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BRÁS CIRO GALLOTTA SÃO PAULO APRENDE A RIR

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BRÁS CIRO GALLOTTA

SÃO PAULO APRENDE A RIR

A IMPRENSA HUMORÍSTICA

ENTRE 1839-1876

Doutorado em História Social

Programa de Estudos Pós-Graduados em História

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

São Paulo

(2)

BRÁS CIRO GALLOTTA

SÃO PAULO APRENDE A RIR

A IMPRENSA HUMORÍSTICA

ENTRE 1839-1876

Tese apresentada à Banca Examinadora do programa de Estudos Pós Graduados em História da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Doutor em História Social, sob a orientação da Professora Doutora Heloisa de Faria Cruz.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

São Paulo

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Banca examinadora

__________________________________

__________________________________

__________________________________

__________________________________

(4)

Para,

Meu Avô Carmine,

que me ensinou a gostar de história.

Para meus Pais,

Ciro e Margarida que sempre me apoiaram.

Para,

(5)

Agradecimentos

Ao finalizar este Tese gostaria de agradecer a diversas pessoas e instituições que

direta e indiretamente que acabaram participando do desenvolvimento deste

trabalho.

Em primeiro lugar, quero agradecer a professora Dra. Heloisa de Faria Cruz, que

acolheu com entusiasmo meu projeto de pesquisa, pelas valiosas orientações no

direcionamento deste trabalho que possibilitou em linhas gerais, na indicação, na

reflexão de leituras apropriadas ao tema, pela qual tem profundo conhecimento e

ajuda no desenvolvimento e finalização desta tese.

Sou muito grato à historiadora Paula Ester Janovitch, grande amiga com quem

compartilhei as descobertas da pesquisa, as dúvidas no direcionamento do tema

aqui estudado, os obstáculos para se consultar às fontes materiais, nem sempre

acessíveis ao pesquisador. Sua ajuda foi imprescindível para a reprodução de

caricaturas necessárias a esta tese. Além das inúmeras “figurinhas” que trocamos

pela afinidade ao tema.

Ao professor Dr. Marcos Antonio da Silva pelas valiosas contribuições no curso de

Pós Graduação na USP, nas leituras de suas obras e depois na qualificação, que

me ajudaram a redefinir melhor as possibilidades de conteúdos a serem trabalhos

nos capítulos desta tese.

Ao professor Antonio Luiz Cagnin, grande amigo, profundo conhecedor da vida de

Angelo Agostini, agradeço sua disponibilidade em conversar comigo, sugerir

inúmeras leituras e informações sobre o mesmo e suas publicações.

A Prof. Dra. Estefânia pelas importantes contribuições sugeridas durante a

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Nesses quatros anos e meio de elaboração desta tese tive a oportunidade de

entrar em contato com inúmeros professores do Pós, entre quais gostaria de

destacar as professoras: Maria Antonieta Martinez Antonacci, Yara Aun Khoury,

Maria do Rosário Cunho Peixoto, que durante suas aulas foi possível trocar muitas

idéias, dicas bibliográficas e orientações metodologias.

Esta pesquisa não seria possível sem ajuda de diversas instituições com que

mantive contato. São elas: o setor de obras raras da Biblioteca Municipal Mario de

Andrade, Sr. Bruno; A Biblioteca da Faculdade de Direito da Universidade de São

Paulo, onde sempre sou muito bem recebido por seus funcionários, especialmente

a Bibliotecária Guaraciaba de Barros Juk, que inúmeras vezes me ajudou nas

pesquisas de jornais e dos estudantes da Faculdade de Direito. Além de Maria

Lúcia Beffa, pela autorização das reproduções de desenhos de jornais do acervo;

A Biblioteca da Poli USP, onde fui muito bem atendido e consultei diversos

materiais sobre a história da ferrovia em São Paulo; Ao Instituto Histórico e

Geográfico de São Paulo, pelo seu valioso acervo, que sempre pude contar com a

ajuda do ex-presidente, prof. Roberto Machado Carvalho. Ao CEDIC – PUC- SP

pelos serviços de digitalização, microfilmagem e leitura de microfilmes. A

Biblioteca Nacional pelos serviços de microfilmagem de periódicos A todos muito

obrigado !

Agradeço a CAPES pela concessão da bolsa que muito me ajudou no

desenvolvimento e financiamento desta pesquisa.

A historiadora Eliane Cristina Lopes Nassif, grande amiga, que sempre me socorre

nos momentos mais difíceis, me ajudou na realização de algumas pesquisas

(7)

A professora Luciana que fez as primeiras revisões e recomendações para

adequar melhor o texto e a Eveline pelas revisões finais.

A Érika Kaiser Mori, que me ajudou no início da pesquisa na coleta de materiais.

À profunda conhecedora da cultura alemã em São Paulo, Marlis Schultze que

forneceu importantes informações sobre a vida do tipógrafo, litógrafo e ourives

Henrique Shroeder.

Aos meus amigos do Pós da PUC, com que compartilhei alegrias e dificuldades

ao longo deste doutorado, Ana Claudia, Ana Magna, Angela Roberti, Carmélia,

Amailton, Airton, Telma Bessa, Marco Sávio ....

Agradecimentos especiais vão também para amigas de longas datas: Débora

Novaes e Kátia Novaes que com muito bom humor me deram todo apoio durante

esta pesquisa. A Ivanildes, com quem trabalhei muitos anos no Instituto e que

nos nossos inúmeros cafés, sempre me deu a maior força para fazer este

trabalho.

Por fim, agradeço aos meus pais pela força e pelo carinho, especialmente minha

mãe, que sempre teve um objetivo muito claro em sua vida: dar educação a seus

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“(...) sempre me dirigi ao meu público através do filtro humorístico.

Para dizer, porém, coisas que são até sérias”.

(9)

RESUMO

Esta tese analisa relações entre imprensa, humor e vida social em São Paulo entre os anos 1839 e 1876. O estudo tem como eixo central o processo inicial de formação da imprensa de humor paulista, identifica como se constituíram os primeiros periódicos humorísticos,e busca problematizar a emergência de estilos e narrativas de humor em meio a processo geral de constituição e afirmação do periodismo paulista . No cruzamento entre o fazer-se dessa imprensa e a vida social, procura surpreender e refletir sobre o diálogo ativo entre a construção de campos temáticos nos periódicos e as transformações da vida urbana naquela conjuntura.

Analisando as publicações e a constituição de narrativas e estratégias de linguagem produzidas por cronistas, jornalistas e por caricaturistas como Angelo Agostini, Eduardo Langlois e Nicolau Hauscar de Vergara, evidenciou-se caminhos que, do interior do jornalismo político e domingueiro, abriam-se a experimentação dos gêneros de humor.

Com a publicação do Diabo Coxo e o Cabrião, as folhas domingueiras sinalizam para uma percepção social mais intensa do viver urbano, explorando o momento de transição e transformação de vila tropeira para metrópole do café e os impactos de novas tecnologias simbolizadas principalmente pela inauguração da Estrada de Ferro São Paulo Railway.

Já as publicações de o Coaracy e o Polichinelo, apresentam-se uma narrativa mais ágil, bem agosto dos novos ritmos que a cidade vivencia. Ironizam-se as primeiras obras de benfeitorias urbanas. Mostra-se também uma cidade mais a vontade com as novidades do mundo moderno. Valorizam-se os debates e combates políticos do momento.

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ABSTRACT

This thesis analyzes the relation among the press, humor and social life in São Paulo between the years 1839 and 1876. The central basis for this study is the first steps in gathering a humoristic local press, identified as the first humoristic periodic, which is aimed to draw attention dramatically to lack of style and humoristic narratives in the ongoing general process of settlement and affirmation of the called ‘periodismo paulista’, i.e paulista periodism. As a result from this ongoing process and social life, it aims also to creep up from behing the reader and reflect upon the concrete conversation between the theme area immersion in the periodic and the urban life changes at that certain point in life.

Analyzing the publications and the narrative and language strategy development used by writers, journalists and cartoonists such as Angelo Agostini, Eduardo Langlois and Nicolau Hauscar de Vergara, it is clearly that by doing so the experimentation in different humor styles began from heart of the political Sunday journalism,

After the releasing of Diabo Coxo and as well Cabrião, the newspaper Sunday pages show a more intense social perception of the urban life, emploring the transition and changing moment from a small ville into the café metropolis notwithstanding the impact of new technology shown mainly by the opening of the Estrada de Ferro São Paulo, i.e, São Paulo Railway.

Nevertheless, the Coaracy and the Polichinelo publications are presented as a more agile narrative, following the trend of rhythms and movements which the city has been goin through. The first urban improvemnet masterpieces are ironised. Moreover, a more relaxing atmosphere regarding new modern technology is also noticed. The political confrontations and debates at present.

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SUMÁRIO

Introdução 12

Capitulo 1 – As primeiras publicações: entre e o político e o literário 26 Capitulo 2 – Humor nos periódicos paulistas 49 Capítulo 3 – A caricatura chega à paulicéia 80 Capítulo 4 – Compondo o jornal de humor 111

Capítulo 5 – A cidade dos humoristas 149

Capítulo 6 – A tecnologia e o progresso: a chegada da ferrovia 213

Considerações finais 263

Fontes e bibliografia 277

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INTRODUÇÃO

Este trabalho propõe a reflexão acerca das relações entre imprensa, humorismo e vida social na cidade de São Paulo, no período de 1839 a 1876. O interesse nesta pesquisa advém de um longo processo de amadurecimento intelectual em relação ao tema e a imprensa de humor paulista..

O contato com estes materiais teve início durante o curso de História da PUC-SP, o que possibilitou a aproximação com a professora doutora Luana Salvia Trindade, antropóloga, da FFLCH-USP, que orientou as primeiras pesquisas a respeito da imprensa do século XIX, em diversos acervos de São Paulo, para os bolsista de iniciação cientifica.

O trabalho em um dos maiores acervos de periódicos de São Paulo, localizado na hemeroteca Julio de Mesquita, pertencente ao Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, possibilitou a descoberta de uma riqueza material sobre a imprensa de São Paulo. Como todo pesquisador iniciante, fiquei fascinado e ansioso diante de todo material. Queria abordar todos os assuntos ao mesmo tempo sem um critério definido.

Em contato com a professora doutora Heloisa de Faria Cruz, do Programa de Estudos Pós-Graduados em História PUC-SP, no início e no final da graduação, pude contar com uma adequada orientação que me incentivou a escolher com rigor e clareza o objeto de estudo para elaboração de minha dissertação de mestrado, O Parafuso: humor e crítica na imprensa paulistana 1915-1921.

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historiográfico para a elaboração de minha dissertação de mestrado e agora para esta tese.1

A forma com que Heloisa apresenta as transformações da imprensa paulistana e do viver urbano no final do século XIX e início do século XX, de como se constroem as experiências culturais e os espaços de sociabilidades urbanas, me instigou a pensar também nessas relações num momento de nascimento da imprensa paulista e da busca de novas narrativas, particularmente, o humorismo.

Naquele momento, fui também incentivado pelas leituras, aulas e conversas com o professor doutor Marcos Silva, do Departamento de História da FFLCH da USP, que despertou o meu interesse pelo estudo da narrativa humorística na imprensa em São Paulo no século XIX. Além das inúmeras conversas e leituras de trabalhos do professor doutor Antonio Cagnin, do Departamento de Cinema, da ECA – USP, um estudioso e apaixonado pelos quadrinhos e pela vida de Ângelo Agostini.

Nesta trajetória, na construção das referências teóricas sobre humor e imprensa, dialoguei com vários autores, dentre os quais, destaco Bakhtin e Gombrich.2

Desde as questões iniciais e as pesquisas em periódicos do século XIX e XX, em desenvolvimento desde o fim da graduação, intensificadas na

1

Versão publicada sob novo título, CRUZ, Heloisa de Faria. São Paulo em papel e tinta periodismo e vida urbana – 1890-1915. São Paulo: Educ/Fapesp/Arquivo do Estado/Imesp, 2000.

2

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elaboração de minha dissertação de mestrado, foi possível ter consciência dos cuidados necessários em relação ao deslocamento temporal das premissas teórico-metodológicas propostas por Bakhtin sobre o escracho, o difamatório, o irônico, o burlesco, a sátira, a paródia como elementos nas mais variadas formas de fazer humor e que fazem parte do universo da cultura cômica popular.

Não obstante a necessidade dos cuidados teóricos assinalados, na avaliação que fazia sobre muitos dos periódicos pesquisados, parecia importante encaminhar o diálogo com as proposições sobre linguagem de Bakhtin, destacando-se a revista O Parafuso e em algumas outras revistas cômicas que vieram a público naquele momento. Parecia instigante refletir sobre as relações dessas publicações com cultura cômica popular e a cultura letrada. É verdade que no contexto brasileiro e, particularmente, paulista, elas assumem uma nova dimensão, tendo como influência os primeiros periódicos humorísticos, publicados em meados do século XIX: além da literatura regionalista paulista, a apropriação de formas de linguagens caipira, literária, além das injúrias, das difamações, do “macarrônico” entre outras praticadas pela boemia paulista. 3

Nesse sentido, o vínculo entre cultura popular e humor, apontado por Bakhtin, e a cultura letrada parece ser pertinente para O Parafuso e para muitos periódicos similares que criaram uma “contra-linguagem”, e que seriam o contraponto à linguagem oficial.

Finalizando a dissertação de mestrado, fiquei instigado a retornar os estudos sobre o humor na imprensa paulista. No sentido de refletir sobre o processo de constituição das linguagens presentes não só em O Parafuso como em muitos periódicos contemporâneos do gênero.

3

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respostas. Por que, para alguns estudiosos4, O Parafuso era um periódico humorístico associado ao escracho, ao difamatório, aos pasquins e à “imprensa sensacionalista”? De onde vinham estas referências? O que o diferenciava de um periódico associado ao “humorismo sadio”?

Naquele momento, eram questões que surgiram sem que pudessem ser aprofundadas, pois não eram o foco de meu trabalho e não exigiam ser esclarecidas, considerando as circunstâncias de momento. Além do que, não havia estudos sobre o assunto em São Paulo: a imprensa humorística anterior ao período Republicano.

Esta constatação instigou-me a pesquisar sobre as primeiras publicações humorísticas de São Paulo. O maior contato com essa imprensa humorística do século XIX, a constatação da pouca pesquisa existente sobre o tema e as indagações a respeito da vida cultural na segunda metade do século XIX, animaram-me a propor um projeto de pesquisa que investigasse essas publicações.

A proposta inicial desta Tese era estudar a imprensa humorística de São Paulo, entre os anos de 1839 a 1889, refletindo acerca das relações políticas no interior das quais a imprensa se articulava, identificando os temas, os grupos produtores e o universo de leitores no contexto de uma cidade, cuja maior parte da produção periódica ainda se traduzia em uma linguagem da e para a elite política.

Entretanto, o contato com essas publicações, em grande parte incompleta e fragmentada, permitiu que se repensasse esta periodização, isto

4

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porque trata-se de um período que abrangeu o final tumultuado da Regência, início e fim do Segundo Reinado, cujo conteúdo apontava para uma predominância de temas relacionados à vida política, principalmente à urbana, entre 1839 e 1876, trata-se portanto de um período de transição. São Paulo estava começando a colher os dividendos do café. E isto me chamou muita atenção, pela forma dúbia com a qual o olhar humorístico apreendia estas transformações.

A cidade, isto é o viver urbano, estava em evidência. As incertezas em relação às novidades que chegavam à cidade provocavam um misto de encanto e desconfiança. As tensões entre o novo e o “provinciano” traduziam-se em cenas muitas vezes ridículas, dignas de risos e ironias de humoristas e caricaturistas.

Já no período posterior, da década de 70 até o final do Império, a imprensa periódica humorística centralizava seus temas nas campanhas abolicionistas, na divulgação das idéias republicanas, nas questões políticas do Império e em outros assuntos. A vida urbana é pouco trabalhada. Além do que estes temas são bastantes conhecidos pela historiografia.

Pela primeira vez, os logradouros, as ruas, os becos, as várzeas, os largos, apresentavam-se como um grande cenário por onde nossos caricaturistas e cronistas transitavam e compunham suas representações. Descortinavam-se aos paulistanos as imagens de uma cidade em transformação, rindo de suas mazelas.

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a especificidade desse contexto pedia análises mais cuidadosas. Daí a justificativa da escolha desta periodização

Além do que, a introdução de periódicos, que inicialmente abriam espaço para o humor e para outros que explicitamente reivindicava-se como humorísticos, inicia um processo de reformulação do espaço público, de discussões e questionamentos. Muito embora ainda este espaço esteja circunscrito à elite letrada, a imprensa humorística se coloca como um elemento importante no processo de transformação da esfera pública. Falas dissidentes tentam romper os limites do circuito letrado na busca de outros públicos.

Deve-se apontar que foi no interior dessas publicações que a caricatura ganhou espaço e atinge maior publicidade, pensando no dinamismo da imagem – do desenho humorístico, da litogravura – produtos dos avanços na técnica de impressão e reprodução para a época que, além de buscar ampliar seu espaço para além dos grupos letrados tradicionais colocar em um espaço aglutinador de parcelas de semi-analfabetos e analfabetos6, era uma forma inovadora de linguagem, inédita para a cultura provinciana da cidade de São Paulo.

5

GOMBRRICH, E. H. O Arsenal do caricaturista. In: GOMBRRICH, E. H. Meditações sobre um cavalinho de pau. São Paulo: Edusp, 1999, pp. 138-139. Gombrich lembra “a equiparação entre estas qualidades sensuais e morais ou tons sentimentais é tão natural a todos nós que dificilmente temos consciência de seu caráter metafórico ou simbólico. A propaganda racial explorou em todos os tempos essa fusão irracional – são testemunhas os horripilantes cartuns publicados no Der Sturmer, o pasquim do período nazista que instigava o povo contra os judeus”.

6

Mas, não podemos esquecer que o acesso a estas publicações ainda eram muito restritos e caros. Segundo pesquisa realizada por Délio Freire dos Santos (O Cabrião e a imprensa paulistana no império (esboço histórico da caricatura e do jornalismo humorístico).São Paulo: s/e, s/d. p. 44, comparando o Diabo Coxo e o Cabrião, que custavam 500 Réis), com outros periódicos contemporâneos, eles seriam os mais caros, o dobro do preço, por exemplo, de o

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No encaminhamento da reflexão, a tese desenvolve alguns diálogos teóricos e historiográficos que merecem destaque.

E. H Gombrich é o historiador que ofereceu a mais importante contribuição no campo teórico para analisar as representações pictóricas. Para ele, toda representação tem uma história. Não veio do nada, não é produto de um olhar imparcial, inocente do artista: é fruto de um conjunto de experiências, no pintar, no olhar, no captar, no transpor para tela a percepção do mundo. O ato de ver, observar, não é apenas registrar, vai muito além. 7

Para este autor, a caricatura é fruto de experimentos, de uma série de testes de desenhos, da fisionomia até chegar à expressão desejada, convincente. Gombrich lembra o sucesso do desenho da Disney, por exemplo, que é uma “verdadeira magia”, pois conseguiu conquistar a todos pela expressão e fisionomia. A meu ver, isso se coloca como um dos sucessos da aceitação do público em relação ao desenho humorístico. 8

“A invenção da caricatura-retrato pressupõe a descoberta teórica da diferença entre semelhança e equivalência”.9 Isto possibilitou criar uma alternativa possível de representação de ver o caricaturado. Portanto, para Gombrich, aqui estaria

o segredo de uma boa caricatura [e também de uma charge] – oferecer uma interpretação visual de uma fisionomia que desde então não conseguimos esquecer e que a vítima [ou a situação, o fato] sempre carregará consigo como um homem enfeitiçado. 10

7

GOMBRICH, E. H. A análise da visão da arte. In: GOMBRICH, E. H. Arte e ilusão um estudo da psicologia na representação pictórica. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 309

8

GOMBRICH, E. H., op. cit., p. 356.

9

Idem, ibidem, p. 364.

10

(20)

elaborada a partir de uma série de pêras – poires. Reagimos a esta representação com suas linhas entrecruzadas, como se fosse a cabeça do Rei.

Durante este trabalho, a leitura de Gombrich foi muito oportuna, pois possibilitou enfrentar as dificuldades ao analisar, tentando decodificar um desenho humorístico, seja caricatura ou charge. Gombrich oferece alguns encaminhamentos importantes, como sua preocupação em desvendar as “formas e expressões”, isto é, como reagimos a estas experiências como público.

A subjetividade de um desenho humorístico, a capacidade que o artista tem de expressar um fato, uma situação, um retrato de uma pessoa que não é apenas um instantâneo do real suscitam questionamentos. O historiador deve ter a sensibilidade, a capacidade de detectar as dimensões temporais contidas nessas imagens, tentando perceber o que o artista está querendo expressar para além da objetividade aparente. Que temporalidades estão ali colocadas? Isto talvez esteja sendo um dos maiores desafios deste trabalho. Mas, ao mesmo tempo, é bastante instigante.

No campo da historicidade do humor visual, destaca-se o trabalho pioneiro do professor doutor Marcos Silva, publicado em 1979, Humor visual no Brasil, resultado de um ciclo de exposições sobre a ilustração no Brasil, realizado no Museu Lasar Segall, com o título de A caricatura no Brasil (o Desenho de humor), quando esta temática ainda era, digamos assim, um assunto “não sério” e enfrentava certas resistências para se trabalhar.

Neste texto o professor Marcos se referia a esta historicidade como um campo restrito

apenas à elaboração das mais completas “árvores

(21)

humor visual um lugar de uma visualidade crítica explicitada, é

preciso considerar o trajeto comunidade/autor/obra/público para

que se compreendam as diferentes configurações assumidas

por tal produção no decorrer da experiência histórica do país.

Nesse sentido, o processo de formação de um mercado de

bens intelectuais e artísticos, paralelo ao alargamento das

parcelas da população atuantes na sociedade política, são

dados importantes para o surgimento dos veículos que

permitiram uma maior expansão do humor visual: os periódicos

impressos – jornais e revistas. 11

Na esteira dessa problematização do humor visual, Marcos Silva escreveu trabalhos como o estudo sobre o personagem Zé Povo, nas revistas cariocas de humor nas primeiras décadas do século XX, dissertação de mestrado; Prazer e poder do amigo da onça, tese de doutorado, e mais recentemente sua livre-docência, Rir das ditaduras: os dentes de Henfil (ensaios sobre o Fradim 1971-1980).

Todos estes trabalhos estão sendo importantes no sentido de entender o papel destes personagens humorísticos, presentes em periódicos variados, desempenhando o papel das vozes de resistências, baseadas nas experiências sociais e podendo ser situadas numa discussão do valor artístico e ideológico.

No Brasil, os estudos sobre as narrativas humorísticas, sejam no campo visual e/ou na escrita, quase sempre estiveram circunscritos no contexto do final do século XIX e início do século XX. A tese de doutorado de Mônica Pimenta Vellozo, O Imaginário humorístico e a modernidade carioca, tomam toma o humor como um elemento-chave para repensar a modernidade carioca fora do paradigma paulista.

11

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A leitura deste trabalho possibilitou entender como Vellozo analisa as modificações introduzidas pelo processo modernizador do quotidiano carioca e suas influências nas relações culturais e nas percepções dos intelectuais, a partir do imaginário construído por este grupo e pelos humoristas.

Isto ajudou a entender, no caso de São Paulo de meados do século XIX, e a repensar o próprio enfoque com uma perspectiva histórica mais direcionada ao viver urbano, ou seja, como os humoristas lidam com os acontecimentos cotidianos que mobilizam e geram tensões sociais na cidade. Os materiais analisados revelam o imaginário social de uma cidade em transformação, cujo espaço público urbano – as ruas, os becos, os largos, as várzeas – está em evidência.

O estudo de Elias Thomé Saliba no seu livro, Raízes do riso, a representação humorística do dilema brasileiro: da belle époque aos primeiros tempos do rádio é um trabalho inédito na historiografia do humor brasileiro e na sua constituição como formas de representação histórica.

O trabalho de Paula Ester Janovitch, Preso por Trocadilho a imprensa de narrativa irreverente paulistana de 1900-1911, possibilitou a pesquisa acerca da narrativa da imprensa humorística do século XIX, levantando temas como: a introdução da ferrovia na cidade de São Paulo. No interior desta pesquisa, procurei igualmente aprofundar e problematizar o contexto das transformações urbanas em processo nesse momento.

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possível estabelecer um parâmetro para o mapeamento desta produção jornalística.

Na verdade, foi a partir da leitura do seu trabalho, O Cabrião e a imprensa humorística no Império (esboço histórico da caricatura e do jornalismo humorístico)12 e juntamente com muitas conversas que tivemos sobre o tema que nasceu a idéia de aprofundar um assunto até então visto apenas pela ótica descritiva, sem qualquer problematização.

Outros trabalhos como os de Afonso A de Freitas, Freitas Nobre, Nelson Werneck Sodré também foram muito importantes no encaminhamento desta pesquisa, pois são imprescindíveis para qualquer pesquisador que se interesse pela história da imprensa em São Paulo. Assim como Herman Lima, Frei Pedro Sinzig, Monteiro Lobato nos com estudos sobre a caricatura no Brasil.

Mais recentemente, a dissertação de mestrado, Humor e sátira: o Cabrião no quotidiano da cidade de São Paulo – 1866-67 e as teses de doutorado de, Gilberto Maringoni de Oliveira, Angelo Agostini ou impressões de uma viagem da Corte à Capital Federal 1864-1910; e de Marcelo Balaban, Poeta do lápis a trajetória de Angelo Agostini no Brasil imperial São Paulo e Rio de Janeiro – 1864-1888, além de inéditos na historiografia da imprensa de humor, permitiram aprofundar minha reflexão sobre os temas abordados pelo Diabo Coxo e o Cabrião, referentes ao quotidiano da cidade.

O período aqui proposto, a acerca das relações da imprensa humorística e da vida pública em São Paulo, entre 1839-1876, nos coloca diante de uma lacuna na historiografia sobre a imprensa, portanto oportuna a ser explorada, havendo necessidade de se problematizar como os humoristas

12

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imprensa se constituía em uma busca de novas formas de narrativas.

Pelo olhar humorístico, é possível visualizar os primeiros impactos das intervenções urbanas, suscitadas pela introdução e pelo choque de hábitos provincianos com os novos hábitos e pelos equipamentos tecnológico que, ao mesmo tempo, deslumbravam e provocavam desconfianças por causa destes sinais de modernidade. É um momento de transição: da vila de tropeiros para a metrópole do café. Trata-se, de certa forma, de um período privilegiado para o historiador. Mais que outras fontes documentais, a imprensa faz emergir experiências sociais que expõem as contradições desse processo modernizador da cidade. Além de colocar o humor e a imagem como marcos importantes para a história das práticas humorísticas na cidade de São Paulo e que, no século XIX, o grupo encontrou terreno para se desenvolver, assim como permitiu a discussão acerca da tradição humorística paulista, até então desconhecida pela historiografia.

Lembro-me que durante a elaboração de minha dissertação de mestrado faltava um elo de ligação entre as práticas humorísticas anteriores e as das primeiras décadas do século XX, constatadas em revistas como O Parafuso, O Pirralho, A Lua, a Marreta, entre outras. Isso me instigou a pesquisar esta tradição que, como veremos, se confunde com a própria constituição da imprensa e com as transformações urbanas da cidade.

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As fontes trabalhadas são os periódicos denominados humorísticos desse período, entre eles O Pensador (1839), o Diabo Coxo (1864-1865), O Cabrião (1866-1867), O Polichinelo (1876), O Coaracy (1876). As seções dos jornais Diário de São Paulo (1865-1867), e o Correio Paulistano (1866). Incluem-se relatos dos memorialistas e de estudiosos da imprensa, como Afonso de Freitas e Délio Freire dos Santos.

Para desenvolver as reflexões acima colocadas, proponho dividir este trabalho da seguinte forma:

No primeiro capítulo, procuro discutir o fazer-se da imprensa paulista e suas relações com as transformações urbanas. O surgimento dos primeiros jornais, a imprensa e as querelas políticas, e a busca por novos conteúdos e formas de contar da imprensa literária. A importância e a atuação dos estudantes da Academia de Direito nos periódicos paulistas, as relações entre a imprensa, a academia e a cultura literária de então.

A descoberta do humor pela imprensa é o tema do segundo capítulo, no qual procuro analisar o caráter fragmentário e efêmero dos periódicos considerados humorísticos, bem como suas estratégias de linguagem para se comunicar com os leitores, comentando seu conteúdo e o impacto da chegada da caricatura na cidade, como expressão e representação do viver urbano. Analiso também como a historiografia clássica sobre a imprensa trata esta temática e as armadilhas colocadas ao criar estereótipos e definições não condizentes com os jornais estudados.

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No quarto capítulo, analiso como os primeiros periódicos humorísticos com caricaturas: Diabo Coxo, Cabrião, O Coaracy e O Polichinelo constroem os mais diversos recursos lingüísticos, compondo uma nova escrita humorística na cidade, utilizando-se de versos, sonetos, metáforas, o contra-discurso, a ironia, as frases rápidas e outros recursos de linguagem articulados com os novos artefatos tecnológicos cada vez mais presentes na vida das pessoas.

A cidade expressa e representada pelos caricaturistas é o tema abordado no quinto capítulo, em que se procura destacar as modificações introduzidas pelas primeiras intervenções urbanas na cidade, observando os sinais de modernidade, que influirão as percepções de nossos caricaturistas e a composição de um imaginário social da/sobre cidade.

Os impactos sociais da chegada da ferrovia em São Paulo, com a frustrada e catastrófica inauguração da São Paulo Railway, são o tema do sexto capítulo. Salientam-se as modificações introduzidas pela mesma na vida quotidiana da cidade e que expressas pelas caricaturas de Agostini e por cronistas do momento. Enfatizo que tais modificações simbolizam as primeiras expressões de modernidade na cidade e que acabam sendo colocadas em questão sobre sua verdadeira eficácia. Mas que, em meados dos anos 70, aparecem consolidadas e triunfantes.

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CAPITULO 1 – AS PRIMEIRAS PUBLICAÇÕES: ENTRE O POLÍTICO E O LITERÁRIO

No momento de emergência da imprensa paulistana torna-se difícil e inadequado isolar as publicações de humor do movimento mais amplo de surgimento constituição da imprensa na cidade. É no interior do movimento de emergência dos vários veículos, de desenho de gêneros, e da descoberta de estilos e narrativas que se busca explorar as relações entre cidade, imprensa e humor.

Nas primeiras décadas do século XIX, período proposto para este estudo, a cidade de São Paulo pouco se diferenciava das vilas dos tempos colonias. As descrições e impressões dos viajantes nesse período e mesmo a historiografia sobre este momento são unânimes em afirmar que o espaço urbano, o núcleo fundante da cidade, pouco se modificara ao conhecido nos tempos coloniais, estabelecido em uma colina, entre os vales do Anhangabaú e do Tamaduatei.

A vocação econômica da cidade, desenhada desde o século XVIII, era comercial. Há relatos de viajantes falando dos pequenos redutos comerciais na região central. São Paulo era um ponto de passagem de muitos tropeiros que vinham e partiam para diversos pontos do interior, litoral e outros estados. Ainda era um entreposto comercial, mantinha contato permanente com Santos, usufruía da lavoura canavieira e do desenvolvimento da cafeicultura no Vale do Paraíba. 1 A cultura do chá também era considerada atividade agrícola importante na cidade, e não passou despercebida pelos viajantes. Embora ainda fossem bastante incipientes, de caráter doméstico, há relatos de pequenas manufaturas: “indústrias” de fiação de algodão e lã assim como a constatação na obra de

1

MATOS, Odilon Nogueira de A cidade de São Paulo no século XIX In: SILVA, Raul Andrada; MATOS, Odilon Nogueira de; PETRONE, Pasquale (orgs.). A evolução urbana em São Paulo,

(28)

sapateiros marceneiros, boticários, entre outros. 2

No que se refere às atividades e práticas letradas, muito pouco havia mudado desde o século XVIII. A Igreja Católica estava fortemente presente, principalmente na figura do jesuitismo para a qual Agostini, como veremos, lançará suas sátiras. Grande parte dos estabelecimentos de ensino ainda estava sobre sua influência. A primeira Biblioteca pública da cidade funcionava desde 24 de abril de 1825, no convento dos franciscanos, e tinha caráter religioso, pois

reunia o acervo dos franciscanos que desde o século XVII resultava

da doação de 2000 livros da biblioteca do Bispo de Funchal e o

acervo do bispo Dom Matheus de Abreu Pereira, esse último

arrematado em praça, especialmente para compor a nova livraria,

localizada ao lado do convento. 3

Este restrito círculo letrado tende aos poucos a perder espaço para a organização de uma elite letrada e tem como elemento predominante os jovens estudantes, futuros bacharéis, homens que ocupariam cargos na administração pública, na presidência das províncias, como deputados, presidentes da República, fazendeiros que também se enveredariam para o jornalismo ou para literatura.

No que diz respeito à organização da cidade letrada, do “burgo de estudantes”, a Fundação Faculdade de Direito, em 1828, também conhecida por Academia de Direito, trouxe importantes transformações para a pacata cidade de São Paulo, não só no que se refere à estrutura física, mas cultural e social. A presença de estudantes vindos de diversas regiões do Brasil alterou os modos de

2

Idem, ibidem, p. 51.

3

(29)

vida da cidade, a ponto de a historiografia tradicional considerar este período uma fase da história da cidade 4.

Reconhecendo a importância desta elite letrada, Cruz alerta criticamente para uma periodização que transforma a abertura da Academia de Direito é em marco fundante da cultura letrada paulistana. 5 Não obstante tais indicações há de se indicar a importância da Academia e seus estudantes na articulação da imprensa periódica do período.

Ao conhecermos um pouco do ambiente cultural no qual a imprensa paulistana estava inserida, identifica-se uma estreita ligação com os acadêmicos da Faculdade de Direito, que se tornam os seus principais protagonistas. Desta forma, falar da imprensa no período aqui proposto – 1839-1876 – implica entender a importância da atuação que o grupo estudantil desempenhou na criação de novos espaços de disputas políticas partidárias, nos experimentos literários e da utilização do humor em diferentes momentos.

Oficialmente, o surgimento da imprensa é datado como anterior à fundação da Faculdade de Direito, em 22 de setembro de 1823, com o PAULISTA, considerado o primeiro jornal manuscrito da cidade de São Paulo, um “bi-semanário dirigido e redigido pelo professor de gramática latina e de retórica, Antonio Mariano de Azevedo Marques, o Mestrinho”. A redação, segundo consta, localizava-se à Rua São Bento, 79, na casa do redator. 6

4

GLEZER, Raquel. São Paulo e a elite letrada brasileira no século XIX. Revista brasileira de História, São Paulo, v. 12, nº 23/24, p. 24,set 1991/ago1992.

5

CRUZ, Heloisa de Faria. São Paulo em papel e tinta periodismo e vida urbana – 1890-1915. São Paulo, Educ/Fapesp, 2000,p. 50.

6

Cf. FREITAS, Affonso A de. A Imprensa periódica de São Paulo. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 19, São Paulo, 1914, pp. 333-336 e p. 342; FREITAS, Affonso A de. O primeiro centenário da fundação da imprensa paulista Conferencia realizado a 7 de fevereiro de 192. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. São Paulo, v. 25, p. 15-16,

(30)

memorialistas e estudiosos da imprensa em São Paulo remetem a dados esparsos. Contudo, foi Afonso de Freitas7 quem melhor detalhou o assunto, transcrevendo um ofício que Mestrinho enviou ao Governo, expondo o plano e o projeto do jornal:

Como não é de sua habilidade, nem de seus conhecimentos (que

não são nenhuns) que ele espera objetos interessantes ele se

oferece para inserir na dita sua folha toda e qualquer

correspondência que tiver por objeto a causa pública, com a

condição, porém de a remeterem assinada e de ficar o original em

seu poder para com ele salvar-se, todas as vezes que for

demandado judicialmente. Adverte igualmente que há de sempre

separar semelhantes correspondências das outras, pelas quais

quiser ficar responsável por meio da nota seguinte - O redator não

fica responsável pelo que se segue. – não se obriga, contudo, a

transcrever qualquer peça insultuosa, ou se tendente a satisfazer

ódios particulares, exceto no caso de ter inserido anteriormente

alguma coisa que diretamente acuse algum indivíduo, pois neste

caso obriga se este inserir a resposta a essas acusações em

quaisquer termos que seja concebida.8

A justificativa estaria, entre outras coisas, na falta de uma tipografia para a cidade e por interesses da “causa pública”.

7

Affonso A de Freitas.Nasceu no Largo da Liberdade, a 12 de junho de 1868 e faleceu a 29 de abril de 1930. Historiador paulista fez curso de Humanidades na “Escola Mineira”, do professor e grande abolicionista José Vila Maria. Aos 16 anos de idade iniciou-se na imprensa, escrevendo na “Redempção”, órgão abolicionista dos caifazes de Antonio Bento. Colaborou, também, na Gazeta do Povo, no Diário Popular, no Comércio de São Paulo e Correio Paulistano, assim como em jornais de várias localidades do interior. Usou, por vezes, os pseudônimos AF, Satier e Adef. Deixou notável bagagem científica disseminada em inúmeros livros, conferências e comunicações, muitas delas feitas nas sessões do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, ao qual se dedicou por mais de 20 anos, sendo inclusive seu presidente. Entre seus trabalhos está a descoberta dos restos mortais do Padre Feijó, os livros Dicionário do Município de São Paulo,

Tradições e Reminiscências Paulistanas e vários trabalhos sobre a história da imprensa em são Paulo, com destaque para. A Imprensa periódica de São Paulo entre outros. FREITAS, Affonso A de. Tradições e reminiscências paulistanas. São Paulo/Belo Horizonte: EDUSP/Ed. Itatiaia, 1985 (Coleção Reconquista do Brasil, 92), pp. 13-17.

8

(31)

Finalmente, em 1827, no mesmo ano da abertura da Academia de Direito, fundou-se o primeiro jornal impresso na cidade em um prelo de madeira que, segundo Freitas, ”permitia uma tiragem de vinte e cinco exemplares por hora ou duzentos e vinte cinco por dia de nove horas”,9 intitulado O Farol Paulistano e redigido por José da Costa Carvalho e Antonio Mariano de Azevedo Marques.

Figura 1.1 – Prelo de madeira, FREITAS, Afonso A de. O primeiro Centenário da fundação da imprensa... , op. cit. p.19.

O tamanho era de 21 X 31, comum aos jornais desse período. Era liberal, de “feição independente”, crítico ao governo de D. Pedro I. Por estas posturas foi, segundo Freitas, o primeiro a sofrer, em 1829, um processo por “crime de abuso da liberdade de imprensa”.10

9

FREITAS, Afonso A de. O primeiro centenário da fundação da imprensa ...., op. cit. p.20.

10

(32)

A partir do segundo jornal publicado, O Observador Constitucional, 1829-1832, inicia-se um processo que a bem dizer se estenderá e se afirmaria até o século XX, que é o diálogo entre jornais, por meio de artigos e respostas constituindo em espaço de debate político entre as correntes partidárias. Muitas vezes, quando nos deparamos com alguns desses jornais, fica difícil identificar suas posturas, ideologias e com quem estão dialogando, pois tudo depende do calor da hora, de quem é situação e oposição.

Esta primeira fase da imprensa, que daria publicidade aos jornais de disputa política abrange o final dos anos 20 até final da década de 40, momento extremamente delicado no país. Trata-se do final do primeiro Reinado, o Sete de Abril, a Regência e o início do Segundo Reinado, quando as forças políticas estão em plena ebulição. As disputas entre liberais e conservadores assumem formas particulares, dependendo dos lugares e situações. Revoltas se espalham como um rastro de pólvora por todo país. Em São Paulo, é deflagrada a Revolta Liberal, em 1842.

A imprensa se desenvolve em meio a esta conjuntura, assume claramente uma feição de disputas políticas. Segundo Sodré, “a imprensa definia-se quanto à orientação, nos três campos: o dos conservadores de direita, embalados no sonho da restauração, o dos liberais de direita, que faziam o papel de centro, e os liberais de esquerda (...)”. Muitas vezes estes combates assumiam caráter pessoal.11 É importante destacar que antes o debate estava restrito aos próprios ambientes, gabinetes e parlamentos onde eram travados. A imprensa amplia e repercute o debate público. Ela acaba por se transformar em interlocutora dos parlamentares e fiel servidora da administração pública. Isto fica nítido em muitos jornais editados nas primeiras décadas do século XIX, criados muitas vezes para difamar, desqualificar a administração do momento atual e seu partido político.

11

(33)

Dentre estes periódicos, é possível ressaltar a edição de O Observador Constitucional que, a princípio fora redigido por Líbero Badaró. Defensor de idéias liberais, identificado, segundo Juarez Bahia12, com posições populares, foi vítima da luta travada contra a organização da Sociedade Filantrópica e contra atos do ouvidor Jupiassu ao qual se referia com o vocativo Chinchorro. Pouco se sabe sobre os detalhes que motivaram o assassinato do jornalista em 1830, mas o fato é que o jornal tinha uma linguagem considerada violenta para a época. 13 Manteve-se em oposição ao governo até a abdicação de D.Pedro II e defendeu a bandeira do Federalismo das províncias brasileiras. A partir de 1832, conforme podemos constar em alguns exemplares, o jornal assume outras posturas políticas contra a imprensa que apoiavam Feijó e Costa Carvalho, adversários dos Andradas.

O Paulista (1831) era um jornal governista e defendia a administração pública de ataques oposicionistas na imprensa. Por conta disso, juntamente com o Correio Paulistano (1831) e O Federalista (1832) rebatiam-se as críticas de O Observador Constitucional e eram contra Caramurus e Carijós, restauradores.14

A Phenix (1838), redigida por Clemente Falcão e José Joaquim Pacheco, circulou até 1841 e fazia severas críticas à antecipação da maioridade de D. Pedro II e atacava as ações dos liberais. Contemporaneamente, a Guarda Nacional Paulista também engrossou os ataques aos liberais e aos irmãos Andradas Antonio Carlos e Martim Francisco. Ambos, segundo Freitas, de linguagem violenta.

12

BAHIA, Juarez. Jornal, história e técnica – história da imprensa brasileira. São Paulo: Editora Ática, 1990, p. 42.

13

Cf. FREITAS, Afonso A de. O primeiro centenário da fundação da imprensa..., op. cit., pp. 22-24. Transcreve trechos de um artigo do jornal dois depois do assassinato descrevendo como teria sido o crime.

14

(34)

estes ataques, defendendo a maioridade: O Escandalizado (1840) e O Escorpião (1840) e um terceiro de existência duvidosa, intitulado Monarquia Constitucional. 15

Na constituição do estilo e das narrativas desta imprensa política, destaca-se a linguagem considerada pesada e de ataque pessoal, elemento característico da imprensa, não só nesse período, presente ao longo do século XIX. Com mais ou menos intensidade de acordo com o momento, é o recurso de um tipo de linguagem considerada, pela historiografia clássica como, “violenta”, “obscena”, “pornográfica”, que, muitas vezes, como veremos adiante, vem carregada de humor e sátira. Daí a dificuldade, neste estudo, de identificar os periódicos humorísticos, se é que podemos falar de periódico exclusivamente humorístico num período em que a imprensa busca testar novas formas de linguagem e de identidade. Tudo ainda é muito incerto e qualquer tentativa classificatório, como as elaboradas pelos primeiros estudiosos da imprensa, parece precipitado, pois, grosso modo, quase todos abriam espaço para diversas formas de linguagens, inclusive a humorística.

Na verdade, o exame destes periódicos sob a ótica que busca privilegiar as relações entre imprensa e humor já nos remete à discussão sobre a natureza dessas narrativas neste momento histórico. Esta questão do “pornográfico”, “obsceno”, nos remete às raízes mais distantes, nas tradições das práticas humorísticas e nos esteriótipos criados pela cultura Ocidental como sugere Saliba.16

15

FREITAS, Afonso A de. O primeiro centenário da fundação da imprensa...., op. cit. p. 30.

16

(35)

Ou seja, desta forma, produzir um “humorismo sadio”, significaria não ofender, não degradar ninguém e seria superior e civilizador. “O humorismo pornográfico” estaria associado aos pasquins seria considerado degradante, agressivo, rancoroso, se aproximaria de uma linguagem mais coloquial, anárquica, escatológica, e por vezes, associado ao erotismo, ao obsceno. Talvez pela presença marcante na Regência e mesmo no Segundo Reinado dos pasquins, a roupagem popular destas publicações, tenha de certo modo contribuído na elaboração destas distinções, ou melhor, destes esteriótipos. Em uma sociedade hierarquizada, escravocrata e elitista, seriam formas de desqualificar e de distanciar-se de hábitos nada nobres. 17

Contudo, o estudo sistemático dos periódicos considerados humorísticos de 1839-1876, objeto de pesquisa desta tese, apontava para outras questões não tão dicotômicas assim. Embora a existência deste estereótipo de fato deva ser levada em consideração, acredito que sejam necessários estudos mais aprofundados sobre o mesmo na imprensa humorística do período.

Em São Paulo, nas primeiras décadas do século, quando a imprensa se instalava, vivenciava os impactos dos conflitos políticos gerados pela abdicação de D. Pedro I e da Regência e, conseqüentemente, de uma imprensa que buscava e testava novas formas de linguagens junto aos seus leitores, inclusive apelativas, agressivas, utilizando o humor como um álibi perfeito para seus intentos. Mas, não só.

O estudo destes materiais foi mostrando que, na verdade, esta dicotomia estava muito mais presente na historiografia que a elaborou, pois reforçou e reproduziu estes esteriótipos em muitos periódicos aqui analisados. Daí a dificuldade, durante as pesquisas de interpretar estes materiais rotulados de “pornográficos” ou “sérios”. No levantamento de periódicos foram listados 27 títulos, alguns apareceram diferentes do original, sendo depreciados, como é o

17

(36)

interpretações superficiais, equivocadas e até mesmo preconceituosas em relação a estes materiais por parte desses primeiros estudiosos da imprensa. Percebe-se que não há grandes diferenças que justifiquem esses rótulos e que as atribuições riso aparecem juntas ou nem mesmo diferenciadas em suas relações.

Podemos notar, em um dos casos mais destacados e polêmicos na imprensa, o processo enfrentado por Agostini no Cabrião, por causa da publicação da caricatura “dança dos mortos” (figura 1.2), em que aparecia uma patuscada entre mortos e vivos, que bebiam e dançavam na maior camaradagem, no cemitério da Consolação, durante o feriado de finados.

Este trabalho foi muito combatido pelos “conservadores”, representados por um dos proprietários de o Diário de São Paulo, Candido Silva, que a pretexto de “atentar contra a moral e a religião”18 e considerar a caricatura “ofensiva” e “grosseira” moveu um processo contra o Cabrião por injúria e difamação, apoiado também por estudantes da Faculdade de Direito. O responsável pela estampa, posteriormente, foi absolvido.

Em outra ocasião, o mesmo periódico se viu obrigado a substituir o pássaro com feições diabólicas de asas de morcego por asas de anjo, situado no cabeçalho de cada exemplar, provavelmente também por pressões moralistas, que não viam com bons olhos a presença “grosseira” do morcego estampado. A partir do nº15, Agostini substituiu o morcego por um pássaro mais “agradável”.19 (Figuras 1.3).

18

SANTOS, Délio Freire dos. Primórdios da imprensa caricata paulistana: o Cabrião. In:

Cabrião: semanário ilustrado editado por Angelo Agostini, Américo de Campos e Antonio Manuel dos Reis, 2ª edição, São Paulo: Ed. Unesp/Imesp, 2000. p xxxvii

19

(37)
(38)
(39)

Na verdade, esta mistura de “humorismo sadio” e “humorismo pornográfico”, pasquinesco não pode ser analisada de maneira estanque e nem apenas no contexto do período de transição, pelo qual passava a sociedade brasileira entre o final do Império e início da República, como sugere Saliba.20 Mas também no momento de transição da Regência para o Segundo Reinado. É um fenômeno que já vinha ocorrendo na Regência, em meio às disputas políticas partidárias, em menor proporção, sim, porque a imprensa em São Paulo ainda era incipiente.

Os diálogos com as fontes sugerem que este ‘humorismo sadio’ estaria associado a um humor velado, oriundo da Academia, de uma produção literária tolerada pelos circuitos letrados, mas marginal, “inocente”, “gracioso”, enquanto o ‘humorismo grosseiro’, ‘pornográfico’ teria uma base mais popular, extrapolando os muros da Academia. Tendo seus principais representantes Luis Gama e Agostini. Por isso, acredito que estes contrapontos não devem ser analisados como categorias separadas, distintas, mas nas tensões propostas para o entendimento da cultura letrada.

Embora, diferentemente do contexto europeu sugerido por Habermas na discussão sobre o papel da imprensa na formação da esfera pública burguesa, a imprensa paulista das primeiras décadas do século XIX vivencia a ampliação do espaço de discussão pública, constituindo-se como um espaço na qual os grupos produzem jornais que encaminham e alimentam suas intervenções políticas. Os grupos políticos em disputa, principalmente durante a Regência, vêem na imprensa um oportuno instrumento para desqualificar, ridicularizar ou até mesmo destruir seu inimigo político.

Por meio de alguns dados, pode-se afirmar que, logo após a abdicação de D. Pedro I, houve um considerável aumento de títulos de jornais, pasquins principalmente, na Corte, conforme alude Sodré. Mas também em São Paulo,

20

(40)

Este aumento de títulos vem acompanhado de uma maior exaltação na linguagem. 21

Contudo, nem só jornais de caráter exclusivamente político surgem na paulicéia. Entram em cena os primeiros jornais literários, que tendem a crescer na década 40 e o jornalismo político a declinar, não desaparecendo por completo devido ao crescente o número de alunos matriculados na Academia e da conseqüente fundação de diversas associações culturais pelo mesmo grupo.

1. 1 – IMPRENSA LITERÁRIA ENTRA EM CENA

O emprego de termos como “científico” e “literário” começam a aparecer na imprensa na década de 30 e se tornam mais freqüentes ao longo do século XIX. Dependendo do contexto em que eram utilizados e das nuanças semânticas, o termo “científico” abarcaria “disciplinas como a matemática, a física, a biologia, a mineralogia, e também a história , a filosofia ou a política” e o termo “literário” referia-se à oratória, à narrativa de ficção e à poesia em geral”. 22

Contudo, embora os acadêmicos fizessem questão de diferenciar os gêneros de publicação, acrescentando ainda as estritamente políticas, de

21

SODRÉ, Nelson Werneck, cita um dado de Moreira de Azevedo que aponta o ano 1832-1833

como o maior grau de exaltação e do número de periódicos na Corte. “Saíram dos prelos, 35

periódicos, dos quais 14 sustentavam o Governo e 21 faziam-lhe guerra aberta, sem medidas, nem tréguas; foi em 1832 que feriam, em 05 de novembro, com um tiro de pistola, a Evaristo Ferreira da Veiga, o redator da Aurora Fluminense”, p. 125; Vide também IPANEMA, Cybele. IPANEMA, Marcelo. Imprensa na regência, observações estatísticas e de opinião pública. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro, v. 307, p. 91-95, abr.jun. 1975; IPANEMA, Marcelo. A imprensa no segundo reinado. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro, v.314, p. 226-258, jan.abr. 1977.

22

(41)

“variedades”, “curiosidade”, “recreio”, “artística” ou mesmo de “humor”, “satírica”23, eram termos, segundo Garmes, “raramente empregados no âmbito acadêmico” . 24

Saliente-se que, num primeiro momento, a diferenciação entre os jornais políticos, literários e científicos poderia estar associada a subterfúgios dos acadêmicos, para criar espaços onde se discutiriam assuntos “sérios”, que os projetaria socialmente, politicamente e profissionalmente, e espaço “não sério”, para entreter aquela vida transitória dos estudantes, efêmera e monótona na cidade São Paulo. A vida do estudante, jornalista e político Pedro Taques de Almeida Alvim,25 é um bom exemplo desta prática.

Portanto, toda esta terminologia deve ser compreendida num sentido mais amplo, dentro do contexto utilizado, atribuindo-lhe outros contornos e significados. Os mesmos autores podem explorar facetas diferentes da narrativa pública.

O período entre 1831-1840 foi considerado de calmaria estudantil, pois houve uma diminuição de alunos matriculados no curso de Direito. Distantes dos conflitos políticos da Regência, os estudantes se voltaram para a literatura romântica e a para a criação de centros e associações culturais e para a produção de periódicos. 26

23

Os termos humor e sátira como subtítulos de periódicos, pelo que foi trabalhado até o momento,

só serão empregados a partir de O Coaracy e o Polichinelo, 1876. Nem o Diabo Coxo, que tinha como subtítulo “jornal domingueiro” e muito menos o Cabrião utilizava estas terminologias no cabeçalho.

24

GARMES, Hélder, op. cit., p. 4.

25

Pedro Taques de Almeida Alvim.Nasceu em Campinas, em 10 de setembro de 1824 e faleceu em São Paulo em 1º de fevereiro de 1870. Entrou para a Academia de Direito de São Paulo em 1849, estudando com José Martiniano de Alencar, Álvaro de Azevedo e José Bonifácio, o moço. Formou-se em 1853, fundando com Diogo José Vieira de Matos o periódico literário Íris. Dirigiu o

Clarin Saquarema, jornal humorístico que defendia os interesses do partido Conservador. Ingressou em 1854 na redação do Correio Paulistano. Em 1858, foi redator iconoclástico do O Azorrague. Fundou e dirigiu em 1865 o Diário de S. Paulo. Escreveu “Cartas de Segismundo”, onde comentava os acontecimentos cotidianos, sendo publicadas no Diário de S. Paulo. Colaborou também para União dos Círculos (1856), O Talião (1858), O Mosquito (1860), O Ipiranga e no

Jornal do Comercio do Rio de Janeiro, sendo correspondente em São Paulo. Foi delegado de polícia, promotor público e deputado provincial. MELO, Luis Correia. Dicionário de autores paulistas. São Paulo: Comissão do IV Centenário da cidade de São Paulo, 1954, pp. 41-42.

26

(42)

Em 1830, aparece o primeiro jornal acadêmico, o Amigo das Letras, que abordava temas literários. Mas Hélder Garmes afirma que era uma publicação de intenção política e moralizadora. Os textos literários não passavam “de traduções francesas, inglesas e alemãs, além de algumas páginas sobre ficção e teatro”.27 Freitas refere-se a este jornal como “estranho a qualquer um dos grupos partidários das idéias que, então, mais do que em qualquer outra época, fracionava a política nacional, e representava o início do jornalismo acadêmico que extraordinária influência passou a exercer no meio intelectual paulistano.”28

Em 1833, foi publicada a Revista da Sociedade Filomática com colaboradores como Francisco Bernadirno Ribeiro e Justiniano José da Rocha, vinculados a uma associação com o mesmo nome, “a primeira sociedade científica e literária existente em São Paulo“.29 Garner destaca as influências da tradição iluminista dos filomáticos, que tentam resgatar o espírito associativo das antigas academias e forjam um modelo associativo de produção intelectual e literário, a qual servirá de base para o surgimento de outras associações do gênero.

Contudo, nos anos 40 e 50 presenciamos uma efervescência na imprensa literária. Agora, os jornais e associações culturais não são mais ocasionais e, cada vez mais, estão presentes.

Nos anos de 1840, apareceram apenas dois títulos de periódicos literários, acadêmicos. O primeiro foi O Americano (1844), definido como um “jornal político, literário e noticioso”, tendo como redator o então diretor da Faculdade de Direito, Joaquim Ignácio Ramalho, Barão de Ramalho, João da Silva Carrão e Antonio

BAHIA, Renato. O estudante na história nacional. São Paulo: Livraria Progresso Editora 1954, p. 89; POERNER, Artur José. O poder jovem. História da participação política dos estudantes brasileiros. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979, p.58-59.

27

GARMER, Hélder, op. cit., p. 07

28

FREITAS, Affonso A de, A Imprensa periódica de São Paulo..., op. cit., p. 336.

29

(43)

Manuel de Campos Mello. Pouco se sabe sobre este material e seu conteúdo, pois, não encontramos nenhum exemplar para consultar. 30

O segundo e mais importante Ensaios Literários (1847-1850) de circulação mensal, abordando em suas páginas assuntos relacionados a “história, jurisprudência, filosofia, religião, relatos de viagem, críticas literária, poemas, narrativas, crônicas e charadas”, tendo como colaboradores importantes figuras do Romantismo brasileiro: José de Alencar, Álvares de Azevedo, Bernardo Guimarães, José Bonifácio de Andrada e Silva, entre outros. Esta revista estava vinculada a uma associação: “Instituto literário Acadêmico, criado por iniciativa dos primeiranistas da turma de 1846”.31

Contudo, havia muitos colaboradores dos Ensaios Literários, entre eles Álvares de Azevedo, que tinha recém-ingressado na Academia, que também participou da Associação Ensaio Filosófico Paulistano, em 1850, último ano dos Ensaios Literários, o que permite supor, segundo Garmes, que os demais integrantes do Instituto Literário Acadêmico também passaram para a nova associação.32

Para se ter uma idéia da dimensão e importância desse gênero jornalístico, que emerge do meio estudantil, observem o quadro abaixo com o número de associações e periódicos literários, filosóficos e científicos correspondentes.

30

FREITAS, Affonso A de. A Imprensa periódica de São Paulo.... op. cit., p. 409; GARMES, Hélder, op. cit., p. 16.

31

GARMES, Hélder, op. cit., p. 17.

32

(44)

ASSOCIAÇÃO DATA FUNDAÇÃO PERIÓDICO DATA

Instituto Literário Acadêmico

1846 (?) Ensaios Literários

Associação Acadêmica Ensaio Filosófico

03/05/1850 Revista Mensal do Ensaio Filosófico Paulistano Sociedade o Ateneu

Paulistano

07/09/1852 Ensaios Literários do Ateneu Paulistano

Associação Arcádia Paulistana

1857 Arcádia Paulistana

Associação culto à Ciência

11/08/1857 Memórias da Associação Culto à Ciência

Clube Científico 1858 Exercícios literários do Clube Científico, 1859. Sociedade Acadêmica

Brasília

1859 Ensaio da Sociedade Brasília

Associação Amor à Ciência

1859 Murmúrios Juvenis, 1859; substituída pelo periódico Trabalhos Literários da Associação Amor à Ciência, 1860. Instituto Acadêmico

Paulistano

1859 O Kaleidoscópio, 1860

Associação Acadêmica Recreio Instrutivo

1861 Revista da Associação Recreio Instrutivo, 1861. Associação Ensaio

Acadêmico

1861 Anais do Ensaio

Acadêmico, 1862. Instituto Científico 29/07/1862 Revista Mensal do

Instituto Científico, 1862. Associação Tributo às

Letras

1863 Revista da Associação

Tributo às Letras, 1863. Clube Radical Paulistano 1869 Radical Paulistano, 1869. Clube Constitucional

Acadêmico

1871 O Constitucional, 1871.

Fontes: GARMES, Hélder, op. cit.;FREITAS, Affonso A de. A Imprensa periódica de São Paulo, op. cit., pp. 321-1136; ROCHA, Maria Aparecida dos Santos. Os rapazes do triângulo: a participação política do estudante de Direito de São Paulo no Império. 1995. 203f . Unesp. Marilia (SP).

33

As informações sobre estas associações estão muito dispersas necessitando um trabalho de garimpo para encontrar tanto os jornais como as referências sobre as mesmas. Alguns, como o

(45)

Havia ainda associações que nasceram fora da Academia, em colégios e instituições religiosas, que depois foram incorporadas pelos acadêmicos. Os periódicos Murmúrios Juvenis, estabelecido no Colégio Brasileiro. Quando seus membros entraram na Faculdade desapareceu este periódico e nasceu Trabalhos Literários da Associação Amor à Ciência (1860). As Memórias da Associação de Culto à Ciência (1857) também surgem fora da Academia, no Colégio Mamede de Freitas, e, posteriormente, a maioria de seus membros já estava estudando na Faculdade de Direito. Garmes lembra que a Episcopal Associação do Ensaio Filosófico, do Rio de Janeiro, que funcionava no Seminário Episcopal de São José da Ordem Seráfica, possivelmente mantinha algum tipo de relação com a Academia em São Paulo, mas o autor dispõe de poucas informações a respeito. 34

Este elo de ligação entre colégios e instituições religiosas, ao que tudo indica, apresenta-se, conforme Garnes, como “um fenômeno bastante revelador do caráter didático e formador inerente às associações”. Iniciada de forma espontânea entre os estudantes na década de 1840, transforma-se em componente curricular importante na década 1860. Sem dúvida, esta ponte com a Faculdade, aliada ao apoio de professores, como no caso do Instituto Acadêmico em 1859, revela a legitimidade que estas associações adquirem na década de 1860, influenciando efetivamente a formação intelectual e literária de seus associados.35

Apesar da importância dessas associações, não podemos deixar de mencionar outros periódicos literários independentes, isto é, sem vínculo com agremiações culturais como a Guayaná (1856) e a Revista Acadêmica de São Paulo (1859), ambas editadas e redigidas por José Vieira Couto Magalhães, também responsável por O Acadêmico do Sul (1857), material redigido pelo estudante Daniel Dias de Almeida, e pela Revista Dramática, 1860, dentre outros.36

34

GARMES, Hélder, op. cit., pp. 45-47.

35

Idem, ibidem, p.47-48.

36

(46)

A partir de finais da década de 1860, essas associações acadêmicas estudantis abraçam bandeiras do republicanismo e do abolicionismo e se proliferam até o final do Império. A criação do Clube Radical Paulistano, em 1869, é um exemplo desse novo tipo de associação.

É no interior dessas associações que se viabilizam espaços para discussões de caráter jurídico, literário, científico e filosófico das publicações lidas e ditadas por essa elite letrada.

Segundo Bruno, as associações eram numerosas no decorrer do século XIX e “tiveram importância considerável sobre o desenvolvimento da cidade, desenvolvendo o gosto pela literatura e pela criação de condições para o aparecimento dos livros de algumas figuras que se tornaram importantes na história literária do país.”37 Eram em sua maioria de caráter efêmero, momentâneo como era a vida de estudante.

É esta imprensa artesanal que, em tese, qualquer um podia fazer sem necessariamente ter uma redação estruturada ou mesmo endereço fixo. Neste período, predominavam periódicos de formato pequeno, com poucos anúncios, que se sustentava com números reduzidos de assinatura, muitas vezes, feitos para atender interesses momentâneos, com tiragem limitada e circulação incerta, com virulência na linguagem, de caráter político, literário, científico, recreativo, de variedades.

É nesse momento também que o embrião da chamada imprensa empresa, intitulada de “grande imprensa” tomará um grande impulso. Era organizada por bacharéis, publicado em formato maior (27 X 35), tinha circulação diária, como O

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Constitucional (1853), o que era inédito para o período em questão, pois os mais assíduos circulavam não mais que duas ou três vezes por semana.

No entanto, somente com a fundação de O Correio Paulistano (1854), podemos localizar a origem da imprensa diária ou da chamada grande imprensa paulista, por ser considerado o primeiro jornal diário da Província. Na segunda metade do século XIX e durante o século XX, tornar-se-ia regular e estável. Na esteira deste, viriam outros como O Diário de São Paulo (1865), A Província de São Paulo, 1875, O Diário Popular (1884), A Platéia (1888).38

O grande diferencial deste tipo de imprensa destaca Cruz, estava na separação de propriedade e direção de redação. No caso de O Correio Paulistano e, posteriormente, do Diário de São Paulo, nada menos que Pedro Taques de Almeida Alvim estava à frente da redação. Outra inovação trazida pela imprensa diária foi a incorporação de novas técnicas de impressão: do prelo de madeira à máquina a vapor e, por conseqüência, essa imprensa também seria espaço para a experimentação de gêneros e narrativas, em um novo formato e número de páginas. 39

Neste período, a imprensa diária se afirma e se destaca de outras publicações, procurando novidades e diferenciais tanto no conteúdo como na apresentação. O Diário de São Paulo (1865), por exemplo, foi o primeiro jornal diário a intercalar ilustrações e caricaturas em suas colunas, compostas pelo litógrafo Henrique Schroeder40 e, talvez, um dos primeiros jornais denominados

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CRUZ, Heloisa Faria. A imprensa paulistana: do primeiro jornal aos anos 50. In: PORTA, Paula (org.). História da cidade São Paulo: a cidade no império 1823-1889. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2004, p. 359.

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Idem, ibidem, p. 359. 40

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