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Escola, Organização Social e Família: um diálogo possível DOUTORADO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

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Academic year: 2019

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Sílvia Maria Pompéia

Escola, Organização Social e Família: um diálogo possível

DOUTORADO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Sílvia Maria Pompéia

Escola, Organização Social e Família: um diálogo possível

DOUTORADO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Tese apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção do título de

DOUTORA em Educação: Psicologia da Educação

sob orientação da Profa. Dra. Heloisa Szymanski.

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Banca Examinadora

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Aos meus filhos, Raul e João, pelas alegrias e pelas

ajudas na vida e nesta tese.

Aos meus netos queridos Tomás, João Pedro e

Guilherme.

Aos meus onze irmãos, pela permanente acolhida e

inspiração.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que me apoiaram nessa aventura de projetos, reflexões, processos participativos de viver e construir conhecimento.

Em especial, agradeço a Heloísa Szymanski, minha amiga de muitos anos, e paciente orientadora, não só de teses mas de lutas e ideais. Da mesma forma Marcos Ortiz, grande mestre das artes do fazer coletivo e do conviver, que nos instiga a mergulhar fundo, até descobrir o que importa na vida.

Agradeço a todos os colegas que tanto ajudaram nas discussões, nas atividades e no meu crescimento pessoal e profissional. A todos o meu muito obrigada!

Agradeço aos membros da banca, efetivos e suplentes, que me acolheram com tanta generosidade!

Mas faço aqui uma menção especial a algumas pessoas que ajudaram diretamente nessa minha ousada iniciativa de concluir o doutorado e produzir uma tese, em meio a tantos desafios da vida pessoal e profissional: Bete, Clarissa, Guto, Marcos, Magui, Marlene e Nega, todos irmãos queridos que deram um apoio direto, indispensável às reflexões e à escrita desta tese. Um agradecimento especial também à equipe do Projeto Diálogo de Marabá, pela paciência e tolerância. Por fim, agradeço ao Antônio Carlos que se desdobrou para ajudar, a tempo, na revisão desta tese.

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RESUMO

Este estudo está fundamentado num processo de pesquisa-intervenção participativa, de base fenomenológica, no âmbito do Projeto Participação e Diálogo, o qual visou trabalhar com práticas dialógicas entre escolas, famílias e organizações sociais que atendem crianças e adolescentes de um mesmo bairro. Desenvolvido por uma Universidade (PUC-SP), em parceria com uma ONG educativa (Associação Educacional Labor), esse projeto envolveu educadores, alunos e seus familiares, de uma Escola municipal e de uma Associação comunitária responsável por creche e por projetos junto a adolescentes e jovens no contraturno escolar. O objetivo desta tese foi investigar os significados dessa experiência para educadores responsáveis pelas instituições parceiras na iniciativa. Para tanto, foram feitas três narrativas do Projeto: uma, realizada por gestores da Escola; outra, pelo diretor da Associação comunitária; e a terceira, pela autora desta tese., integrante do grupo de pesquisa da PUC-SP e da Associação Labor. A análise dessas narrativas foi feita à luz de aportes teóricos da fenomenologia e de autores que se dedicaram ao estudo de processos dialógicos e participativos, principalmente Paulo Freire, Robert Chambers, Celso Beisiegel, e Marcos Ortiz Gomes. Como conclusões, destacamos os principais aportes dessa experiência percebidos como significativos pelos narradores, tais como: a conquista de uma profícua interação entre as instituições e destas com as famílias; o processo participativo como fundamental para a construção de processos dialogais na gestão e no fazer pedagógico, assim como para o fortalecimento das equipes. Reflexões a respeito de políticas públicas em educação, do papel desempenhado pela universidade e pela organização educativa nesse Projeto foram ainda apontadas, para que possam, eventualmente, servir de inspiração a outras instituições similares em suas interações com escolas e instituições educativas.

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ABSTRACT

This work has been based in a process of participative research-intervention, with phenomenological underpinnings, in the context of the Projeto Participação e Diálogo

(Project for Participation and Dialogue), whose goals are to work with dialogical practices in schools, families and social organizations that serve children and teenagers of a given neighbourhood. It was developed by a University (PUC-SP), in partnership with an NGO of the Education sector (Associação Educacional Labor), and involved education professionals, students and their families of a municipal school and of a Community Association which is responsible for the kindergarten and for other social projects with children and young adults. The goal of this Thesis is to study what this experience has meant to education professionals of the institutions that were involved in this initiative. To achieve that goal, we describe three narratives of this project: the first, by leaders and school administrators; the second, by the head of the Community Association; and the third, by the author of this work, which is both a research member of PUC-SP and a member of Associação Educacional Labor. The analysis of these narratives was carried out in light of theoretical and phenomenological frameworks from several authors that studied dialogical and participative processes, namely Paulo Freire, Robert Chambers, Celso Beisiegel, and Marcos Ortiz Gomes. Among the conclusions reached by the analysis, we highlight the main achievements of this experience, as perceived by the narrators, such as: a deep and productive relationship between institutions and families; the participative process as a fundamental basis on which dialogical processes can be employed to advance pedagogical and managerial participative practices, as well as to empower the teams. Some thoughts about public policies in education, about the role of universities and about organizations in the Education area, are also presented, so as to serve as inspiration to other similar institutions in their interaction with schools and educational organizations.

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8 SUMÁRIO

RESUMO ... 6

ABSTRACT... 7

1. TRAJETÓRIA ACADÊMICA E PROFISSIONAL DA AUTORA: Memorial... 9

2. CENÁRIOS: CONTEXTO E HISTÓRICO DO PROJETO ... 30

2.1 A Universidade se aproxima da Associação Comunitária ... 30

2.2 Porque a Associação Educacional Labor procurou a parceria da universidade para desenvolver um projeto dessa natureza ... 34

2.3 A Brasilândia ... 38

2.4 Constituição do Projeto e formação do Grupo Diálogo ... 42

3. QUESTÃO A SER INVESTIGADA E OBJETIVOS DA PESQUISA ... 46

3.1 Objetivo e Questões ... 46

3.2 Caminhos da pesquisa ... 47

4. APORTES TEÓRICOS ... 49

4.1 Conceitos: Diálogo e Participação ... 49

4.2 Opção metodológica pelos aportes da Fenomenologia ... 72

5. MÉTODO ... 82

5.1 Pesquisa Qualitativa Fenomenológica ... 82

5.2 Pesquisa-intervenção participante ... 84

5.3 Procedimentos: descrição das atividades de intervenção e de pesquisa ... 94

6. NARRATIVAS ... 103

6.1 Relato da experiência da autora ... 104

6.2 Narrativa do diretor da Associação Comunitária ... 131

6.3 Narrativa do diretor e da coordenadora pedagógica da Escola do Bairro ... 140

7. ANÁLISE: NARRATIVA DAS NARRATIVAS ... 152

7.1 Significados desvelados pela análise da narrativa do diretor da associação comunitária ... 152

7.2 Significados desvelados pela análise da narrativa do diretor e da coordenadora pedagógica da Escola do Bairro ... 165

8. CONCLUSÕES ... 182

8.1 Percepção da realidade da Escola, da Associação e do Bairro ... 183

8.2 Percepção sobre as equipes de apoio ao projeto da PUC-SP e da Associação Educacional Labor ... 190

8.3 Sobre os tempos... 192

8.4 Sobre os momentos ... 196

8.5 Sugestões... 198

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1.

TRAJETÓRIA ACADÊMICA E PROFISSIONAL DA AUTORA:

Memorial

Minha vida acadêmica foi um tanto esquisita. Apesar de ter sido bem sucedida em quase todos os processos educacionais nos quais me aventurei – boa aluna no Primário, Ginásio e Científico, muito bem colocada no exame vestibular para a USP, aluna aplicada do Instituto de Física (IFUSP), bolsista de Iniciação Científica da FAPESP e monitora de Laboratório de Ensino de Física ainda como estudante de graduação – não concluí o mestrado em Ensino de Ciências no mesmo IFUSP, por problemas de saúde, embora tenha cumprido todos os créditos e qualificado a pesquisa. Obtive, mais tarde, o título de Mestre em Ciência Ambiental pela USP e, finalmente, me dediquei ao doutorado em Psicologia da Educação na PUC-SP.

Essa trajetória original fica mais fácil de compreender se considero a minha vida fora da escola e da academia: meu engajamento político, minha vida profissional, as responsabilidades que tentei assumir e as buscas por uma fundamentação e um sentido para o meu fazer no mundo.

Com efeito, me engajei, desde os 15 anos, em lutas e movimentos sociais e políticos, empenhada em contribuir para que a sociedade mudasse para melhor – uma Escola,, uma Universidade, uma Cidade e um Brasil melhores; um mundo mais humano, justo e solidário. Assim, participei, em 1963-64, da UPES (União Paulista de Estudantes Secundários), quando conheci as ideias de Paulo Freire, com as quais me identifiquei muito já naquele tempo, assim como com as propostas de “dinâmica de grupos”, de Lauro de Oliveira Lima.

Em 1966, tendo entrado para a USP, segui nessa vocação, integrando, em 1967, a

diretoria do “CEFISMA” (Centro Acadêmico da Física e Matemática) e, em 1968, a

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Física, fiz parte das Comissões Paritárias que tentaram propor contribuições para a Reforma Universitária.

No meio tempo, desde a época de estudante secundária, militei em grupo de esquerda que, a partir do Golpe de 64, por força das circunstâncias, se tornaria clandestino. Em 1968, mecasei, tive meu primeiro filho, no ano seguinte e, em 1970, o segundo.. Para ajudar na manutenção da casa, uma vez que meu marido também era um profissional em início de carreira e ao mesmo tempo estudante, comecei a dar aulas em escolas de ensino básico, quando ainda estava no segundo ano da faculdade. Gostei!

Além disso, em 1968, comecei a trabalhar na Fundação Pe. Anchieta (TV Cultura), adaptando aulas de matemática para um curso a distância por rádio, num sistema de telepostos com monitores, apoiado por fascículos vendidos em banca e também distribuídos pelo sistema. Foi um tremendo desafio, assumido por uma equipe multidisciplinar que apreciei muito. Essa tarefa era coordenada diretamente e com grande empenho pelo Prof. Soares Amora. Também gostei!

Porém, quando boa parte dos programas estava já elaborada e indo ao ar, o Governo Federal - de forma totalmente oportunista, em nossa opinião – decidiu jogar essas aulas em rede nacional, sem telepostos, sem monitoria, sem nada. Assim, alimentaria

de modo barato os primeiros tempos do “Projeto Minerva”, de emissão obrigatória em cadeia nacional, logo após a “Voz do Brasil”. Eu e mais alguns colegas da equipe

pedimos para nos retirar, decepcionados e indignados com essa decisão, ao nosso ver irresponsável para com os ouvintes de rádio.

Eu aprendera com o meu pai1 a considerar, como o desafio maior de um docente, a sua capacidade de mostrar para quê serve cada conhecimento, interessar o aluno e proporcionar boas explicações – que levem à efetiva compreensão sobre o assunto, parte essencial do processo de aprendizagem. Assim, tinha a clareza de que o bom

professor é aquele com o qual todos aprendem, e não aquele considerado um “crânio”

porque passa a lição, não explica, dá uma prova difícil e reprova muitos alunos – perfil

1 Paulus Aulus Pompéia, professor da Escola Politécnica de São Paulo, fez parte do grupo de profissionais que

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infelizmente comum entre os professores de Física. Estes, segundo meu pai, mostravam dessa forma uma incompetência para realizar sua missão, a de proporcionar o aprendizado a todos os seus alunos. Mas lamentavelmente a cultura escolar, muitas vezes autoritária, seletiva e preconceituosa, não permitia que tal modelo de ensino fosse visto dessa forma.

Já no último ano de graduação, o professor Antônio Teixeira, de quem eu já era monitora, me convidou a trabalhar na FUNBEC2, onde colaborei no desenvolvimento do Projeto Brasileiro de Ensino de Física - PBEF e em sua aplicação experimental (avaliação e monitoramento). Aliando prática e teoria, e baseado em experiências simples mas extremamente interessantes e motivadoras, o Projeto significava uma revolução no ensino de ciências – pelo menos, na forma como era tradicionalmente ensinada no Brasil. Como parte de minhas funções, fui docente em vários cursos voltados aos professores das redes públicas para aplicação do PBEF e de outros projetos de ensino baseados nesses mesmos princípios, em geral promovidos pelo CECISP3, que, na época, fazia parte da Faculdade de Educação da USP.

Como professora de Ensino Médio, apliquei também esses projetos com meus alunos, inclusive do Colégio São Domingos (colégio de aplicação da PUC-SP), obtendo bastante sucesso junto a eles, mesmo com os considerados mais “terríveis” pelos

demais professores e pela direção. Lembro de um dia estar dando uma provinha rápida de Física para a turma do segundo ano do São Domingos, quando o diretor resolveu parar na porta para olhar. As questões estavam no quadro e ele ficou espantado, pois pareciam complicadas – falavam de espectro da luz solar, comprimentos de onda, composição química das estrelas, etc. Mesmo assim, os alunos estavam sérios,

escrevendo bastante, absortos, e não pareciam estarrecidos com a “dificuldade” da prova. Nem mesmo a “turma do fundão”. Mal sabia ele que, pelas experiências

2 FUNBEC - Fundação Brasileira para o Desenvolvimento de Ensino de Ciências - teve sua origem na Universidade

de São Paulo, em 1967 com recursos da Unesco. A instituição, sem fins lucrativos, através do trabalho de técnicos e professores de renome, como Isaías Raw e Antonio de Souza Teixeira, obtinha recursos com a venda de

equipamento médico-eletrônico e os aplicava no ensino de ciências. A FUNBEC criou, por exemplo, a coleção de

kits “Os cientistas”, que teve mais de 1 milhão de exemplares vendidos em bancas de revista pela Editora Abril.

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realizadas, com a ajuda inclusive da própria turma do fundão, cujo senso prático era sempre de grande valia nessas horas, aquelas questões não os assustavam. De fato, poucos alunos demonstrariam, pela prova, alguma dificuldade com o tema.

Graduada em 1971, continuei na FUNBEC até 1972, tendo me afastado e, finalmente, saído de lá por motivos de grave problema de saúde.

Em 1975, foi, finalmente, criada no IFUSP uma área de pesquisa em Ensino de Física, numa iniciativa pioneira do Instituto de Física associado à Faculdade de Educação, resultado de uma luta na qual muitos professores e alunos se engajaram, inclusive eu. Considerávamos que uma das maiores responsabilidades da Universidade era colaborar para o ensino no Brasil, que, já naquela época, deixava muito a desejar. E o Instituto de Física, que gastava sozinho 10 vezes mais do que todas as demais Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras da USP juntas, não tinha nenhuma política ou preocupação quanto ao ensino de Física – matéria classicamente mal ensinada nas

escolas. Dizíamos que era (e ainda é) o estilo “ensino vacina”, no qual o professor

ensina um pouco de seu conteúdo, de tal modo que seja o suficiente para o aluno tomar horror para o resto da vida.

Tendo lutado para a criação do Programa de Pós Graduação em Ensino de Física, entrei na primeira turma. Estudei muito – tínhamos que fazer todos os créditos obrigatórios da pós-graduação “normal” da Física, mais créditos obrigatórios da

Faculdade de Educação, além de algumas disciplinas eletivas. Para isso ser possível dentro das regras do jogo, para nós uma mesma disciplina valia menos crédito do que

para as turmas “normais”. Aprendi muito. Fiz pesquisa e exame de qualificação, mas

não pude completar o mestrado nessa ocasião.

Durante essa pós-graduação, fui “monitora” do IFUSP, dando aulas de Física na Escola

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no estúdio. Foi o precursor dos Cursos Supletivos por TV, numa parceria da Fundação Pe. Anchieta com a Fundação Roberto Marinho, em sucessivas edições, das quais participei também, por um breve tempo, quando conheci a Professora Clarilza Prado, da Faculdade de Educação da PUC-SP.

Com essas experiências em Ensino a Distância, e com a facilidade para o conteúdo de

“exatas”, fui chamada a trabalhar num projeto pioneiro no Senai4 ensino de matemática à distância para trabalhadores da indústria mecânica. Esta experiência foi extremamente rica, especialmente porque encontrei, ali, uma equipe multidisciplinar competente e dedicada. Pudemos, durante os primeiros 4 meses, nos preparar para esse desafio, por meio de pesquisas e estudos coordenados por especialistas internacionais; depois, trabalhamos intensamente em todas as fases para implantar inicialmente esse projeto no Senai-SP: planejamento, elaboração, validação, aplicação, monitoramento, avaliação de resultados e revisão de todo o material. Pude visualizar também o tipo de ensino praticado, nas escolas regulares destinadas a capacitar os trabalhadores especializados, o que gerou, em mim, muitos questionamentos, como:

1. Constatei que o Brasil tinha, na época, não uma “pirâmide educacional”, na qual a base seriam os alunos que entram no sistema de ensino (1ª série) e, no topo, estariam os alunos que conseguiam terminar o ensino fundamental (8ª série);

mas um “obelisco educacional” no qual os alunos eram reprovados inúmeras vezes e desistiam de continuar no sistema já nas três primeiras séries do ensino fundamental;

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“Obelisco” da exclusão escolar: A parte cinza representa, numa aproximação gráfica, a parte da população que permanece na escola, à medida que passam os anos (eixo vertical). A base corresponde aos 7, 8 anos; em seguida, aos 9 a 10 anos; vem aí um salto aos 11, 12 anos; e assim por diante.

Essa visualização simbólica, aproximada, se baseia em informações do MEC/CIP publicadas no quadro

Permanência no Sistema Escolar: milhões são reprovados...milhões abandonam os estudos... milhões não exercerão plenamente a cidadania” em A Educação Básica é Fundamental, Governo de São Paulo, Secretaria de Educação - FDE/Diretoria Técnica - GDO/CEDUC, São Paulo, 1992.

2. Constatei que, para o grande número de “excluídos” do sistema de ensino

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A parte colorida desse “obelisco” representa justamente o grupo excluído, invisível para o sistema escolar, que vai aumentando com a idade, tornando-se a grande maioria. O sistema escolar preocupava-se com a parte interna do obelisco, como se fossem somente estes os adolescentes e jovens que deveriam ser educados no Brasil...

3. Testemunhei cenas deprimentes de subjugação de jovens e de incentivo à delação, em uma das escolas do Senai, tendo ficado, a partir daí, preocupada com o fato de o governo simplesmente delegar aos empresários essa missão, mas não criar instâncias tripartites de decisão, com representantes do governo, dos empresários e dos trabalhadores – principais interessados nesse processo. Essa experiência me trouxe uma questão que iria futuramente afetar projetos como o

“Diálogo e Participação”: como nossa sociedade vê a cultura e a capacidade intelectual de um jovem ou de um adulto quando ele não teve acesso a níveis mais altos de ensino formal?

Buscando um alcance maior para o ensino a distância, o Senai de São Pauloaproximou-se do governo canadense, que estava avançando a passos largos na tecnologia de ensino por meio de computadores, sendo pioneiros nessa matéria. Estávamos no início dos anos 80 e ainda imperavam os grandes computadores centrais, máquinas grandes e caras, instalados nos famosos “CPDs” (Centros de

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funcionavam como “terminais inteligentes”, para administrar cursos semi-presenciais,

associados ao „Sistema Telidon”. Esse sistema juntava cursos por TV e programas de ensino por computador. Funcionavam especialmente bem no caso de recuperação de pré-requisitos e aquisição de linguagens (vocabulário e conceitos) nas várias áreas do conhecimento, destacando-se a da matemática.

Assim, fui enviada ao Canadá, como parte de um projeto entre o Brasil e aquele país financiado pela CIDA5, para conhecer o sistema deles e trazer ao Brasil novidades que poderiam gerar acordos entre os países por meio do Senai. Essa foi outra experiência que me levou a perceber o tipo de soluções que poderiam vir do uso dos computadores no ensino, assim como alguns dos riscos associados ao uso desse instrumento.

Trata-se, na realidade, de um “livro” sofisticado, que pode ilustrar, mostrar experimentos,

gráficos, animações, propor jogos e testes para desafiar e para verificar as aquisições realizadas e, atualmente, pode proporcionar até interações ao vivo, via internet. Mas não faz milagres: só oferece aquilo que foi lá colocado, significando que um bom programa de ensino é, no máximo, tão bom quanto os professores que o propuseram, mas bem menos flexível que eles. No entanto – e para isso um dos professores mais experientes do Canadá me alertou já naquele tempo – o mais comum eram programas mal planejados ou mal realizados, que “maceteavam” um assunto, abordavam conteúdos sem real profundidade e se tornavam muito irritantes para alguém que busca um conhecimento mais completo e interessante, embora tenha havido diversas e valiosas exceções a essa regra.

Saindo do Senai, em 1982, me engajei nos grupos reunidos para compor o programa de governo de André Franco Montoro e apoiar sua campanha nas primeiras eleições livres para governador, no final dos anos de ditadura militar. Integrei, com dois colegas do Senai, o GT de Educação, buscando contribuir para duas coisas: políticas de melhoria do ensino fundamental e políticas voltadas para os jovens excluídos do ensino fundamental. As discussões foram muito interessantes e, novamente, voltei a trabalhar com pesquisadores da linha de Paulo Freire, como Moacir Gadotti. Tentamos discutir

5 CIDA Canadian International Development Aid, é uma agência internacional de apoio aos países “em

desenvolvimento” que financia pesquisas e projetos de intervenção voltados ao desenvolvimento e à superação da

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políticas voltadas para os “excluídos do obelisco da educação”, como uma responsabilidade do sistema público de ensino, oferecendo uma segunda chance de aprendizado, dentro de suas expectativas e necessidades, inclusive voltadas para o mundo do trabalho. Não fomos ouvidos: nem pelas pessoas egressas do meio político, dos movimentos de esquerda, muito menos pelos que pertenciam ao meio acadêmico.

Era como se esses jovens fossem “invisíveis” para eles, como se fizessem parte “naturalmente” de um mundo à parte, tão excluídos que nem mereciam a atenção dos sistemas de ensino.

Novamente, constato a invisibilidade, para nossa “elite” econômica, política e

intelectual, dos jovens e adultos das chamadas “classes populares”, o quanto são desconsiderados enquanto sujeitos de cultura, com potencial criativo, capacidade de contribuição.

Montoro eleito, fui trabalhar na Fundação Prefeito Faria Lima - CEPAM6, pois o novo governo decidiu investir nesse órgão, esperando garantir as bases para uma política de

“participação e descentralização” na gestão do Estado. Como o Cepam promovia

alguns cursos a distância, voltados especialmente para a formação profissional de funcionários municipais de regiões distantes da capital, fui convidada a atuar nessa área para rever, melhorar e ampliar a abrangência de tais cursos. Rapidamente outras prioridades se levantaram, e acabei coordenando um projeto de levantamento e divulgação de experiências alternativas realizadas nos municípios – formas criativas de desenvolvimento local, as quais, mesmo com poucos recursos (ainda concentrados na esfera federal), conseguiam melhoras significativas na educação, na saúde, na agricultura, na infraestrutura urbana, etc.. Da análise dessas experiências, fiz uma constatação, que considero importante: o fator preponderante do sucesso de muitas delas era o fato de contarem com a participação dos vários setores envolvidos, em especial com a dos próprios beneficiários dos projetos.

6 CEPAM Centro de Estudos de Administração Municipal: órgão criado na década de 70, ligado à Secretaria do

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Em 1987, fui “emprestada” pelo Cepam para trabalhar no Programa Terra-Homem, uma iniciativa do Ministério da Cultura em parceria com o do Meio Ambiente, proposto e presidido por Judith Cortesão7. Tratava-se de criar condições para que a nascente conurbação do eixo Rio de Janeiro / São Paulo pudesse se desenvolver de modo mais sustentável e menos destrutivo para seus habitantes. Para tanto, seria necessário identificar e implementar políticas públicas de planejamento local e regional integrado, que valorizassem o PNEC – Patrimônio Natural, Étnico e Cultural da região, ao invés de comprometê-lo, como parecia ser a tendência; bem como promover a formação profissional de quadros locais, que percebessem a importância disso, para que pudessem participar do planejamento e da execução das ações decorrentes. Judith

ressaltava a importância da formação do que chamava de “quadros intermediários”.

Para ela, no Brasil, havia muitos operários e muitos doutores, mas poucas pessoas bem formadas que pudessem assumir, de modo autônomo e criativo, responsabilidades nas ações práticas, nas atividades técnicas, artísticas e culturais que compõem o dia a dia da nação.

Trabalhei direta e exclusivamente com Judith por dois anos. Tive a sensação, porém, de ter aprendido mais com ela do que em dez anos de universidade. Com ela, aprendi a ver o mundo com outros olhos, a perceber os fantásticos detalhes da natureza e a

incrível riqueza cultural de muitas pessoas consideradas “incultas”. Aprendi o significado e a importância da luta pelo “meio ambiente” no sentido integral, isto é, o quanto a vida e a qualidade da vida das pessoas dependem das relações interpessoais, sociais e políticas. Percebi que dependemos totalmente do ambiente em que vivemos – da natureza e das outras pessoas – queiramos ou não, tenhamos ou não consciência disso.

Desenvolvemos projetos com governos locais e estaduais, com comunidades como a dos caiçaras do Lagamar de Iguape-Cananéia-Guraqueçaba8; obtivemos recursos,

7 Judith Cortesão, médica e pesquisadora, ambientalista e poetisa, influenciou fortemente boa parte da atual

geração de técnicos e quadros governamentais que atuam na área de Meio Ambiente. Filha do historiador português Jaime Cortesão, casada com o filósofo Agostinho da Silva, com o qual teve 6 filhos, ajudou a redigir as primeiras normas e leis sobre Meio Ambiente no Brasil, inclusive o capítulo sobre esse tema na Constituição de 88.

8Lagamar

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inclusive em Genebra, Suíça, onde fiz pesquisa na OIT9 sobre tipos de ensino profissional existentes nas Américas e na Europa, para buscar inspiração a projetos na interface com órgãos afins no Brasil. Estávamos em meio a esse trabalho, quando ocorreu a queda do Muro de Berlim – numa série de ocorrências e eventos que assistimos por diversos dias na televisão suíça. Me impressionou o fato de que, praticamente em todas as cenas assistidas, sempre havia algum grupo tocando samba. Samba, isso mesmo. Era a melhor forma que encontravam de celebrar, festejar, manifestar alegria, libertação.

Me perguntava: Quantas escolas, no Brasil, levam a sério nossa cultura? Em quantas se estuda música, dança? E, no entanto, temos uma contribuição muito significativa para a cultura universal nessas áreas... Quem se importa seriamente com isso nas secretarias de educação? E nas faculdades de pedagogia? Quem se importava, nessa época, com a vida real dos alunos em seu ambiente social e natural – enquanto matéria a ser ensinada, discutida e pesquisada pelos alunos e, finalmente, formalizada pela escola?

Acontece que, naquele novembro de 1989, Collor foi eleito presidente do Brasil. E uma

de suas primeiras providências foi fechar o Ministério da Cultura: “com uma penada”

terminou o Programa Terra-Homem. Tivemos que desarticular os projetos, decepcionar as comunidades, declinar dos recursos provenientes de empresas, ONGs e instituições nacionais e internacionais, pois nenhum órgão governamental federal ou estadual

aceitou ficar com o Programa, agora sem “pai”, sem recursos próprios de manutenção. Seria duvidoso e demorado o aporte de recursos vindos de outras partes e já prometidos para os projetos, pois não haveria mais a contrapartida do Governo Federal.

Nessa ocasião, Judith me recomendou para uma bolsa de aperfeiçoamento profissional no Chile, financiada pelo BID, voltada para agentes governamentais da América Latina. Tratava-se de estudar o planejamento econômico e financeiro de projetos de interesse

Paranaguá (PR), incluindo as Ilhas do Cardoso e de Superagui, além da costa dos municípios de Ilha Comprida, Cananéia e Antonina.

9 OIT

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social. Foi outra experiência muito interessante, embora bem difícil, pois era um curso dado pelos chamados “Chicago Boys”, do Pinochet. Nesse ano de 1989, o presidente do Chile ainda era Pinochet, embora o país estivesse já se preparando para uma eleição livre ao final do ano. E o curso em pauta era todo baseado nas premissas do chamado neo-liberalismo. Eu e vários dos colegas gostaríamos de discutir mais determinados pontos e valores, afirmados como „naturais‟ pelos docentes, mas não

havia nenhuma abertura para isso. Ao contrário, o clima era altamente desfavorável para qualquer participação dos alunos nas aulas. Parte do curso era fascinante – nos eram apresentadas várias ferramentas matemáticas aplicadas à economia, que facilitavam a compreensão de fenômenos mais ou menos triviais, além de permitir um planejamento muito mais rigoroso da parte econômica e financeira de projetos. Toda essa construção era bem elaborada, funcionava. Mas se assentava em algumas premissas sobre a natureza humana e as condições de progresso social. Ora, eu e outros colegas não concordávamos com parte dessas premissas e tentávamos mostrar que, mudando-as, toda a construção mudava de sentido, embora mantendo as mesmas ferramentas. E isso os professores não queriam discutir, porque não admitiam essa possibilidade. Era uma questão de valores, de princípios. As premissas eram, para eles, “imexíveis”.

Concluí o primeiro semestre desse Curso (5 meses de aulas em tempo integral, com provas todos os sábados, totalizando 840 horas) e voltei para o Brasil. Pouco depois, fui chamada de volta ao CEPAM. Lá, havia sido criada a Gerência de Meio Ambiente, na qual fui trabalhar. De 1990 a 1998, nessa gerência, aprendi especialmente que todas as políticas públicas relacionadas ao meio ambiente exigiriam a formação dos diferentes tipos de profissionais, para que pudessem enxergar os aspectos socioambientais de sua atividade, levando-os em conta em sua área de competência. Ao mesmo tempo, exigiam um trabalho de educação ambiental dos cidadãos em geral, para compreender a importância dessa questão e saber como cumprir o seu papel e exigir dos governos as medidas necessárias.

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Unidades Escolares de Ação Comunitária, implantadas na segunda metade dos anos 70, como uma medida do governo militar para controlar várias pequenas comunidades rurais isoladas no estado de São Paulo, as quais, vivendo no total abandono do Estado, haviam dado algum apoio ao grupo armado de Lamarca. Junto com as UEACs, foram implantadas também Unidades de Saúde com agentes comunitários das próprias comunidades. No entanto, as responsáveis10, pela forma como foi planejada e colocada

em prática essa política de “atenção às comunidades isoladas do Vale do Ribeira”, levaram a sério a ideia de acesso aos conhecimentos e benefícios que o poder público deveria prestar às tais comunidades. Essas políticas se tornaram instrumentos de

verdadeira inclusão, “conscientização” e promoção dos seus direitos. Tive a oportunidade de visitar, discutir e vivenciar a força dessa experiência, pelo contato direto com alguns de seus principais autores. Elas marcaram e contribuíram, também, para as concepções nas quais embasamos a proposta de gestão participativa e de interação com as famílias, no Projeto Participação e Diálogo.

Em 1990, fui convidada, por um grupo de empresários que dava apoio a uma instituição que abriga crianças (a Aldeia Infantil SOS11, de Rio Bonito), a apresentar um projeto voltado para crianças com dificuldades de aprendizado na escola, embora demonstrassem muita capacidade de aprender em casa ou em assuntos diferentes dos tratados nas escolas. Formamos uma pequena equipe e conseguimos um recurso para pesquisar e criar uma proposta. Nós nos fazíamos perguntas como: o que seria um “bom ensino”? Que tipo de escolas o Brasil deveria ter? Para quem? Porque o sistema escolar provocava tanta exclusão social? Como evitar a evasão maciça desde as primeiras séries?

Começamos pela busca das respostas com os professores “bem sucedidos” – que conseguiam alfabetizar a todos, mesmo crianças com deficiências e grandes

10Me refiro, aqui, principalmente à Professora Luiza Alonso e à Médica Maria Cecília Dellatorre, respectivamente dirigentes regionais de Educação e de Saúde, no Vale do Ribeira, nessa época, cujas iniciativas foram reconhecidas como muito válidas e ampliadas no Governo Montoro e depois extinguidas no Governo Quércia, que se seguiu.

11 Aldeias Infantis SOS organização internacional nascida na Áustria, no final da Segunda Grande

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dificuldades de aprendizado; que conseguiam manter a atenção e obter bons resultados, mesmo com os meninos e meninas “difíceis”, “rebeldes”, com a “turma do fundão”; que eram estimados, admirados e respeitados pelos alunos, além de reconhecidos como excelentes professores pelas famílias e pelos colegas. A questão era: qual seria a “receita de sucesso” desses professores?

Pois buscamos alguns deles, fizemos entrevistas individuais e uma série de reuniões. As respostas vieram, claras e surpreendentes. Os princípios em que se baseavam vieram à tona. Havia grande intersecção entre eles. Construímos, assim, uma

“proposta pedagógica”12 congregando esses princípios e propondo uma forma de entender o que se passa nas escolas e como lidar com isso.

O próximo passo seria buscar professores interessados em aplicar essa proposta e verificar o que aconteceria. Para tanto, foi formada a Associação Educacional Labor13, cujo alvo inicial foram as crianças da Aldeia de Rio Bonito e, mais tarde, algumas escolas públicas municipais e estaduais de São Paulo, estendendo-se, depois, a outros estados brasileiros. Neste trabalho, pude fazer convergir toda a minha experiência pregressa, desde como ensinar de forma interessante e significativa, mesmo as

matérias consideradas “difíceis” e “chatas”; como ligar prática e teoria; como

estabelecer vínculos com os alunos e as comunidades; como desenvolver material didático para educadores; como propor e avaliar um projeto; como trabalhar temas transversais; como fazer um diagnóstico e planejar a escola de forma participativa; como reconhecer e propor políticas públicas, e assim por diante.

12

Essa proposta está descrita na coleção de fascículos intitulada “Proposta Pedagógica Labor”, publicada em primeira edição pela EDUC (1999) e, em segunda edição, pelo INEP/MEC (2002). Atualmente, a Labor conta com uma edição revista e atualizada, com base nos avanços trazidos pelas sucessivas aplicações da proposta em vários estados brasileiros. Os fascículos podem ser baixados do site da Labor em http://www.labor.org.br.

13 A Associação Educacional Labor é uma organização sem fins lucrativos criada em 1992 que tem por

missão “investigar, elaborar e propor alternativas pedagógicas, instrumentalizando educadores a serem co-autores de um ensino mais eficaz para as crianças e adolescentes em risco de exclusão escolar.” Os projetos da Labor, oferecidos gratuitamente a escolas públicas, por meio de financiamentos de

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A primeira aplicação da Proposta Pedagógica Labor em escolas públicas foi acompanhada e avaliada por uma pesquisa realizada pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), coordenada pela Dra. Heloisa Szymanski.

Essa interação ensejou que, alguns anos depois, fosse proposto o projeto de intervenção organizado pelo mesmo Programa da PUC-SP em parceria com a Labor, ao qual se refere a presente tese de doutorado, no qual atuamos no âmbito de uma pesquisa-intervenção participativa.

Inspirada fortemente em práticas bem-sucedidas de educação popular no Brasil14, a Labor tem exigido de mim uma permanente reflexão, associada a uma prática vivida nas mais diferentes realidades educacionais no Brasil – desde a periferia de uma megalópole como S. Paulo até pequenas escolas rurais no interior da Bahia, por exemplo. Ela deu as bases para todos os projetos educativos, de formação profissional ou de processos participativos junto a comunidades, que ajudei a planejar e a executar dali em diante.

No meio-tempo, para que me aprofundasse na área ambiental, o Cepam apoiou minha participação no Programa LEAD - Leadership for Sustainable Development, uma iniciativa da Fundação Rockfeller15, que proporcionou a formação de equipes de pessoas em posição de responsabilidade social em governos, empresas, ONGs e

14 Refiro-me a diversos projetos de alfabetização e de formação de lideranças, aplicados a jovens e

adultos por diferentes grupos e instituições, como os movimentos inspirados em Paulo Freire. Embora eu não tenha pessoalmente participado desses trabalhos, acompanhei vários deles e compartilhei de relatos e discussões sobre seu efeito junto aos participantes. Posso citar dois desses processos, cujos

resultados pude acompanhar mais recentemente: o do Instituto Cajamar, em São Paulo, que fazia formação de lideranças populares; e o outro, mais impressionante, o da Escola Quilombo dos Palmares (EQUIP), que vem há muitos anos, atuando principalmente no Nordeste do país. Um dos casos de sucesso, que a EQUIP mantinha em João Pessoa, em parceria com a UFPB, foi o curso básico para operários da construção civil. Outro caso interessante é o de alguns jovens da área rural, que passaram a ter muito bom aproveitamento escolar no ensino fundamental, na medida em que seguiram a formação proporcionada pela EQUIP. Assim, animaram-se a continuar seus estudos, destacando-se no ensino médio e conseguindo passar no vestibular para as Universidades Públicas da região. Alguns desses jovens foram para a área de pedagogia e, em 2006, soube que pelo menos três deles estavam desenvolvendo pesquisas em mestrado e doutorado sobre esse processo pelo qual haviam passado.

15 A Fundação Rockfeller, que financiara pesquisas na área de reprodução humana consideradas de

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universidades, em sete dos países mais populosos do mundo, entre eles o Brasil. O Programa se instalou em nosso país por meio de uma parceria com a Faculdade de Economia e Administração da USP. Fui da primeira turma do LEAD, experiência igualmente muito marcante, sob vários aspectos, dos quais destaco o que influenciou bastante o trabalho aqui apresentado: a descoberta de uma nova área do conhecimento que formalizava-se enquanto tal naquele momento e cujos resultados práticos se mostravam essenciais para a área ambiental e social – a área dos processos participativos.

Em 1994, terminado o Programa LEAD, entrei para o PROCAM – Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental que se desenhou, na USP, como uma interface de muitas das unidades, incluindo Economia, Educação, Física, Medicina, Biociências, etc. Fiz, então, meu mestrado, com professores muito especiais, os quais me revelaram dimensões surpreendentes, que até hoje me são de grande valia, como o caso da discussão sobre as diferentes dimensões da sustentabilidade, a discussão de políticas públicas essenciais como a matriz energética brasileira – de onde se pode ver claramente a relação entre as alternativas de desenvolvimento possíveis para o país e o investimento em educação, ciência e tecnologia, tendo com fundamento um ensino básico de qualidade. Outra questão bastante aprofundada em meus estudos, nessa época, foi a importância dos processos participativos e as condições para que eles possam ser realizados. E aí, novamente, a constatação do espaço fundamental da escola enquanto lócus do aprendizado de formas de exercício da democracia representativa e participativa.

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bibliotecários, há enfim uma gama enorme de profissionais cuja atuação pode ser aperfeiçoada, se estiverem voltados para formas de agir mais sustentáveis. Essa preocupação, assim como os instrumentos para atuar dessa forma, seriam. então objetos da Formação Ambiental dos profissionais – fator previsto em lei, no Brasil, mas até agora praticamente ignorado, quer nas faculdades, quer nos cursos de capacitação profissional.

Procurei demonstrar, nessa mesma dissertação, a importância dos processos participativos de decisão e atuação como componente essencial para a sustentabilidade dos projetos de desenvolvimento local, destacando a existência de quatro instâncias que precisam participar nessas decisões: a instância governamental/política, os agentes econômicos, os agentes técnicos e a comunidade, inclusive a chamada população-alvo ou beneficiários dos projetos.

Em 1998, devido a minha experiência em Educação Ambiental, assim como meu conhecimento em Meio Ambiente (via Cepam, LEAD e PROCAM) e vivência junto a escolas e ao sistema escolar (via Labor), fui chamada a contribuir para a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), no tema transversal “Meio Ambiente”.

Essa foi outra experiência riquíssima, me permitiu ver um pouco mais a fundo o que se passa com respeito às lutas, concepções de diferentes grupos e forças atuantes nos processos decisórios da Educação brasileira, aos níveis nacional e estadual.

Logo depois, trabalhei na equipe de concepção e coordenação de um projeto de âmbito nacional voltado para proporcionar educação ambiental nas escolas de ensino fundamental. Proposto pelo WWF e com parceiros como os Ministérios de Educação e do Meio Ambiente, além da Fundação Roberto Marinho, o projeto ganhou o nome de

Muda o Mundo, Raimundo. Foi um marco em várias localidades pelas quais passou.

Mas houve outro ganho excepcional para minha carreira e para a atuação da Labor, a

partir do “Muda o Mundo, Raimundo”: a descoberta de uma equipe de jovens, em

Minas Gerais, que apoiaram a execução do projeto em escolas mineiras. Aconteceu

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escolas aplicaram um processo de diagnóstico participativo, baseado na metodologia de DRP16. Os importantes resultados obtidos junto às comunidades, professores e alunos nos chamaram a atenção e buscamos a origem dessa proposta, conhecendo, então, um de seus principais divulgadores e cocriadores no Brasil, o Dr. Marcos Afonso Ortiz Gomes, o qual passou a ser solicitado para ajudar nos projetos e na formação dos técnicos da Associação Labor, visando ao emprego dessa metodologia.

Enquanto isso, na mesma Labor, uma das conclusões a que a pesquisa da PUC chegara com relação à aplicação da Proposta Pedagógica nas quatro escolas públicas

“pioneiras”, foi a de ser um fator, fundamental para o sucesso do ensino, o empenho e o estilo de gestão da equipe de direção. Isso foi muito interessante porque, simultaneamente e sem conhecimento, uns dos outros, três dos diretores dessas quatro escolas vieram à Labor pedir um trabalho que os orientasse para uma gestão condizente com a proposta pedagógica – uma gestão mais participativa e voltada para o pedagógico, que soubesse lidar com a comunidade, aproveitando a proximidade criada entre os professores e as famílias. Esses diretores relataram, ainda, que gostariam de dar uma resposta efetiva a uma demanda institucional, criada pela recém-aprovada Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de que cada escola desenvolvesse

seu Projeto Político Pedagógico de modo autônomo e participativo. “O que é isso?”, perguntavam. “Como fazer isso de modo participativo?”

Para dar resposta a esta demanda que espelhava uma necessidade real, sem a qual não seria realmente possível a aplicação da política pública proposta pelo Ministério e pelas Secretarias de Educação, a Labor desenvolveu uma proposta que chamou de Gestão Estratégica Participativa (GEP), com o apoio de Marcos Ortiz e de mais dois especialistas em planejamento – Ivan Petrilli (especialista em Planejamento Estratégico

16 DRP

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Empresarial) e Marcos Arroyo (especialista em Planejamento Estratégico Situacional, voltado para a área governamental17), com recursos vindos do Instituto C&A.

Muito estudamos e muito investimos em aplicações monitoradas e em avaliações ao longo desse projeto, dele resultando a segunda linha de atuação da própria Labor: apoio à gestão em escolas públicas.

Essa foi a primeira vez que interagi com o grupo de pesquisa orientado por Heloisa Szymanski, cuja atuação acompanhei com muito interesse. Essa pesquisa trouxe de volta os técnicos da Labor à reflexão das bases e fundamentos que a nortearam no início do processo, para um mergulho mais profundo, uma revisão e atualização. E permitiu que houvesse um aporte mais sistemático da academia, proporcionando um olhar externo que tornou evidentes vários aspectos dessa experiência. Essa parceria da Labor com a PUC, desde então, se manteve permanente, embora por alguns anos não tivesse havido oportunidade de se montar nova pesquisa sistemática, o que ocorreu em 2004, quando esse grupo de pesquisa, junto com a Labor, fez a proposta do Projeto Participação e Diálogo, do qual trata a presente tese de doutorado.

Tanto nos PCNs quanto no Muda o Mundo, Raimundo, pude aplicar os princípios e propor abordagens metodológicas gestados na Labor. Mais tarde, já no século XXI, continuei a me inspirar nesse aprendizado em trabalhos ligados à educação e a formação, dos quais vim a participar, como o Programa Modular de Formação em Administração Pública, na República de Moçambique; o Projeto Genesis, aplicado no Brasil e na Espanha; o Projeto Fonte da Vida, aplicado em vários municípios da Grande São Paulo e divulgado na Argentina; e o Projeto O Valor do Amanhã, proposto pelo Instituto Unibanco junto a professores de Ensino Médio e a educadores de organizações sociais que trabalham com jovens. Em todos eles, destacava-se a

17 Carlos Matus, ex- ministro do planejamento do presidente Allende na época do seu assassinato pelo

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importância de se estabelecer uma relação de serviço, um vínculo de confiança entre a instância formadora e o sujeito da formação, considerado em seu lócus social e cultural. Ou seja, oferecer não uma educação que Paulo Freire chamaria de bancária, ou um processo de dominação/imposição cultural, mas uma educação libertadora, no sentido de reconhecer os valores e potenciais dos estudantes enquanto partícipes e cocriadores de seus ambientes (familiares, comunidade). Esse reconhecimento é difícil, tanto entre professores das escolas formais quanto entre técnicos responsáveis pela formação de funcionários ou trabalhadores, em especial quando se trata de pessoas pertencentes aos empregos nos níveis hierárquicos inferiores ou aos alunos de grupos

excluídos de nossa sociedade. Há, em geral, alguma consciência de “direitos” como

uma afirmação de cunho político-ideológico, mas não um reconhecimento de valor, um acolhimento dessas pessoas enquanto detentoras de uma cultura e de uma visão crítica diversas da “oficial”. Predomina, ao contrário, a desqualificação dessa cultura, justificando, portanto, o estabelecimento de uma relação de superioridade para com “essa gente” (que pode assumir uma feição até caridosa, assistencialista) e a necessidade de sua aculturação.

Nesses anos todos de atuação profissional, aprendi muito com os estudos, porém muito mais com pessoas incríveis que tive a felicidade de encontrar. Algumas delas foram citadas aqui. Muitas outras, porém, me ensinaram tanto ou mais, especialmente professores e diretores de escolas, lideranças comunitárias, pescadores, jovens, colegas de trabalho, familiares. O presente trabalho deve a elas todo esse acúmulo de experiências e aprendizados como ponto de partida.

Nesses anos, realizei também pesquisas e produzi muitos textos, vários dos quais publicados, mas poucos de caráter acadêmico, sendo a maioria voltada para a prática, para a orientação de educadores e técnicos ou para a divulgação de experiências.

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2. CENÁRIOS: CONTEXTO E HISTÓRICO DO PROJETO

Neste capítulo será explicado como o grupo de pesquisa da universidade se aproximou dos parceiros para constituir o Projeto Participação e Diálogo18, e o contexto em que isso ocorreu. Será apresentado um breve histórico da relação construída entre os pesquisadores e as instâncias da comunidade envolvidas nesse projeto, assim como a forma pela qual se estabeleceu a parceria com a Associação Educacional Labor, tendo em vista o tipo de intervenção desejada. Por fim, se fará uma breve caracterização das instituições e do bairro no qual essa intervenção ocorre.

2.1 A Universidade se aproxima da Associação Comunitária

Em entrevista dada à autora, Heloisa Szymanski relatou que, na década de 1980, buscando investigar sobre o tema “A família pensada e a família vivida”, começou a

trabalhar com as famílias das crianças atendidas por uma organização que atuava num bairro da Brasilândia.

Partindo de temas propostos em encontros anteriores com os familiares, eram realizadas reuniões sistemáticas que, inicialmente, consistiam na devolutiva da sistematização das falas e conclusões da reunião anterior, seguidas de breves exposições intercaladas por discussões do tema.

Heloisa resolveu adotar, como forma de devolutiva, o sociodrama, uma vez que a

forma escrita não fazia muito sentido para aquelas famílias. “Eu desenvolvi um sóciodrama, para eles entenderem o que eu descobri com o trabalho. O sóciodrama é um recurso que permite uma participação e uma compreensão muito grandes. E foi

18 Ver, no Anexo 1, o resumo do Relatório do Projeto Participação e Diálogo enviado ao CNPq, em 2010,

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muito bom. Tão bom, que as pessoas quiseram continuar a fazer esses encontros lá. Então criamos esse trabalho com as famílias.”19

Tempos depois, devido a mudanças na diretoria dessa instituição, o trabalho foi interrompido. Mas outra organização da mesma localidade, a Associação Comunitária

(que viria a fazer parte mais tarde do Projeto Participação e Diálogo) recebeu o grupo de pesquisa da PUC-SP, estando interessada justamente nesse tipo de atendimento para as famílias das crianças que frequentavam a Creche.

Foi então oferecido à Associação Comunitária um primeiro trabalho com as famílias da Creche, associado a uma pesquisa-intervenção participante – o projeto Relação Família/Creche: O Desenvolvimento de uma Prática Educativa Dialógica e a Constituição da Identidade20. Sobre esse projeto foi publicado um artigo (SZYMANSKI, 2007).

O objetivo da parceria, nessa época, era o de “abrir um espaço de reflexão sobre educação das crianças e co-construir alternativas dialógicas para a educação dos filhos”21. Com base num referencial teórico, método e foco de estudos já estabelecidos,

os pesquisadores desenvolveram algumas atividades iniciais com a Associação, que

“naquele momento assumiram a forma de encontros grupais com as famílias dos moradores do bairro”22. Tais encontros, semanais, eram mobilizados pela Associação e, como anteriormente, facilitados por recursos de sociodrama, “pois tal procedimento ensejava uma participação ativa”23.

Os pesquisadores, ao mediar os encontros, observavam as histórias e as vivências expostas, evitando interpretar o que ouviam e viam “numa busca do sentido, e não de

19 Texto extraído da entrevista mencionada.

20 Esse Projeto foi alvo de vários trabalhos de iniciação científica, dissertações de mestrado e teses de

doutoramento, conforme Anexo 2.

21 Texto extraído do artigo SZYMANSKI, H. A participação na pesquisa em psicologia e educação:

ensinamentos da experiência. VII Simpósio Nacional de Práticas Psicológicas em Instituição – CD ISBN 97885-98843 – 51 – 1. São Paulo, 2007.

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explicações causais.”24 E, a cada encontro, se fazia uma devolução dos dados sistematizados do encontro anterior, os quais eram apresentados e discutidos, constituindo-se em sua análise, ou compreensão dos pesquisadores a respeito deles.

Estabeleceu-se, assim, um clima de respeito e confiança entre pesquisadores e famílias, permitindo que mães e pais expressassem suas dificuldades na educação dos filhos, em especial quanto a superar o paradigma autoritário e adotar atitudes dialogais.

Os momentos de reflexão oferecidos pelos encontros eram muito apreciados pelas mulheres e considerados como raros momentos em que se podiam trocar ideias”25. Exigências da Prefeitura, com a qual a Creche Comunitária é conveniada, tornaram necessário que as educadoras buscassem obter diploma de terceiro grau e que o Projeto Político Pedagógico fosse apresentado rapidamente. Para tanto, uma pesquisadora da PUC-SP deu uma ajuda, “muito no sentido dela fazer [por eles], longe do processo participativo, porque eles tinham uma necessidade urgentíssima. Tinham que entregar [esse documento] na semana seguinte para a Secretaria. Então, ela fez o Projeto Pedagógico praticamente sozinha, mas foi com essa base que depois foram se desenvolvendo os outros.”26

Outros aportes foram feitos por meio de projetos de alunos, os quais faziam “a observação dos professores e o registro do comportamento das crianças da creche”27,

o que era posteriormente matéria de processos formativos nas “Paradas” – assim chamado o dia por mês reservado para reunir todos os educadores e funcionários, visando planejar e avaliar as atividades, bem como trabalhar a formação dos educadores da Associação Comunitária.

24 Idem. Aqui o artigo está se referindo aos pressupostos da fundamentação teórica da pesquisa, de

base fenomenológica. Esses fundamentos estão explicados, de forma sucinta, no capítulo sobre a metodologia empregada na presente tese, que segue a mesma linha teórica.

25 Cf artigo citado acima.

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Então, “havia uma troca em que eles reconheciam tanto que precisávamos de sua colaboração para levar adiante nossas obrigações acadêmicas, como viam em nossa atuação uma retribuição pelo que estavam oferecendo.” 28

Constatou-seque os encontros com as famílias significavam, para os participantes,

uma situação de escuta que raramente lhes era dada”.29

Durante uma década de encontros sistemáticos (1995 a 2004), a equipe de pesquisa se consolidou e obteve, finalmente, o pleno reconhecimento de seu compromisso com as questões relacionadas a educação e família. Os pesquisadores perceberam que esse longo tempo foi necessário, ao constatar que esta população tem sido alvo da

manipulação “por „políticos‟ inescrupulosos e/ou por pesquisadores ávidos por „coletar dados‟ para suas publicações e teses. Por outro lado, elas também se acautelam, definem seu período de prova, antes da admissão dos „estrangeiros‟.”

Isso nos faz pensar na importância de se ter um compromisso social com a população com quem se constrói a parceria, e o tempo necessário para o estabelecimento de uma relação de confiança.”30 A constituição dessa parceria foi, assim, considerada como um processo de aprendizagem lento para ambas as partes. Do lado da Universidade, havia uma relativa transitoriedade na equipe, uma vez que alunos de graduação e pós-graduação passavam de dois a quatro anos no grupo, enquanto duravam suas pesquisas. Somente a orientadora manteve-se permanente na equipe, ao longo desses dez anos iniciais. Mas os grupos iam sendo mudados aos poucos, com maior tempo de permanência por parte de alguns pesquisadores cujas pesquisas se estendiam por vários anos, enquanto outros entravam e saíam do grupo, mantendo-se dessa forma a coerência e continuidade da ação.

Do lado da Associação Comunitária houve também algumas mudanças no conjunto de educadores e gestores, e bem mais mudanças nas famílias que frequentavam os

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encontros, tanto por que sua disponibilidade e interesse variavam, quanto pelo fato de seus filhos saírem da Creche após alguns anos.

Em meados de 2004, uma nova perspectiva de parcerias se ofereceu: a mesma educadora, que havia apresentado a PUC à Associação Comunitária, tornara-se professora de uma escola da vizinhança, a Escola do Bairro31. Como o novo diretor dessa escola – um professor de Ensino Médio muito dedicado e apreciado por seus alunos – estivesse à busca de ajuda, para conseguir trabalhar de modo consistente com a comunidade e as famílias dos estudantes, apresentou-o à Associação Comunitária e à PUC-SP, sugerindo um trabalho conjunto.

A equipe da Universidade achou a ideia interessante e buscou um outro parceiro, com o qual já trabalhara em pesquisa-intervenção anterior: a Associação Educacional Labor32 que, justamente, desejava pesquisar uma forma de atuação que proporcionasse a integração entre escola, organização social educativa e famílias da comunidade.

Assim nasceu no âmbito da PUC-SP, em seu Departamento de Psicologia da Educação33, o Projeto Participação e Diálogo, para o qual foram garantidos os componentes de pesquisa, apoio às atividades e acompanhamento permanente por parte da Universidade, com a colaboração da Labor.

2.2 Porque a Associação Educacional Labor procurou a parceria da

universidade para desenvolver um projeto dessa natureza

Com o aumento da complexidade da sociedade atual, incluindo um crescente nível de sofisticação tecnológica que leva a rápidas mudanças nos processos de produção e

31 Com a finalidade de manter a privacidade da instituição, demos o nome de Escola do Bairro à escola

na qual se desenvolveu a pesquisa-Intervenção narrada na presente tese. Trata-se de uma escola municipal de ensino fundamental (EMEF), de um bairro da Brasilândia, que funcionava em 4 turnos, à época da pesquisa: das 7h às 11h, das 11h às 15h, das 15h às 19h e das 19h às 23h, isto é, ininterruptamente.

32 Sobre a Associação Educacional Labor, ver nota 13 do capítulo anterior (capítulo 1). 33 Programa de Estudos Pós Graduados em Educação / Psicologia da Educação da Pontifícia

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uso de materiais e de informações, exige-se das novas gerações um tempo cada vez

maior de escolarização, além de uma capacidade bem desenvolvida de “aprender a

conhecer”, dentro e fora do contexto escolar. Essa capacidade é, simultaneamente, “um meio e uma finalidade da vida humana. Meio, porque se pretende que cada um aprenda a compreender o mundo que o rodeia (...) para desenvolver as suas capacidades profissionais, para comunicar. 34 Assim, em menos de 50 anos, o ensino fundamental, reconhecido como direito de todas as crianças e sua oferta como obrigação do Estado, passa de 4 anos para 8, mais recentemente para 9 anos e, finalmente, para 12 anos ao se incluir o Ensino Médio como obrigatório, completando-se assim a educação básica. Por outro lado, garantir que os filhos frequentem a escola dos 6 aos 14 anos, tornou-se uma obrigação legal da família.

Mais ainda: além de estender a cobertura do ensino desde a pré-escola até o ensino

médio, a sociedade busca também melhorar a sua “qualidade”. Uma das formas amplamente colocadas em prática para isso consistiu em se criar muitas alternativas de educação complementar – espaços educativos extraescolares – ou em aumentar o tempo da permanência da criança na escola, oferecendo-lhe educação em tempo integral.

Em 1999, duas técnicas, responsáveis por seleção e orientação de projetos sociais e educativos da Vitae35, incentivaram instituições a investir na criação de uma experiência na interface entre instituições sociais e escolas, que favorecesse a oferta de educação em tempo integral para crianças e adolescentes, por meio da associação e sinergia entre as escolas e os demais equipamentos educativos da localidade.

34

“Aprender a conhecer” é um dos Quatro Pilares da Educação para o século XXI, de acordo com relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, coordenada por Jacques Delors. O Relatório está publicado em forma de livro, no Brasil, com o título Educação: Um Tesouro a Descobrir (UNESCO, MEC, Cortez Editora, São Paulo, 1999).

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Partia-se da hipótese que, nos casos em que se amplia a oferta de educação por meio de atividades complementares em horário alternativo ao da escola, se um mesmo jovem é sujeito a processos educativos proporcionados por diferentes instituições, seria importante que os educadores dessas instâncias pudessem atuar de modo integrado, trocando informações sobre o aluno e planejando em conjunto os processos pedagógicos sob sua responsabilidade. Para tanto, seria necessário proporcionar a interação e integração entre esses educadores.

Por outro lado, tanto as escolas quanto quaisquer outros tipos de organização educativa precisam interagir com um outro tipo de instituição considerada fundamental

na educação das crianças e jovens: a “família”, de quem as demais instituições

esperam uma ação básica de grande responsabilidade e uma colaboração complementar.

Para orientar, tanto as escolas quanto a organização social, a Vitae convidou a Associação Educacional Labor, cujas iniciativas vinha acompanhando havia algum tempo. Projetos da Labor financiados anteriormente pela Vitae, que os acompanhara e avaliara, levaram ao estabelecimento desse patamar de confiança.

Com efeito, a Labor havia desenvolvido competências tanto na área pedagógica quanto na de gestão, trabalhando de forma participativa nas instituições que atendia. Isso levava os educadores, de um lado, a melhorar seu fazer pedagógico, aumentando a

eficácia do ensino para todos os alunos, em especial aqueles mais “difíceis”; e, ao

mesmo tempo, facilitava a revisão do Projeto Político Pedagógico com o conjunto da comunidade escolar, de modo que ele fosse efetivamente assumido pelo coletivo.

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A forma de atuação da Labor é original e consegue bastante eficácia no alcance de seus objetivos. Isso se deve a vários fatores, dentre os quais ressalta-se o fato de seus quadros serem justamente pessoas que vivem, em seu dia a dia, a realidade do

sistema educacional brasileiro. Além disso, “entrar num projeto da Labor” é sempre

uma opção – primeiro da escola e, depois, do educador: considera-se fundamental que haja adesão e ninguém participe dele por obrigação. Os projetos são desenhados “sob medida” para as escolas objeto da experiência e seu detalhamento é realizado em

parceria com os gestores: desde os técnicos das Secretarias de Educação até a equipe de direção da escola. Os princípios e métodos são discutidos intercalando-se teoria e prática. O trabalho dos professores é acompanhado individualmente por um

“orientador” (em geral um professor de escola pública como ele, com experiência na

Proposta Labor) e há encontros/oficinas ao longo de todo o processo, nos quais são apresentados os avanços e dificuldades de cada um e propostos/discutidos os novos

passos. Não se impõe um projeto único, “enlatado”, ao professor, mas princípios e

procedimentos que ajudem cada participante a planejar individualmente seu próprio projeto de ensino, de acordo com a realidade de seus alunos, a formação e habilidades especiais do professor, a escola em que atue, a comunidade do entorno, o momento histórico-político vivido etc. Tudo isso cotejado com os objetivos pedagógicos que lhe competem durante o período no qual se desenvolve o projeto.

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Figura 2 128  - Elementos num paradigma de prática no pluralismo transformador

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