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Aplicação exponencial

No documento Grupos de Lie (páginas 63-69)

3.3

Aplicação exponencial

A aplicação exponencial exp : g ! G é o objeto central usado para trans- portar ao grupo de Lie G propriedades de sua álgebra de Lieg. A idéia básica de sua construção é que, por de…nição, os elementos de g são equações difer- enciais ordinárias em G (campos invariantes), que possuem ‡uxos, os quais são formados por difeomor…smos locais de G. Os elementos formadores desses ‡uxos se identi…cam naturalmente a elementos de G, permitindo construir, a partir de X 2 g, um subgrupo de G parametrizado por t 2 R (subgrupo a 1-parâmetro). A aplicação exponencial é construida a partir desses subgru- pos.

Para colocar esses comentários de maneira precisa, seja X um campo invariante (à esquerda ou à direita em G). Denote por Xt o seu ‡uxo. Em

princípio Xté um ‡uxo local, isto é, para t …xado, o domínio domXtde Xté

o subconjunto aberto de G das condições iniciais cujas soluções se prolongam até t.

A invariança de X acarreta a seguinte simetria do ‡uxo Xt: suponha, por

exemplo, que X 2 Invd, tome g; h 2 G com h 2 domXt e considere a curva

(t) = Dg(Xt(h)) = Xt(h) g. O seu domínio é um intervalo aberto de R,

contendo 0 com (0) = hg pois X0(h) = h. Além do mais, pela regra da

cadeia 0(t) = d (D

g)Xt(h)(X (Xt(h))), e como X é invariante à direita segue

que

0(t) = X (X

t(h) g) = X ( (t)) :

Portanto, é solução de dg=dt = X (g) com condição inicial (0) = hg, isto é, (t) = Xt(hg). Isso signi…ca que

Xt(hg) = Xt(h) g X 2 Invd: (3.1)

Tomando em particular h = 1, …ca Xt(g) = Xt(1) g. Isto é, a solução

que passa por g é obtida por translação à direita da solução que passa pelo elemento neutro.

De maneira análoga, se mostra que

gYt(h) = Yt(gh) Y 2 Inve: (3.2)

(e Yt(g) = gYt(1)) se Y é campo invariante à esquerda.

Como as trajetórias são obtidas umas das outras por translação, elas se prolongam ao mesmo intervalo de R, isto é, as soluções maximais dos campos invariantes têm todas os mesmos intervalos de de…nição. Isso permite mostrar

64 CAPÍTULO 3. GRUPOS DE LIE E SUAS ÁLGEBRAS DE LIE que os campos invariantes são completos, isto é, suas trajetórias se prolongam sobre todo R.

Proposição 3.7 Um campo invariante (à esquerda ou à direita) é completo. Além do mais, se A 2 T1G, então as trajetórias Ad t(1) e (Ae)t(1), que

passam pelo elemento neutro coincidem para todo t 2 R. Além do mais, a aplicação t 2 R 7! Ad

t(1) 2 G é um homomor…smo do grupo aditivo R a

valores em G.

Demonstração: Seja X um campo invariante à direita. Para mostrar que X é completo basta mostrar que a trajetória Xt(1) que passa pelo elemento

neutro em t = 0 se prolonga a R. Seja ( ; !) com < 0 e ! > 0 o domínio de de…nição da solução maximal t 7! Xt(1). Suponha por absurdo que

! < +1. Então, X!=2(1) é bem de…nido e a trajetória s 7! Xs X!=2(1) se

prolonga a ( ; !), pois as soluções maximais de um campo invariante estão de…nidas num mesmo intervalo. Esse prolongamento permite de…nir a curva

: ( ; 3!=2)! G por

(t) = Xt(1) se t2 ( ; !=2]

Xt !=2 X!=2(1) se t2 (!=2; 3!=2):

É claro que (0) = 1, assim para chegar a uma contradição basta mostrar que (t)é solução de dg=dt = X (g). Por construção, 0(t) = X ( (t))para

t 2 ( ; !=2] ou t 2 (!=2; 3!=2). Quanto a t = !=2, deve-se observar que (t) = Xt(1) se t 2 ( ; !), pois se t 2 (!=2; !) então Xt !=2 X!=2(1) =

Xt(1), pela propriedade de ‡uxo. Daí que 0(t) = X ( (t)) também em

t = !=2. Portanto, é uma solução de dg=dt = X (g) que se prolonga a ( ; 3!=2) contradizendo a suposição de que ( ; !) é o intervalo da solução maximal passando por 1. Com isso …ca mostrado que ! = +1. Da mesma forma se veri…ca que = 1, concluindo a demonstração de que X é completo.

A propriedade de homomor…smo é agora imediata: Xt+s(1) = Xt(Xs(1)) ;

já que Xt é ‡uxo. Por outro lado, se por exemplo, X é invariante à direita

então por (3.1) com h = 1 e g = Xs(1), vale Xt(1Xs(1)) = Xt(1) Xs(1).

Isso mostra que

3.3. APLICAÇÃO EXPONENCIAL 65 isto é, t 7! Xt(1) é um homomor…smo.

Por …m, falta veri…car que as trajetórias de Ad e Ae que passam pelo

elemento neutro coincidem. Para isso basta veri…car que a curva (t) = Ad

t(1) é solução do campo invariante à esquerda, isto é, satisfaz

0(t) =

Ae( (t)), pois (0) = 1. Pela propriedade de homomor…smo, (t + s) =

(t) (s) = (s) (t). Mas, 0(t) = d

ds (t + s)js=0. Usando cada uma das

expressões para (t + s), obtém-se

0(t) = dD

(t) 1( 0(0)) = dE (t) 1( 0(0)) :

Como 0(0) = A, segue que (t) é trajetória de ambos os campos Ad e Ae,

concluindo a demonstração. 2 Essa descrição das trajetórias dos campos invariantes permite de…nir a aplicação exponencial.

De…nição 3.8 Seja X 2 T1G. Então, exp X = Xd t=1(1) = (Xe)t=1(1).

Como é usual exp X também se escreve como eX.

A aplicação exponencial é da forma exp :g ! G. A de…nição pressupõe que a álgebra de Lie g de G está sendo vista como o espaço tangente ao elemento neutro. Pelas identi…cações acima, se X é um campo invariante exp X faz sentido e é o valor em t = 1 da solução de X que passa pelo elemento neutro quando t = 0. Em virtude da proposição acima, a aplicação t 7! exp (tX), X 2 g, é um homomor…smo. Portanto,

fexp (tX) : t 2 Rg

é um subgrupo de G, denominado de subgrupo a 1-parâmetro gerado por X. A seguinte proposição reúne algumas propriedades da aplicação exponen- cial e dos ‡uxos dos campos invariantes.

Proposição 3.9 Valem as seguintes a…rmações:

1. Se X é campo invariante à direita então Xt = Eexp(tX), isto é, Xt(g) =

exp (tX) g.

2. Se X é campo invariante à esquerda então Xt = Dexp(tX), isto é,

66 CAPÍTULO 3. GRUPOS DE LIE E SUAS ÁLGEBRAS DE LIE 3. exp 0 = 1.

4. Para todo X 2 g, e t; s 2 R,

exp (t + s) X = exp (tX) exp (sX) = exp (sX) exp (tX) ;

isto é, os elementos do subgrupo fexp (tX) : t 2 Rg comutam entre si. 5. Sejam X; Y 2 g. Então, [X; Y ] = 0 se, e só se, exp tX exp sY =

exp sY exp tX.

Demonstração: Apenas a última propriedade não foi provada ainda. Mas ela é consequência da propriedade geral de campos de vetores que a…rma que seus ‡uxos comutam se, e só se, o colchete de Lie entre eles se anula em todos

os pontos. 2

O item 4 da proposição acima garante que (exp X)n = exp (nX) para todo n 2 Z. Em particular, (exp X) 1 = exp ( X).

Exemplos:

1. Como foi visto os campos invariantes à direita em Gl (n; R) são da forma X (g) = Ag, com A matriz n n. A equação diferencial associada a X é o sistema linear

dg dt = Ag

no espaço das matrizes. Sua solução fundamental é dada pela expo- nencial de matrizes exp A =Pk 0 k!1Ak, que coincide, portanto, com a

aplicação exponencial em Gl (n; R).

2. Se A é uma álgebra associativa, então aplicação exponencial do grupo de Lie G (A) é dada por exp A = Pk 0

1 k!A

k,da mesma forma que em

Gl (n; R).

3. Em (Rn; +) os campos invariantes são constantes: X (x) = x + v. O

‡uxo de um campo desses é dado pelas translações Xt(x) = x + tv.

Tomando x = 0, vê-se que

exp (tv) = tv: Em particular, exp (v) = v e exp = id.

3.3. APLICAÇÃO EXPONENCIAL 67 4. Se G e H são grupos de Lie com álgebras de Lieg e h respectivamente então exp (X; Y ) = (exp X; exp Y ) se (X; Y ) 2 g h, a álgebra de Lie de G H. Isso se deve a que os campos invariantes à direita no produto direto G H são da forma (X; Y ) com X campo invariante à direita em G e Y campo invariante à direita em H. Portanto, suas soluções podem ser encontradas coordenada a coordenada.

A mesma observação vale para um produto direto G1 Gk aonde

a exponencial é dada pelo produto cartesiano das exponenciais em cada grupo.

2 Além das propriedades algébricas da aplicação exponencial, enunciadas na proposição 3.9, sua diferenciabilidade também é relevante. A aplicação exponencial foi de…nida através da solução da equação diferencial dg=dt = X (g), com X campo invariante. O conjunto das equações de…nidas (por exemplo) pelos campos invariantes à direita pode ser colocada numa única equação dependente do parâmetro A 2 T1G, escrevendo

dg

dt = f (A; g) (3.3) onde f : T1G G! T G é dada por f (A; g) = (dDg)1(A). No caso em que

G e p são de classe pelos menos C2, f é de classe

C1. Portanto as soluções

de (3.3) dependem diferenciavelmente do parâmetro A. Isso signi…ca que a aplicação exponencial exp : g ! G é uma aplicação diferenciável.

A diferencial de exp é amplamente utilizada no desenvolvimento da teo- ria. Existe uma fórmula para essa diferencial em termos de uma série cu- jos termos sucessivos são colchetes de elementos em g. Essa fórmula será demonstrada posteriormente. Um de seus casos particulares é a expressão enunciada abaixo para a diferencial da exponencial na origem 0 2 g. Para ler a expressão a ser escrita deve-se levar em conta que exp 0 = 1, assim, (d exp)0 é uma aplicação linearg ! T1G =g.

Proposição 3.10 (d exp)0 = id.

Demonstração: Dado A 2 g, (d exp)0(A) = d

dt exp (0 + tA)jt=0. Mas essa derivada é exatamente A pois a curva exp (tA) é solução de dg=dt = Ad(g).

68 CAPÍTULO 3. GRUPOS DE LIE E SUAS ÁLGEBRAS DE LIE Corolário 3.11 Existem uma vizinhança U de 0 2 g e uma vizinhança V de 1 em G tal que exp jU : U ! V é um difeomor…smo.

Demonstração: Segue do teorema da função inversa e do fato que (d exp)0 =

idé inversível. 2

Corolário 3.12 Seja G um grupo de Lie conexo e tome g 2 G. Então, existem X1; : : : ; Xs 2 g tal que

g = exp (X1) exp (Xs) :

Demonstração: Como G é conexo, a vizinhança V do corolário anterior gera G, isto é,

G = [

n 1

Vn: Um elemento de Vn é da forma g

1 gn com gi = exp Xi 2 V . Portanto,

um elemento de Vn é um produto de exponenciais, o mesmo ocorrendo com

g 2 G arbitrário. 2

De acôrdo com o corolário 3.11 a aplicação exp 1 : V ! U é um difeo- mor…smo entre um aberto de G e um aberto de um espaço vetorial. Portanto, exp 1 pode ser considerada uma carta, ou sistema de coordenadas local, de

G. Essa carta é denominada de sistema de coordenadas canônico de primeira espécie.

Um outro tipo de sistema de coordenadas nas vizinhanças do elemento neutro, obtida por exponenciais, é dada pela seguinte aplicação: tome uma base fX1; : : : ; XNg de g e considere a aplicação

: (t1; : : : ; tN)2 RN 7 ! et1X1 etNXN 2 G: (3.4)

Ela satisfaz (0) = 1 e d 0 = id, pois para cada elemento ei da base canônica

de Rn, vale d 0(ei) = @ @ti (0) = d dti (0; : : : ; ti; : : : ; 0)jti=0 = Xi:

Portanto, d 0 é isomor…smo o que acarreta que em alguma vizinhança de 02 RN, é um difeomor…smo. Uma aplicação dessas é chamada de sistema

3.4. HOMOMORFISMOS 69

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