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Arte, redes sociais e pós-internet : a produção de Aleta Valente, Andressa Ce. e Laís Pontes

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Academic year: 2021

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A PRODUÇÃO DE ALETA VALENTE, ANDRESSA CE. E LAÍS PONTES

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS

MIRELE DE OLIVEIRA PACHECO

ARTE, REDES SOCIAIS E PÓS-INTERNET:

A PRODUÇÃO DE ALETA VALENTE, ANDRESSA CE. E LAÍS PONTES

PORTO ALEGRE 2019

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Mirele de Oliveira Pacheco

ARTE, REDES SOCIAIS E PÓS-INTERNET:

A PRODUÇÃO DE ALETA VALENTE, ANDRESSA CE. E LAÍS PONTES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) como requisito para a obtenção do título de Mestre em Artes Visuais.

Linha de Pesquisa: Relações sistêmicas da arte

Orientadora: Dra. Maria Amelia Bulhões Garcia

PORTO ALEGRE 2019

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Pacheco, Mirele de Oliveira

Arte, Redes Sociais e Pós-Internet: A produção de Aleta Valente, Andressa Ce e Laís Pontes / Mirele de Oliveira Pacheco. -- 2019.

168 f.

Orientadora: Maria Amélia Bulhões Garcia.

Dissertação (Mestrado) -- Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Artes, Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais, Porto Alegre, BR-RS, 2019.

1. Mulheres artistas . 2. Fotografia e pós-fotografia. 3. Ciberfeminismo. 4. Relações sistêmicas da arte. I. Bulhões Garcia, Maria Amélia, orient. II. Título.

Elaborada pelo Sistema de Geração Automática de Ficha Catalográfica da UFRGS com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).

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Mirele de Oliveira Pacheco

ARTE, REDES SOCIAIS E PÓS-INTERNET:

A PRODUÇÃO DE ALETA VALENTE, ANDRESSA CE. E LAÍS PONTES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), como requisito para a obtenção do título de Mestre em Artes Visuais.

Aprovada em 12 de Setembro de 2019.

___________________________________________________________________________ Profa. Dra. Maria Amelia Bulhões Garcia – PPGAV/UFRGS (Orientadora)

_________________________________________________________________________ Profa. Dra. Priscila Almeida Cunha Arantes – PUC/SP

___________________________________________________________________________ Profa. Dra. Daniela Pinheiro Machado Kern – PPGAV/UFRGS

___________________________________________________________________________ Prof Dr. Alberto Marinho Ribas Semeler – PPGAV/UFRGS

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha família e amigos por todo o carinho e estímulo, especialmente, ao meu avô paterno Flávio, por me mostrar desde muito pequena o valor da dignidade humana através do estudo; à Terezinha e à Lília, minhas avós, por me transmitirem amor e fé. Sou grata à minha mãe e ao meu pai, que tanto lutaram por minha educação e sempre me incentivaram a crescer. Ao meu filho, pela dedicação e apoio incondicional.

Sou grata à minha orientadora, Maria Amelia, pela valiosa escuta ao acolher minhas ideias, hipóteses e dúvidas, e guiar meu trabalho com zelo e competência. À minha psicoterapeuta Lúcia, pelo profissionalismo e afeto com que conduz meus processos de autoconhecimento e cura interior. Ao professor Alberto Semeler, por todo o incentivo e orientação acadêmica; à professora Daniela Kern, pelo estímulo a esta pesquisa por meio de suas qualificadas considerações e referências.

À CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelo financiamento parcial obtido por meio da bolsa de pesquisa de Mestrado; aos professores coordenadores e demais docentes deste Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da UFRGS.

Às colegas da graduação e da pós-graduação; aos colegas de almoços e jantares no Restaurante Universitário, e a todas as pessoas que, de alguma forma, colaboraram neste processo.

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RESUMO

Este trabalho é uma investigação sobre propostas artísticas desenvolvidas por três mulheres artistas brasileiras que utilizam elementos da cibercultura. Os conteúdos abordam a utilização da linguagem fotográfica junto a redes sociais e blogs, no contexto de desenvolvimento das suas poéticas visuais, pautadas na internet com elaborações desdobradas a partir de pautas feministas. Para tanto, considera a interface com os meios digitais e a web estabelecendo relações entre processos de produção e circulação de conteúdos artísticos on-line e off-line. A metodologia consiste em seguir publicações das artistas e realizar coleta de posts nas plataformas das redes sociais. Propõe o debate teórico a fim de identificar, analisar e promover as condições de produção, participação, circulação e legitimidade desse tipo de manifestação artística na contemporaneidade.

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ABSTRACT

This work is an investigation of artistic proposals developed by three Brazilian women artists using elements of cyberculture. The contents address the use of photographic language in social networks and blogs, in the context of the development of their visual poetics, based on the internet with elaborations unfolded from feminist guidelines. To this end, it considers the interface with digital media and the web establishing relationships between processes of production and circulation of online and offline artistic content. The methodology consists of following the artists' publications and collecting posts on social media platforms. It proposes the theoretical debate in order to identify, analyze and promote the conditions of production, participation, circulation and legitimacy of this type of artistic manifestation in contemporary times.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO_8

1. REDES SOCIAIS: LINGUAGENS E NARRATIVAS_18 1.1. Andressa Ce.: Blog, Facebook e Instagram_22

1.2. Laís Pontes: Facebook e Instagram_29 1.3. Aleta Valente: Instagram e Facebook_36 1.4. Pós-fotografia e subjetividades_42

2. O CORPO DA MULHER E A CENSURA ON-LINE_58 2.1. Mulheres artistas e feminismos_58

2.2. Corpografia e identidade(s) on-line_77

2.3. Potências políticas do virtual e a censura on-line_89 3. DAS REDES AO CIRCUITO ARTÍSTICO_103 3.1. Desdobramentos on-line para off-line_107

3.2. Circuito expositivo off-line e arte pós-internet_119 CONCLUSÃO_143

REFERÊNCIAS_152 GLOSSÁRIO_162

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INTRODUÇÃO

A escolha por desenvolver esta pesquisa de mestrado tem origem nas diversas indagações e inquietações surgidas durante a atuação como bolsista de Iniciação Científica, junto ao projeto de pesquisa Territorialidades na arte contemporânea: experiências artísticas na internet no Brasil, sob a orientação da Profª Dra. Maria Amelia Bulhões Garcia, do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A partir de um mapeamento sobre arte e internet, realizado anteriormente, acessamos a produção das artistas e percebemos atributos que indicavam uma linha de trabalho a ser explorada pelo viés da história, teoria e crítica de arte.

Observamos no mundo atual o advento das mídias digitais e da web na composição de processos artísticos desenvolvidos com dispositivos tecnológicos. A partir desse pressuposto, indagamos como a arte contemporânea se relaciona com a internet e como a internet interfere na arte. Seria possível enunciar que existe um tipo de arte específica produzida no contexto da cibercultura?

Nesta perspectiva, a investigação trata das formas de abordagem para a manifestação artística gerada na experiência do viver em rede nesta última década do século XXI. A linguagem artística está permeada por determinadas estratégias contextuais do ciberespaço que demandam, em virtude de sua natureza, reflexões que fogem da estética tradicional. Desse modo, a construção do percurso teórico exige um olhar receptivo à experimentação de novos paradigmas.

De caráter descritivo e analítico, a pesquisa tem foco na observação de propostas artísticas geradas na web, mais especificamente, nas plataformas de redes sociais Facebook, Instagram e um blog. O desenvolvimento da pesquisa é baseada na produção de três mulheres artistas brasileiras: Aleta Valente, Andressa Ce. e Laís Pontes. As proposições, que versam sobre a apropriação da estética do blog e das redes sociais abordam aspectos que apontam para a expansão das narrativas da arte mais recente. Evidencia-se a presença de imagens do corpo intensamente veiculadas pela fotografia digital e mediadas na web.

A observação e coleta de dados das experiências no ambiente on-line permitiram o levantamento de farto o material como documentos que atestam o funcionamento social e cultural de uma época. Em diálogo com a tecnologia digital e da internet, procuramos por interlocuções que contextualizam as propostas, tendo em vista as formas de representação visual do objeto de pesquisa. O conteúdo da dissertação é constituído como um recorte dentre as manifestações que utilizam as redes sociais da internet como projeto artístico.

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O estudo tem por objetivo analisar as iniciativas criadas e publicadas no formato de posts, a fim de examinar atributos expressos em poéticas visuais virtuais e a produção de subjetividades na contemporaneidade conectada. Em conjunção a princípios teóricos e sob esta ótica, é possível identificar qualidades estéticas e conceituais para debater modos de operação que vão desenhar um determinado cenário em poéticas visuais virtuais.

Para a construção da pesquisa, partimos em termos metodológicos das relações sistêmicas da arte com a intenção de localizar em termos contextuais o material que é apresentado e analisar as séries de publicações com fotografias e a presença da linguagem literária no campo artístico. Situamos o objeto de análise na interface da estética digital e das redes que propõem alterações sobre os modos de construir, narrar e consumir o objeto artístico dado neste contexto. Investigar os meandros da cibercultura constitui, aqui, um desafio necessário aos apontamentos complexos configurados por estas iniciativas. Os tópicos compreendem articulações relacionadas às narrativas publicadas nas plataformas virtuais com o intuito de perscrutar sua dimensão estética e política. O período compreende trabalhos datados entre 2011 e 2019 que revelam desdobramentos teóricos e visuais com foco na produção compartilhada junto ao público usuário das redes.

Durante o percurso da pesquisa, nos deparamos com várias possibilidades abertas por diferentes tipos de leituras e abordagens que poderiam contribuir na exploração deste território. Optamos pelos questionamentos que buscam visualizar e compreender o que está acontecendo hoje em relação à arte e internet, com o foco centrado nas proposições desenvolvidas no formato do blog e das redes sociais. A tarefa predominante consiste na investigação e análise dos processos artísticos desenvolvidos por artistas brasileiras que utilizam a web em seus processos criativos. Entretanto, o estudo foi ampliado de tal forma que ressaltou o interesse a partir da descoberta de projetos que ultrapassam a fronteira do virtual e se desenvolvem no formato tradicional de exposição.

A análise dos ambientes on-line e off-line exige trânsitos distintos em função da especificidade de cada plataforma na web ou território expositivo. Dotados de características bem singulares, tanto na estrutura quanto no sistema de funcionamento, o virtual com seus dispositivos demandam a possibilidade de conexão à internet e atualização dos conteúdos. Já para perscrutar a ordem do território físico, seria necessário deslocamento para os locais de exposição. Na impossibilidade de realizar viagens internacionais, e mesmo nacionais, optamos por pesquisar na web a partir de notícias jornalísticas e outras veiculadas pelas instituições artísticas e culturais, além de materiais de divulgação compartilhados pelas próprias artistas. Por ocasião de uma mostra coletiva e um festival de fotografia na cidade de

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Porto Alegre, foi possível visitar o espaço expositivo, conhecer e fotografar um trabalho de Aleta Valente e uma projeção de Laís Pontes.

Neste momento histórico onde nos encontramos imersos na tecnologia digital e na internet, interessa pensar criticamente sobre a pretensa objetividade dos dispositivos tecnológicos e a subjetividade do campo artístico, a partir de experiências estéticas que promovem a interatividade de artistas e público usuário. Interconectividade, ubiquidade e compartilhamento configuram novas abordagens do objeto artístico mediado pela tecnologia contemporânea. Tais ações permeiam nossas vidas e é imperioso tomar a rede como âmbito de referência para compreender suas funções e, assim, chegar até a representação imagética estudada no contexto desta pesquisa.

O projeto trabalha com imagens fotográficas publicadas on-line e também de alguns desdobramentos no circuito off-line. Com esta formulação dissertativa, a intenção é difundir um panorama da produção contemporânea que utiliza na composição do repertório em poéticas visuais a introdução de movimentos do ciberespaço. Produzir, assim, novos sentidos a partir de metáforas da fotografia como representação das identidades conectadas no virtual torna-se o elemento propulsor desta diligência.

Além de explicitar conceitos envolvidos nos trabalhos selecionados, buscamos promover a noção de um processo de escritura na arte contemporânea pautada na internet, a fim de identificar, também, quais seriam os desdobramentos e ressonâncias para além desse território. Um dos tópicos fundamentais é reconhecer as estruturas em operação, tanto no modo on-line quanto off-line dos trabalhos que utilizam tecnologia digital e web. Integram-se às reflexões diretrizes e elaborações teóricas no cruzamento de múltiplos elementos enquanto lugares de produção, circulação e fruição.

Contudo, pretendemos explorar aspectos que apontam para o desenvolvimento ou esgotamento do uso da web, refletindo sobre mudanças nos protocolos de exposição que adquirem os objetos artísticos fora da rede conectada. Consideramos, para tanto, a aplicação de um conceito debatido atualmente, a arte pós-internet, a fim de visualizar quais são as repercussões das práticas que estariam caracterizando este tipo de arte.

Com o intuito de pensar sobre as possibilidades de articulação de linguagens específicas no ciberespaço, a estratégia metodológica consiste em seguir publicações das artistas nos perfis utilizados como suporte e temática das proposições. A estruturação do projeto inicia no procedimento de coleta de dados na forma de posts, que prossegue em paralelo à observação do seu funcionamento na rede. Após o mapeamento de algumas publicações, na etapa seguinte, são elencadas características que definem tipologias de

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investigação. Os dados, coletados junto aos perfis de trabalho das artistas e também captados de sites e via sistema de buscas na web, permitem que as propostas sejam acompanhadas e atualizadas, em função da natureza da dinâmica da internet e das redes sociais. Além disso, encontramos conteúdos através de pesquisa no Google resultando em consultas on-line de forma permanente e diária, junto ao levantamento de apoio bibliográfico em livros, periódicos e arquivos disponíveis no formato digital.

A comunicação com as artistas propiciada por conversas via e-mail e chat de redes sociais, como o Messenger, constitui uma estratégia importante de aproximação e conhecimento das motivações de trabalho. Através de trocas de mensagens, estabelecemos a interação com as artistas a fim de esclarecer dúvidas e solicitar mais informações e detalhes sobre os processos de construção e funcionamento das propostas. De posse das informações e referências armazenadas à semelhança de um banco de dados, é possível organizar e classificar os conteúdos para construir o corpo da pesquisa. Considerando o caráter de investigação diária e contínua, a obtenção dos resultados é atualizada no levantamento on-line que inclui a seleção de posts, leitura de textos, análise de obras de outras artistas, além de vídeos na internet.

A metodologia reúne referenciais teóricos para explicitar o pensamento de autoras e autores afinados com pesquisas acadêmicas e artísticas recentes, além de um conjunto de teses e dissertações coletadas no percurso. A fim de diversificar as discussões, evocamos o pensamento de especialistas que compõem as principais referências: Priscila Arantes, abordando arte e mídia numa perspectiva da estética digital; Juan Martín Prada com investigações voltadas para a arte nas redes sociais e os estatutos da imagem em tempos de internet; Lucia Santaella com sua contribuição reflexiva sobre as mutações do corpo orgânico em face do princípio da tecnologia digital. Como referência ao sistema da arte, recorremos ao aporte de Maria Amelia Bulhões, com estudos específicos sobre as relações entre arte e internet no âmbito das relações sistêmicas. São utilizadas, ainda, entre outras importantes contribuições teóricas, Giselle Beiguelman, Paula Sibília e Cláudia Gianetti. Sobre os estudos feministas consultamos Marcia Tiburi, Heloísa Buarque de Hollanda, Teresa de Lauretis, Simone Osthoff, entre outras autoras.

A análise tem por objetivo destacar aspectos constitutivos das propostas para além do debate relacionado à tecnologia digital e ao impacto das redes sociais na contemporaneidade. Interessa, também, a investigação considerando a interface entre linguagem fotográfica, dispositivo digital, internet e seus efeitos na composição de subjetividades. O desenvolvimento dos capítulos consiste, sobretudo, nas discussões teóricas a fim de

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identificar, analisar e promover as condições de produção, participação, circulação e legitimidade desse tipo de manifestação artística na contemporaneidade. As reflexões podem ser proveitosas no sentido de oferecer visões de especialistas que têm incursões diversificadas nas áreas da arte, tecnologia, cibercultura e feminismos, a fim de contribuir para dinamizar a investigação.

Nas origens da internet com a rede mundial de computadores e o WWW, conforme concebido por Tim Berners Lee estava o princípio de amplificação democrática das sociedades. A partir dessa constatação, o que podemos inferir do atual momento ao questionar para onde evoluiu, no sentido do bem e do mal, a rede internet? Da mesma forma que caracteriza um imenso repositório de dados com estrutura capaz de conectar indivíduos e instituições de, praticamente, todos os cantos do planeta, a rede também tornou-se um espaço de geração de discursos de ódio, oposições e violências de variados níveis. Com essa intenção pautamos a investigação das ações aqui desenvolvidas como um território que reúne mulheres artistas para processos de reflexão coletiva, interrogando a forma de pensar o mundo e a própria arte, a partir do advento da internet com suas ferramentas, recursos e limitações. Acreditamos que demonstrar a necessidade e a relevância de construir registros e análises pensados como um fenômeno ligado à atualidade, no âmbito estético e político, é capaz de oxigenar o pensamento poético e crítico sobre as práticas atuais.

Com relação à utilização de algumas noções próprias do universo da arte e tecnologia na pesquisa ressaltamos que, na literatura especializada, encontramos inúmeros termos entre vocábulos e expressões que descrevem tipos de práticas artísticas na web e que vêm demandar, à luz da investigação acadêmica sua compreensão e estudo. Ao percorrer artigos, dissertações e teses, observamos diferentes nomenclaturas para os processos evidenciados com o uso de ferramentas digitais, entre computadores, dispositivos móveis e internet, concebidas e exibidas em épocas distintas e de acordo com os recursos disponíveis no momento.

Trazendo à tona conceitos como a pós-fotografia e a pós-internet suscitamos linhas de pensamento teórico buscando estimular modelos de produção, distribuição e recepção de conteúdos no âmbito acadêmico e curatorial. Através da metodologia de pesquisa on-line mesclada ao referencial buscamos orquestrar a reflexão no decorrer do processo de análise de forma transdisciplinar. A instauração de renovados modos de construir, narrar e expor a poética visual fica em evidência na diversidade de implicações que surgem com a presença dos autorretratos fotográficos, a questão da representação das identidades e, principalmente, dos atritos gerados pela exposição de imagens do corpo da mulher.

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Os tópicos desenvolvidos trazem à tona considerações gerais sobre as tecnologias digitais no âmbito da vida contemporânea e do processo artístico, bem como efeitos e implicações ao sistema da arte. A proposta busca estimular junto à comunidade acadêmica, científica e artística a ampliação de repertório poético e teórico em práticas artísticas no Brasil, principalmente as produções que incorporam os meios tecnológicos digitais e a internet, por meio das redes sociais. As imagens, referências e citações são relativas aos estudos mais recentes sobre a expansão da produção artística brasileira, envolvendo as atividades de investigação, consulta, apropriação, fruição, análise e circulação de dados sobre o cenário.

Os principais conteúdos dizem respeito à utilização de redes sociais e blogs na produção artística; apresentação do conjunto de trabalho desenvolvido no curso de Mestrado; introdução à arte e internet; discussão sobre terminologias empregadas na área; contexto de desenvolvimento das poéticas visuais e da cibercultura no Brasil; conceitos teóricos e pesquisas de artistas, historiadores e acadêmicos; web arte; imagens fotográficas do corpo na internet; pós-fotografia; livros e referências on-line.

O projeto de pesquisa é pautado na relevância de se visualizar e atualizar o panorama de inserção e desenvolvimento da arte e internet no Brasil. Entre os principais objetivos, destacamos o compartilhamento de dados sobre práticas artísticas pautadas na web para potencializar a construção de repertório num percurso analítico e reflexivo das poéticas visuais, estabelecendo relações entre processos de produção e circulação de conteúdos artísticos nas redes.

Nesse aspecto, considerar a dimensão das imagens fotográficas digitais e dos textos como fonte e objeto de pesquisa pode conduzir a uma exploração produtiva, entretanto, para revelar sua condição artística, o ponto de partida é interrogá-los como documentos. É preciso citar que no campo de estudo da arte intensamente pautada na dinâmica social do fotográfico mediado pela internet, há certo vazio teórico na abordagem de processos de caráter tão específico. A partir desses pressupostos, indaga-se: quais seriam os atributos das narrativas desenvolvidas pelas artistas, especificamente, no âmbito do pós-fotográfico em redes sociais virtuais?

Alguns questionamentos também intrigam e mobilizam a reflexão em direção a perspectivas dinâmicas sobre os relacionamentos entre arte e internet. É na última década, portanto, que vamos observar e vivenciar uma série de mutações que perpassam os âmbitos do tecido social e cultural em que vivemos. Justamente sobre essa reconfiguração da arte na contemporaneidade é que iniciamos a abordagem com a apresentação dos trabalhos das

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artistas. Para o desenvolvimento do texto final da dissertação o material foi organizado da seguinte forma.

No primeiro capítulo é proposta a apresentação de ideias sobre as linguagens e narrativas nas redes sociais, através das quais serão conduzidas todas as análises das poéticas visuais virtuais em destaque nesta exploração. Disparadas a partir da década de 1960, no âmbito das manifestações artísticas surgem diversificadas expressões estéticas que passam a incorporar dispositivos tecnológicos. A partir de 1990, delineia-se outro panorama com a série de influências decorrentes do aparecimento e da gradativa inserção do aparato digital, mediado pelas tecnologias de informação e comunicação.

Para tanto, destacamos o pensamento de um dos teóricos da cibercultura, Manuel Castells, responsável por difundir reflexões sobre as mudanças sociais advindas do uso de recursos digitais e da web. Com o propósito de expor pontos de vista acerca das linguagens expandidas da comunicação, mais intensamente veiculadas com o sistema computacional e das redes conectadas, explicitamos definições, usos e aplicações de alguns conceitos desta área. A fim de compreender o território que pretendemos explorar, procuramos pautar a discussão sobre a compreensão da cibercultura, do ciberespaço, da World Wide Web e da Web 2.0.

Através do estudo das propostas, buscamos, também, contextualizar o desenvolvimento em arte e internet no Brasil com seus dispositivos de representação, a fim de investigar e compreender os processos criativos e metodológicos. Observamos que o material exposto evidencia aspectos sobre o uso do corpo e da linguagem fotográfica nas propostas que pensam o virtual no contemporâneo e tratamos de realizar apontamentos sobre elementos e características da produção permeada pelo ciberespaço.

No formato descritivo, são introduzidas individualmente as séries de trabalhos, a começar pelo blog de Andressa Ce. denominado Histórias nem tão reais, nem tão fictícias. Com relação à linguagem do blog na arte elegemos o pensamento de Juan Martin Prada que reflete sobre as poéticas na era da internet, e de Lucia Santaella, sobre a relação entre imagem e texto. A presença da linguagem literária é tratada como um elemento relevante no sentido de instigar a verificação das ideias presentes nos escritos dos posts, seja por meio de textos curtos, legendas, comentários ou hashtags.

Na sequência, examinamos o projeto Born Nowhere, de Laís Pontes, realizado no Facebook e no Instagram. Com os autorretratos modificados digitalmente e lançados na plataforma pela artista, indagamos sobre as configurações das noções de identidades on-line

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na contemporaneidade. Como não poderia deixar de ser, atentamos para a apuração da linguagem mediada que vem demandar a colaboração do público usuário na criação artística.

Percebemos a recorrência das imagens fotográficas como uma forma de relacionamento com os usuários da rede social. Passamos, então, a verificar a série de selfies do perfil @ex_miss_febem desenvolvidas por Aleta Valente no Instagram. As demandas suscitadas envolvem a compreensão de mecanismos que estabelecem arte e internet como um território singular, até os desdobramentos e interseções das práticas com ideias dos pensamentos feministas contemporâneos. Utilizamos como referências as perspectivas de estudos feministas e ciberfeministas, considerando as autoras Marcia Tiburi, Ivana Bentes, Donna Haraway, Tatiana Wells, Jarid Arraes, além de comentários e posicionamentos da própria artista Aleta Valente.

A propósito do fenômeno fotográfico no universo da cibercultura, vamos dissecar o conceito de pós-fotografia e subjetividades, à luz das teorizações de Juan Fontcuberta. Projetamos um panorama da pós-fotografia, ao elencar nomenclaturas e formatos de ser e estar no mundo virtual cooptadas sob o domínio da figura do perfil, do avatar, da ficção, das identidades fake ou inventadas. Abordamos a pós-fotografia considerando aspectos da tecnologia com seus dispositivos e interfaces, na constituição de subjetividades em relação à utilização das mídias digitais e internet. Tomamos como exemplos imagens das artistas investigadas junto a comentários e outras observações captadas no blog e nas demais plataformas.

No segundo capítulo, debatemos a exposição de imagens do corpo da mulher e os mecanismos restritivos que fazem parte das normas de privacidade nas redes sociais quando entra em pauta a questão da censura on-line. Julgamos pertinente, também, resgatar algumas obras fotográficas de mulheres artistas desenvolvidas em período anterior, a fim de evocar aproximações com trabalhos mais recentes e pontuar questões refletidas na intercessão com pautas das agendas feministas. O argumento chave para dissertar sobre o protagonismo feminino na arte deste século e, mais especificamente, a partir do advento da internet é considerar que uma complexa transformação de paradigmas vem ocorrendo nas últimas décadas, e que não passamos incólumes frente às novas ou renovadas demandas a respeito da exposição de imagens do corpo.

Delineando este objeto como análise teórica e crítica de poéticas visuais no virtual, evidenciamos relações da ordem do corpo como meio e suporte na arte. Considerando as proposições analisadas comentamos sobre estatutos da imagem digital quanto à representação, por meio da performatividade na fotografia. Buscamos as narrativas sobre o corpo, além dos

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deslocamentos e perspectivas instauradas pela relação do corpo com as tecnologias na abordagem de novos formatos de identidades ou nas suas formas remidiadas de apresentação. A leitura crítica tem foco, ainda, nas publicações que integram imagem fotográfica e literatura, conectadas pelo conceito de corpografia e identidades no ambiente on-line.

O aspecto do protagonismo do ‘eu’ representado em imagens fotográficas mediadas pela web, leva à proposição de reflexões sobre as políticas da vida virtual que permeiam nosso cotidiano. Neste caso, pensamos nas possibilidades suscitadas pelo ato de expor a nossa realidade nas redes sociais. Como base para a discussão, trazemos a noção da estética da interface na perspectiva de Priscila Arantes, buscando compreender os formatos narrativos que estamos construindo com o digital a respeito de nossas vivências mais íntimas.

No contexto das narrativas, enfocamos no capítulo um ponto nevrálgico das redes sociais, como por exemplo, o teor de alguns comentários encontrados nos posts de Aleta Valente. Caracterizados como discursos de ódio, os escritos postados por usuários e seguidores expõem uma faceta da vida virtual onde nem sempre as interações transcorrem de forma saudável ou pacífica. Neste ponto, integramos as indagações e constatações de Marcia Tiburi e Ivana Bentes ao versarem sobre as representações imagéticas e discursos a respeito do corpo nu da mulher, aliado às implicações suscitadas na esfera midiática on-line e entendidas como repreensão e censura. Enfoca e debate alguns desafios e restrições que o meio virtual impõe à circulação de imagens fotográficas do corpo feminino e que acabam por impactar o domínio da criação artística.

O terceiro e último capítulo procura analisar as condições de proposição e operação que caracterizam a migração do objeto on-line para o circuito expositivo off-line. Com o debate amparado em Lucia Santaella, Pierre Lévy e Claudia Giannetti procuramos traçar uma argumentação profícua na intenção de verificar os arranjos da estética digital permeada pelos movimentos da cibercultura, e a consequente recepção e assimilação dos fenômenos próprios ao mundo contemporâneo.

Este tópico apresenta, pois, as ideias e temas tratados pelas artistas, destacando-se como um recorte no mapeamento das propostas desenvolvidas por mulheres conectadas à rede. Inquirindo os trabalhos, extrapolamos o ambiente virtual e encontramos desdobramentos expostos fora da internet. No âmbito das exposições realizadas pelas artistas procuramos verificar quais são as características assumidas pelos trabalhos quando mostrados em outros suportes e contextos, como galerias, museus e o espaço público da cidade. Integra um tópico relevante de pesquisa em função da multiplicidade de conexões em fluxos de produção, circulação e sistematização do trabalho artístico.

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Reunir os fragmentos da vida contemporânea em forma de posts que configuram um pensamento artístico sobre tantas facetas sociais e culturais que nos mobilizam, requer um investimento estratégico em formas de abordagem metodológica e pressupostos teóricos. Alguns preceitos verificados pelo caráter transitório e efêmero das redes sociais digitais acompanham este percurso diariamente atualizado ao longo de, praticamente, dois anos de pesquisa. Tendo como referência e suporte a perspectiva teórica procuramos vislumbrar, no universo do ciberespaço como se organizam as narrativas que regulam arte e internet, desejando que a escrita da história da arte reflita, de forma contundente, sobre as nuances que afetam a vida contemporânea.

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1. REDES SOCIAIS: LINGUAGENS E NARRATIVAS

Foi na década de 1990 que a inserção da internet (criada por volta de 1969 nos Estados Unidos) expandiu-se rapidamente de forma comercial. Utilizada inicialmente por cientistas para a troca de informações, não possuía um padrão para congregar e facilitar seu uso. Somente em 1991 foi desenvolvida a parte da internet que corresponde à www (World Wide Web) pelo físico britânico e cientista da computação, Tim Berners-Lee. Com a criação de um protocolo comum para trocar informações através da rede, a partir de princípios do hipertexto, instituições, empresas, universidades e pessoas passaram a ter acesso a novos recursos e ferramentas constituídas num sistema global de computadores interligados. Através de sua interface gráfica, tornou-se possível acessar diversos dados na forma de textos, sons, filmes. De acordo com Castells (2003), a internet é um meio de comunicação que permite, pela primeira vez, a comunicação de muitos com muitos, num momento escolhido, em escala global, o que o autor denomina de Galáxia da Internet que, como sistema de comunicação e organização explodiu nos últimos anos do segundo milênio.

A influência das redes baseadas na internet vai além do número de seus usuários: diz respeito também à qualidade do uso. Atividades econômicas, sociais, políticas e culturais essenciais por todo o planeta estão sendo estruturadas pela internet e em torno dela, como por outras redes de computadores. De fato, ser excluído dessas redes é sofrer uma das formas mais danosas de exclusão em nossa economia e em nossa cultura. (CASTELLS, 2003, p.8)

No território da arte, com apropriação do suporte computacional e da web, verificam-se experimentações envolvendo computadores e internet, práticas que vêm até a atualidade recebendo a adesão de artistas e oferecendo subsídios para se pensar novas configurações da estética digital. Movimentos artísticos da contemporaneidade refletem mudanças tecnológicas e ampliação do campo de atuação de artistas.

O desenvolvimento internacional da rede Internet, com sua utilização generalizada a partir da segunda metade dos anos 90, oferece aos usuários formas individualizadas de percorrer inúmeras vias de informação à sua disposição, buscando encontrar os objetos de seu interesse e conectar-se com seu grupo ou tribo. Os artistas perceberam, desde o início, as possibilidades desse novo meio; as primeiras propostas de produção artística on-line datam de 1994. (BULHÕES, 2012, p. 49)

No que diz respeito às ações entre arte e internet observa-se a ocorrência da web arte, entendida como uma forma de expressão criativa que envolve o computador ou os dispositivos digitais móveis com acesso à internet. Como meio e suporte de expressão, é

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caracterizada por uma série de experimentos em forma de obras on-line concebidas por artistas em várias partes do mundo. Neste campo de concepção, a arte contemporânea recebe impulso da tecnologia digital de forma a gerar propostas que dependem da conexão para, efetivamente, existirem. São encontrados trabalhos em formato de sites, por exemplo, que misturam formas estáticas e dinâmicas, imagens, sons, vídeos, textos e camadas mixadas para evidenciar suas mensagens. Assim, a web arte deve ser entendida como um tipo de produção específica de iniciativas criadas a partir da internet e para a internet, tendo seu funcionamento condicionado à web. Como um lugar de interação virtual, a rede propicia a transferência e o compartilhamento de dados entre milhares de pessoas on-line, ou seja, com o recurso da conexão ativo em seus dispositivos, ainda que estejam sediadas fisicamente em distintos pontos do planeta.

Convém explicitar que o espaço virtual formado por computadores e usuários conectados à internet em uma rede mundial interligada pelo protocolo da World Wide Web (www), conhecida popularmente como web, é também relacionada ao termo ciberespaço designando o espaço de comunicações que não existe fisicamente, mas, virtualmente. Ciberespaço e internet se tornaram sinônimos, pois, na rede são expressas as principais características do ciberespaço como os fluxos informacionais que operam independentes de seu contexto ou localização geográfica. Em função do ambiente conectado, a estética derivada ou originada de forma on-line caracteriza uma parcela significativa da produção ao potencializar criação e compartilhamento de arquivos de imagens e textos, constituindo, além das próprias obras artísticas, potentes registros de obras em circulação na internet.

Entre algumas artistas brasileiras que desenvolvem esse tipo de prática, destacam-se: Lucia Leão (1963), Simone Michelin (1956), Denise Agassi (1975), Giselle Beiguelman (1962), somente para citar alguns exemplos. As principais temáticas dos trabalhos abordam desde questões experimentais com os recursos tecnológicas e a rede internet até aspectos que envolvem trânsitos e deslocamentos, identidades e memórias. São recorrentes as iniciativas que fazem uso dos sistemas de localização tipo GPS, imagens de cidades, fotografias apropriadas, hashtag, textos, arquivos de áudio e vídeo como um remix de elementos captados no ciberespaço. Os componentes encontrados nas propostas são produzidos com utilização dos recursos tecnológicos possibilitados pelos próprios dispositivos, além de questionamentos sobre as transformações geradas pela disseminação da internet no modo de vida contemporâneo. Grau (2014) afirma que no universo imagético baseado na mídia social de hoje, as imagens, juntamente com as culturas de onde partiram, estão em movimento.

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Imagens incontáveis fluem com extrema mobilidade em frações de segundo ao redor do mundo como mensagens de comunicação transnacional e transcultural. (...) O que vemos, neste momento, é a mudança de nossas culturas de imagem que estão conectadas à mídia internacional na direção de uma única cultura de imagem que opera num crescente transcultural. (GRAU In BEIGUELMAN & MAGALHÃES, 2014, p.104).

À medida que o uso do ambiente virtual é expandido, desenvolvem-se novas linguagens e modos de comunicação entre pessoas usuárias da web. Na ampliação dessas modalidades de estruturação de linguagens e comunicação, surgem as redes sociais fundamentadas na ideia de redes, conforme aborda Castells (2003), “uma rede é um conjunto de nós interconectados. A formação de redes é uma prática humana muito antiga, mas as redes ganharam vida nova em nosso tempo transformando-se em redes de informação energizadas pela Internet”. De fato, por esse princípio, conhecemos as redes sociais virtuais disponíveis e acessíveis para gerar relações fundamentadas na interação e no compartilhamento.

Atentas à experiência de viver em redes sociais na última década do século XXI, diversas artistas exploram especificidades das plataformas para desenvolver seus projetos com mídias digitais desde o ambiente on-line. Esta análise inicia, portanto, através da identificação de proposições que utilizam o modelo do blog e as plataformas mais populares, como Facebook e Instagram.

De acordo com Prada (2016, tradução nossa), “é a partir da configuração de web 2.0 que a interação de usuários em recriações de estratégias para uma expressão criativa na internet tornou-se possível, alimentada pela apropriação de produções encontradas na web”. Para o autor, as grandes plataformas e bancos de dados coletivos colaborativos próprios do modelo web 2.0 desencadearam, também, a proliferação de uma infinidade de produções recaptadas, modificadas, readaptadas ou parodiadas por milhões de usuários, dando origem a fenômenos virais de personagens que acabaram sendo objetos de milhões de respostas por outros usuários e que se tornaram também fenômenos massivos, a exemplo de alguns vídeos no YouTube.

Percorrendo os movimentos da arte e da web, uma das questões principais é compreender se há possibilidade de estabelecer um marco para a arte contemporânea situado no advento da internet. E, especificamente, com relação à arte que se origina em redes sociais e blogs como territórios de exposição, quais são os formatos assumidos por essas representações visuais e suas repercussões? E ainda, de que forma as instituições culturais atuam para a difusão de tais práticas estabelecidas na sociedade da interatividade e do compartilhamento?

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Para tentar responder às questões é necessário investigar qual é esse circuito e qual a tipologia das propostas que abordam, neste caso, as narrativas construídas a partir das redes. Em virtude do complexo contexto das operações, suas ferramentas e funcionalidades, aliadas a questões sobre representação, identidade, gênero e feminismos, são empregadas leituras transdisciplinares. Os projetos são apresentados com objetivo de apontar características evidenciadas por experiências contemporâneas que utilizam, especificamente, a tecnologia digital e a internet. Suscitam reflexões sobre a instituição da internet na arte a partir da criação de experiências interestéticas. Cabe ressaltar que o conceito de interestética, na perspectiva de Arantes (2012, p.169) significa uma estética da interface, ou seja, “uma das possibilidades para se pensar na estética da contemporaneidade”. Nesse sentido, a ideia de interface é compreendida não como uma visão técnica, mas como processo de fluxos de informações, à semelhança do que têm feito as artistas explorando possibilidades poéticas de modo a refletir um movimento de características singulares na arte on-line.

A intenção é, sobretudo, potencializar desdobramentos teóricos e conceituais a partir do trabalho de Andressa Ce., Laís Pontes e Aleta Valente que desenvolvem suas práticas narrativas nas redes sociais com o Facebook, o Instagram e o blog. As séries em estudo utilizam-se da produção e do compartilhamento na forma de post, linguagem característica das publicações realizadas nas redes sociais virtuais. Entre os aspectos relevantes, além de possíveis leituras e abordagens sobre as imagens e conteúdos das publicações, a intenção é destacar a formulação de alguns questionamentos que são o mote das investigações. A análise teórica tem origem no ato de identificar e mapear publicações que constituem os trabalhos das artistas, no período entre 2011 e 2019.

O principal argumento para dissertar sobre o protagonismo de mulheres na arte deste século tem foco, sobretudo, no interesse em analisar e promover as condições de produção, participação, circulação e legitimidade de mulheres artistas no circuito da arte que utiliza a tecnologia das mídias digitais e da internet.

A partir do seu advento, em meados de 1990, e das redes sociais com proliferação massiva em 2004, observa-se a ocorrência de uma complexa transformação nos modos de ver, conviver e expressar, impulsionados pela interface tecnológica. Artistas apropriam-se das linguagens das mídias na rede conectada que entra em pauta como plataforma e conteúdo na tematização de práticas artísticas e experimentações sobre a representação do corpo e identidades da mulher. Para Wells (2017), “a nova luta das mulheres envolve desafiar a sua força da modelagem sistemática, sejam nas leituras midiatizadas e distorcidas de nós mesmas, de nossos corpos e desejos, ou através da crise das jovens meninas” (WELLS, In MAYER,

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2017, p.45).

No sentido de estimular o debate produtivo sobre ações de mulheres artistas na web, entram em pauta estudos sobre o corpo na cultura visual e perspectivas feministas. Nossa condição histórica, social, política está permeada por determinadas estratégias contextuais do ciberespaço que demandam reflexões de caráter sistêmico. Além disso, como efeitos da composição e circulação de subjetividades on-line surgem alguns desafios impostos à exposição de imagens do corpo da mulher no âmbito das redes sociais. As séries aqui apresentadas configuram um aprendizado teórico, a fim de tornar possível ampla reflexão sobre a atuação e a presença de mulheres artistas no trânsito tecnológico intensamente propiciado na contemporaneidade.

1.1. Andressa Ce.: Blog, Facebook e Instagram

Iniciativas em poéticas visuais desenvolvidas por mulheres no modelo web 2.0 podem ser encontradas, também, no modelo do blog que surgiu com a expansão massiva do fenômeno dos blogueiros, a partir de 1999. Considerados uma espécie de diário virtual, os blogs possibilitaram aos usuários a capacidade de transposição da função de leitores para a função de produtores de informação e conteúdo. É o caso das séries de trabalho da artista Andressa Ce. (1990, São Paulo/SP) na plataforma Wordpress.com onde explora a existência de três heterônimos. Sam Terri, Olga Gaia e Ella A. introduzem uma coletânea de memórias como fotos e textos curtos para promover narrativas em primeira pessoa ou evocativas sobre pessoas, lugares, situações, passagem de tempo, experiência, morte. O blog denominado “Histórias nem tão reais nem tão fictícias” foi criado em 2014, com suporte de um projeto de residência artística através do LAB MIS Fotografia, do Museu da Imagem e do Som de São Paulo.

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A estratégia de Andressa consiste em assumir a função de artista e de narradora da própria obra com fotografias e literatura, recorrendo a três distintas personalidades incorporadas ao ambiente virtual. A figura do heterônimo, neste contexto, caracteriza uma autoria fictícia constituída por uma espécie de persona que obtém um nome atribuído por um autor para certas obras suas com características e atributos próprios. Cada heterônimo é dotado de traços de personalidade, desejos, pontos de vista e formas de expressão da linguagem. Conforme indicam as autoras no blog, as histórias contadas não são reais, mas, de acordo com a proposta não seriam tão fictícias assim. A propósito, o blog, um formato que caracterizou a web 2.0 resgata uma prática semelhante a da escrita em diários íntimos, uma forma de registro e armazenamento de conteúdos dotados de um tipo diferenciado de estética, pois no espaço on-line não prevê a participação ativa do público usuário, além da leitura.

Nesse aspecto, a participação do público na condição de espectador do projeto artístico fica limitada, de certa forma, à visualização do post com imagem e texto, bem como a sua interpretação e a percepção decorrentes do contato com os conteúdos. Entre os posts, encontram-se inúmeras publicações de Ella A., Sam Terri e Olga Gaia que promovem narrativas através de imagens fotográficas e literatura. Evidenciam, por meio de fotografias e palavras, um movimento que configura as relações no fazer artístico decorrente da web. Em

https://historiasnemtaoreais.com/ o texto de apresentação expõe a finalidade da página: “Ella, Olga e Sam, contos e fotografias se unindo em uma narrativa só”.

Texto abaixo da imagem na tela de abertura do blog Disponível em https://historiasnemtaoreais.com/

Logo a seguir, indica os ícones para acesso ao Facebook e ao Instagram do projeto e fornece os endereços de e-mail das três personas.

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No ambiente on-line, o surgimento dos blogs inaugura um modelo de linguagem, mais informal e usual como expressão de pensamentos e questionamentos. No trabalho de Andressa Ce., os heterônimos falam de si a partir de imagens e textos, que vão de legendas simples com uma frase até breves textos íntimos. Artistas cada vez mais se utilizam dessa espécie de apropriação de imagens e palavras numa fusão de linguagens, principalmente de imagens fotográficas que circulam na web ou de produções fotográficas próprias. PRADA (2016) considera a existência de diversos blogs escritos por escritores assumindo diferentes personalidades fictícias em torno da necessidade pessoal de exprimir canalizada pelas mídias na web.

Na seção https://historiasnemtaoreais.com/ella-a/ Ella A. participa com fotografias e contos onde o texto explica que todo seu trabalho “representa uma busca incansável por sua identidade que nunca será encontrada porque não existe”.

Tela inicial da seção de Ella A.

Disponível em https://historiasnemtaoreais.com/ella-a/

A era da imagem na internet tem dotado o visual de uma percepção expandida na articulação da linguagem quando introduz texto escrito junto às imagens publicadas. “A relação entre a imagem e seu contexto verbal é íntima e variada. A imagem pode ilustrar um texto verbal ou o texto pode esclarecer a imagem na forma de um comentário” (SANTAELLA & NÖTH, 2012, p.55). A respeito da relação imagem-texto, a concepção adotada aqui segue um princípio de Santaella & Nöth ao dissertar que Barthes distingue duas formas principais de referência recíproca entre texto e imagem: ancoragem (fixação) e relais (revezamento). No princípio da ancoragem, “o texto dirige o leitor através dos significados da imagem e o leva a considerar alguns deles e a deixar de lado outros. (...) A imagem dirige o leitor a um significado escolhido antecipadamente”. Em contrapartida, na relação de relais, “o

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texto e a imagem se encontram numa relação complementar. As palavras, assim como as imagens, são fragmentos de um sintagma mais geral e a unidade da mensagem se realiza em um nível mais avançado” (SANTAELLA & NÖTH, 2012, p.57). Com base nesse princípio, a estratégia da relação de ancoragem seria direcionada do texto para a imagem, enquanto no relais a atenção do observador é dirigida para o percurso que vai da imagem à palavra e da palavra à imagem. Nesse sentido, na sequência do post o texto informa sobre o contexto de existência da persona como uma teoria da autora sobre Ella A.:

Texto sobre Ella A.

Fonte https://historiasnemtaoreais.com/ella-a/

A explicitação da referência feita aos textos da autora através da linguagem escrita é reforçada pela necessidade das imagens fotográficas como recurso de expressão para definir a si mesma.

Texto sobre Ella A.

Fonte https://historiasnemtaoreais.com/ella-a/

Por fim, a descrição complementa: “É inocente porque tudo lhe é desconhecido. Esforça-se para entender o mundo como ele é, mas se perde nos próprios pensamentos e é

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como se uma névoa de fantasia não lhe permitisse enxergar e relatar a realidade. Vive em seus próprios devaneios”.

O heterônimo Sam Terri opta por um caminho diferenciado quanto à representação e descrição da própria imagem. A introdução de sua seção no blog já apresenta uma foto de detalhe do corpo nu cuja primeira frase informa: “Sam é uma pessoa difícil. Ela pode ser bastante imatura e um tanto dramática, tende a entrar em contradição e seu humor é de uma instabilidade nata. Sentimentos a atingem com uma intensidade imensa, e ela não sabe muito bem como lidar com eles, por isso tende a tomar atitudes impulsivas e impensadas. É autodestrutiva e parte do seu trabalho é usada para reconstruir seus pedaços quebrados no processo de autodestruição. Dona de sua sexualidade, sente-se confortável com o próprio corpo e com o corpo dos outros. Estabeleceu forte vínculo com a nudez e formas corpóreas e gosta de utilizar-se delas em suas imagens. Encontra-se confortável em ambientes noturnos, e já conheceu muitas personalidades interessantes deste imaginário. Aprecia expô-las em textos, mas em suas imagens a identidade é preservada: pessoas aparecem apenas como corpos, porque considera que o corpo basta como expressão. Sam se envolve muito com estas pessoas, possui uma relação concreta com aqueles que retrata ou escreve como personagem. Ela as conhece muito bem e tem necessidade de apresentá-las ao mundo. Porém, ao mesmo tempo em que ela possui este entrosamento com outros, ela é uma pessoa muito absorta em suas próprias questões, egocêntrica. As outras pessoas são importantes apenas enquanto pertinentes a Sam, e seu prazer está mesmo em falar de si, mesmo quando falando dos outros. Estou dizendo, Sam é uma pessoa difícil, muito difícil. Mas é também muito divertida.”

Seção de Sam Terri

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Com esse heterônimo surge uma configuração intrigante na descrição de seu temperamento e hábitos que virão a justificar conteúdos mostrados em fotos e textos. Para Sam, os retratos publicados desempenham uma função de mediação entre ela e seu entorno social e que, simultaneamente, declaram características e preferências pessoais, sexuais, afetivas. Por meio do gesto de publicar imagens e relatos de outras pessoas para dar a conhecer-se, ocorre uma apropriação desses contextos imagéticos e vivenciais como uma coleção de informações concomitantes à própria existência. Sam também possui perfil próprio no Facebook e no Instagram como @sam.terri.

Especificamente sobre a linguagem dos blogs, Prada (2016) considera que a expansão das práticas de apropriação traz a recuperação da figura do artista como um coletor, um colecionador dos materiais encontrados.

As diversas formas de deambulação e apropriação pela web recordam muito as míticas peregrinações de Joseph Cornell, a exemplo da obra La jaula de cristal (Retrato de Berenice), 1943, nos anos 40, buscando fotos, gravações, películas, cartas que seriam depositadas em suas caixas de sombra. Peregrinações estas que, hoje, seriam substituídas por um trânsito digital, pela navegação na rede, através de

blogs e plataformas de fotografias e vídeo, por exemplo, recolhendo esses

fragmentos de vida cotidiana. (PRADA, 2016, tradução nossa)

Um tanto diferenciada dos demais heterônimos, Olga Gaia denota uma personalidade neurótica e foge aos padrões de busca por sentido existencial. Sua seção no blog tem como título o comunicado ou aviso “Denúncias de Olga Gaia”. Ao clicar sobre a frase, o usuário é remetido ao blog https://maybeyouaremad.wordpress.com/ com o título Maybe You’re mad – Always be aware, que na tradução significa “Talvez você seja louco – esteja sempre atento”. Escrito na língua inglesa, o blog apresenta as publicações como uma coletânea de pistas sobre a existência de uma teoria conspiratória.

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Seção de Olga Gaia

Fonte https://maybeyouaremad.wordpress.com/

A foto da publicação de abertura mostra um tipo de cone, objeto típico utilizado para sinalização. De cor amarela, está localizado sobre um piso cinza com a inscrição advertindo: “Cuidado, chão molhado”. Ao lado do cone sinalizador há uma mancha no chão. Acima da imagem, uma legenda recomenda: “Aqui estão algumas dicas para você” e, abaixo da imagem há uma lista de cinco itens com as seguintes recomendações: “1 – Esteja ciente; 2 – Faça anotações, tire fotos. Mantenha-se informado; 3 – Não tenha medo; 4 – Não confie em ninguém. Confie em seus instintos; 5 – Oculte. Mantenha um perfil discreto”.

Post de Olga Gaia

Fonte https://maybeyouaremad.wordpress.com/2018/12/31/blindness/

No post “Blindness” que na tradução quer dizer cegueira, vemos um retrato de mulher em perfil à semelhança das fotografias analógicas mais antigas em preto e branco. Uma rasura nos olhos dá o tom da observação escrita logo abaixo da imagem: “Eu já fui cega para essas coisas. Assim como você está agora”.

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As publicações seguintes obedecem a um padrão expresso por um título ou legenda como se fosse um aviso, uma foto assinalada com detalhe rasurado nos olhos ou no rosto das figuras. Em outras imagens também aparecem grifos com círculos ou setas assinalando particularidades que devem ser observadas. Acompanham as fotos determinadas legendas indicativas de algo relevante para Olga, e o teor predominante das publicações evidencia o esforço de dirigir o leitor a uma atitude de suspeição ou sugerir prudência nas ações.

O projeto de Andressa envolve, além do blog, páginas no Facebook e Instagram onde os posts são compartilhados. As imagens que contem nu, entretanto, são evitadas pela artista ou protegidas com uma camada pixelizada nos detalhes que poderiam causar notificações, por explicitar conteúdo erótico ou infringir as normas da política de dados e privacidade das plataformas.

No Facebook, através do endereço https://www.facebook.com/historiasnemtaoreais/

é possível conferir alguns conteúdos dos três heterônimos. Na seção informativa, a página está classificada como Blog pessoal, indicando conteúdo de artes literárias, artes e entretenimento, além disso, Ella A. possui um perfil no Instagram como @ella.matrioska.

Na seção Loja, do Facebook, constam anúncios de quatro livros que Andressa possui publicados e que podem ser adquiridos on-line, cujos títulos sobre o projeto são: Intimidade Miojo, de Sam Terri, e Matrioska, de Ella A. As edições serão comentadas em capítulo posterior.

1.2. Laís Pontes: Facebook e Instagram

O trabalho proposto por Laís Pontes (1981, Fortaleza/CE) denominado Born Nowhere (2011-2012) que, traduzido para o português quer dizer “Nascido(a) em lugar nenhum”, é um projeto artístico de identidade on-line que utiliza plataformas de mídias sociais como base de interação para a construção de personas virtuais. Através de autorretratos compostos fisicamente com adereços a artista transformou seus traços fisionômicos e construiu novas identidades. Após a produção, as fotografias foram transferidas para o computador e modificadas digitalmente com tratamento e edição disponíveis em programas. A proposta está na página original do projeto no Facebook

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(à esquerda) Ana Cristina Born Nowhere, 2011

Disponível em www.laispontes.com/born-nowhere/characters/Born_Nowhere_Ana_Cristina_web/

(à direita) Neide Born Nowhere, 2011

Disponível em www.laispontes.com/born-nowhere/characters/Born_Nowhere_Neide_web/

Após fazer os retratos, Laís faz a postagem das fotos na página do projeto no Facebook e convida os usuários a comentarem com suas respostas às mais variadas perguntas formuladas por ela. No post de outubro de 2012, são lançadas as indagações: Quem é ela? Qual o nome dela, seu trabalho, sua idade, sua personalidade, seus passatempos? O que ela está pensando? Poste seu comentário e participe da nossa conversa de mídia social! Vamos criá-la em lugar nenhum!

Disponível em

https://www.facebook.com/Project.Born.Nowhere/photos/a.267787206572540.71764.267781766573084/494640 797220512/?type=3&theater

Por meio da estratégia interativa com os usuários, a composição desta série envolve a construção de identidades on-line que são fundamentadas nas publicações dos autorretratos no

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Facebook, junto aos comentários solicitados aos usuários nos posts. As questões instigam os espectadores a pensar quem seria aquela pessoa retratada, qual o seu contexto, local de origem, idade e hábitos. Assim, compilando os comentários de usuárias e usuários como interatores e espectadores, a artista construiu uma biografia para as imagens virtuais. As informações publicadas na mídia social serviram para compor a descrição final de cada uma das imagens. É intrigante observar que as descrições são influenciadas pelo tipo de cabelo, vestuário e expressão facial, o que os psicoanalistas conceituam como projeção; o observador da imagem tende a projetar o próprio ambiente onde está inserido, aliado a suas vivências, desejos, realidades e memórias incorporando seus pensamentos e interpretações como uma espécie de banco de dados.

Neste ponto, Grau (2014) destaca que “os receptores passivos de antigamente que refletiam sobre obras de arte distintas e distantes, mesmo que de maneira ativa intelectualmente, tornaram-se usuários interativos com níveis consideráveis de liberdade” [...] “mais ainda, tornaram-se mediadores ativos e facilitadores de universos de imagens, além de seus produtores, uma vez que reúnem, modificam, distribuem e situam as imagens seletiva e estrategicamente. Novas informações visuais surgem não apenas pelo diálogo em que uma ou mais redes estão envolvidas” (GRAU In BEIGUELMAN & MAGALHÃES, 2014, p.105).

Trecho dos comentários no post de Claudia Born Nowhere Disponível em

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10150350697491774&set=a.463136386773&type=3&theater

Numa perspectiva de leitura, as personas de Laís poderiam ser apreendidas como heterônimos, à semelhança do trabalho de Andressa Ce., pois os padrões de personalidade e

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atributos próprios de cada personagem ficam evidenciados também nessa proposição. A diferença surge no momento em que os perfis ganham ‘vida própria’ e suas ações passam a ter certa limitação, uma vez que estariam condicionados a corresponder às características fixadas na descrição de cada um deles.

O trabalho pode ser visto como uma ação fotográfica performativa on-line onde cria um ambiente flexível de interação entre os seus participantes, possibilitando o desenvolvimento da concepção de trabalho a partir do compartilhamento de experiências interativas sem limitações sociais ou culturais. Convém ressaltar que os termos ‘fotografia performativa’ ou ‘performatividade na fotografia’ são empregados, nesta perspectiva, como similares e têm a intenção de salientar a diferença desse tipo de prática em relação à performance, como é conhecida na linguagem da arte. Na performance, a fotografia inicialmente possui o status de registro da ação, e não a situação ou objeto que atesta essa efemeridade propriamente dita. Por isso mesmo, adquiriu uma linguagem própria até chegar ao estatuto de obra de arte. Ao contrário, na performatividade, existe a ideia de construir a imagem e posar para a câmera a partir de determinadas regras, à semelhança de um jogo com protocolos estabelecidos pelas artistas.

Tela de abertura do perfil do projeto Born Nowhere Disponível em https://www.facebook.com/Project.Born.Nowhere/

Utilizando o mesmo processo, as 26 personas receberam suas identidades permanecendo vinculadas ao projeto Born Nowhere. Através do Facebook surgem Lucia, Courtney, Neide, Stacy, Amber, Sarah, Julia e dezenas de imagens de mulheres inventadas.

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Print do perfil com todas as personas do projeto Disponível em

https://www.facebook.com/pg/Project.Born.Nowhere/photos/?tab=album&album_id=267787206572540

Um exemplo é o post de Claudia, em 6 de setembro de 2011, ao apresentar os caracteres da persona com as respostas compiladas a partir de sugestões dos usuários.

Print do post de Claudia Born Nowhere Disponível em

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10150350697491774&set=a.463136386773&type=3&theater

Sua descrição diz o seguinte: Claudia, 28 anos, casada, ama sua sobrinha de 5 anos. Muito boa pessoa que se dá bem com todos. Nascida em nenhum lugar. Ela está grávida e já escolheu nomes de bebês: Paul, se for menino, e Hope, se for uma menina. Seu pai é francês e sua mãe é brasileira. Ela atualmente trabalha como secretária, mas ela costumava ter uma agência de publicidade bem-sucedida. Adora literatura e filosofia. Ela se voluntaria como professora de inglês em meio período. Sua vida é bem normal. Ela não é feliz. Terapia vai ser o próximo passo.

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Print do post de Karenina Disponível em

https://www.facebook.com/Project.Born.Nowhere/photos/a.267799843237943/427876360563623/?type=3&thea ter

39 anos de idade - ou talvez 34? - ninguém sabe sua idade exata. Ela tem um fabuloso cirurgião plástico. Além de cirurgias plásticas antienvelhecimento casuais, ela teve seu nariz redesenhado, na esperança de dar a ela um visual italiano. Ela vem de uma família indiana, mas nasceu na Inglaterra. Todos os dias ela enfrenta a divisão cultural oriental/ocidental, sente que ela incorpora essa contradição. Ela acabou de se mudar para NYC para se juntar a um escritório de advocacia. Ela é uma advogada muito talentosa e famosa. Ela gosta de fazer seus clientes se apaixonarem por ela apenas por diversão. Ela ama homens mais jovens. Ela é solteira no momento e suas amigas ocasionalmente a colocam em um encontro às cegas. O que ninguém sabe é que ela tem um amor secreto no Brasil. Ele é um político poderoso. De vez em quando ela escreve para uma revista de moda. Dolce e Gabbana a amam tanto quanto Berlusconi. Nascida em nenhum lugar. Ela ama poder e luxo. Ela é ambiciosa, metódica, obstinada, uma ótima profissional que ganha muito dinheiro. Ela segue uma dieta zero-carb e só come saladas. Ela tem uma tatuagem de um cisne na parte inferior das costas. Algumas pessoas juram que a viram em um vídeo do concurso de canto boliviano no YouTube, que foi recentemente removido. Ela secretamente gosta de visitar cabarés, gosta de colecionar vasos chineses e tem uma paixão por artigos sobre histórias de amor alternativas, como a de Casemiro que decidiu ser Tânia depois de ter descoberto que sua esposa o deixou por outra mulher, e Roberto revelado ele mesmo como Leila.

No site de Laís encontram-se todos os retratos e conteúdos descritivos sobre os projetos:

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As personas de Born Nowhere

Fonte http://www.laispontes.com/born-nowhere/bn-grade/

Uma síntese informativa do trabalho também pode ser visualizada na plataforma Vimeo, acessando: https://vimeo.com/115134508 .

Com o caráter de pesquisa em processo, Laís deu continuidade ao fluxo de produção fotográfica e de narrativas em que a participação nas redes sociais tornou-se o elemento principal de ações compartilhadas junto aos usuários. Valendo-se do recurso de imagens e textos, após ter formatado as identidades das personas virtuais a partir dos comentários postados, a artista realizou nas etapas seguintes alguns processos de desdobramento da proposta e suas estratégias, alterando também o tipo de experiência e de relacionamento através das conexões da rede social. O projeto foi iniciado em 2011 e permanece ativo em 2019.

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