Grupos de Lie
Luiz A. B. San Martin
15 de Agosto de 2011
Conteúdo
1 Introdução 9
1.1 Exercícios . . . 15
2 Grupos topológicos 17 2.1 Introdução . . . 17
2.2 Vizinhanças do elemento neutro . . . 22
2.3 Grupos Metrizáveis . . . 26
2.4 Subgrupos . . . 27
2.5 Ações de grupos e espaços quocientes . . . 31
2.5.1 Descrição algébrica . . . 31
2.5.2 Ações contínuas . . . 35
2.5.3 Grupos quocientes . . . 41
2.6 Grupos compactos e conexos . . . 42
2.7 Exercícios . . . 47
3 Grupos de Lie e suas álgebras de Lie 51 3.1 De…nição . . . 51
3.2 Álgebra de Lie de um grupo de Lie . . . 56
3.2.1 Campos invariantes . . . 57
3.3 Aplicação exponencial . . . 63
3.4 Homomor…smos . . . 69
3.4.1 Representações . . . 72
3.4.2 Representações adjuntas . . . 73
3.5 Equações diferenciais ordinárias invariantes . . . 78
3.6 Exercícios . . . 80
3.7 Subgrupos de Lie . . . 83
3.8 Introdução . . . 83
3.9 Subálgebras e subgrupos de Lie . . . 86 3
4 CONTEÚDO
3.10 Ideais e subgrupos normais . . . 91
3.11 Limites de produtos de exponenciais . . . 93
3.12 Subgrupos fechados . . . 96
3.13 Subgrupos conexos por caminhos . . . 100
3.14 Exercícios . . . 102 4 Grupos de transformações 107 4.1 Espaços homogêneos . . . 107 4.2 Ações de grupos . . . 112 4.3 Fibrados . . . 122 4.3.1 Fibrados principais . . . 122 4.3.2 Fibrados associados . . . 128
4.4 Espaços homogêneos e …brados . . . 132
4.5 Exercícios . . . 133 5 Homomor…smos e Recobrimentos 141 5.1 Homomor…smos . . . 141 5.1.1 Imersões e submersões . . . 141 5.1.2 Grá…cos e diferenciabilidade . . . 145 5.1.3 Extensões . . . 147 5.2 Recobrimento universal . . . 151
5.3 Existência (terceiro teorema de Lie) . . . 158
5.4 Grupos analíticos . . . 160
5.5 Exercícios . . . 160
6 Grupos de Automor…smos 163 6.1 Automor…smos de grupos de Lie . . . 163
6.2 Grupo A…m . . . 170
6.3 Produto semi-direto . . . 172
6.4 Exercícios . . . 174
6.5 Resultados adicionais . . . 177
7 Expansões em séries 179 7.1 Série de Taylor e álgebra envelopante . . . 179
7.2 Diferencial da aplicação exponencial . . . 185
CONTEÚDO 5
8 Geometria invariante 191
8.1 Tensores invariantes . . . 191
8.1.1 Tensores . . . 191
8.1.2 Tensores invariantes em espaços homogêneos . . . 191
8.1.3 Tensores bi-invariantes em grupos de Lie . . . 192
8.2 Formas-volume e integração . . . 194
8.2.1 Medidas de Haar . . . 194
8.2.2 Apêndice: Medidas de Borel e formas-volume . . . 198
8.2.3 Espaços homogêneos . . . 201
8.3 Métricas Riemannianas . . . 201
8.4 Grupos de Lie complexos . . . 201
8.4.1 Varieades complexas e pseudo-complexas . . . 201
8.4.2 Grupos complexos . . . 203
8.5 Variedades simpléticas e órbitas co-adjuntas . . . 204
8.6 Exercícios . . . 204
9 Grupos nilpotentes e solúveis 209 9.1 Grupos solúveis . . . 209
9.1.1 Álgebras de Lie solúveis . . . 209
9.1.2 Grupos solúveis simplesmente conexos . . . 210
9.2 Grupos nilpotentes simplesmente conexos . . . 211
9.2.1 Álgebras de Lie nilpotentes . . . 212
9.2.2 exp é difeomor…smo . . . 214
9.3 Exercícios . . . 217
9.4 Sobras . . . 219
10 Grupos compactos 223 10.1 Exemplos preliminares . . . 224
10.2 Álgebra de Lie de um grupo compacto . . . 225
10.3 Álgebras semi-simples compactas . . . 228
10.3.1 Componentes simples . . . 228
10.3.2 Construção de Weyl . . . 228
10.3.3 Subálgebras de Cartan e elementos regulares . . . 230
10.4 Grupo fundamental de Aut (g) . . . 234
6 CONTEÚDO A Variedades diferenciáveis 235
A.0.1 Medidas de Borel e formas-volume . . . 235
A.1 Campos de vetores e colchetes de Lie . . . 239
A.2 Exercícios . . . 245
B Integrabilidade de distribuições 247 B.1 Imersões e subvariedades . . . 247
B.2 Distribuições características e teorema de Frobenius . . . 251
B.3 Unicidade e variedades integrais maximais . . . 258
B.4 Cartas adaptadas . . . 261
B.5 Variedades integrais são quase-regulares . . . 263
B.6 Exercícios . . . 265 — Grupos semi-simples e decomposições de Cartan e Iwasawa.— var-iedades ‡ag; grupos de Weyl como normalizadores. Métrica de Borel e cam-pos gradientes. Decomcam-posição de Jordan de g 2 G.
— introdução aos grupos algébricos
— representações (já aparece um começo no cap. homomor…smos); rep-resentações de grupos compactos.
— semigrupos
— espaços simétricos (compactos, não-compactos...) — pontos …xos de automor…smos (grupos de Vinberg).
— Linearização local de ações (grupos compactos (Cartan) e grupos semi-simples).
— ‡ags.
— métricas invariantes e bi-invariantes, suas conexões e geodésicas. — teorema de Palais, representação in…nitesimal e global (local).
— existem apenas três grupos de Lie (dim < 1) (ou melhor álgebras de Lie de campos de vetores) agindo em dim = 1 (R).
Prefácio
Os grupos aos quais esses métodos se aplicam diretamente são os denomina-dos grupos de Lie,
este tipo de coisa vai pra prefácio
— segunda parte: teoria que precisa de álgebra de Lie.
Capítulo 1
Introdução
Este capítulo introdutório tem um carácter informal. Seu objetivo é propiciar ao leitor uma visão geral da teoria, discutindo alguns dos resultados principais através de exemplos, que são ao mesmo tempo concretos e ilustrativos, por isso mesmo são centrais dentro da teoria.
A de…nição formal de um grupo de Lie será feita adiante no capítulo 3. Para todos efeitos, um grupo de Lie consiste num grupo G cujo produto
(g; h)2 G G7 ! gh 2 G
é uma aplicação diferenciável. Um exemplo rico o bastante para cobrir boa parte da teoria e ao qual deve-se recorrer sempre como guia, é o grupo linear geral Gl (n; R). Os elementos deste grupo são as matrizes n n inversíveis com entradas reais, ou, o que é essencialmente a mesma coisa, as transformações lineares inversíveis de um espaço vetorial real de dimensão …nita.
A seguir serão discutidos alguns aspectos do grupo Gl (n; R). A primeira observação é que este conjunto é um aberto do espaço vetorial das matrizes n n, isto é, de Rn2. Ele é formado por duas componentes conexas, deter-minadas pelo sinal do determinante. Uma delas é
Gl+(n; R) = fg 2 Gl (n; R) : det g > 0g;
que é um subgrupo de Gl (n; R). A outra componente conexa é formada pelas matrizes com determinante < 0 e não é um subgrupo.
A estrutura de grupo em Gl (n; R) é dada pelo produto usual de matrizes. Se X = (xij) e Y 2 (yij) são matrizes n n, então Z = XY = (zij) é dado
10 CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO por zij = n X k=1 xikykj;
que é uma aplicação polinômial de grau dois nas variáveis xij; yij. Portanto,
o produto é uma aplicação diferenciável. Por esta razão Gl (n; R) é um grupo de Lie.
A grande força da teoria dos grupos de Lie está baseada na existência das álgebras de Lie associadas aos grupos. As álgebras de Lie possibilitam transportar métodos da álgebra linear ao estudo de objetos não lineares, como são os grupos de Lie. Uma álgebra de Lie é de…nida como sendo um espaço vetorial g munido de um produto (colchete) [ ; ] : g g ! g que satisfaz as seguintes propriedades.
1. Bilinearidade, isto é, [ ; ] é linear em cada uma das variáveis. 2. Anti-simetria, isto é, [A; B] = [B; A], para A; B 2 g.
3. Identidade de Jacobi: para A; B; C 2 g,
[A; [B; C]] = [[A; B]; C] + [B; [A; C]]:
Os elementos da álgebra de Lie de um grupo de Lie são equações diferenci-ais ordinárias (campos de vetores) no grupo, que satisfazem uma propriedade de simetria proveniente da estrutura multiplicativa do grupo (campos de ve-tores invariantes por translações, veja o capítulo 3). Enquanto que os ele-mentos do grupo são obtidos através das soluções dessas equações, como elementos de seus ‡uxos.
Em outras palavras, a álgebra de Lie é um objeto linear que aproxima o grupo: para se obter os elementos da álgebra de Lie deve-se derivar curvas no grupo. O procedimento contrário consiste em resolver equações diferenciais. Por isso, nos primeiros decenios do desenvolvimento da teoria era empregado o termo grupo in…nitesimal , ao invés de álgebra de Lie.
No caso de Gl (n; R), sua álgebra de Lie é o espaço vetorial das matrizes n n, munido do colchete dado pelo comutador de matrizes1
[A; B] = BA AB:
1A ordem inversa que aparece neste comutador deve-se à escolha dos campos invariantes
11 Essa álgebra de Lie será denotada por gl (n; R). Para estabelecer a relação entre a álgebra e o grupo, considere, para cada matriz A 2 gl (n; R), o campo de vetores
g 7! Ag
no espaço da matrizes. Este campo induz a equação diferencial linear dg
dt = Ag: (1.1)
Esta equação é nada mais nada menos que o sistema linear dx
dt = Ax, x 2 Rn, repetido n vezes, uma vez para cada coluna da matriz g. A solução fundamental do sistema linear em Rn é dada por
exp (tA) =X n 0 1 n!(tA) n ;
o que garante que a solução da equação (1.1) com condição inicial g (0) = 1 (onde 1 denota a matriz identidade n n) é g (t) = exp (tA). Esta solução está inteiramente contida em Gl (n; R), pois as exponenciais são matrizes inversíveis. Além do mais, a curva
g : R ! Gl (n; R)
é um homomor…smo quando se considera a estrutura aditiva de grupo em R, já que vale a fórmula exp ((t + s) A) = exp (tA) exp (sA). A imagem desse homomor…smo é o que se denomina de grupo a 1-parâmetro do grupo de Lie. Em suma, existe uma construção natural que associa para cada elemento da álgebra de Lie um subgrupo do grupo de Lie. Essa é a construção básica para o desenvolvimento da teoria, pois é a aplicação exponencial que esta-belece o vinculo entre o colchete na álgebra de Lie e o produto no grupo, determinando (quase que) completamente a estrutura do grupo de Lie a par-tir da álgebra de Lie. Esse vinculo é realizado através fórmulas que envolvem [ ; ], exp e o produto no grupo.
A mais geral delas é a Fórmula de Campbell-Hausdor¤ . Essa fórmula se escreve, para A e B na álgebra de Lie, como
12 CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO onde S (A; B) é uma série (similar a uma série de Taylor), que envolve apenas A e B e seus colchetes sucessivos. Os primeiros termos dessa série são
S (A; B) = A + B + 1 2[A; B] + 1 12[[A; B]; B] 1 12[[A; B]; A] + (1.2) e os demais termos envolvem colchetes com quatro ou mais elementos.
A série S (A; B) converge se A e B su…cientemente pequenos, mostrando que para esses valores de A e B, o produto exp (A) exp (B) é completamente determinado pela álgebra de Lie, isto é, pelos colchetes entre seus elementos. Este tipo de relação entre o colchete e o produto, pode ser propagado (via prolongamento analítico) a todo grupo permitindo mostrar que, a menos de propriedades topológicas globais (como o grupo ser conexo e simplesmente conexo), existe um único grupo de Lie associado a uma álgebra de Lie dada. Apesar da fórmula de Campbell-Hausdor¤ mostrar como obter o grupo de Lie a partir de sua álgebra, sua expressão apenas não indica todas as razões pelas quais existe essa relação estreita entre essas duas estruturas.
A seguir serão discutidas outras fórmulas, cujas deduções permitem en-trever a álgebra de Lie, seus elementos e o colchete entre eles, como objeto in…nitesimal associado ao grupo de Lie.
Considere novamente o grupo Gl (n; R). Por ser um aberto do espaço vetorial das matrizes n n, o espaço tangente a cada um de seus pontos se identi…ca com o espaço vetorial das matrizes n n. Em particular, uma matriz qualquer pode ser vista como um vetor tangente à matriz identidade 1. Agora, sejam A; B 2 gl (n; R). O comutador
(t) = exp (tB) exp (tA) exp ( tB) exp ( tA)
é uma curva em Gl (n; R), que passa pela identidade quando t = 0. Usando reiteradamente a expressão
d
dt (exp (tA)) = A exp (tA) = exp (tA) A; veri…ca-se que 0(0) = 0 e
00(0) = [A; B]:
Isto signi…ca que a expansão de Taylor de é da forma (t) = 1 + t
2
13 cujo termo relevante é [A; B]. Isso apresenta o colchete como o objeto in…ni-tesimal associado ao comutador no grupo. Derivadas deste tipo se estendem a campos de vetores em geral. Foi essa expansão de Taylor que levou ao conceito de colchete de Lie de campos de vetores, como se conhece hoje em dia. Esse conceito foi introduzido por Sophus Lie, o que fez com que toda teoria levasse o seu nome.
Outras fórmulas relevantes envolvem conjugações no grupo e o colchete de Lie na álgebra. Por exemplo, no caso do grupo linear, pode-se escrever
eXY e X =X
k 0
1
k![X; [X; [ ; [X; Y ] ] (1.3) com X aparecendo k vezes em cada somando.
Outros exemplos de grupos de Lie com suas respectivas álgebras de Lie são os seguintes:
1. Se G é um grupo é abeliano então sua álgebra de Lie é abeliana, isto é, o colchete [ ; ] é identicamente nulo ( e vice-versa no caso de grupos conexos, veja a fórmula de Campbell-Hausdor¤). Os grupos de Lie abelianos conexos serão descritos no capítulo 5, seção 5.2.
2. Seja
G = O (n) =fg 2 Gl (n; R) : ggT = gTg = 1g
o grupo das matrizes ortogonais. Sua álgebra de Lie é a subálgebra de matrizes anti-simétricas:
so (n) = fA 2 gl (n; R) : A + AT = 0g:
O colchete em so (n) é o comutador de matrizes. A razão para isso é que A é uma matriz anti-simétrica se, e só se, exp tA é uma matriz ortogonal para todo t 2 R.
3. O grupo Gl (n; C) das matrizes complexas n n inversíveis é um grupo de Lie pela mesma razão que Gl (n; R) o é. A álgebra de Lie Gl (n; C) é a álgebra de Lie gl (n; C) das matrizes complexas n n.
O programa da teoria de Lie consiste em estudar os grupos de Lie através de suas álgebras de Lie. Isso signi…ca deve-se classi…car e descrever as pro-priedades estruturais dos grupos de Lie reduzindo-os às propro-priedades corres-pondentes das álgebras de Lie.
14 CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO No caso da classi…cação dos grupos de Lie a redução é feita da seguinte forma: se G1 e G2 são grupos de Lie com mesma álgebra de Lie (isto é,
com álgebras de Lie isomorfas) então os grupos são localmente isomorfos. Isso signi…ca que existe um difeomor…smo entre vizinhanças dos elementos neutros de G1 e G2, respectivamente, que respeita o produto nos grupos
(compare com a fórmula de Campbell-Hausdor¤ (1.2) e veja o capítulo 5, para mais detalhes). Esse isomor…smo pode não ser global. A globalização do isomor…smo depende de propriedades dos espaços topológicos subjacentes aos grupos (na verdade de seus grupos fundamentais, apenas). O que se pode provar é que se G1 e G2 (ou melhor, os espaços topológicos subjacentes) são
conexos e simplesmente conexos então eles são isomorfos se suas álgebras de Lie são isomorfas.
De forma complementar, seg é uma álgebra de Lie (sobre o corpo R e de dimensão …nita) então existe um grupo de Lie G simplesmente conexo cuja álgebra de Lie é isomorfa a g. Dessa forma, a classi…cação das álgebras de Lie fornece a classi…cação dos grupos de Lie conexos e simplesmente conexos: dada uma álgebra de Lie existe um, e apenas um (a menos de isomor…smo), grupo de Lie conexo e simplesmente conexo com a álgebra de Lie dada.
Os demais grupos de Lie conexos (não necessariamente simplesmente conexos) são da forma G = eG=D com eG simplesmente conexo e D um sub-grupo discreto contido no centro de eG. Nesse caso D coincide (ou melhor é isomorfo) com o grupo fundamental de G, o que signi…ca que a álgebra de Lie e o grupo fundamental determinam completamente um grupo de Lie conexo. Um situação típica do que foi descrito acima é o caso dos grupos abelianos R (grupo aditivo da reta real) e S1 (grupo dos números complexos z com jzj = 1, ou seja, o grupo quociente R=Z dos números reais com a soma módulo 1). Esses grupos têm a mesma álgebra de Lie, são localmente isomorfos, mas obviamente não são globalmente isomorfos. Aliás, a menos de isomor…smo, R e S1 são os únicos grupos de Lie conexos de dimensão 1. A razão disso
é que quaisquer duas álgebras de Lie de dimensão 1 são isomorfas, pois elas são abelianas (isto é, [ ; ] 0). Além do mais, R é simplesmente conexo e pode-se mostrar que um subgrupo discreto D R é isomorfo a Z o que acarreta que R=D R=Z.
Em geral a classi…cação dos grupos de Lie conexos consta de três passos: 1) a classi…cação das álgebras de Lie reais; 2) determinar, para cada álgebra de Lie real g (ou melhor, para sua classe de isomor…smo de álgebras de Lie), um grupo de Lie simplesmente conexo eG cuja álgebra de Lie seja g; 3)
1.1. EXERCÍCIOS 15 encontrar o centro Z Ge de eGe os subgrupos discretos D Z Ge .
Deve-se observar que essa classi…cação funciona bem para grupos conexos, uma vez que são esses os grupos que podem ser acessados pelas álgebras de Lie, através de soluções de equações diferenciais.
Outros resultados que ilustram o poder das álgebras de Lie no estudo dos grupos de Lie são os seguintes:
1. Se G é um grupo de Lie com álgebra de Lieg então os subgrupos de G são descritos pelas subálgebras de Lie deg. Aqui não deve-se considerar todos os subgrupos, mas apenas a classe dos chamados subgrupos de Lie e, novamente, a relação funciona bem para os subgrupos conexos. Alguns exemplos desses subgrupos foram apresentados acima.
2. Os homomor…smos entre grupos de Lie são obtidos através dos homo-mor…smos entre as respectivas álgebras Lie. Esses últimos são apli-cações lineares, ao contrário dos primeiros.
Decomposição de Levi
Grupos Simples Clássicos, complexos e reais. complexi…cações???? Compactos O (n), SO (n), U (n), SU (n), Sp (n), Não compactos Sl (n; R), Sl (n; C), Sl (n; H) = SU (2n), Sp (n; R), Sp (n; C), O (p; q), SO (p; q), U (p; q), SU (p; q)
1.1
Exercícios
1. Demonstre a fórmula de Campbell-Hausdor¤ (1.2) e a fórmula 1.3 para o grupo linear Gl (n; R). (Sugestão: tome exponenciais do tipo exp tA, exp tB e coloque em evidência os termos tk.)
2. Seja A uma matriz n n. Se exp A =Pk 0 1 k!A
k mostre que A é
anti-simétrica (A + AT = 0) se, e só se, exp tA é uma matriz ortogonal para
16 CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 3. Seja Sl (n; R) = fg 2 Gl (n; R) : det g = 1g o grupo das matrizes unimodulares. Assuma que Sl (n; R) é um subgrupo de Lie e veri…que, usando exponenciais, que sua álgebra de Lie é
sl (n; R) = fA 2 Mn n(R) : trA = 0g:
4. Seja SU (2) o grupo das matrizes unitárias 2 2, isto é, SU (2) =fg 2 M2 2(C) : gTg = ggT = id; det g = 1g:
Assuma que SU (2) é um subgrupo de Lie de matrizes inversíveis e veri…que, usando exponenciais, que sua álgebra de Lie é o espaço das matrizes anti-hermitianas
su (2) = fA 2 M2 2(C) : A + A T
= 0; trA = 0g:
Veri…que que su (2) é uma álgebra de Lie real com dim su (2) = 3 (onde o colchete de Lie é dado pelo comutador de matrizes). Veri…que também quesu (2) é isomorfa às seguintes álgebras de Lie: 1) so (3) = fA 2 M3 3(R) : A + AT = 0g (com o comutador); 2) R3 munido do
produto vetorial ^.
5. Seja H = fa + bi + cj + dk : a; b; c; d 2 Rg a álgebra do quatérnions. Escreva = a + ib + jc + kd como = (a + ib) + j (c id), isto é, = z + jw com z; w 2 C. A multiplicação à esquerda por pode ser vista como uma aplicação linear de C2. Calcule a matriz dessa
aplicação na base f1; jg e mostre que a aplicação : a + bi + cj + dk = z + jw 7 ! z w
w z 2 M2 2(C) é um homomor…smo injetor. Mostre também que a restrição de à esfera f 2 H : j j = 1g é uma bijeção sobre SU (2) e conclua que SU (2) é conexo e simplesmente conexo. Determine o centro de SU (2) e todos os grupos de Lie conexos com álgebra de Liesu (2) so (3) (R3;
Capítulo 2
Grupos topológicos
Diversas propriedades dos grupos de Lie dependem apenas de sua topolo-gia e não da estrutura de variedade diferenciável. Essas propriedades valem para grupos topológicos gerais, conforme serão estudados neste capítulo. O objetivo aqui não é proporcionar um estudo exaustivo da teoria dos gru-pos topológicos, mas apenas estabelecer uma linguagem e demonstrar alguns resultados úteis para os grupos de Lie.
O elemento neutro de um grupo G será denotado por 1. Se A X é um subconjunto de um espaço topológico se denota por A , A e @A o interior, fecho e fronteira de A, respectivamente.
2.1
Introdução
Um grupo topológico é um grupo cujo conjunto subjacente está munido de uma topologia compatível com o produto no grupo, no sentido em que
1. o produto p : G G ! G, p (g; h) = gh, é uma aplicação contínua, quando se considera G Gcom a topologia produto e
2. a aplicação : G! G, (g) = g 1, é contínua (e, portanto, um home-omor…smo, já que 1 = ).
Essas duas propriedades podem ser condensadas tomando a aplicação q : G G ! G, de…nida por q (g; h) ! gh 1. De fato, q é contínua se p e
são contínuas e, reciprocamente, se q é contínua então g ! (1; g) ! g 1 é
contínua e, portanto, p (g; h) = q (g; h 1)é contínua. 17
18 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS Cada elemento g de um grupo G de…ne, naturalmente, as seguintes apli-cações:
translação à esquerda Eg : G! G, Eg(h) = gh,
translação à direita Dg : G! G, Dg(h) = hg e
conjugação (ou automor…smo interno) Cg : G! G, Cg(h) = ghg 1.
Segue das de…nições que Eg Eg 1 = Dg Dg 1 = id. Além do mais,
Cg = Eg Dg 1 portanto todas essas aplicações são bijeções de G. No caso
de grupos topológicos essas aplicações são contínuas pois Eg = p sg;1 e
Dg = p sg;2 onde sg;1(h) = (g; h)e sg;2(h) = (h; g) são aplicações contínuas
G ! G G. A continuidade das translações e as fórmulas (Eg) 1
= Eg 1,
(Dg) 1 = Dg 1 e (Cg) 1 = Cg 1, mostram que essas aplicações são, na
ver-dade, homeomor…smos de G. As fórmulas a seguir relacionam as translações com a inversa .
Dg Eh = Eh Dg.
Eg = Dg 1.
Dg = Eg 1.
Deve-se observar que a continuidade das translações e das conjugações dependem de uma propriedade mais fraca que a continuidade de p, já que, por exemplo Eg é contínua se, e só se, a “aplicação parcial” h 7! gh é
contínua. Em geral aplicações de…nidas em espaços produtos podem ser contínuas em cada variável sem que seja contínua. Esse fenômeno leva à de…nição de grupo semi-topológico, que é um grupo em que o produto é parcialmente contínuo, isto é, todas as translações são contínuas. Exemplos de grupos semi-topológicos e não topológicos serão apresentados abaixo. Exemplos:
1. Subgrupos de Gl (n; R): Gl (n; C), O (n) Sl (n; R), Sl (n; C), Gl (n; H). 2. (Rn; +).
3. Qualquer grupo em que o conjunto subjacente é munido da topologia caótica (em que todos os conjuntos são abertos).
2.1. INTRODUÇÃO 19 4. Num corpo ordenado (K; +; ; ) pode-se de…nir a topologia da ordem, que é gerada pelos intervalos abertos. Em relação a essa topologia a operação + de…ne um grupo topológico, enquanto que o produto de…ne um grupo topológico em K = K n f0g.
5. O círculo S1 tem uma estrutura de grupo natural que é dada pelo
produto de números complexos de módulo 1: S1 = fz 2 C : jzj = 1g. Com a topologia canônica S1 é um grupo topológico. De forma
alternativa, o produto em S1
é dado pelo quociente S1
= R=Z, em que o produto é dado pela soma módulo 1 de números reais.
6. Exemplos mais gerais que o anterior são dados pelos cilindros Tk Rm = Rm+k
=Zk
= Rk
=Zk
Rm, com topologias canônicas. (Veja abaixo
produtos e quocientes de grupos topológicos.)
7. Seja (C n f0g; ) munido da topologia gerada pela base de abertos, que é formada pelos intervalos abertos das retas verticais ra = fa + ix 2
C : x 2 Rg. Esse grupo não é topológico em relação a essa topologia. De fato, a translação à esquerda Eei é uma rotação de ângulo 2 R.
A imagem do aberto ra = fa + ix 2 C : x 2 Rg não é aberto se, por
exemplo, = =2.
8. Sejam G um grupo topológico e X um espaço topológico. Denote por A (X; G) o conjunto das aplicações contínuas f : X ! G. Este con-junto tem uma estrutura de grupo com o produto (f g) (x) = f (x) g (x). Introduza em A (X; G) a topologia compacto-aberto, que tem como base de abertos os conjuntos do tipo
AK;U =ff 2 A (X; G) : f (K) Ug
onde K X é compacto e U G é aberto. Com essas estruturas A (X; G) é um grupo topológico. De fato, o produto em A (X; G) A (X; G) é homeomorfo a A (X; G G) por (f; g) 7! h onde h (x) = (f (x) ; g (x)), com a topologia compacto-aberta em A (X; G G). Seja qA(f; g) = f g 1. Através da identi…cação entre esses espaços, qA1(AK;U)
é o conjunto das funções h : X ! G G tais que h (K) q 1(U ). Isto
é,
qA1(AK;U) = AK;q 1(U )
onde a vizinhança do segundo membro é vista em A (X; G G). Por-tanto, o grupo é topológico.
20 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS 9. Como caso particular do exemplo anterior, seja fGigi2I uma família de
grupos indexada pelo conjunto I. O produto cartesiano G = Qi2IGi
é o conjunto formado pelas aplicações f : I !Si2IGi tais que f (i) 2
Gi para todo i 2 I. O produto cartesiano admite uma estrutura de
grupo em que o produto é dado componente a componente: (f g) (i) = f (i) g (i). A topologia produto em Qi2IGi é gerada por abertos do
tipo Qi2IAi com Ai Gi abertos, i 2 I e Ai = Gi a menos de um
número …nito de índices (topologia compacto-aberta em que I tem a topologia discreta). Como o produto é feito componente a componente e cada Gi é um grupo topológico, G é grupo topológico com a topologia
produto.
Em particular, se I é um conjunto …nito,Qi2IGi = G1 Gn, seus
elementos são n-uplas g = (g1; : : : ; gn), gi 2 Gi, a multiplicação é dada
por
gh = (g1h1; : : : ; gnhn)
com a topologia produto, gerada por subconjuntos do tipo A1 An
com Ai Gi aberto.
10. Este exemplo ilustra um grupo com uma topologia em que o produto é uma aplicação contínua, mas (g) = g 1 não é contínua. Considere o
grupo aditivo (R; +) com R munido da topologia (topologia de Sorgen-frey) gerada pela base dada pelos intervalos [a; b), a < b. O produto é uma aplicação contínua pois se x + y 2 [a; b) então para algum " > 0, x + y + " < b, o que garante que [a; b) contém [x; x + "=2) + [y; y + "=2) (= fz + w : z 2 [x; x + "=2) e w 2 [x; x + "=2)g). Isso signi…ca que o aberto [x; x + "=2) [y; y + "=2) está contido em p 1[a; b), mostrando
que p é contínua. Por outro lado, (x) = x não é contínua pois, por exemplo, ( 2; 1] = 1[1; 2) não é aberto.
11. Este exemplo ilustra o caso de um grupo G em que a inversa (g) = g 1
é contínua e p é parcialmente contínua (isto é, G é semi-topológico), mas não contínua. Tome o grupo aditivo (R2; +) com R2 munido da topolo-gia gerada pelas bolas siamesas, que são de…nidas da seguinte forma: tome duas bolas de mesmo raio com centros numa mesma reta vertical e que se tangenciam. A bola siamesa correspondente é a união do in-terior das bolas juntamente com o ponto de tangência. O conjunto das bolas siamesas forma uma base para topologia. Munido dessa topologia a inversa em R2 é contínua (por simetria em relação à origem), assim
2.1. INTRODUÇÃO 21 como as translações. No entanto, o produto p = + não é contínuo. De fato, (1; 0) + ( 1; 0) = (0; 0). Tome uma bola siamesa B com tangên-cia em (0; 0) e sejam B1 e B2 bolas siamesas com pontos de tangência
em (1; 0) e ( 1; 0), respectivamente. Então, B1 + B2 não está
con-tida B, como pode ser veri…cado geometricamente. Isso signi…ca que B1 B2 não está contido em p 1(B). Como B, B1 e B2 são elementos
arbitrários da base para a topologia, segue que p não é contínua em ((1; 0) ; ( 1; 0)).
2 Se A é um subconjunto de G e g 2 G a translação Eg(A) é denotada
simplesmente por gA = fgx : x 2 Ag. O fato de que as translações são homeomor…smos implica que gA é aberto ou fechado se A é aberto ou fechado, respectivamente. A mesma observação vale para as translações à direita Ag. De forma mais geral, seja B G e escreva
A B = AB =fxy 2 G : x 2 A; y 2 Bg:
Por de…nição AB = Sx2BAx =Sx2AxB. Dessa forma, se A (ou B) é aberto, então AB é aberto por ser união de abertos. Deve-se observar, no entanto, que AB pode não ser fechado, mesmo que ambos os conjuntos sejam fechados (por exemplo, em (R2; +)
tome os ramos de hipérboles: A = f x;1
x : x > 0g, B = f x;1
x : x > 0g. A soma A + B está contida no semi-plano y > 0 e, no entanto, (0; 0) está no fecho de A + B).
Juntamente com a notação AB, surgem naturalmente as notações A2 =
A A, A3 = A2 A = A A2, etc.
Para A G é usada a notação A 1 = fx 1 2 G : x 2 Ag. Como (g) = g 1 é um homeomor…smo, A 1 = (A) é aberto ou fechado se, e só
se, A é aberto ou fechado, respectivamente.
Uma vizinhança U da identidade é dita simétrica se U = U 1. Não é difícil construir vizinhanças simétricas. De fato, se V é uma vizinhança qual-quer de 1 então V 1
também é uma vizinhança e V \ V 1 é uma vizinhança
22 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS
2.2
Vizinhanças do elemento neutro
Seja U G um aberto não vazio e tome g 2 U. Então, g 1U e U g 1
são vizinhanças do elemento neutro de G. Reciprocamente, se V é uma vizinhança de 1 então, dado g 2 G, gV e V g são vizinhanças de g. Essas observações têm como consequência que toda informação sobre a topologia de Gestá concentrada no conjunto das vizinhanças abertas do elemento neutro. O conjunto dessas vizinhanças é denotado por V (1) ou simplesmente V. A proposição a seguir lista algumas propriedades de V, que serão usadas posteriormente para descrever a topologia de G.
Proposição 2.1 Seja G um grupo topológico e denote por V o conjunto das vizinhanças abertas do elemento neutro 1. Então, valem as seguintes pro-priedades:
T1) O elemento neutro 1 pertence a todos os subconjuntos U 2 V. T2) Dados dois conjuntos U; V em V, U \ V está em V.
GT1) Para todo U 2 V, existe V 2 V tal que V2 U
GT2) Dado U 2 V, U 1
2 V.
GT3) Para todo g 2 G e U 2 V, gUg 1 2 V.
Demonstração: As propriedades (T1) e (T2) valem para as vizinhanças de um ponto num espaço topológico qualquer. A propriedade (GT1) é equivalente ao produto ser contínuo em 1. De fato, p 1(U ) G G
é um aberto contendo (1; 1). Portanto existe um aberto V de G, com (1; 1) 2 V V p 1(U ). Isso signi…ca que V2 = p (V V ) U. Já a
propriedade (GT2) foi comentada acima e é equivalente à continuidade em 1da aplicação . Por …m (GT3) segue de que g1g 1 = 1e C
g(x) = gxg 1 é
contínua. 2
As propriedades enunciadas nesta proposição caracterizam completamente o conjunto das vizinhanças da identidade.
De…nição 2.2 Um sistema de vizinhanças da identidade (ou elemento neu-tro) em um grupo G é uma família de conjuntos V satisfazendo as pro-priedades da proposição anterior.
2.2. VIZINHANÇAS DO ELEMENTO NEUTRO 23 Será mostrado abaixo que um sistema de vizinhanças da identidade de…ne de forma única a topologia de um grupo topológico. Para isso será necessário um lema que garante a continuidade de aplicações a partir da continuidade em um único ponto. Resultados análogos a esse lema são utilizados constan-temente na teoria.
Uma topologia T num grupo G é dita invariante à esquerda se gA é aberto de T para todo g 2 G e A 2 T . Uma topologia é invariante à esquerda se, e só se, as translações à esquerda são contínuas (e, portanto, homeomor…smos). Da mesma forma se de…nem as topologias invariantes à direita.
Se T é uma topologia invariante à esquerda em G então a topologia produto em G Gé invariante à esquerda pois (g; h) (A B) = (gA) (hB) se A; B G e (g; h) 2 G G. Da mesma forma, a topologia produto é invariante à direita em G G se for invariante à direita em G.
Lema 2.3 Seja G é munido de uma topologia T invariante à esquerda e à direita. Então, G é um grupo topológico se, e somente se,
1. p é contínua em (1; 1) e
2. : G! G, (g) = g 1, é contínua em 1.
Demonstração: É claro que as condições são necessárias. A demonstração da su…ciência requer as seguintes igualdades, cujas demonstrações são ime-diatas.
1. Dado (g; h) 2 G G sejam E(g;h) e D(g;h) a translação à esquerda
e à direita em G G, respectivamente. Então p E(g;1) = Eg p e
p D(1;g) = Dg p.
2. Dado g 2 G, Eg = Dg 1 .
Agora, tome (g; h) 2 G G. Então p E(g;1) D(1;h) = Eg Dh p. O
segundo membro dessa igualdade é uma aplicação contínua em (1; 1) pois Eg Dh é homeomor…smo. Portanto, p E(g;1) D(1;h) é contínua em (1; 1).
Mas E(g;1) D(1;h) é um homeomor…smo, daí que p é contínua em (g; h) =
E(g;1) D(1;h)(1; 1).
Por outro lado, Dg 1 é contínua em 1, portanto, Eg é contínua em
24 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS Para caracterizar a topologia de G a partir dos sistemas de vizinhanças da identidade deve-se lembrar que um sistema fundamental de vizinhanças de um ponto x num espaço topológico X é uma família F de abertos de X tal que cada elemento de F contém x e se A X é um aberto com x 2 A então existe B 2 F tal que B A.
Proposição 2.4 Seja G um grupo e suponha que V é um sistema de vizin-hanças da identidade em G. Então, existe uma única topologia T que torna G um grupo topológico de tal forma que V é um sistema fundamental de vizinhanças do elemento neutro em relação a T .
Demonstração: De…na T como sendo a família dos subconjuntos A G tais que para todo g 2 A, existe U 2 V tal que gU A. É claro que os conjuntos ; e G são elementos de T . Para ver que T é uma topologia tome A; B 2 T e x 2 A \ B. Então, existem U; V 2 V tais que xU Ae xV B. Pela propriedade (T2), U \ V 2 V. Mas,
x (U \ V ) = xU \ xV A\ B;
mostrando que A \ B 2 T . A de…nição de T mostra que uma união qualquer de conjuntos em T é um elemento de T .
Agora as vizinhanças abertas de 1 em relação a T são os elementos de V. De fato, a própria de…nição de T mostra que os elementos de V são vizinhanças de 1. Por outro lado, seja U uma vizinhança de 1 em relação a T . Então, existe V 2 V tal que 1 V U. Portanto, V é um sistema fundamental de vizinhanças de 1 em relação a T .
A de…nição de T e a propriedade (GT3) garantem que T é invariante à direita e à esquerda. De fato, uma translação à esquerda gU , u 2 V, é também uma translação à direita da forma gU = (gU g 1) g. Por (GT3) se
U 2 V então gUg 1 2 V. Portanto, pelo lema anterior para garantir que G munido de T é grupo topológico, basta veri…car que p e são contínuas em (1; 1) e 1, respectivamente. Mas essas continuidades são equivalentes às propriedades (GT1) e (GT2), respectivamente, concluindo a demonstração de que G é grupo topológico com a topologia T .
Por …m, suponha que T0 é outra topologia satisfazendo as mesmas
con-dições. Então, V é um sistema fundamental de vizinhanças de 1 em relação a T0. Realizando translações à esquerda, vê-se que gV , com V variando em
V é um sistema fundamental de vizinhanças de g 2 G. Portanto, para todo A 2 T0 e g 2 A, existe V 2 V tal que gV A. Daí que todo aberto de
2.2. VIZINHANÇAS DO ELEMENTO NEUTRO 25 T0 é aberto de T , isto é, T0 T . Alterando o papéis de T e T0, segue que
T = T0, concluindo a demonstração. 2
Exemplo: Uma situação ilustrativa da construção feita acima é quando os elementos de V são subgrupos de G. Nesse caso, as condições para V se re-duzem a (T2) e (GT3) pois se V é um subgrupo então 1 2 V e V2 = V 1 = V.
Um exemplo de um sistema V desse tipo é construido no grupo Z. Dado um número primo p > 0 seja Vp a família de subgrupos Vn = pnZ, n 1. Como
Z é abeliano, a condição (GT3) é automaticamente satisfeita. Já a condição (T2) vale pois pn
Z \ pm
Z = pmaxfn;mgZ. Portanto, V de…ne uma topologia
em Z tornando-o um grupo topológico. Essa é a chamada topologia p-ádica
em Z. 2
A descrição feita da topologia em termos das vizinhanças da identidade estabelece o princípio de que toda descrição topológica em G de ver feita através dessas vizinhanças. A proposição abaixo segue esse principio ao dar um critério para que a topologia seja de Hausdor¤ em termos das vizinhanças da identidade.
Proposição 2.5 Seja G um grupo topológico. Então, as seguintes condições são equivalentes:
1. A topologia de G é Hausdor¤. 2. f1g é um conjunto fechado. 3. TU 2V(1)U = f1g.
Demonstração: Numa topologia Hausdor¤ todo conjunto unitário é fe-chado, em particular f1g é fechado. Suponha que f1g seja fechado. Para mostrar que a interseção das vizinhanças se reduz ao elemento neutro deve-se mostrar que para todo x 6= 1, existe U 2 V tal que x =2 U. Como f1g é fechado, existe tal V 2 V tal que 1 =2 x 1V, isto é, x =
2 V . Por …m, assuma que a interseção se reduz a f1g e tome x 6= 1. Então existe U 2 V tal que x =2 U. Por (GT1) existe V 2 V tal que V2 U. Então, V \ xV 1 = ;, pois z 2 V \ xV 1 deve satisfazer z = u = xv 1
, u; v 2 V , e daí que x = uv 2 V2 U, contradizendo a escolha de U . Consequentemente, os
26 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS existem abertos U1 e U2 com y 1z 2 U1 e 1 2 U2 e U1\ U2 =;. Portanto, os
abertos yU1 e yU2 separam z de y. 2
Seguindo ainda o princípio de que a topologia de G é descrita pelas viz-inhanças da identidade e as translações, a proposição a seguir diz respeito à continuidade de homomor…smos.
Proposição 2.6 Sejam G1 e G2 grupos topológicos e : G1 ! G2 um
homo-mor…smo. Então, é contínuo se, e somente se, for contínuo no elemento neutro 1 2 G1.
Demonstração: Basta mostrar que a continuidade em 1 acarreta a con-tinuidade em todos os pontos. Como é homomor…smo, Eg = E (g)
para todo g 2 G. O segundo membro é contínuo em 1. Portanto, Eg
é contínuo em 1 e como Eg é homeomor…smo, segue que é contínuo em
g = Eg(1). 2
2.3
Grupos Metrizáveis
Uma distância d : G G! R+ num grupo G é dita invariante à esquerda se
d (gx; gy) = d (x; y)para todo g; x; y 2 G. Em outras palavras, d é invariante à esquerda caso as translações à esquerda Eg são isometrias. As distâncias
invariantes à direita são de…nidas de maneira análoga. Uma distância é bi-invariante se ela é ao mesmo tempo bi-invariante à esquerda e à direita.
Uma condição necessária para que um espaço topológico seja metrizável é que todo ponto admita um sistema fundamental de vizinhanças enumerável. No caso de grupos topológicos essa condição também é su…ciente e, como antes, basta veri…cá-la no elemento neutro.
Teorema 2.7 Seja G um grupo topológico e suponha que exista um sistema de vizinhanças da identidade que seja enumerável. Então, existem dE e dD
distâncias invariantes à direita e à esquerda, respectivamente, que são com-patíveis com a topologia de G.
Este teorema não será demonstrado aqui. No caso em que G é um grupo de Lie a condição de enumerabilidade é satisfeita pois localmente G é home-omorfo a Rn. Portanto, grupos de Lie são metrizáveis. No entanto, para
2.4. SUBGRUPOS 27 grupos de Lie, em particular, existe uma construção mais simples que a da demonstração geral do teorema 2.7, utilizando métricas Riemannianas em variedades diferenciáveis. Essa demonstração será apresentada posterior-mente.
Em todo caso, vale a pena ressaltar que o teorema garante a existên-cia tanto de uma distânexistên-cia invariante à direita quanto de uma invariante à esquerda. Porém, pode não existir uma distância bi-invariante num grupo metrizável.
Exemplos: Alguns exemplos de distâncias invariantes são: 1. Seja j j uma norma qualquer em Rn
e d (x; y) = jx yj. Então d é uma distância bi-invariante em (Rn; +).
Observe que uma distância de…nida por uma norma no espaço de ma-trizes n n não é necessariamente invariante quando restrita ao grupo Gl (n; R).
2. Seja G um grupo compacto metrizável por uma distância d0. De…na d (g; h) = sup
x2G
d0(gx; gy) :
Então d é uma distância invariante à esquerda em G, compatível com sua topologia. A distância d pode ser vista também da seguinte maneira: denote por Hom (G) o grupo dos homeomor…smos de G e seja : G! Hom (G) a aplicação (g) = Eg. Então d é a restrição a (G) da
dis-tância em Hom (G) que de…ne a convergência uniforme em relação a d0.
2
2.4
Subgrupos
Seja G um grupo topológico e H um subgrupo de G. Como H é subconjunto de G ele pode ser munido com a topologia induzida, cujos abertos são da forma A \ H com A aberto em G. Então, H torna-se um grupo topológico. De fato, denote por pH : H H ! H o produto em H, que é a restrição a
28 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS p 1(A)
\(H H). Em particular, se A é aberto, pH1(A\ H) é um aberto da topologia induzida em H H pela topologia produto em G G. No entanto, essa topologia induzida coincide com a topologia produto de H. Daí que pH
é contínua. Da mesma forma se mostra que H(h) = h 1 é contínua em H.
Um subgrupo H Gcom a topologia induzida é denominado de subgrupo topológico de G.
A seguir serão apresentados alguns resultados envolvendo propriedades topológicas dos subgrupos de G. Em algumas demonstrações se usa o seguinte lema de caráter geral. A
Lema 2.8 Seja X um espaço topológico e : X ! X um homeomor…smo. Suponha que A X é um subconjunto invariante por , isto é, (A) A. Então A, A e @A também são invariantes. Além do mais, se (A) A então A A.
Demonstração: Tome x 2 A e U uma vizinhança de (x). Então 1(U )é uma vizinhança de x. Portanto, existe y 2 A\ 1(U )e como A é invariante, e (y)2 A \ U, mostrando que A é invariante.
Seja x 2 A e tome um aberto U com x 2 U A. Então (x)2 (U) A, pois A é invariante. Como é homeomor…smo, (U )é aberto, e, portanto
(x)2 A .
Como A é invariante, o seu complementar em X também é invariante. Daí que a @A = A\ Ac é invariante.
Suponha que (A) A. Como é homeomor…smo, (A) = A .
Por-tanto, A A = A. 2
Proposição 2.9 Seja H G um subgrupo. Então seu fecho H também é subgrupo. Além do mais, se H é normal o mesmo ocorre com H.
Demonstração: Deve-se mostrar que xy 2 H se x; y 2 H. Para isso suponha em primeiro lugar que x 2 H. Então, Ex deixa H invariante e
o lema acima garante que Ex H H. Mas, isso signi…ca que se y 2 H
então xy 2 H. Portanto, dados x 2 H e y 2 H, xy 2 H. Esta frase pode ser interpretada dizendo que Dy(H) H para todo y 2 H. Mas, Dy é
homeomor…smo, portanto Dy H H, para todo y 2 H, o que signi…ca que
2.4. SUBGRUPOS 29 Por um argumento semelhante, a inversa deixa invariante H, mostrando que H é subgrupo.
Por …m, dizer que H é normal é o mesmo que dizer que H é invariante pelas conjugações Cg, g 2 G. Pelo lema 2.8 segue que H também é invariante
por Cg, isto é, H é normal. 2
Os subgrupos fechados desempenham um papel central no estudo das ações dos grupos topológicos (e de Lie), pois no caso de ações contínuas, os subgrupos que …xam um ponto (subgrupos de isotropia) são fechados. A proposição 2.9 mostra a existência de uma grande quantidade de subgrupos fechados. Por outro lado, a situação com o interior H de um subgrupo H é ainda mais simples, já que ou o interior é vazio ou é o próprio H, isto é, H é aberto e nesse caso fechado, como mostram as proposições a seguir.
Proposição 2.10 Seja H G um subgrupo e suponha que H 6= ;. Então, H é aberto.
Demonstração: Suponha que exista x 2 H . Então para todo y 2 H, o conjunto yx 1(H ) é aberto, contém y e está contido em H. Isso mostra
que y 2 H e, portanto, H H , isto é, H = H . 2
Proposição 2.11 Suponha que H é um subgrupo aberto de G. Então, H é fechado.
Demonstração: Uma classe lateral gH de H é obtida de H por uma translação à esquerda. Portanto, se H é aberto, o mesmo ocorre com gH. Mas o grupo G é a união de H com as classes laterais gH, g =2 H. Isso signi…ca que o complementar de H em G é uma união de abertos, e daí que
H é fechado. 2
Um subconjunto A de um espaço topológico X que é ao mesmo tempo aberto e fechado é união de componentes conexas de X, isto é, se uma com-ponente conexa C X satisfaz C \ A 6= ; então C A. Esta observação juntamente com a proposição 2.11 mostra que os subgrupos abertos de G são uniões de componentes conexas de G. Em particular, se o grupo é conexo ele é o único de seus subgrupos abertos.
30 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS Em todo caso, as componentes conexas de G estão relacionadas com os grupos abertos. Essas componentes são descritas a seguir a partir da com-ponente conexa G0 que contém o elemento neutro 1 2 G. Essa componente
conexa é denominada componente da identidade (ou do elemento neutro). Proposição 2.12 Denote por G0 a componente conexa do elemento neutro.
Então G0 é um subgrupo fechado e normal de G. Qualquer outra componente
conexa é uma classe lateral gG0 = G0g de G0. Reciprocamente, toda classe
lateral gG0 = G0g é uma componente conexa de G.
Demonstração: Uma translação à esquerda Eg, g 2 G, é um
home-omor…smo, portanto Eg leva componentes conexas de G em componentes
conexas. Em particular, se g 2 G0, então Eg(G0) está contido em uma
com-ponente conexa de G. Porém, 1 2 G0 e Eg(1) = g 2 G0. Isso implica que
Eg(G0) G0. Tomando, então g; h 2 G0, vê-se que gh 2 G0. Analogamente,
(G0) deve estar contido em uma componente conexa de G que só pode ser
G0 pois (1) = 1. Isso mostra que G0 é subgrupo. Para ver que é normal,
basta repetir o mesmo argumento com as conjugações Cg, g 2 G, levando em
conta que Cg(1) = 1. Por …m, por ser componente conexa, G0 é fechado.
Como G0 é normal, gG0 = G0g para todo g 2 G. É claro que gG0 =
Eg(G0) é conexo e, portanto, gG0 C onde C é uma componente conexa
G. Suponha por absurdo que gG0 6= C. Então, G0 = Eg 1(gG0) 6= g 1C e
G0 C, contradizendo o fato de que G0 é componente conexa, já que g 1C
é conexo. 2
Em geral a componente da identidade não é um subgrupo aberto. Por exemplo, em (R; +) considere o subgrupo Q R munido da topologia in-duzida. Então, a componente da identidade se reduz a f0g, que não é aberto induzido.
Uma condição para que a componente da identidade G0 seja um aberto é
que o grupo seja localmente conexo, no sentido em que todo ponto tem uma vizinhança aberta conexa. Os grupos de Lie por serem localmente homeo-morfos a Rn são localmente conexos, assim a proposição a seguir assegura
que as componentes conexas desses grupos são abertas.
Proposição 2.13 Suponha que G é localmente conexo. Então, G0 é um
2.5. AÇÕES DE GRUPOS E ESPAÇOS QUOCIENTES 31 Demonstração: Como G é localmente conexo, existe uma vizinhança conexa U do elemento neutro. É claro que U G0. Portanto, G0 tem
inte-rior não vazio, e daí que é aberto. 2 Por …m, será mostrado o seguinte resultado sobre a forma de gerar grupos, que é bastante útil no estudo dos grupos de Lie.
Proposição 2.14 Suponha G conexo e tome uma vizinhança U do elemento neutro. Então, G =Sn 1Un.
Demonstração: Seja V = U \ U 1 uma vizinhança simétrica contida em U . Como Sn 1Vn S
n 1U
n basta mostrar que G = S n 1V
n. A
união Sn 1Vn é fechada por produtos. Além do mais, como V é simétrico,
(Vn) 1
= Vn. Isso implica queS n 1V
n é um subgrupo de G, que tem
inte-rior não vazio pois V Sn 1Vn. Portanto,S
n 1Vn é um subgrupo aberto.
Como G é conexo, G = Sn 1Vn. 2
2.5
Ações de grupos e espaços quocientes
2.5.1
Descrição algébrica
Uma ação à esquerda de um grupo G num conjunto X é uma função que associa a g 2 G uma aplicação a (g) : X ! X e que satisfaz as propriedades:
1. a (1) = idX, isto é, a (1) (x) = x, para todo x 2 X e
2. a (gh) = a (g) a (h).
Essas propriedades garantem que cada a (g) é uma bijeção, já que a g 1 a (g) = a (1) = a (g) a g 1 = idX:
Visto de outra maneira, uma ação à esquerda é um homomor…smo a : G ! B (X), onde B (X) é o grupo das bijeções de X, com o produto dado pela composta de duas aplicações.
Uma ação à direita é de…nida de maneira análoga substituindo a segunda propriedade por a (gh) = a (h) a (g).
32 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS De forma alternativa, uma ação à esquerda é de…nida como sendo uma aplicação : G X ! X satisfazendo (1; x) = x e (gh; x) = (g; (h; x)), g; h2 G e x 2 X. A relação entre e a é a óbvia: (g; x) = a (g) (x), isto é, a (g) é a aplicação parcial g de quando a primeira coordenada é …xada:
g(x) = (g; x).
A outra aplicação parcial associada a é obtida …xando x 2 X: x : G! X, x(g) = (g; x) = a (g) (x).
Normalmente, os símbolos a ou são suprimidos na notação para ações de grupos. Assim uma ação à esquerda escreve-se apenas g (x), g x ou gx ao invés de a (g) (x). Para ações à direita é mais conveniente escrever o valor de a (g) em x como (x) a (g) aparecendo então a notações (x) g, x g ou xg. Com essas notações uma ação à esquerda satisfaz 1x = x e g (hx) = (gh) x, já uma ação à direita satisfaz x1 = x e (xg) h = x (gh).
Se a é uma ação à esquerda de G em X então a aplicação a0 de…nida por
a0(g) = a (g 1)é uma ação à direita e vice-versa. No que segue serão tratadas
apenas a ações à esquerda. As propriedades enunciadas são automaticamente transferidas para as ações à direita substituindo a (g) por a (g 1).
Dado x 2 X, sua órbita por G denotada por G x ou Gx é de…nida como sendo o conjunto
G x = fgx 2 X : g 2 Gg:
Mais geralmente, se A G então Ax = fgx : g 2 Ag. Em outras palavras, Ax = x(A). Cada órbita é uma classe de equivalência da relação de equiv-alência x y se existe g 2 G tal que y = gx. Por isso, é claro que duas órbitas ou são disjuntas ou coincidem.
Um subconjunto B X é G-invariante se gB B para todo g 2 G. Um conjunto invariante é união de órbitas de G. Se B é um conjunto invariante então a restrição da ação a G B de…ne uma ação G B ! B de G em B. Em particular o grupo G age em suas órbitas.
O conjunto Gx dos elementos de G que …xam x é denominado de subgrupo
de isotropia ou estabilizador de x:
Gx =fg 2 G : gx = xg:
O subgrupo de isotropia é de fato um subgrupo de G, pois (gh) x = g (hx), portanto gh …xa x se gx = hx = x. Além do mais, g 1x = x se gx = x, pois
a (g 1) = a (g) 1.
2.5. AÇÕES DE GRUPOS E ESPAÇOS QUOCIENTES 33 Proposição 2.15 Dados x; y 2 X, suponha que y = gx com g 2 G. Então, Gy = gGxg 1, onde Gx e Gy denotam os subgrupos de isotropia.
Demonstração: Por de…nição h 2 Gy se, e só se, h (gx) = gx. Aplicando
g 1 a esta igualdade segue que (g 1hg) x = x, isto é, g 1hg
2 Gx. Portanto,
h2 Gy se, e só se, h 2 gGxg 1. 2
As ações de um grupo G são distinguidas em classes de acôrdo com as propriedades de suas órbitas e grupos de isotropia.
De…nição 2.16 Seja a uma ação de G em X.
1. A ação é dita efetiva se ker a = fg 2 G : a (g) = idXg = f1g.
2. A ação é dita livre se os subgrupos de isotropia se reduzem ao elemento neutro de G, isto é, se gx = x para algum x 2 X, então g = 1.
3. A ação é dita transitiva se X é uma órbita de G, isto é, para todo par de elementos x; y 2 X existe g 2 G tal que gx = y.
É claro, a partir das de…nições, que ações livres são efetivas, no entanto nem toda ação efetiva é livre. Em termos do homomor…smo a : G ! B (X), uma ação é efetiva se, e só se, ker a = f1g, isto é, se a é injetora. Portanto, numa ação efetiva, G é isomorfo à sua imagem a (G) por a. Por essa razão, uma ação efetiva é também denominada de ação …el .
Deve-se observar que a restrição da ação a uma órbita é uma ação tran-sitiva. Portanto, toda a…rmação sobre ações transitivas se aplica à restrição da ação a uma órbita.
Um caso particular de ação de grupo se dá nos espaços quocientes. Seja H G um subgrupo e denote por G=H o conjunto das classes laterais gH, g 2 G. Então a aplicação (g; g1H) 7! g (g1H) = (gg1) H de…ne uma
ação à esquerda natural de G em G=H. Denotando por : G ! G=H a aplicação sobrejetora (projeção) canônica (g) = gH essa ação …ca escrita como g (g1) = (gg1).
Evidentemente a ação de G em G=H é transitiva. Por outro lado toda ação transitiva se identi…ca (ou melhor, está em bijeção) com um espaço quociente de G.
34 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS Proposição 2.17 Suponha que a ação de G em X é transitiva e tome x 2 X. Então, aplicação x : gGx 2 G=Gx 7! gx 2 X é uma bijeção entre
G=Gx e X. A aplicação x é equivariante no sentido em que g x(g1H) = x((gg1) H), g; g1 2 G, isto é, x comuta com as ações de G em G=H e X,
respectivamente. Além do mais, se y = gx então y = x Dg.
Demonstração: Em primeiro lugar, a aplicação é bem de…nida pois se g1
e g2 estão na mesma classe lateral, isto é, g1Gx = g2Gx então g21g1 2 Gx, o
que signi…ca que g21g1x = x, isto é, g1x = g2x. Por de…nição a aplicação é
sobrejetora se, e só se, a ação é transitiva. Agora, suponha que g1x = g2x.
Então g21g1x = x, isto é, g21g1 2 Gx e daí que g1Gx = g2Gx, mostrando a
injetividade da aplicação.
Seja y = (g1H). Então y = g1x, e, portanto, gy = g (g1x) = (gg1) x.
Daí que g (g1H) = ((gg1) H).
Por …m, se y = gx então y(h) = h (gx) = (hg) x = x(hg), mostrando
que y = x Dg. 2
A aplicação x da proposição acima está relacionada com a aplicação
parcial x através do seguinte diagrama comutativo G x
! X
# %
x
G=H
Em virtude dessa identi…cação, um quociente G=H é também chamado de espaço homogêneo, como são chamados normalmente os conjuntos onde os grupos agem transitivamente. O ponto x escolhido para estabelecer a iden-ti…cação entre X e G=Gx é denominado de origem ou base do espaço
ho-mogêneo X. A identi…cação de X com G=Gx depende da escolha da origem.
No entanto, alterando x não muda substancialmente o espaço quociente, pois numa ação transitiva os subgrupos de isotropia são conjugados entre si, como mostra a proposição 2.15. De fato, se H Gé um subgrupo então para todo g 2 G a aplicação
hH 7 ! g (hH) g 1 = ghg 1 gHg 1 estabelece uma bijeção entre G=H e G=gHg 1.
2.5. AÇÕES DE GRUPOS E ESPAÇOS QUOCIENTES 35 Os fatos descritos acima sobre ações transitivas se aplicam de imediato às órbitas de uma ação qualquer G X ! X. Nesse caso, a restrição da ação sobre uma órbita G x é transitiva o que permite identi…car G x com G=Gx.
Toda a discussão acima se estende de forma análoga a ações à direita, onde os espaços homogêneos são os quocientes H n G, formados pelas classes laterais Hg, g 2 G.
Num espaço homogêneo G=H, isto é, na presença de uma ação transitiva, as ações livres são aquelas em que o subgrupo de isotropia H se reduz a f1g. Nesse caso, o espaço homogêneo se identi…ca a G. Já as ações transitivas e efetivas são descritas a seguir pelos subgrupos normais contidos no grupo de isotropia.
Proposição 2.18 Seja G uma ação transitiva em X = G=H. Então, a ação é efetiva se, e somente se, H não contém subgrupos normais de G, além de f1g.
Demonstração: Suponha que N H é um subgrupo normal de G, isto é, gN g 1 N
para todo g 2 G. É claro que H é o grupo de isotropia da origem. Mas, pela proposição 2.15, os subgrupos de isotropia são conjugados entre si. Portanto, qualquer h 2 N está contido em todos os subgrupos de isotropia. Mas isso signi…ca que hy = y, para todo y 2 X, isto é, h = idX.
Portanto, se a ação é efetiva, N = f1g.
Reciprocamente, o subgrupo normal ker a = fg 2 G : 8y 2 X; gy = yg está contido em H. Portanto, se H não contém subgrupos normais, além do trivial, então ker a = f1g e a ação é efetiva. 2
2.5.2
Ações contínuas
No contexto topológico deve-se considerar ações contínuas no seguinte sen-tido.
De…nição 2.19 Seja G um grupo topológico e X um espaço topológico. Uma ação de G em X é contínua se a aplicação : G X ! X, (g; x) = gx, é contínua.
Se H G é um subgrupo, a restrição a H da ação de G em X é uma ação de H. Tomando em H a topologia induzida, a restrição de uma ação contínua é contínua.
36 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS No caso de uma ação contínua, os objetos introduzidos anteriormente admitem boas propriedades topológicas.
De fato, se é contínua então as aplicações parciais x : G ! X, x 2
X, e g : X ! X, g 2 G, são também contínuas. Além do mais, como a (g) = g e a (g) 1 = a (g 1) segue que para cada g 2 G, a (g) : X ! X é homeomor…smo de X.
A proposição a seguir aborda os grupos de isotropia das ações contínuas. Proposição 2.20 Suponha que a ação de G em X seja contínua e que X seja espaço de Hausdor¤. Então, qualquer subgrupo de isotropia Gx, x 2 X,
é fechado.
Demonstração: Em termos da aplicação , o subgrupo de isotropia é dado por
Gx =fg 2 G : (g; x) = xg = x1fxg:
Como X é Hausdor¤, segue que Gx é fechado. 2
O objetivo agora é olhar a bijeção da proposição 2.17 no caso de ações contínuas. Para isso é necessário introduzir uma topologia em G=H. Essa deve ser a topologia quociente, que é de…nida em geral para relações de equivalência em espaços topológicos da seguinte maneira:
De…nição 2.21 Seja Y um espaço topológico e uma relação de equivalên-cia em Y . Denote por Y = o conjunto das classes de equivalência de e por : Y ! Y= a aplicação sobrejetora canônica, que a cada y 2 Y associa sua classe de equivalência. A topologia quociente em Y = é aquela em que um subconjunto A Y = aberto se, e só se, 1(A) é aberto em
Y. De forma equivalente, F Y = é fechado se, e só se, 1(F ) é fechado em Y .
A topologia quociente é a mais …na (que contém a maior quantidade de abertos possível) que torna a projeção canônica : Y ! Y= uma aplicação contínua. A continuidade, em relação à topologia quociente, de funções de…nidas em Y = é veri…cada através da seguinte propriedade. Proposição 2.22 Sejam Y e Z espaços topológicos em que Y é munido da relação de equivalência . Então, uma aplicação f : Y = ! Z é contínua
2.5. AÇÕES DE GRUPOS E ESPAÇOS QUOCIENTES 37 se, e somente se, f : Y ! Z é contínua:
Y
# & Y = ! Z
Demonstração: Se f é contínua então f é contínua, pois é contínua. Reciprocamente, suponha que f é contínua e seja A Z um aberto. En-tão (f ) 1(A) = 1(f 1(A))é aberto em Y . Pela de…nição da topologia
quociente, segue que f 1(A)é aberto em Y = , concluindo a demonstração.
2
No caso em que G é um grupo e H G um subgrupo, o quociente G=H é o conjunto das classes de equivalência da relação de equivalência em G em que x y se, e só se, xH = yH. Portanto, G=H pode ser munido da topologia quociente por essa relação de equivalência, quando G é um grupo topológico.
No caso particular de um conjunto de classes laterais G=H a aplicação canônica : G ! G=H é uma aplicação aberta. De fato, para um subcon-junto A G vale
1( (A)) = AH:
Se A é aberto então AH =Sh2HAh é aberto em G e daí que (A) é aberto na topologia quociente. Deve-se observar também que, em geral a projeção não é uma aplicação fechada (por exemplo, tome G = R2
, H = f0g R e F G o grá…co f(x; y) 2 R2 : < x <
e y = tgxg. O conjunto (F ) não é fechado).
A topologia quociente tem um bom comportamento em relação ao pro-duto cartesiano de grupos. Sejam G1 e G2 grupos topológicos e H1 G1,
H2 G2 subgrupos. O produto H1 H2 é um subgrupo de G1 G2 e o
quo-ciente (G1 G2) = (H1 H2) se identi…ca com (G1=H1) (G2=H2) através
da bijeção
: (g1; g2) (H1 H2)7 ! (g1H1; g2H2) :
Essa bijeção é um homeomor…smo em relação às topologias quocientes nos es-paços homogêneos. Isso pode ser visto facilmente pela de…nição de topologia quociente e o seguinte diagrama comutativo:
G1 G2
id
! G1 G2
# #
38 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS Proposição 2.23 A topologia quociente em G=H é de Hausdor¤ se, e so-mente se, H é fechado.
Demonstração: A aplicação : G! G=H é contínua e H = 1
fxg se x denota a origem de G=H. Portanto, se G=H é Hausdor¤, H é fechado.
Reciprocamente, suponha que H é fechado. A propriedade de Hausdor¤ é equivalente à diagonal
=f(x; x) 2 G=H G=H : x 2 G=Hg
ser um conjunto fechado em relação à topologia produto em G=H G=H, que coincide com a topologia quociente em (G G) = (H H). Deve-se mostrar que 21( )é um conjunto fechado em G G onde 2 : G G! G=H G=H
é a projeção canônica. Mas, 2(g; h) 2 se e só se gH = hH, isto é, se
h 1g 2 H. Em outras palavras,
1
2 ( ) = q
1(H)
onde q é a aplicação contínua q (x; y) = x 1y. Portanto, se H é fechado, 1
2 ( ) é fechado. 2
Proposição 2.24 A ação de G em G=H é contínua em relação à topologia quociente.
Demonstração: A aplicação : G G=H ! G=H que de…ne a ação faz parte do seguinte diagrama comutativo
G G !p G id## # G G=H ! G=H
Seja A G=H um aberto. Então, p 1 1(A)é aberto e daí que (id ) 1(A) é um aberto em G G. Mas, isso signi…ca que 1(A)é aberto em G G=H, pela de…nição da topologia quociente. 2 Voltando agora a uma ação geral G X ! X cada órbita G x está em bijeção com o quociente G=Gx. Por intermédio dessa bijeção pode-se colocar
2.5. AÇÕES DE GRUPOS E ESPAÇOS QUOCIENTES 39 aberto se o conjunto correspondente em G=Gx for um aberto da topologia
quociente.
No entanto, se a ação G X ! X for contínua, então a órbita G x X admite também a topologia induzida de X. A discussão a seguir tem por objetivo comparar essas topologias, analisando a propriedade de homeomor…smo da aplicação x. Para isso é su…ciente considerar o caso de ações transitivas pois se uma ação é contínua G X ! X é contínua então sua restrição à uma órbita G x também é contínua em relação à topologia induzida.
Proposição 2.25 Seja G X ! X uma a ação contínua e transitiva de G em X. Fixe x 2 X e considere a bijeção x : G=Gx ! X dada por x(gGx) = gx. Então, x é contínua em relação à topologia quociente em
G=Gx.
Demonstração: Pela proposição 2.22 basta mostrar que x é contínua. Agora, x (g) = x(gH) = gx, isto é, x = x que é contínua se a ação
é contínua. 2
A situação ideal seria poder identi…car, como espaços topológicos, o es-paço X onde se dá uma ação transitiva com o quociente G=Gx. Em geral
isso não é possível, pois a aplicação x não é homeomor…smo por não ser aplicação aberta. Um exemplo disso é apresentado a seguir.
Exemplo: Se G é um grupo a aplicação g 2 G 7! Eg de…ne uma ação
(à esquerda) de G em si mesmo por translações à esquerda. Essa ação é claramente transitiva em que o subgrupo de isotropia Gg = f1g para todo
g 2 G. Portanto, para cada g 2 G existe um diagrama G ! Gg
# %
g
G=f1g = G
onde g(h) = hg. Em particular, 1(h) = h é a aplicação identidade. Dessa
forma, para exibir um exemplo de uma ação contínua em que x não é uma aplicação aberta basta mostrar a existência de um grupo munido de duas topologias T1 e T2 com T2
6= T1. Nesse caso
40 CAPÍTULO 2. GRUPOS TOPOLÓGICOS é contínua, mas não aberta. Se ambas topologias tornam G um grupo topológico então a ação à esquerda de G em G é contínua.
Um exemplo de um grupo desses é dado pela reta real (R; +). Tome T1
como sendo a topologia usual. Quanto a T2, considere um ‡uxo irracional no
toro T2, isto é, a imagem em R2=Z2 de uma reta r R2, com inclinação irra-cional. Esse conjunto é um subgrupo de T2
isomorfo a R, porém a topologia induzida sobre a imagem é uma topologia T2 em R estritamente contida na
topologia a usual. Em ambas topologias R é um grupo topológico, pois a topologia T2 é a que torna R um subgrupo topológico de T2. 2
A seguir será apresentado um resultado de caráter geral garantindo que
x é uma aplicação aberta, dentro do contexto do teorema das categorias de
Baire. Antes disso é conveniente reduzir o problema a um único ponto. Lema 2.26 Suponha que exista x0 2 X tal que para toda vizinhança aberta
U 2 V (1), o conjunto U x0 = x0(U ) contém x0 em seu interior. Então, x
é uma aplicação aberta para todo x 2 X e, portanto, é um homeomor…smo. Demonstração: Considere em primeiro lugar x0. Neste caso, dado um
aberto V G deve-se mostrar que V x0 é um aberto, isto é, se g 2 V então
gx0é ponto interior de V x0. Por hipótese, se g 2 V então U = g 1V 2 V (1)
é tal que U x0 é uma vizinhança de x0. Isso implica que V x0 = (gU ) x0 =
g (U x0) é uma vizinhança de gx0, já que g é um homeomor…smo. Isso
mostra que x0 é aplicação aberta.
Agora, se x = hx0 então x = x0 Dh. Portanto, se x0 é aplicação
aberta, o mesmo ocorre com x. 2 O resultado geral a seguir sobre o homeomor…smo G=Gx ! X vale
quando X é um espaço de Baire, isto é, a união enumerável de conjuntos de interior vazio ainda tem interior vazio. Exemplos de espaços de Baire são os espaços métricos completos ou os espaços topológicos que são de Hausdor¤ e localmente compactos.
Lema 2.27 Sejam G um grupo topológico, D G um subconjunto denso e U 2 V (1) uma vizinhança da identidade. Então,
G = [
g2D
2.5. AÇÕES DE GRUPOS E ESPAÇOS QUOCIENTES 41 Demonstração: Tome uma vizinhança simétrica W U. Então, dado x 2 G existe g 2 D tal que g 2 xW , isto é, x 1g
2 W . A simetria de W garante que g 1x
2 W , o que signi…ca que x 2 gW gU, concluíndo a
demonstração. 2
Proposição 2.28 Seja G X ! X uma ação contínua e transitiva. Supo-nha que G seja separável (isto é, admite um conjunto enumerável denso) e que X seja um espaço de Baire. Então, as aplicações x : G=Gx ! X são
homeomor…smos.
Demonstração: Tome x0 2 X, U 2 V (1) uma vizinhança aberta e W uma
vizinhança simétrica tal que W2 U. Pelo lema 2.26 é su…ciente mostrar
que U x0 é vizinhança de x0. Seja gnuma sequência densa em G. Pelo lema
anterior, os conjuntos gnW cobrem G e, portanto, os conjuntos gnW x0
cobrem X. No entanto, X é um espaço de Baire, o que garante que para algum n0, gn0W x0 tem interior não vazio, isto é, contém gn0g x0 em seu
interior para algum g 2 W . Como gn0g é homeomor…smo, segue que x0 é
ponto interior de g 1g 1 n0 (gn0W x0). Mas, g 1gn1 0 (gn0W x0) = g 1W x 0 U x0; concluindo a demonstração. 2 Por …m deve-se observar que no caso de ações diferenciáveis grupos de Lie será mostrado posteriormente, com o auxílio do cálculo diferencial, que as aplicações x são homeomor…smos (na verdade difeomor…smos).
2.5.3
Grupos quocientes
Uma situação especial dos quocientes considerados acima acontece quando o subgrupo H é normal em G. Nesse caso o quociente G=H tem uma estrutura de grupo, de…nida por (gH) (hH) = (gh) H e a projeção canônica : G! G=H é um homomor…smo. Com a topologia quociente esse grupo passa a ser um grupo topológico. Para ver isso basta recorrer à proposição 2.22 e escrever o diagrama
G G p! G
## #