UFPE — MA989 — 2014.1 — PROF. FERNANDO J. O. SOUZA
LISTA DE EXERC´ ICIOS 05 – v. 1.0
Assuntos: Pr´atica de manipula¸c˜oes sint´aticas em l´ogica atrav´es de pro- priedades b´asicas das ´algebras booleanas.
Orienta¸c˜ao: Dar solu¸c˜oes leg´ıveis e completas, explicando todos os passos e detalhes, e indicando as propriedades e os resultados utilizados. S´o conferir a solu¸c˜ao de um item ap´os tentar resolvˆe-lo seriamente.
Defini¸c˜ao. Seja A um conjunto no qual dois elementos foram distinguidos (destacados) e denotados por 0 e 1 respectivamente. Sejam ¬ uma opera¸c˜ao un´aria emA (ditacomplementooun˜ao), e∧(supremoouou) e∨(´ınfimo ou e) opera¸c˜oes bin´arias nele. A, munido de 0, 1,¬,∧ e∨, ´e dito uma ´algebra booleana se, e somente se, valem os 10 axiomas (identidades) abaixo:
1. Associatividadede ∧: ∀x, y, z ∈ A, (x∧y)∧z =x∧(y∧z);
2. Associatividadede ∨: ∀x, y, z ∈ A, (x∨y)∨z =x∨(y∨z);
3. Comutatividade de ∧: ∀x, y ∈ A, x∧y=y∧x;
4. Comutatividade de ∨: ∀x, y ∈ A, x∨y=y∨x;
5. Distributividade de ∧com rela¸c˜ao a ∨:
∀x, y, z ∈ A, x∧(y∨z) = (x∧y)∨(x∧z);
6. Distributividade de ∨com rela¸c˜ao a ∧:
∀x, y, z ∈ A, x∨(y∧z) = (x∨y)∧(x∨z) 7. Complemento reticular: ∀x∈ A, x∧ ¬x = 0;
8. Complemento reticular: ∀x∈ A, x∨ ¬x = 1;
9. Absor¸c˜ao (ou redundˆancia): ∀x, y ∈ A, x∧(x∨y) =x;
10. Absor¸c˜ao (ou redundˆancia): ∀x, y ∈ A, x∨(x∧y) =x.
Para esta lista, imporemos uma restri¸c˜ao antiga sobre A, a saber, que 0 6= 1 e, portanto, o n´umero de elementos (cardinal) de A ´e, pelo menos, 2.
Tal restri¸c˜ao foi removida em tratamentos posteriores do assunto, permitindo 0 = 1 (´algebra booleana degenerada) e X =∅ no ´ultimo exemplo abaixo.
Ex.: A menor (com menos elementos) ´algebra booleana consiste de um con- juntoB ={0,1}, ditodom´ınio booleano, munido de opera¸c˜oes¬,∧e∨cujos valores s˜ao os usuais, dados pelos itens (g–i) da Quest˜ao 1 abaixo.
Obs.: B´e importante na teoria das ´algebras booleanas, em eletrˆonica digital e na interpreta¸c˜ao da l´ogica booleana, justificando o que j´a fazemos infor- malmente neste curso: interpretemos os valores l´ogicos F e V como o 0 e o 1 de B, respectivamente, e a nega¸c˜ao, a disjun¸c˜ao e a conjun¸c˜ao l´ogicas como as opera¸c˜oes alg´ebricas acima (¬, ∧ e ∨, respectivamente). Com isto, cada vari´avel proposicional assume valores l´ogicos em {F, V}, enquanto sua interpreta¸c˜ao assume valores em B.
Teorema: Duas f´ormulas na l´ogica proposicional s˜ao logicamente equivalen- tes (no sentido semˆantico) se, e somente se, suas interpreta¸c˜oes atrav´es de B s˜ao equivalentes por meio de uma sequˆencia finita de aplica¸c˜oes dos axiomas acima (ou seja, num sentido sint´atico).
Ex.: Estendendo B para A = {0,1,?}, onde ? representa o valor l´ogico
“talvez” ou “desconhecido”, as opera¸c˜oes s˜ao determinadas pelos valores an- teriores (em B) e: ¬? =?; 0∨? =? =?∨0 =?∨?, mas 1∨? = 1 =?∨1; e 1∧? =? =?∧1 =?∨?, mas 0∧? = 0 =?∧0.
Ex.: Relacionada `a l´ogica difusa, temos A= [0,1]⊂R munida de:
∀x, y ∈ A, ¬x= 1−x,x∨y= max{x, y} ex∧y= min{x, y}.
Ex.: Como veremos neste curso, dado um conjunto n˜ao-vazio X, seu con- junto das partesA=P(X) (conjunto dos subconjuntos deX) ´e uma ´algebra booleana quando consideramos 0 = ∅ e 1 = X, e o munimos das seguintes opera¸c˜oes: para todos C e D contidos em X, ¬C = Cc = X\C (com- plemento), C ∨D = C ∪D (uni˜ao) e C∧D = C ∩D (interse¸c˜ao). Suas sub´algebras booleanas s˜ao ditas ´algebras booleanas concretas.
Dica para toda a lista: Explorar a dualidade presente nas ´algebras e l´ogica booleanas, isto ´e, reaproveitar express˜oes v´alidas e demonstra¸c˜oes trocando
toda instˆancia de∧por∨e vice-versa, e toda instˆancia de 0 por 1 e vice-versa, baseando-se no fato de que todo axioma de ´ındice par acima ´e a dualiza¸c˜ao do axioma de ´ındice ´ımpar anterior.
Quest˜ao 1. Provar que, numa ´algebra booleana A, valem as propriedades:
a. Limita¸c˜ao – lei de identidade: ∀x∈ A, x∧1 =x;
b. Limita¸c˜ao – lei de identidade: ∀x∈ A, x∨0 =x;
c. Idempotˆenciade ∧: ∀x∈ A, x∧x=x;
d. Idempotˆencia de∨: ∀x∈ A, x∨x=x;
e. Limita¸c˜ao – aniquilamento: ∀x∈ A, x∧0 = 0;
f. Limita¸c˜ao – aniquilamento: ∀x∈ A, x∨1 = 1;
Os valores das opera¸c˜oes nos elementos especiais s˜ao os desejados/esperados:
g. ¬0 = 1; ¬1 = 0;
h. 0∧0 = 0∧1 = 1∧0 = 0; 1∧1 = 1; e i. 0∨0 = 0; 0∨1 = 1∨0 = 1∨1 = 1;
Finalmente:
j. ∀x, y ∈ A, x∧y =x∧(¬x∨y);
k. ∀x, y ∈ A, x∨y=x∨(¬x∧y);
l. Caracteriza¸c˜ao da nega¸c˜ao pelas leis de complemento: ¬x ´e deter- minado pelas leis de complemento. Em outras palavras, ¬x ´e o ´unico elemento de A a satisfazer tais leis:
para todosx, y ∈ A, se x∧y= 0 e x∨y= 1, ent˜ao y=¬x; m. Involutividade de ¬(ou dupla nega¸c˜ao): ∀x ∈ A, ¬ ¬x=x;
n. Lei de De Morgan: ∀x, y ∈ A, ¬(x∧y) =¬x∨ ¬y;
o. Lei de De Morgan: ∀x, y ∈ A, ¬(x∨y) =¬x∧ ¬y.
Quest˜ao 2. Demonstrar que, na presen¸ca de alguns dos axiomas 1 a 8, o par de axiomas 9 e 10 equivale ao par de identidades ae b.
RESOLU ¸C ˜AO COMENTADA
1.a. Dado um elemento x∈ A, x∧1 =x∧(x∨ ¬x) =x, onde a primeira igualdade ´e devida ao Axioma 8, e a segunda, ao Axioma 9 tomando-se1 y =¬x. Da arbitrariedade de x, temos a Identidade a;
1.b. Dualizar a argumenta¸c˜ao acima;
1.c. Dadox∈ A, x∧x= (x∧x)∨0 = (x∧x)∨(x∧ ¬x) =x∧(x∨ ¬x) = x∧1 =x, onde: a primeira igualdade ´e devida `a Identidadebreescrita como y∨0 = y e aplicada ao elemento y =x∧x; a segunda ´e devida ao Axioma 7; a terceira, `a distributividade de ∧ com rela¸c˜ao a ∨; a quarta, ao Axioma 8; e a quinta, `a Identidade a. Da arbitrariedade de x, temos a Identidade c;
1.d. Dualizar a argumenta¸c˜ao anterior;
1.e. Dado x ∈ A, x∧0 = x∧(x∧ ¬x) = (x∧x)∧ ¬x = x∧ ¬x = 0, onde: a primeira e ´ultima igualdades s˜ao devidas ao Axioma 7; a segunda,
`a associatividade de ∧; e a terceira, `a Identidade c. Da arbitrariedade dex, temos a Identidade e;
1.f. Dualizar a argumenta¸c˜ao anterior;
1.g. ¬0 = ¬0∨0 = 0 ∨ ¬0 = 1, onde: a primeira igualdade ´e devida `a Identidade b aplicada ao elemento x =¬0; a segunda, `a comutatividade de
∨; a terceira, ao Axioma 8 aplicado ao elemento x= 0. A dualiza¸c˜ao desta demonstra¸c˜ao prova que ¬1 = 0;
1.h. Aplicando a Identidadeaaos elementosx= 0 ex= 1, respectivamente, obtemos 0∧1 = 0 e 1∧1 = 1. Aplicando a Identidade e ao inv´es de a, ob- temos 0∧0 = 0 = 1∧0;
1.i. Dualizar a argumenta¸c˜ao anterior;
1.j. Dados x, y ∈ A, x∧(¬x∨y) = (x∧ ¬x)∨(x∧y) = 0∨(x∧y) = (x∧y)∨0 =x∧y, onde: a primeira igualdade ´e devida `a distributividade de
∧ com rela¸c˜ao a∨; a segunda, ao Axioma 7; a terceira, `a comutatividade de
1¬x´e o resultado de uma opera¸c˜ao emAe, portanto, ´e um elemento deA.
∨; e a quarta, `a Identidade b aplicada ao elemento x∧y. Da arbitrariedade de x ey, temos a Identidade j;
1.k. Dualizar a argumenta¸c˜ao anterior;
1.l. Nesta prova, temos uma certa simetria entre y e ¬x. A menos de co- mutatividade, desenvolvemos y at´e a forma 0∨(¬x∧y) e, ent˜ao, seguimos passos an´alogos em ordem reversa para obtermos¬x. Sejamx eyelementos de A tais que x∧y = 0 (Hip´otese 1) e x∨y= 1 (Hip´otese 2). Desejamos mostrar que y =¬x. Ora, y=y∧1 =y∧(x∨ ¬x) = (y∧x)∨(y∧ ¬x) = (x∧y)∨(¬x∧y) = 0∨(¬x∧y) = (x∧ ¬x)∨(¬x∧y) = (¬x∧x)∨(¬x∧y) =
¬x∧(x∨y) =¬x∧1 =¬x, onde: a primeira igualdade ´e devida `a Identidade a aplicada ao elemento y; a segunda, ao Axioma 8; a terceira, `a distributi- vidade de ∧ com rela¸c˜ao a ∨; a quarta, `a comutatividade de ∧; a quinta, `a Hip´otese1; a sexta, ao Axioma 7; a s´etima, `a comutatividade de ∨; a oitava,
`a distributividade de∨ com rela¸c˜ao a∧; a nona, `a Hip´otese2; e a d´ecima, `a Identidade a aplicada ao elemento ¬x. Da arbitrariedade de x e y, temos a propriedade l;
1.m. Nesta prova, temos uma simetria entre ¬¬x e x. A menos de co- mutatividade, desenvolvemos ¬¬x at´e a forma (x∧ ¬¬x)∨0 e, ent˜ao, se- guimos passos an´alogos em ordem reversa para obtermos x. Dado x ∈ A,
¬¬x=¬¬x∧1 =¬¬x∧(x∨ ¬x) = (¬¬x∧x)∨(¬¬x∧ ¬x) =
(x ∧ ¬¬x) ∨ (¬x ∧ ¬¬x) = (x ∧ ¬¬x) ∨ 0 = (x ∧ ¬¬x) ∨ (x ∧ ¬x) = x∧(¬¬x∨ ¬x) =x∧(¬x∨ ¬¬x) = x∧1 =x, onde: a primeira igualdade
´e devida `a Identidade a aplicada ao elemento ¬¬x; a segunda, ao Axioma 8; a terceira e a s´etima, `a distributividade de ∧ com rela¸c˜ao a ∨; a quarta,
`a comutatividade de ∧; a quinta, ao Axioma 7 aplicado ao elemento ¬x; a sexta, ao Axioma 7; a oitava, `a comutatividade de ∨; a nona, ao Axioma 8 aplicado ao elemento ¬x; e a ´ultima, `a Identidade a. Da arbitrariedade de x, temos a Identidade m;
1.n. Dados x, y ∈ A, mostraremos que o elemento b = ¬x∨ ¬y de A ´e o resultado da opera¸c˜ao ¬ aplicada ao elemento a = x∧y de A. Para tanto, utilizaremos a Propriedade l: se a∧b= 0 e a∨b = 1, ent˜aob =¬a. Ora:
a∧b = (x∧y)∧(¬x∨ ¬y) = [(x∧y)∧ ¬x]∨[(x∧y)∧ ¬y] =
[y∧(x∧ ¬x)]∨[x∧(y∧ ¬y)] = [y∧0]∨[x∧0] = 0∨0 = 0, onde: a segunda igualdade ´e devida `a distributividade de ∧ com rela¸c˜ao a ∨; a terceira, ao
uso judicioso2 da comutatividade e da associatividade de ∧ em cada fator de ∨; a quarta, ao Axioma 7 aplicado aplicado, separadamente, a x e y; a quinta, `a Identidade e aplicada aplicado, separadamente, a y e x; e a sexta,
`a Propriedade i. J´a a∨b = (x∧y)∨(¬x∨ ¬y) = (¬x∨ ¬y)∨(x∧y) = [(¬x∨ ¬y)∨x]∧ [(¬x ∨ ¬y)∨y] = [¬y∨(x ∨ ¬x)]∧[¬x∨ (y ∨ ¬y)] = [¬y ∨1]∧[¬x ∨1] = 1 ∧1 = 1, onde: a segunda igualdade ´e devida `a comutatividade de ∨; a terceira, `a distributividade de ∨ com rela¸c˜ao a ∧; a quarta, ao uso judicioso3 da comutatividade e da associatividade de ∨ em cada fator de ∧; a quinta, ao Axioma 8 aplicado, separadamente, a x e y;
a sexta, `a Identidade f aplicada aplicado, separadamente, a ¬y e ¬x; e a s´etima, `a Propriedade h. Logo, b=¬a, isto ´e,¬a =b, isto ´e,
¬(x∧y) = ¬x∨ ¬y. Da arbitrariedade de xe y, temos a Identidade n;
1.o. Um caminho ´e a dualiza¸c˜ao do argumento anterior. Outro caminho combina as duas ´ultimas identidades: Sejam x e y elementos de A. De n, sabemos que, para todos os elementos w e z de A, ¬(w∧z) = ¬w∨ ¬z.
Aplicando isto aos elementos w =¬x e z =¬y, obtemos que
¬(¬x∧¬y) =¬¬x∨¬¬y=x∨y, onde a ´ultima igualdade ´e devida `a aplica¸c˜ao da dupla nega¸c˜ao a xey. Logo, x∨y=¬(¬x∧ ¬y). Aplicando a nega¸c˜ao a ambos os membros da igualdade, obtemos ¬(x∨y) =¬¬(¬x∧¬y) =¬x∧¬y. Da arbitrariedade de xe y, temos a Identidade o. Q.E.D.
2. Seja A um conjunto munido de 0, 1, ¬, ∧ e ∨ satisfazendo os axiomas 1–8. Na Quest˜ao 1, obtivemos 9 ⊢ a (e, dualmente, 10 ⊢ b). Al´em disto, ao provarmosc–f, usamos, diretamente, alguns dos axiomas 1–8 e as identidades ae bcom estas duas j´a demonstradas mas, se elas fossem axiomas, ter´ıamos chegado a c–fsem usarmos 9 ou 10. Em suma: {1−8,a,b} ⊢ {c−f}. Da´ı:
{a,b} ⊢ 9: dados x, y ∈ A, x∧(x∨y) = (x∨0)∧(x∨y) =x∨(0∧y) = x∨(y∧0) =x∨0 =x, onde: a primeira e a ´ultima igualdades s˜ao devidas `a Identidade b; a segunda, `a distributividade de∨ com rela¸c˜ao a∧; a terceira,
`a comutatividade de ∧; e a quarta, devido `a Identidade e (consequˆencia de 1–8, a e b) aplicada ay. Da arbitrariedade dex e y, obtemos 9;
{a,b} ⊢ 10: dualizar a argumenta¸c˜ao anterior. Assim:
{1−10} ⊢ {a,b} e {1−8,a,b} ⊢ {9,10}∴{1−8} ⊢ {(9 e 10)⇐⇒(a eb)}.
2Ex.: (x∧y)∧ ¬x= (y∧x)∧ ¬x=y∧(x∧ ¬x); e (x∧y)∧ ¬y=x∧(y∧ ¬y).
3Ex.: (¬x∨ ¬y)∨x= (¬y∨ ¬x)∨x=¬y∨(¬x∨x) =¬y∨(x∨ ¬x); e (¬x∨ ¬y)∨y=¬x∨(¬y∨y) =¬x∨(y∨ ¬y).