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4. APORTES TEÓRICOS

4.1 Conceitos: Diálogo e Participação

Neste item, discutem-se os conceitos de Diálogo, de Participação e o binômio Diálogo & Participação cujo significado ultrapassa o da simples soma Diálogo + Participação. Isso se justifica especialmente por terem sido idéias fundantes neste trabalho, em três sentidos: primeiro, enquanto norte do projeto de intervenção, uma vez que a busca dos parceiros foi a de conquistar mais espaço para o diálogo e a participação. tanto internamente no processo educativo, quanto nas interrelações interinstitucionais e intersubjetivas; segundo, enquanto método da pesquisa-intervenção que pretendeu ser de caráter participativo, com procedimentos assentados nos princípios e atitudes dialógicas; e, terceiro, enquanto conceitos que norteiam a questão colocada no início deste trabalho, uma vez que neste projeto, que se chamou “Diálogo e Participação”, não poderíamos deixar de investigar o significado atribuído a essas palavras-chave pelos atores aqui investigados e que se desvelarão em suas narrativas.

Para tanto, vamos, antes de tudo, buscar em Paulo Freire uma referência teórica para esses conceitos e esse binômio, uma vez que foi principalmente nele que se inspirou a equipe, ao propor e orientar as atividades de intervenção junto aos educadores da Escola, da Associação e das Famílias neste projeto. Em segundo lugar, vamos trazer os aportes de outros estudos do mesmo grupo de pesquisa, nos quais se revelaram vários aspectos e nuances que qualificaram como tais conceitos foram reconhecidos pelos diferentes atores envolvidos no processo. Pois o binômio Diálogo & Participação foi, neste Projeto, uma forma de conceber tanto as relações “em sala de aula” quanto das instituições educativas entre si e com outros adultos da comunidade.

50 4.1.1 Diálogo e Participação em Paulo Freire

Tendo em vista o objetivo deste trabalho, procura-se uma reflexão que possa trazer alguma contribuição para uma mudança em profundidade em nosso sistema educacional – identificada como fundamental já há várias décadas por educadores como Anísio Teixeira44 e Paulo Freire, para que o Brasil pudesse fazer face aos seus desafios contemporâneos. Não se trata de pequenas mudanças incrementais, que não resolveriam os principais problemas desse sistema cujas consequências são alvo da atenção, hoje em dia, da maior parte dos segmentos de nossa sociedade, desde as famílias de comunidades periféricas até o empresariado, passando pela classe política e pelos próprios educadores e gestores da educação. Mas uma mudança radical, paradigmática. É nosso ponto de vista que a mudança reclamada deveria ser uma verdadeira mudança de paradigma.

Nesse sentido, encontramos grande ressonância na forma de Celso Beisiegel45 trazer a história da educação no século XX e de apresentar as idéias de Paulo Freire de forma contextualizada em sua época, incluindo os autores em que se inspirou.

De um lado, mostra como Freire não constrói suas propostas para a educação num processo de simples dedução lógica a partir de fundamentos teóricos, mas procura, além de pedagogos, um conjunto de psicólogos, sociólogos, educadores, filósofos e escritores46, cujas idéias possam trazer luzes e contribuições para uma forma de ação que vem sendo como que “puxada” pela experiência vivida no convívio com o povo ao

44 Embora seus propósitos soassem como algo visionário, custoso e caro, Anísio Teixeira justificava a

implantação da escola em tempo integral, planejada com a comunidade, porque eram custosos e caros os objetivos a que visava, comparando a educação no Brasil a uma guerra que é sempre cara: não se poderia fazer uma educação barata, "se é a nossa defesa que estamos construindo, nunca será demasiado caro, pois não há preço para a sobrevivência". CORDEIRO, C. M. F. Anísio Teixeira, uma "visão" do futuro. Estudos Avançados, vol.15 no.42, São Paulo, May/Aug. 2001.

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142001000200012

45 BEISIEGEL, Celso de Rui. Política e educação popular: a teoria e a prática de Paulo Freire no Brasil.

Brasília: Líber Livro, 4ª edição, 2008.

46 Por exemplo: Bernanos, Jaques Maritain, Gabriel Marcel, Corbusier, Alceu de Amoroso Lima (Tristão

de Athayde), Álvaro Vieira Pinto, Alberto Guerreira Ramos e, especialmente, Karl Mannheim, Zevedei Barbu

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qual espera servir47. Essa foi também, aliás, a forma como a Associação Educacional Labor construiu e continua a construir suas propostas educativas. Naturalmente, na medida em que se percebe haver uma grande proximidade de um autor, ao fazer uma leitura da realidade que se enfrenta e com elementos que se identificam com as evidências de uma prática empiricamente construída que “funciona”, a leitura desse autor passa a influenciar essa mesma construção, permitindo um avanço nessa elaboração que, como o próprio Paulo Freire constata, se constitui no processo de ação-reflexão-ação. E uma reflexão puxa outra, gera a necessidade do aprofundamento, do debate, de novos aportes teóricos.

De outro lado, ao buscarmos como fundamento as bases de Freire e as suas constatações, percebemos que elas confirmam a percepção de que Diálogo e Participação andam juntos, lado a lado com o respeito ao educando e à autonomia de cada educador, o qual deve ser o autor de sua prática. E a escola só poderá cumprir sua função na medida em que leve em consideração as organizações da comunidade e estabeleça profícuas relações com as famílias.

De fato, Beisiegel mostra como as propostas centrais de Freire são “a necessidade do

diálogo entre os homens, a defesa da necessidade do respeito à autonomia do outro, a

afirmação da necessidade da participação de todos os homens na construção da vida

coletiva (...)”48. Mostra ainda que a escola deve, sim, ensinar os procedimentos para leitura, escrita e cálculo, mas não de forma desvinculada e autoreferente em si mesma, e sim “no seu contexto real, como habilidades, sem as quais não se pode hoje viver. O

programa da escola será a própria vida da comunidade, com seu trabalho, as suas tradições, as suas características, devidamente selecionadas e harmonizadas.”49

47 Idem, pgs. 51 e 61.

48 Idem, pg 50. Os grifos são do autor.

49 TEIXEIRA, Anísio S. Educação não é privilégio. Rio de Janeiro: José Olympio, 1957, p.52-2. In:

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Iremos salientar, de todas as inúmeras reflexões de Paulo Freire, trazidas principalmente por Celso BEISIEGEL50, algumas vertentes que dialogam mais diretamente com nosso trabalho:

a) os aportes da prática da “Educação Popular” para o pensamento freiriano sobre Educação;

b) a influência mútua entre os fundamentos e as práticas pedagógicas da Igreja Católica progressista, ou “pensamento cristão renovador” e as propostas de Paulo Freire ;

c) diante desses pressupostos, as críticas feitas por Paulo Freire à escola “tradicional” brasileira;

d) as propostas freirianas em resposta ao desafio da Educação no Brasil;

e) a importância do binômio Diálogo & Participação como fundamento de suas propostas pedagógicas.

Ao trazer esses aspectos, pretende-se iluminar a análise das narrativas obtidas, as quais descrevem o processo do Projeto Participação e Diálogo, oferecendo o seu significado aos educadores que o protagonizaram e às instituições envolvidas.

a) Aportes da prática da “Educação Popular” para o pensamento freiriano sobre Educação.

Esses aportes são importantes pois, além de serem a origem de muitas das reflexões de Paulo Freire, as considerações que as embasam se aplicam até hoje nas relações entre a escola e as famílias, a comunidade. Portanto, elas serão importantes para iluminar a compreensão desse aspecto de nossa pesquisa.

Beisiegel aponta, em seu livro51, que, desde o início do Século XX, assistia-se ao gradativo aumento da rede pública, devido à maior demanda, tendo em vista a

50 BEISIEGEL, 2008, op. cit. Essa obra toda trata desse assunto. Embora traga muitos outros aspectos

sobre as idéias e práticas existenciais de Paulo Freire, aqui tomaremos somente um recorte possível, centrado nos conceitos de diálogo e participação, como método para uma educação eficaz, no sentido de tratar o educando como sujeito na construção de seu conhecimento.

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crescente urbanização e industrialização do país. O mercado de trabalho muda, a urbanização e as oportunidades criam perspectivas de ascensão social e, portanto, de procura de oportunidades por meio da maior escolarização.

A forma desse aumento, no entanto, obedece a razões mais de ordem política do que educacional, não havendo, então, uma preocupação com a eficácia, não se planeja mudar o currículo ou o método tendo em vista a mudança de alguns objetivos, público e demandas da sociedade. “De escola seletiva passou a escola comum”52. Mas mesmo assim, algumas modificações acabaram ocorrendo: o currículo tradicional, por exemplo, se mantém, mas sofre modificações.

Celso aponta que a ideia de Educação para todos não surge, de fato, da demanda social nem da preocupação da elite intelectual com a educação do povo, mas se impôs mais como uma questão de coerência do pensamento dessas elites com doutrinas liberais da Europa, no início da República. Significa, ainda, em tempos de lutas pela real libertação do Brasil, uma reação ao pensamento colonialista que impede educação dos brasileiros. Nesse momento, a “instrução popular (...) era entendida como um

direito de todos” 53. Mais tarde, seria também imposta como um dever de todos – a partir da Constituição de 1988, além do governo ter a obrigação de oferecer o ensino fundamental público gratuito, os pais têm a obrigação de manter os filhos na escola dos 7 aos 14 anos e, desde 2010, dos 6 aos 14 anos. Mais recentemente, estuda-se tornar todo o ensino básico (os 9 anos de ensino fundamental e os 3 anos de ensino médio) uma obrigação do poder público.

Essas mudanças, porém, continuam sem uma contrapartida efetiva no currículo, método, formação de professores e procedimentos do dia a dia escolar que representem o resultado de um diálogo do sistema educativo com a sociedade, sequer com os próprios educadores desse sistema, aí incluindo as universidades em seu papel tanto de pesquisa quanto de formação dos educadores. Elas explicitam, ao contrário, de acordo com o autor, as suas origens ideológicas e suas funções de “controle social”.

51 BEISEGEL, 2008. Op. Cit., especialmente a Introdução e o capítulo 1

– Educação e realidade brasileira.

52 BEISEGEL, 2008. Op. Cit., p. 15. 53 Idem, p. 19.

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O desenvolvimento nacional proporcionado pela industrialização, junto com a crise internacional de 28, seguida da Segunda Grande Guerra, provoca mudanças, entrando numa fase de desenvolvimentismo nacionalista de base industrial. Nesse contexto ocorre a Campanha de Educação de Adultos (do Ministério da Educação e Saúde, em 1947), propondo uma “educação de base ou educação fundamental comum a todos os

brasileiros”54.

Nesse contexto, Paulo Freire é colocado diante do desafio de encontrar um caminho para obter melhores resultados na educação de adultos e tece algumas hipóteses. Atribui, inicialmente, suas dificuldades “a uma simples diferença de linguagem”55. Mas o estudo da “linguagem” do povo leva a outras descobertas: “(...) ao investigar as

significações peculiares das palavras aí utilizadas, a atenção do investigador desloca- se em direção ao estudo das características da vida popular que emprestavam significado às palavras.” Paulo Freire afirma, então, que “Ocorreu comigo uma longa e lenta evolução”, na medida em que partia “da linguagem do povo, dos valores do povo,

de suas concepções do mundo”56. A partir dessa experiência, propõe uma nova concepção do processo educativo em que o educando, a partir do uso da linguagem, pode mobilizar-se para conseguir mudanças estruturais em sua realidade.

Considero que, em síntese, esse processo descoberto na “educação popular”, na interação com adultos em processo de alfabetização, poderia ser visto da seguinte forma:

=> Uso da Linguagem (própria, de seu domínio, sua compreensão) => Expressão da realidade (pronuncia, nomeia sua realidade)

=> Percepção da realidade / clarificação da consciência crítica (apodera- se do conhecimento de sua própria realidade, portanto de seus aspectos críticos)

54 Idem, p. 28.

55 Entrevista concedida por Paulo Freire a Walter José Evangelista em 1972: In Beisiegel, 2008, op. cit. p

36.

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=> Consciência da experiência prática (reconhece-se como sujeito da ação e do conhecimento)

=> Consciência da participação popular (reconhece o próprio potencial de mudar as situações, como indivíduo e em grupo)

=> Mudanças estruturais (estrutura sociais podem ser mudadas pela participação do povo consciente)

Se a educação ocorre partindo da linguagem e da realidade do educando, Paulo Freire conclui que “todo o planejamento educacional, para qualquer sociedade, tem de

responder às marcas e aos valores dessa sociedade”. Para tanto, além das exigências da sociedade, há as exigências existenciais do homem, sendo necessário estabelecer “quais seriam as necessidades humanas decisivas na orientação das reflexões sobre a

educação”57, o que exigia explicitar uma concepção de homem – situado no tempo (histórico) e no espaço (região, localidade, grupo).

b) A influência mútua entre os fundamentos e as práticas pedagógicas da Igreja Católica progressista, ou “pensamento cristão renovador”, e as propostas de Paulo Freire.

Celso Beisiegel58, Tereza Cavalcanti59 e Faustino Teixeira60, dentre outros, descrevem a influência do pensamento católico progressista ou do “pensamento cristão renovador” nas idéias e, mais que nas idéias, no sentido e motivação de Paulo Freire em suas ações e reflexões a respeito da educação. Essa influência se dá principalmente por

57 FREIRE, Paulo. Educação e atualidade brasileira. Tese de concurso para a cadeira de História e

Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes de Pernambuco. Recife, 1959. In: BEISIEGEL, op. cit. p 43.

58 BEISEGEL, 2008. Op. Cit., p. 44-47.

59 CAVALCANTI, Tereza M. P. Tentativa de uma leitura teológica do pensamento de Paulo Freire.

Revista Síntese – Nova Fase, no 5, Editora Loyola, 1975, Out/Dez. vol 2.

60 TEIXEIRA, Faustino. A fé na vida: um estudo teológico-pastoral sobre a experiência das CEBs no

Brasil. Tese de doutorado, pela Pontifícia Universidade Gregoriana - PUG, Itália. São Paulo: Loyola, 1987.

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meio dos movimentos da Ação Católica que, após a segunda grande guerra, florescem na Europa, chegando ao Brasil na década de 50 e ganhando bastante impulso até meados da década de 1960, ao propor aos jovens o desafio de transformar não só a sua realidade, mas a própria realidade social. Florescem, então, em várias partes do Brasil, os movimentos da JOC (Juventude Operária Católica, a mais engajada), a JUC (Juventude Universitária Católica) e a JEC (Juventude Estudantil Católica, de estudantes secundaristas, os mais jovens). Houve também a Renovação Cristã, para os “mais velhos”, que permaneceu por mais tempo. E, a partir da década de 1970, com a Teologia da Libertação, essa influência, ao que tudo indica, foi mútua.

Em entrevista a Celso Beisiegel, em 1980, Paulo Freire declarou que, embora nunca tenha participado da JUC, “tempos atrás havia atuado em grupos da Ação Católica”61. Esse movimento partiu de uma profunda crítica de parte da Igreja Católica à prática e à reflexão tradicionais, em especial à “catequese tradicional”, consideradas formas de dominação ou, como diria Freire, de domesticação, semelhante à sua crítica à “educação tradicional”, bancária. A essas práticas autoritárias, centralizadoras, assistencialistas, não dialogais e muito menos participativas – e respectivas reflexões teológicas decorrentes - esse segmento da Igreja propunha uma Teologia da Libertação, assentada em uma prática e reflexão opostas, que alcançou bastante penetração em povos como os latinoamericanos.

Segundo Gonçalves62, algumas mudanças na Igreja possibilitaram o surgimento da Teologia da Libertação. Entre elas, cito:

1. A experiência da Ação Católica e seu método VER-JULGAR-AGIR cuja pedagogia, voltada para uma visão crítica da realidade, impulsionou uma ação transformadora. 2. A realização do Concílio Vaticano II, entre 1962-1965, e a busca de diálogo da

Igreja com o mundo moderno.

3. O florescimento das Comunidades Eclesiais de Base que lutavam pela transformação social.

61 BEISEGEL, 2008. Op. Cit., p 241.

62 GONÇALVES, A. J (2007). Gênese, crise e desafios da Teologia da Libertação, revista Adital: Notícias

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4. O enfrentamento dos regimes militares por parte das conferências episcopais nacionais, e por bispos com grande liderança, como Dom Hélder Câmara, Dom Pedro Casaldáliga, Dom Paulo Evaristo Arns e Dom Oscar Romero, entre outros. Seria coincidência o fato de que, enquanto essas idéias estavam se gestando na Igreja Católica, Paulo Freire lança, sucessivamente, Educação como prática da liberdade, em 1963; Pedagogia do oprimido, em 1970; Uma educação para a liberdade, em 1974 e, ainda, Las Iglesias, la educación y el proceso de liberación humana em la historia, também em 1974 ?

Em entrevista com uma das teólogas dessa linha, que escreveu, em 1975, um artigo justamente sobre essa convergência -Tentativa de uma leitura teológica do

pensamento de Paulo Freire – havia muitas interconexões e conceitos semelhantes entre os que serviram de base para a pedagogia freiriana e a teologia da libertação. Cita, nesse sentido, as visões de Homem e de História, o aprender a dizer a sua

palavra, a atitude crítica, o emergir da própria situação, o denunciar e anunciar, entre

outros. Localiza, claramente, essa forma comum de pensar e agir em termos pedagógicos que provoca um movimento por toda a América Latina, às voltas com regimes militares, no sentido de o povo assumir a própria libertação63. Afirma que pesquisadores e militantes que trabalham o tema das Comunidades Eclesiais de Base (CEB‟s), mencionam as obras e o pensamento de Paulo Freire, a exemplo do Doutor em Teologia, Faustino Teixeira, cuja tese doutorado versa justamente sobre CEB‟s 64. Num de seus trabalhos recentes, Faustino cita um depoimento interessante de um participante num encontro das CEB‟s: Antônio, da Favela Esperança - zona Sul de São Paulo, em 1986, que associa claramente a vida da CEB com as celebrações, as lutas populares, a alfabetização de adultos e a reforma agrária. “(...)Pensa que eu nem sabia ler e escrever! Não é que eu agora sei muito, mas em vista do que sabia, hoje tenho uma visão mais clara. Começamos a nos reunir para apreender a ler e a escrever. Estou falando dos Círculos de Cultura do Paulo Freire. Está sendo muito bom. Assim

63 CAVALCANTI, 1975, op. cit. p 87

– 99.

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nós temos aulas para adultos, celebrações, reuniões de reivindicação e lutas para a melhoria da favela.”65

Em outro artigo, afirma: “A reflexão da TdL estará intimamente articulada com a

afirmação e crescimento dos movimentos sociais e populares de libertação dos anos 60, de majoritária inspiração socialista. A título de exemplificação podem ser lembradas as fecundas experiências relacionadas ao trabalho de educação popular (vinculadas a Paulo Freire), a experiência das CEBs (comunidades eclesiais de base), do MEB (Movimento de Educação de Base) e da Ação Católica especializada, em particular a JUC (Juventude Universitária Católica), JEC (Juventude Estudantil Católica) e JOC (Juventude Operária Católica). 66

Essa influência se faz presente também na iniciativa da qual trata esta pesquisa, uma vez que há uma forte liderança, na Associação Comunitária, egressa desses movimentos. As convicções que norteiam as ações dessa organização demonstram essa influência – evidente na forma como essa liderança tenta levar uma atitude dialogal e participativa aos projetos educativos da Associação, refletindo-se desde a prática pedagógica junto a crianças e jovens, até nas relações com os familiares e intrafamiliares, passando pela própria gestão da entidade.

c) Críticas de Paulo Freire à “escola tradicional” brasileira.

Essas críticas, que se estendem do fazer pedagógico em sala de aula até a formação dos professores, são decorrências do seu aprendizado na convivência com os educandos e educadores, de sua visão de Homem e de Mundo, trazendo também aportes para um olhar crítico e analítico que se busca nesta pesquisa.

Numa tentativa de resumir as críticas feitas por Paulo Freire à escola “tradicional”, identificamos oito vertentes, descritas brevemente a seguir, em que destacamos a ausência de diálogo e do apoio à participação.

65 Revista "MUNDO e MISSÃO" - http://www.pime.org.br/mundoemissao/igrejacebs.htm, Março/2011. 66 TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO: EIXOS E DESAFIOS - PPCIR-UFJF. -

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1. Ausência de entrosamento entre a educação e a realidade brasileira. A escola seria67: desenraizada, desatualizada, desvinculada da realidade nacional e local, tendo seus conteúdos e métodos transplantados de padrões externos; inorgânica, por não atender a duas “exigências gritantes” – democratização crescente e industrialização crescente; inautêntica, desvinculada da vida, porque estranha às condições do presente.

2. Modelo de ensino inadequado: verbalista, palavroso; rigidamente programado em matérias; conteúdos decorativos, nocionais; escola estereotipada, propedêutica, bacharelesca, acadêmica.

3. Exercita e reproduz atitudes inadequadas, sendo de “feição autoritária,

rigidamente centralizadora, avessa a quaisquer modalidades de diálogo e participação, orientação assistencialista”68: alimenta extrema passividade na ausência do debate, da pesquisa e da reinvenção; não responde à necessidade