instituídas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos44. À primeira o Código Tributário Nacional chamou de obrigação principal e à segunda, de obrigação acessória45.

Preliminarmente, cumpre observar que, conforme leciona a mais recente doutrina46, o termo obrigações acessórias não é adequado para rotular a significação que pretende suscitar, em decorrência de duas ponderações:

A obrigação, mais profundamente estudada no âmbito do Direito Civil, pressupõe uma característica inexistente nessa espécie de vínculo acessório, qual seja, a sua possível quantificação pecuniária. Nesse aspecto, é importante ressaltar que, em que pese o parágrafo terceiro do artigo 113 do Código Tributário Nacional prescrever que a falta da observância de um dever instrumental enseja a sua conversão em obrigação principal, deve-se

44 “Desse modo, exceto a obrigação de levar certa quantia em dinheiro aos cofres públicos, advinda da relação jurídica tributária em sentido estrito, […] todos os demais deveres impostos a esse mesmo sujeito passivo, defronte ao tributo instituído, com a inerente característica da impossibilidade de mensuração econômica, de cunho administrativo, devem ser entendidos como deveres instrumentais” (MARICATO, Andreia Fogaça Rodrigues. Os impactos das mudanças nos deveres instrumentais com a informatização

fiscal: constituição do crédito tributário; prescrição e decadência; e prova tributária. 2014.

Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2014).

45 “Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. § 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente. § 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. § 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.”

46 Neste sentido: “tais relações são conhecidas pela designação imprecisa de ‘obrigações acessórias’, nome impróprio, uma vez que não apresentam o elemento caracterizador dos laços obrigacionais, inexistindo nelas prestação passível de transformação em termos pecuniários” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 355); e “entendemos que não se pode afirmar que essas obrigações tributárias são relações jurídicas ‘lato sensu’ acessórias. E justamente porque calcados nesses pressupostos, entendemos ser cientificamente oportuno alterar a denominação das obrigações tributárias ‘acessórias’ para ‘obrigações tributárias instrumentais” (ZOCKUN, Maurício. Regime Jurídico da Obrigação Tributária

(38)

compreender que o desatendimento à legislação que institui dever instrumental dá razão à aplicação de sanções, eventualmente expressadas em valores pecuniários, não sendo outorgada, contudo, semblante pecuniário aos deveres instrumentais, que mantém as suas características independentemente da constatação do seu não cumprimento pelos utentes do Direito.

Ademais47, as obrigações principal e acessória não são “umbilicalmente associadas”48, ou seja, a legitimidade da obrigação acessória não depende da eclosão dos efeitos jurídicos da obrigação principal. Nesse sentido, sujeitos isentos e imunes à tributação são obrigados a cumprir deveres instrumentais e administrados em geral são submetidos a procedimentos fiscalizatórios, sendo-lhes imposto o cumprimento de diversos deveres instrumentais, sem que seja necessariamente constatada a ocorrência do fato jurídico tributário, ensejador do nascimento da obrigação principal 49 . Embora os referidos deveres

47 Talvez conferindo demasiada autonomia aos deveres instrumentais, ensina Aliomar Baleeiro, “as ‘obrigações acessórias’ têm vida própria, nascendo de hipótese específica e seguindo regime independente […] somente se extinguindo naqueles casos disciplinados em lei” (BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 702). 48 ZOCKUN, Maurício. Regime Jurídico da Obrigação Tributária Acessória. São Paulo:

Malheiros, 2005, p. 116.

49 “TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CDA. MULTA POR

(39)

pressuponham a existência lógica da obrigação tributária, dispensam o seu surgimento in concreto50, faltando motivos para ser empregado o adjetivo

acessória à relação em comento.

Postas essas razões, seguimos a sorte daqueles estudiosos que julgam ser mais conveniente atribuirmos às referidas obrigações o termo deveres instrumentais51: dever, porque previstos na lei, e instrumentais, pois que conferem operacionalidade à regra-matriz de incidência tributária, fornecendo-lhe motivação para a sua incidência e aplicação. Decorrência lógica, as então nomeadas obrigações tributárias principais serão simplesmente mencionadas como obrigações tributárias.

Superada a nomenclatura das relações instituídas pela aplicação das leis tributárias, passemos a estudá-las.

Em razão da subsunção de determinado fato signo presuntivo de riqueza52 previsto na hipótese de uma regra-matriz de incidência tributária, surgem os elementos da relação jurídica tributária, cujo objeto é uma prestação pecuniária, na forma de tributo.

Justamente para viabilizar a fiscalização do cumprimento das normas que prescrevem a instituição das obrigações tributárias, existem os deveres instrumentais, que veiculam mandamentos de fazer ou não fazer, “preordenados a facilitar o conhecimento, o controle e a arrecadação da

especial provido.” (REsp 1035798/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/04/2009, DJe 06/05/2009).

50 Neste sentido, são as lições de Luis Eduardo Schoueri: “não é necessário que haja um tributo devido para que surja o poder de fiscalizar; ao contrário, da fiscalização pode-se concluir que nenhum tributo é devido. Mas, justamente para que se tenha tal certeza, haverá a fiscalização. Assim, por exemplo, um ente imune está sujeito à fiscalização, que investigará se os requisitos constitucionais ou da Lei Complementar, se for o caso, foram preenchidos” (SHOUERI, Luis Eduardo. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 721).

51 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 357 et seq.

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importância devida como tributo”53.Os deveres instrumentais representam uma das espécies de prova competentes para formar a convicção do agente fiscalizador a respeito dos acontecimentos factuais54 e, ato contínuo, subsumir o fato à norma.

Com efeito, sob uma perspectiva, ambas as espécies de relações jurídico-tributárias “colaboram, em momentos distintos, para a realização do mesmo fim, qual seja, a implantação do tributo”55. As normas prescritivas de obrigações acessórias são aplicadas para inserir na realidade jurídica linguagem que viabiliza o conhecimento acerca dos acontecimentos factuais e o controle do fiel cumprimento da prestação tributária; e as normas que enunciam obrigações principais, que pressupõem o tecido de linguagem produzido pelo cumprimento das obrigações acessórias, são positivadas, constituindo o crédito tributário.

São exemplos de espécies de obrigações tributárias aquelas decorrentes da incidência e aplicação das regras-matrizes de incidência do ISS e do ICMS, e de deveres instrumentais a escrituração de livros, inscrição em cadastro de contribuintes, apresentação de declarações, promoção de levantamentos físicos, econômicos ou financeiros, não recebimento de mercadorias desacompanhadas de nota fiscal, manutenção de dados e documentos fiscais e, inclusive, a sujeição à fiscalização realizada pela Administração, que é o objeto de estudo do presente trabalho.

53 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 355.

54 Já individualizando uma espécie de dever instrumental, Fabiana Del Padre Tomé ressalta prescrição normativa que atribui caráter probatório aos elementos que relatam fatos sociais: “Vale lembrar, ainda, que o atual Código Civil dispõe, em seu art. 226, que ‘os livros e fichas dos empresários e sociedades provam contra as pessoas a que pertencem, e, em seu favor, quando, escriturados sem vício extrínseco ou intrínseco, foram confirmados por outros subsídios’” (TOMÉ, Fabiana Del Padre. A Prova no Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Noeses, 2011, p. 113-114).

(41)

Por fim, é importante observarmos que, conquanto o cumprimento dos deveres instrumentais dê origem a um substrato linguístico que relata o acontecimento de eventos possivelmente tributáveis, referida linguagem não basta, por si só, para a constituição da relação jurídico-tributária obrigacional em torno do objeto prestacional. É imprescindível a enunciação de uma norma individual e concreta, que veicula a obrigação tributária individualizada no tempo e espaço, por agente competente, “num resumo objetivo daquele tecido de linguagem, mais amplo e abrangente, constante dos talonários de notas fiscais, livros e outros feitos jurídico-contábeis”56.

Fundamentalmente57, existem dois sujeitos competentes para produzir as normas individuais e concretas que veiculam as relações jurídicas tributárias decorrentes da positivação de normas tributantes e motivadas na linguagem constante nos documentos decorrentes do cumprimento de deveres instrumentais: o próprio indivíduo que figura no polo passivo do vínculo obrigacional tributário e a Administração, por meio dos seus agentes fiscais.

1.3.2 Fiscalização tributária

Ao definir conotativamente o conceito de fiscalização tributária, numa acepção ampla, enuncia Ruy Barbosa Nogueira, in verbis:

A fiscalização tributária é exercício de poder administrativo, que compreende todos os atos de ‘verificação’ e ‘controle’,

56 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2008, p. 836.

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Tabela  1  -  Atividades  relativas  à  apreensão  de  mercadorias,  bens,  documentos,  equipamentos e arquivos digitais:

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