Aula 9 – Pontos not´
aveis de um triˆ
angulo
Objetivos
• Apresentar os pontos not´aveis de um triˆangulo.
• Estabelecer alguns resultados envolvendo esses elementos.
Pontos not´
aveis de um triˆ
angulo
Nesta aula veremos alguns segmentos e retas relacionados aos triˆangulos que s˜ao importantes no estudo da Geometria: medianas, bissetrizes, mediatri-zes e alturas relativas aos lados do triˆangulo. Algumas das no¸c˜oes envolvidas j´a s˜ao nossas conhecidas.
Defini¸c˜ao 22
SejaABCum triˆangulo qualquer e sejaDo ponto m´edio deBC. O segmento AD´e chamado medianade ABC relativa ao lado BC. (veja figura 161).
A
B C
D
Fig. 161: AD´e mediana relativa ao ladoBC.
Da mesma forma, seE ´e o ponto m´edio deAC eF ´e o ponto m´edio de AB, os segmentos BE e CF s˜ao as medianas relativas aos lados AC e AB, respectivamente.
Defini¸c˜ao 23
Seja ABC um triˆangulo e D um ponto do lado BC tal que, BADb ≡ CAD.b
O segmentoAD´e chamado bissetriz interna relativa ao ladoBC. Da mesma forma, defini-se bissetriz interna relativa aos outros dois lados. Observe a figura 162.
A
B C
D
Fig. 162: AD´e bissetriz interna relativa ao ladoBC.
Usaremos tamb´em a palavra bissetriz interna para designar a semi-reta
−−→
AD.
Defini¸c˜ao 24
As mediatrizes de AB, de AC e de BC s˜ao chamadas simplesmente de me-diatrizes deABC. Observe a figura 163.
A
B C
D
H
Fig. 163: DH
↔
´e mediatriz.Defini¸c˜ao 25
Dado um triˆanguloABC, trace a retarque passa porAe que ´e perpendicular `a reta ←BC. Seja→ R o ponto em que r e ←BC→ se cortam. O segmento AR ´e chamado de altura relativa ao lado BC.
O ponto R pode pertencer ao interior BC, coincidir com B ou C, ou estar fora do segmento BC, como mostrado na figura 164. Ele ´e tamb´em chamado ”p´e da altura” relativa ao lado BC. Da mesma forma, define-se a altura relativa ao ladoAC e a altura relativa ao lado AB.
Por simplicidade de linguagem, tamb´em chamamos de altura a medida e a reta suporte de uma altura de qualquer triˆangulo.
A
B C
R
A
C
A
B
C R
B R
Fig. 164: Altura relativa ao ladoBC.
Bissetrizes de um triˆangulo
Dado um triˆangulo ABC, considere as bissetrizes internas −AD−→ e −BE.−→ Estas se encontram em um pontoF no interior deABC, como na figura 165.
A
B C
D E
F
Fig. 165: Encontro de duas bissetrizes internas.
Para mostrar que, de fato, as bissetrizes internas s˜ao concorrentes, u-saremos o seguinte resultado:
Proposi¸c˜ao 18
Seja BACb um ˆangulo e seja −AD−→ a bissetriz de BAC. Seb P ∈ −−→
AD, ent˜ao P equidista de ←AB→e de ←AC. Reciprocamente, se→ P est´a no interior de BACˆ e equidista de ←AB→ e de ←AC, ent˜ao→ P ∈
−−→
AD.
Prova:
Suponha que P perten¸ca `a bissetriz −AD−→ de BAC. Trace as perpen-b diculares P X e P Y `as retas ←AB→ e ←AC, respectivamente, como na figura→ 166.
A B
C D
P
X
Y
Fig. 166: Proposi¸c˜ao 18.
Compare os triˆangulosP AY eP AX. Segue deLAAqueP AY ≡P AX
(note que P A ´e comum aos dois triˆangulos). Da´ı, obtemos que P X ≡P Y,
ou seja, que a distˆancia de P `a reta ←AB→ ´e igual `a distˆancia de P `a ←AC.→ Deixaremos como exerc´ıcio desta aula a prova de que, se P equidista de ←AB→ e de ←AC, ent˜ao→ P ∈
−−→
AD.
Q.E.D.
Provaremos, agora, como se utiliza essa proposi¸c˜ao a fim de provar que as bissetrizes internas de um triˆangulo s˜ao concorrentes. Para isso, retorne-mos `a figura 165. Como F pertence `a bissetriz de ABC, pela proposi¸c˜ao 18,b garantimos que F equidista de ←AB→e de ←BC. A mesma proposi¸c˜ao assegura→ queF equidista de←AB→e de←AC→(poisF pertence `a bissetriz deBAC). Logo,b F equidista das retas ←AC→ e ←BC. A segunda parte da proposi¸c˜ao 18 garante→ queF pertence `a bissetriz deACB, ou seja, que a bissetriz deb ACBb tamb´em passa porF.
Provamos, assim, a seguinte proposi¸c˜ao:
Proposi¸c˜ao 19
As bissetrizes internas de um triˆangulo s˜ao concorrentes.
Defini¸c˜ao 26
O ponto de encontro das bissetrizes internas de um triˆangulo ´e chamado de
incentro(veja figura 167).
A
B C
F
Fig. 167: F´e o Incentro deABC.
Neste ponto ´e oportuno vocˆe reler os axiomas e comparar as suas afirma¸c˜oes com a afirma¸c˜ao da proposi¸c˜ao 19. Provavelmente, vocˆe n˜ao questionou nenhuma afirma¸c˜ao de qualquer axioma, simplesmente porque os considerou bastante naturais. Ser´a que vocˆe aceitaria, com a mesma na-turalidade, a afirma¸c˜ao da proposi¸c˜ao 19? Provavelmente n˜ao. ´E por isso que tivemos de prov´a-la. E o impressionante ´e que a prova utilizou apenas os axiomas e os resultados deles decorrentes.
Segue da proposi¸c˜ao 18 que o incentro de um triˆangulo ´e equidistante dos seus lados. Mais precisamente, se P ´e o incentro de um triˆagulo ABC e os segmentos P R, P S e P T s˜ao perpendiculares aos lados AB, AC e BC, respectivamente, ent˜aoP R≡P S ≡P T ( veja figura 168).
A
B C
R S
P
T
Como conseq¨uˆencia, o c´ırculo com centro em P e de raio P R ser´a tangente aos trˆes lados de ABC. Esse c´ırculo ´e chamado de c´ırculo inscrito no triˆanguloABC (veja figura 169).
A
B C
R S
P
T
Fig. 169: C´ırculo inscrito.
Medianas de um triˆangulo
Trataremos, agora, de mostrar que as medianas de um triˆangulo s˜ao tamb´em concorrentes. Para isso, considere um triˆangulo qualquer ABC e trace as medianas AD eBE. Essas medianas encontram-se em um ponto G (figura 170).
A
B C
D E F
G
Fig. 170: Encontro das medianasADeBE.
Mostraremos que a mediana CF tamb´em passa por G. Com esse ob-jetivo, trace o segmento ED e considere os pontos m´edios H, de AG, e I, deBG. Trace os segmentos HE,HI e ID, formando o quadril´ateroHEDI (veja a figura 171).
A
B D C
E F
G
I H
Fig. 171: Encontro das medianasADeBE.
Como E ´e o ponto m´edio de AC e D ´e o ponto m´edio de BC, temos queED´e paralelo aABe que m(ED) = m(AB)
2 . Da mesma forma, comoH
´e o ponto m´edio deAGeI ´e o ponto m´edio deBG, tem-se queHI´e paralelo aAB e que m(HI) = m(AB)
2 . Desses fatos resulta que HI ´e paralelo a ED
e que m(HI) = m(ED).
O quadril´atero HEDI tem ent˜ao um par de lados opostos paralelos e congruentes. Isso implica queHEDI ´e um paralelogramo.
Logo, temos tamb´em HE//ID e HE ≡ID. Segue queHEGb ≡DIG.b
Como os ˆangulosHGEb e DGIb s˜ao congruentes (opostos pelo v´ertice), segue por L.A.A. que HGE≡DGI (veja figura 172).
A
B D C
F
G E H
I
Fig. 172: Encontro das medianasADeBE.
Assim, HG ≡ DG e GE ≡ GI. Mas n˜ao esque¸ca que AH ≡ HG e
BI ≡IG (poisH ´e o ponto m´edio de AG eI ´e o ponto m´edio deBG).
Logo, m(AH) = m(GH) = m(GD) e m(BI) = m(IG) = m(GE). Assim, m(AG) = 2m(GD) e m(BG) = 2m(GE), ou seja, o ponto G de encontro das medianasAD eBE divide cada mediana em dois segmentos de forma que o segmento que cont´em o v´ertice mede o dobro do outro.
Considere, agora, as medianas AD eCF e seja T o ponto de encontro entre elas (figura 173).
A
B D C
F
T
Fig. 173: Encontro das medianasADeCF.
Proposi¸c˜ao 20
As medianas de um triˆangulo s˜ao concorrentes. Al´em disso, o ponto de encontro entre elas divide cada mediana em dois segmentos de modo que o segmento que cont´em o v´ertice mede o dobro do outro.
Defini¸c˜ao 27
O ponto de encontro das medianas de um triˆangulo ´e chamado debaricentro.
(Veja figura 174). A
B D C
E F
G
Fig. 174: G´e o baricentro deABC.
O baricentro de um triˆangulo tem uma propriedade f´ısica interessante: ele ´e o centro de massa do triˆangulo. Uma experiˆencia a ser feita ´e a seguinte: recorte um triˆangulo de papel˜ao e fa¸ca um furo no seu baricentro. Passe um barbante por esse furo e estique-o na posi¸c˜ao horizontal. Se o papel˜ao for sempre da mesma espessura (sem pontos mais pesados que outros), vocˆe poder´a girar o triˆangulo e par´a-lo em qualquer posi¸c˜ao, sem que ele se mexa mais. Parece normal? S´o que se vocˆe furar o triˆangulo fora do baricentro e fizer a mesma coisa, o triˆangulo vai ter uma ”posi¸c˜ao preferida”, uma parte que sempre vai tender a ficar para baixo, por ser mais pesada. O baricentro ´e para o triˆangulo, nesse sentido, como o ponto de encontro das diagonais ´e para o quadrado.
Centro de Massa, Baricentro, Centro de Gravidade e Centr´oide H´a v´arias defini¸c˜oes para Centro de Massa de um corpo. Podemos definir Centro de Massa de um corpo como o ponto do corpo sobre o qual poder´ıamos concentrar toda a massa do corpo ou o ponto do corpo pelo qual podemos pendurar o corpo de modo que fique em equil´ıbrio. Do grego, B´aros (pesado) + k´entron (centro), o baricentro ´e o centro de massa de um corpo. Esse tema, muito importante na F´ısica, tem seu maior conte´udo no trabalho de Ferdinand M¨obius (1287): Der Baricentrische Calcul. No caso do triˆangulo, o Baricentro (e conseq¨uentemente o Centro de Massa) est´a localizado no ponto de encontro das medianas do triˆangulo. Quando um corpo est´a sujeito `a for¸ca da gravidade, o Centro de Massa ´e o ponto em que podemos representar a resultante das for¸cas que atuam sobre todos os pontos do corpo. ´E o ponto onde marcamos a ’for¸ca peso’. Nesse caso o ponto ´e chamado de Centro de Gravidade. No caso do corpo ser homogˆeneo, o centro de massa recebe o nome de Centr´oide.
Mediatrizes e Alturas de um triˆangulo
Nos exerc´ıcios desta aula, faremos juntos a prova da seguinte pro-posi¸c˜ao:
Proposi¸c˜ao 21
As mediatrizes de um triˆangulo s˜ao concorrentes.
Defini¸c˜ao 28
O ponto de encontro das mediatrizes de um triˆangulo ´e chamado de circun-centro.
Faremos tamb´em, nos exerc´ıcios desta aula, a prova da proposi¸c˜ao:
Proposi¸c˜ao 22
As alturas de um triˆangulo s˜ao concorrentes.
Defini¸c˜ao 29
O ponto de encontro das alturas de um triˆangulo ´e chamado deortocentro.
Resumo
Nesta aula vocˆe aprendeu...
• As defini¸c˜oes de mediana, bissetriz interna, mediatriz e altura de um
triˆangulo.
• Que as medianas, as bissetrizes internas, as mediatrizes e as alturas de
um triˆangulo s˜ao concorrentes.
• Que todo triˆangulo possui um c´ırculo inscrito.
Exerc´ıcios
1. (Restante da prova da proposi¸c˜ao 18.) Na proposi¸c˜ao 18 provamos que, se um ponto pertence `a bissetriz de um ˆangulo, ent˜ao ele equidista dos lados desse ˆangulo. O objetivo deste exerc´ıcio ´e provar o inverso: se um ponto pertence ao interior de um ˆangulo e equidista dos lados desse ˆangulo, ent˜ao esse ponto pertence `a bissetriz desse ˆangulo. Para isso, considere um ˆangulo BACb e um ponto P no interior de BACb e equidistante dos lados desse ˆangulo. Trace os segmentos P D e P E perpendiculares respectivamente aos lados −→AC e−→AB (veja figura 175).
B
E
A D
P
C
Fig. 175: Exerc´ıcio 1.
Agora prove que a semi-reta −→AP ´e bissetriz de BAC.b
2. Na figura 176, m(AC) = 30cm e ˆB ´e reto. Determine a medida de P O.
A B
C
Q P
O
3. Na figura 177, ABCD ´e um paralelogramo. Determine x.
A B
C D
P x
16
M
Fig. 177: Exerc´ıcio 3.
4. Na figura 178, ABCD ´e um paralelogramo. Determine x.
A B
C D
P x 8
E
Fig. 178: Exerc´ıcio 4.
5. Na figura 179,ABCD´e um retˆangulo eABM´e um triˆangulo equil´atero. Sem(AB) = 15cm, determine m(AP).
D M C
A
P
B
Fig. 179: Exerc´ıcio 5.
6. Na figura 180, P pertence `a mediatriz de AB. Prove que P equidista deA e B (ou seja, m(P A) =m(P B)).
A B
P
Fig. 180: Exerc´ıcio 6.
7. Este exerc´ıcio ´e o rec´ıproco do exerc´ıcio 6. Se P ´e equidistante dos pontos A e B, prove que P pertence `a mediatriz do segmento AB.
8. (Circuncentro de um triˆangulo.) O objetivo deste exerc´ıcio ´e mos-trar que as mediatrizes de um triˆangulo s˜ao concorrentes, ou seja, pas-sam pelo mesmo ponto. Para isso, considere as mediatrizes r e s dos lados BC e AC, respectivamente, as quais encontram-se em um ponto P (figura 181). Use os exerc´ıcios 6 e 7 para mostrar que P pertence `a mediatriz de AB.
A
B C
P r
s
Fig. 181: Exerc´ıcio 8.
9. (C´ırculo circunscrito.) O objetivo deste exerc´ıcio ´e provar que todo triˆangulo possui um c´ırculo circunscrito. SejaABC um triˆangulo e seja P o circuncentro de ABC (figura 182).
A
B
P
C
Fig. 182: Exerc´ıcio 9.
Prove que P A ≡ P B ≡ P C. Ent˜ao o c´ırculo com centro em P e de
raio P Apassa pelos trˆes pontos de ABC.
Esse c´ırculo ´e chamado de c´ırculo circunscrito ao triˆanguloABC(figura 183).
A
B
P
C
10. (Ortocentro de um triˆangulo.) O objetivo deste exerc´ıcio ´e mostrar que as alturas de um triˆangulo s˜ao concorrentes. Para isso, considere um triˆangulo ABC e, por cada v´ertice, trace a reta paralela ao lado oposto. Essas retas determinam um triˆangulo DEF (figura 184).
A
B C
D E
F
t r
s
Fig. 184: Exerc´ıcio 10.
Prove queA,BeCs˜ao os pontos m´edios deDE,DF eEF, respectiva-mente. Em seguida, mostre que as alturas deABC s˜ao as mediatrizes de DEF. Use o exerc´ıcio 8 para concluir que as alturas de ABC s˜ao concorrentes.
11. Seja O o centro do c´ırculo circunscrito a um triˆangulo ABC. Prove que O pertence ao interior de ABC se e somente se o triˆangulo ABC ´e acutˆangulo.