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Estabelecimento de parcerias entre instituições de pesquisa e indústrias em projetos de alto risco : o caso do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Faculdade de Engenharia Mecânica

ROSANA CERON DI GIORGIO

Estabelecimento de parcerias entre

instituições de pesquisa e indústrias em

projetos de alto risco: o caso do Laboratório

Nacional de Ciência e Tecnologia do

Bioetanol

CAMPINAS 2016

(2)

ROSANA CERON DI GIORGIO

Estabelecimento de parcerias entre

instituições de pesquisa e indústrias em

projetos de alto risco: o caso do Laboratório

Nacional de Ciência e Tecnologia do

Bioetanol

Orientador Prof. Marcelo Pereira da Cunha

CAMPINAS 2016

Tese de Doutorado apresentada à Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para obtenção do título de Doutora em Planejamento de Sistemas Energéticos.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA ROSANA CERON DI GIORGIO

E ORIENTADA PELO PROF. DR MARCELO PEREIRA DA CUNHA.

... ASSINATURA DO ORIENTADOR

(3)
(4)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ENGENHARIA MECÂNICA

COMISSÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA

MECÂNICA

PLANEJAMENTO DE SISTEMAS ENERGÉTICOS

TESE DE DOUTORADO

Estabelecimento de parcerias entre

instituições de pesquisa e indústrias em

projetos de alto risco: o caso do Laboratório

Nacional de Ciência e Tecnologia do

Bioetanol

Autor: Rosana Ceron Di Giorgio Orientador: Marcelo Pereira da Cunha

A Banca Examinadora composta pelos membros abaixo aprovou esta Tese: ____________________________________________________

Prof. Dr. Marcelo Pereira da Cunha, Presidente IE/Unicamp

____________________________________________________ Prof. Dr. Sergio Luiz Monteiro Salles Filho

IG/Unicamp

____________________________________________________ Prof. Dr. Marco Aurélio Pinheiro Lima

IFGW/Unicamp

____________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Augusto Horta Nogueira

UNIFEI/Itajubá

___________________________________________________ Prof. Dr. Antônio Maria Francisco Luiz José Bonomi

CNPEM/Campinas

A Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

(5)

Resumo

A curva de aprendizado traçada pelo setor sucro-energético brasileiro é motivo de orgulho para o país. Entretanto, esta levou quarenta anos para se concretizar. Assim, o sistema de inovação do setor não pode ser considerado dinâmico o suficiente para ser chamado de desenvolvido. Outro fato que aponta para isto é a baixa a quantidade de patentes em tecnologias de etanol de segunda geração (menos de 300, enquanto que os EUA possuem cerca de 18.000).

O Laboratório Nacional (LN) de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) foi criado, dentre outros objetivos, para de manter o Brasil na vanguarda no setor de bioetanol de cana-de-açúcar, tendo como estratégias de atuação para atingir este alvo, a proximidade com a indústria do setor e a transferência de tecnologias.

Para atrair o parceiro industrial, o CTBE se preocupou em criar um ambiente que proporcionasse aos parceiros segurança e atendimento de seus interesses, além, naturalmente, dos interesses do CTBE. Para criar este ambiente favorável foi estabelecido um conjunto de diretrizes que passaram por questões de propriedade intelectual, da confidencialidade, do financiamento governamental, do capital privado, da transferência de tecnologia, entre outras, para que as parcerias fossem bem sucedidas e portanto, a inovação se tornasse possível.

A principal contribuição deste trabalho é a proposição de diretrizes que devem estar presentes na estratégia de relacionamento entre ICTs e indústrias, bem como a demonstração da aplicação destas diretrizes em dois casos práticos de transferência de tecnologias entre o CTBE e indústrias atuantes no setor sucroenergético brasileiro.

A principal conclusão desta tese é que não bastam a criação do LN e aportes de recursos para a pesquisa e desenvolvimento (P&D). Para que os resultados das atividades de P&D cheguem à sociedade, através de produtos e serviços úteis à humanidade (quanto então estará se dando a inovação), é fundamental a existência de uma estratégia de relacionamento entre o LN e a indústria.

(6)

Abstract

The learning curve drawn by the Brazilian sugar-energy sector is a source of pride for the country. However, it took forty years to materialize. Thus, the innovation system of the sector cannot be considered dynamic enough to be said developed. Another fact that points to this is the low number of patents in second generation ethanol technologies (less than 300, while the USA has about 18,000).

The Brazilian Bioethanol Science and Technology Laboratory (CTBE) is a National Laboratory (NL) and was created in order to keep Brazil in the frontier of the sugarcane bioethanol sector (among other purposes), having as strategies to achieve this target, the proximity to industry and technology transfer.

To attract the industrial partner, CTBE decided to create an environment that could provide partners security and meet their interests (and, of course, CTBE´s interests). In order to create this favorable environment, a set of guidelines was established that dealt with issues of intellectual property, confidentiality, government funding, private capital, technology transfer, among others, so that partnerships were successful and thus, innovation became possible.

The main contribution of this thesis is the proposal of guidelines that must be present in the strategy of relationship between research institutions and industries, as well as, the application of such guidelines in two technology transfer cases that took place between CTBE and industries from the Brazilian sugar-energy sector.

The main conclusion of this study is that, creating the NL and funding research and development (R & D) activities, are not enough actions to provide that R & D results reach the society, through useful products and services to humanity (when innovation happens). It is essential to create a strategy to govern the relationship between the NL and industry.

(7)

Lista de Ilustrações

Figura 1: Volume de produção de etanol no Brasil de 1970 a 2014. ... 32

Figura 2: participação do etanol combustível em veículos leves no Brasil, em percentual com relação à gasolina. ... 33

Figura 3: Curva de experiência do etanol hidratado (custos totais: produção da matéria-prima e produção industrial do etanol) ... 36

Figura 4: Crescimento nos rendimentos e redução nos custos de produção para produtos da agroindústria brasileira de cana-de-açúcar de 1975 a 2008. ... 37

Figura 5: Evolução da quantidade de açúcar brasileiro exportado, por ano civil. ... 38

Figura 6: Representação dos Programas do CTBE e suas interações. ... 67

Figura 7: Organograma do CTBE após reestruturação em 2015 ... 92

Figura 8: Investimentos e risco na cadeia da inovação ... 96

Figura 9: Processo de transferência de tecnologia do MIT ... 111

Figura 10: Exemplo de processo de transferência de tecnologia com base na demanda. ... 117

Figura 11: Formas de proteção de propriedade intelectual ... 121

Figura 12: ETC – Estrutura de Tráfego Controlado ... 164

(8)

Lista de Tabelas

Tabela 1: Mistura de álcool anidro na gasolina ... 27

Tabela 2: Comparação entre os investimentos feitos no PAISS, do BNDES e FINEP com o Biomass Program do DOE (Department of Energy) dos EUA ... 48

Tabela 3: Publicações de empresas especializadas em biocombustíveis avançados e bioprodutos ... 99

Tabela 4: Contraste entre os princípios da inovação fechada e aberta. ... 102

Tabela 5: Projetos de biorrefinarias que contam com financiamento público nos EUA (dados de 2014) ... 106

Tabela 6: Patentes do CTBE originadas na parceria com a indústria ... 119

Tabela 7: Royalties praticados pela indústria – dados obtidos de profissionais de licenciamento. ... 150

Tabela 8: Exemplo de royalties praticados pelo escritório de transferência de tecnologia do MIT. ... 150

Tabela 9: Termos financeiros e obrigações encontrados nos contratos de licenciamento do NIH ... 157

Tabela 10 - Patentes decorrentes do projeto ETC ... 169

Tabela 11: Requisitos técnicos da ETC e Implemento de Colheita ... 173

Tabela 12: Condições em que são baseados os requisitos da Tabela 11 ... 173

Tabela 13: Resultados das simulações na BVC, visando a valoração da tecnologia no projeto com Dow e DSM ... 185

Tabela 14: Características principais das destilarias básica e otimizada ... 185

(9)

Lista de Abreviaturas e Siglas

ABIQUIM – Associação Brasileira da Indústria Química APTA - Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios APTE - Associação de Parques Tecnológicos da Espanha ATP – Advanced Technology Program

BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento BIOEN - Programa em Bioenergia

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BVC - Biorrefinaria Virtual de Cana-de-açúcar

CA - Comitê de Administração CCA - Centro de Ciências Agrárias

CENBIO - Centro Nacional de Referência em Biomassa CGEE - Centro de Gestão e Estudos Estratégicos

CIDE - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico CIMA - Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool CNI – Confederação Nacional da Indústria

CNPEM - Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais COALBRA - Coque e Álcool da Madeira S/A

CP – Comitê de Projeto

CRADA - Cooperative Research and Development Agreement CTBE – Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol CTC – Centro de Tecnologia Canavieira

CTNBIO - Comissão Técnica Nacional de Biossegurança DARPA - Defense Advanced Research Projects Agency DHR - Dedini Hidrólise Rápida

DoD – Department of Defense DOE – Department of Energy

(10)

EBTA - Empresa de Base Tecnológica Agropecuária Embrapa - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ESALQ - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz Etanol 1G – Etanol de Primeira geração

Etanol 2G – Etanol de Segunda Geração ETC – Estrutura de Tráfego Controlado

ETT - Escritório de transferência de tecnologia EUA – Estados Unidos da América

FUNTEC - Fundo Tecnológico GEE - Gases do Efeito Estufa

GNSS - Global Navigation Satelite System

FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos

FNDCT - Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico FTI - Fundação de Tecnologia Industrial

FUNTTEL - Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações FVA – Fundo Verde-Amarelo

GN – Gestão de Negócios

GDI – Gestão de Desenvolvimento e Inovação GCH - Gestão de Capital Humano

GPF - Gestão de Planejamento Financeiro GPS - Global Positioning System

IAA - Instituto do Açúcar e Álcool IAC - Instituto Agronômico de Campinas IB - Instituto Biológico

IEA - Instituto de Economia Agrícola ICT – instituição científica e tecnológica

INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial IP - Instituto de Pesca

ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas

(11)

IZ - Instituto de Zootecnia LN – Laboratório Nacional

LNBio – Laboratório Nacional de Biociências LNLS – Laboratório Nacional de Luz Síncrotron LNNano – Laboratório Nacional de Nanotecnologia LPI - Lei de Propriedade Industrial

MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento MCTI - Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação

MDIC – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior MIT – Massachussets Institute of Technology

MTA – Material Transfer Agreement NDA - Non Disclosure Agreement NFS - National Science Foundation NIH - National Institute of Health

NIPE - Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético NIT - Núcleo de Inovação Tecnológica

NL – National Laboratory OE – Objetivo Estratégico

OGM - Organismo Geneticamente Modificado ONG – Organização não Governamental OSM – On Site Manufacture

OTT - Office of Technology Transfer PAG – Programa Agrícola

PAT – Programa de Avaliação Tecnológica PIN – Programa Industrial

PROETA - Programa de Apoio ao Desenvolvimento de Novas Empresas de Base Tecnológica Agropecuária e à Transferência de Tecnologia

PSE – Programa de Sustentabilidade PPB - Programa de Pesquisa Básica

PAISS - Plano Conjunto de Apoio à Inovação Tecnológica Industrial dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico

(12)

PI – Propriedade Intelectual

PITE - Programa Parceria para Inovação Tecnológica P&D – Pesquisa e Desenvolvimento

PD&I - Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação PIB - Produto Interno Bruto

PLANALSUCAR - Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar PMGCA - Programa de Melhoramento Genético da Cana-de-açúcar

POP - Patente ou Pedido de Patente Proálcool – Programa Nacional do Álcool

ProCana - Programa de melhoramento genético de cana-de-açúcar do IAC R&D – Research and Development

RIDESA - Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro RFS - Renewable Fuel Standard

SIG - Sistema de Informações Geográficas SBIR – Small Business Innovation Research SSI - Sistemas Setoriais de Inovação

TRL – Technology Readness Level TT - Transferência de tecnologia

UFSCar - Universidade Federal de São Carlos

UNESP - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNICA –União da Indústria de Cana-de-açúcar

Unicamp - Universidade Estadual de Campinas USP - Universidade de São Paulo

UFAL – Universidade Federal de Alagoas UFPR – Universidade Federal do Paraná UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRPE – Universidade Federal Rural de Pernanbuco UFSCar – Universidade Federal de São Carlos UFSE – Universidade Federal de Sergipe UFV – Universidade Federal de Viçosa UnB Universidade de Brasília

(13)

UNIFEI - Universidade Federal de Itajubá

(14)

Sumário

1.INTRODUÇÃO ... 16

1.1 Objetivos ... 19

1.2 Estrutura da tese ... 19

2.METODOLOGIA ... 21

3.HISTÓRICO DO SETOR SUCROENERGÉTICO SOB O PONTO DE VISTA DA INOVAÇÃO ... 23

3.1 Os primórdios da indústria sucroenergética brasileira e sua evolução até o início do século XXI ... 23

3.2 O Sistema de inovação da indústria sucroenergética no Brasil ... 26

3.2.1 O papel do Estado ... 26

3.2.1.1 A crise do setor energético a partir de 2008 – inovação, trajetória, perspectivas e mercado ... 31

3.2.1.2 A recuperação do setor ... 33

3.2.1.3 A curva de aprendizado do etanol ... 35

3.2.1.4 Outras ações do Estado que impactaram a inovação em biocombustíveis ... 39

3.2.2 O papel da indústria, das Instituições de Pesquisa e as parcerias estratégicas ... 49

3.2.2.1 Localização do Sistema de Inovação do Setor Sucroenergético Brasileiro ... 49

3.2.2.2 Novas variedades de Cana-de-açúcar ... 49

3.2.2.3 Inovação na área industrial ... 55

3.2.2.4 A influência da indústria automotiva no sistema de inovação sucroenergético ………..58

3.2.3 A propriedade intelectual (PI) no setor sucroenergético ... 59

4.A CRIAÇÃO DO CTBE E SUA ESTRUTURA FUNCIONAL... 65

4.1. Concepção da estrutura funcional do CTBE ... 66

4.2.Relacionamento do CTBE com a indústria ... 74

4.3.Reestruturação do CTBE ... 91

5.A INTELIGÊNCIA DO RELACIONAMENTO ENTRE A ICT E A INDÚSTRIA ... 96

5.1 Por que é necessário um protocolo de interação entre a ICT e a indústria? ... 96

5.2 As diretrizes que devem estar presentes no relacionamento entre ICT e indústria ... 98

5.2.1 A importância das alianças (parcerias) entre a ICT e empresas do setor produtivo ...98

5.2.2 A importância do investimento público e do capital privado no processo de inovação ... 103

5.2.3 A transferência de tecnologia ... 110

5.2.3.1 Definição ... 110

5.2.3.2 O processo de transferência de tecnologia: Os exemplos do MIT (Massachussets Institute of Technology), Embrapa e CTBE. ... 111

5.2.4 A importância dos direitos de propriedade intelectual (PI) ... 118

5.2.5 A importância da confidencialidade ... 122

5.2.6 Os contratos empregados no processo da TT ... 128

5.2.7 O licenciamento e o fornecimento... 130

(15)

5.2.7.2 Licenças exclusivas de tecnologias-chave ... 138

5.2.8 Licenciamento a uma empresa estabelecida ou criação de spin-outs ... 140

5.2.9 Valoração das tecnologias e formas de remuneração à ICT ... 146

5.2.9.1 Sobre a BVC ... 151

5.2.10 Gestão e cumprimento (Patent Enforcement) das licenças efetivadas ... 153

5.3 Outros fatores que afetam o relacionamento ICT-indústria e a inovação ... 158

6.ESTUDOS DE CASO ... 163

6.1 Caso 1: ETC – Estrutura de Tráfego Controlado... 164

6.2 Caso 2: Produção de etanol 2G. ... 175

7.CONCLUSÕES ... 190

Referências...198

(16)

1.

INTRODUÇÃO

O interesse mundial por fontes energéticas renováveis e mais limpas tem sido crescente, em virtude da busca da redução da dependência pelos combustíveis fósseis e de solução para as questões climáticas – particularmente, a redução das emissões dos gases causadores do efeito estufa (GGE).

Dentro deste contexto, os biocombustíveis têm assumido um papel importante pois, além de aumentarem a diversificação da matriz energética, são renováveis e podem trazer um baixo teor de poluição no meio ambiente, visto que sua produção se dá, em geral, de forma mais limpa. Por este motivo, vários países, incluindo o Brasil, criaram políticas visando a introdução dos biocombustíveis em suas matrizes energéticas.

Sendo assim, esta fonte de energia passou a chamar a atenção da comunidade internacional, principalmente a partir da década passada, especialmente os biocombustíveis de segunda geração, que podem ser produzidos a partir de materiais lignocelulósicos, que contemplam matérias-primas que não competem com a produção de alimento.

Dentro do assunto biocombustíveis, o Brasil é considerado o país mais avançado do mundo pela produção de etanol de primeira geração (etanol 1G) a partir da cana-de-açúcar. Em termos das reduções de GEE, este biocombustível é considerado um dos mais eficientes do mundo, pois promove a redução destes gases em torno de 85% em comparação com as fontes de energia fósseis.

O etanol tradicional obtido a partir da sucrose presente no caldo extraído da moagem da cana-de-açúcar diz respeito a uma tecnologia de primeira geração (1G). Em seu processo de obtenção, o bagaço e a palha da cana são considerados resíduos, frequentemente reaproveitados através de queima em caldeira para produção de vapor e energia elétrica (bioeletricidade). Na verdade, o produto resultante da moagem da cana (o caldo) pode ser convertido tanto em açúcar como em etanol e a escolha é feita pelo produtor em função das melhores condições de mercado para cada produto. Assim, uma usina típica brasileira produz açúcar, etanol e, em alguns casos, excedentes de eletricidade.

(17)

O etanol de segunda geração (etanol 2G), ou etanol celulósico, é aquele que pode ser obtido através da celulose da planta, como por exemplo, do bagaço e/ou da palha de cana-de-açúcar - cada um deles tem cerca de um terço do conteúdo energético da cana.

Além de não competir com fontes de alimentos, como o açúcar, o etanol 2G da cana-de-açúcar tem potencial para acrescentar 40% a mais de etanol por tonelada processada desta matéria-prima. Com o contínuo aumento pela demanda mundial de biocombustíveis, o etanol celulósico tem um grande potencial. Entretanto, apesar de várias empresas em torno do mundo terem introduzido suas primeiras plantas de etanol celulósico, sua viabilidade econômica ainda não foi demonstrada comercialmente. A tecnologia se encontra em desenvolvimento, ainda não demonstrou viabilidade econômica e não se sabe qual rota tecnológica ocupará uma fatia do mercado no futuro (VELRAEDS, 2015; MILANEZ et al., 2015).

Atualmente, o etanol 2G é produzido em escala comercial somente nos Estados Unidos, a partir dos resíduos do milho e, na Itália, a partir de palha de arroz, palha de trigo e de uma gramínea, Arundo donax, também chamada de cana gigante.

Entretanto, segundo estudo feito pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o etanol 2G de cana-de-açúcar no Brasil pode ser mais competitivo que o etanol convencional e próximo do patamar de preço do barril de petróleo a US$44, no longo prazo (MILANEZ et al., 2015).

Além disso, o Brasil tem as condições mais propícias para produzir o etanol 2G de cana-de-açúcar, haja vista que a forma de se produzir o biocombustível com melhores resultados econômicos é através de uma planta de etanol 2G integrada à usina de etanol 1G, para que haja economia de escopo 1(visto que a matéria-prima, por exemplo o bagaço da

cana, já está disponível na planta convencional de primeira geração, para uso na segunda geração) e o país possui o maior parque instalado do mundo de usinas de primeira geração de cana-de-açúcar (DIAS et al., 2012).

Foi pensando no elevado potencial do bioetanol brasileiro que o governo do Brasil contratou um estudo, realizado entre 2005 e 2008 pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) e pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que objetivava

1O conceito de economia de escopo está relacionado às vantagens de custo, de modo geral, que uma empresa

(18)

avaliar a possibilidade do Brasil se tornar um grande produtor e exportador de etanol. O estudo mostrou que, para que o Brasil atingisse este patamar, seria necessário vencer vários obstáculos tecnológicos identificados no ciclo cana-de-açúcar/etanol, capazes de impedir um aumento substancial na escala de produção do etanol brasileiro. Foi então que o governo brasileiro decidiu criar o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) para trabalhar em pesquisa e desenvolvimento (P&D), eliminar estes obstáculos e manter a liderança brasileira na produção de bioetanol de cana-de-açúcar. Desta forma, o desenvolvimento do etanol 2G passou, imediatamente, a ser uma das atividades principais do CTBE, o qual foi concebido para atuar no desenvolvimento de toda a cadeia produtiva da biorrefinaria de cana-de-açúcar.

A biorrefinaria da cana-de-açúcar, similar à sua análoga para o petróleo, pode ser definida como um complexo integrado capaz de produzir diferentes produtos (combustíveis, químicos e eletricidade) usando esta biomassa (e seus resíduos) como matéria-prima. Atualmente, as usinas que produzem bioetanol de cana-de-açúcar já podem ser consideradas como exemplos de biorrefinarias, com a produção combinada de açúcar, bioetanol, excedentes de eletricidade e alguns produtos químicos, assim como potência e calor com base na biomassa residual (BNDES e CGEE, 2008).

Entretanto, a criação do LN (CTBE) e os investimentos governamentais (em infraestrutura e nas atividades de P&D) não são suficientes para que os resultados produzidos no CTBE cheguem até a indústria, onde então se dará a inovação. O mesmo vale para qualquer outra instituição científica e tecnológica (ICT). É necessário que a ICT atue próxima à indústria e que cada uma das partes entenda as demandas e interesses da outra.

As tecnologias produzidas nas ICTs não são ainda comerciais. Estão em uma fase embrionária da pesquisa e requerem elevados investimentos para chegarem ao estágio de um produto que possa ser produzido em escala industrial e comercializado no mercado. Estes investimentos elevados significam risco. Despertar o interesse da indústria para ingressar em uma parceria visando o desenvolvimento de tecnologias deste estágio não é simples. O parceiro industrial precisa ter a segurança de que recuperará os investimentos feitos e que os ganhos deverão compensar o risco assumido. Esta segurança é passada ao parceiro industrial/investidor pela clareza no tratamento das questões ligadas à liberdade para operar (freedom to operate), partilha da propriedade intelectual (PI), partilha de benefícios,

(19)

confidencialidade, financiamento governamental, capital privado e processo de transferência de tecnologia. Por isso, é fundamental a criação de uma estratégia de relacionamento entre a ICT e a indústria que aborde todos estes pontos-chave desta interação.

Assim sendo, a hipótese central deste trabalho é que, para fomentar a inovação no setor sucroenergético, não bastam a criação do Laboratório Nacional e investimentos em pesquisa. É também necessário o estabelecimento de um protocolo (conjunto de diretrizes) que tratem o relacionamento do LN com a indústria.

1.1 Objetivos

São objetivos deste trabalho:

a) Propor um conjunto de diretrizes que devem estar presentes no protocolo de relacionamento entre ICT e indústria, facilitando a interação entre as partes através da clareza no tratamento dos pontos críticos da parceria. Estas diretrizes abordam questões de propriedade intelectual, confidencialidade e outras frequentemente presentes no processo de transferência de tecnologia;

b) Mostrar a aplicação de tais práticas através de dois estudos de caso no CTBE.

1.2 Estrutura da tese

A tese está estruturada através de sete Capítulos, incluindo esta Introdução, resumidamente descritos a seguir.

O Capítulo 2 descreve a metodologia utilizada no desenvolvimento desta pesquisa. O Capítulo 3 apresenta o histórico do setor sucroenergético, do ponto de vista da inovação, os atores que compõem o sistema de inovação do setor, bem como seus papéis, tais como o papel do Estado, das universidades, dos institutos de pesquisa e das indústrias. Este Capítulo apresenta, também, uma análise do nível de maturidade deste sistema de

(20)

inovação para o caso do etanol de segunda geração, e o volume de patentes do setor nesta área.

O Capítulo 4 aborda a criação do CTBE, a visão do Governo brasileiro em criar este Laboratório para manter a liderança do país em biocombustíveis, particularmente no etanol de segunda geração a partir de cana-de-açúcar e a forma pela qual o CTBE foi estruturado – incluindo sua estratégia de relacionamento com a indústria.

O Capítulo 5 trata da proposição de um conjunto de diretrizes que deve compor um protocolo de relacionamento entre ICTs e indústrias; neste capítulo, discorre-se sobre as práticas que devem compor a inteligência do relacionamento entre ICT e indústria, as quais incluem os fatores-chave deste relacionamento, tais como: propriedade intelectual, confidencialidade, financiamento governamental, capital privado e transferência de tecnologia e mostra como estes fatores devem ser tratados através de um conjunto de diretrizes objetivas e concisas.

O Capítulo 6 apresenta dois casos de parcerias de sucesso entre o CTBE e a indústria, no setor sucroenergético, que fazem uso do protocolo proposto no Capítulo 5: i) desenvolvimento da estrutura de tráfego controlado para agricultura de cana-de-açúcar, em parceria com a Máquinas Agrícolas Jacto e ii) desenvolvimento de processo de produção de etanol 2G em parceria com as empresas Dow e DSM.

(21)

2.

METODOLOGIA

A metodologia utilizada neste trabalho foi baseada em entrevistas, revisão bibliográfica e na experiência profissional da autora incluindo sua atuação no CTBE através da proposição de um protocolo relacionamento com a indústria, objeto desta tese.

O primeiro passo consistiu em levantar os obstáculos que surgem nas parcerias ICT-indústria. Para isto foi elaborado um documento descrevendo como o CTBE deveria se relacionar com a indústria. Este documento contém pontos que deveriam ser tratados para trazer às partes segurança e atendimento aos seus interesses. Em linhas gerais, este documento aborda: as áreas de atuação do CTBE; o que o LN oferece à indústria, em termos de produtos, serviços, cooperações, transferência de tecnologias, etc.; como deve ser feita a aproximação entre o CTBE e a indústria e a apresentação da oportunidade; a governança dos projetos conduzidos em parceria; o tratamento da confidencialidade; partilha da propriedade intelectual e dos benefícios resultantes da exploração comercial e, por último, a descrição das possibilidades de cooperação com o CTBE. Este documento foi a primeira versão do Manual de Relacionamento CTBE-Indústria.

Como segundo passo, oito indústrias foram selecionadas para entrevistas (conforme detalhamento feito na seção 4.2). Estas empresas receberam o manual antecipadamente e então, as entrevistas foram agendadas com o propósito de se colher críticas e sugestões ao documento. As empresas selecionadas foram: Jacto, Dow, Corn, Dedini, Ultra, Rhodia, Usina da Pedra e Braskem, por serem representativas dos segmentos sucroenergético e sucroquímico da indústria, segmentos estes previstos como sendo os principais demandantes das soluções do CTBE. Esta etapa gerou a segunda versão do Manual de Relacionamento CTBE-Indústria.

O terceiro passo consistiu em validar o manual, por indústrias, associações de indústrias, instituições financeiras, agências de fomento e governo. Estas instituições apresentaram suas considerações em um workshop realizado no CTBE, organizado pela autora desta pesquisa. As instituições selecionadas para o processo de validação foram: ETH (atual Odebrecht Agroindustrial), ANPEI, COSAN, UNICA, BNDES, MCTIC, FINEP e ABIQUIM. A versão final consolidada do referido manual, denominada “Relacionamento CTBE-Indústria” (CTBE b, 2011), foi distribuída às indústrias que

(22)

interagiam com o CTBE na época e colocada no website do LN. Este documento está transcrito na seção 4.2 desta pesquisa, com alguns comentários atuais.

O quarto passo foi o detalhamento dos obstáculos do relacionamento entre ICT e indústria anteriormente levantados, culminando com o conjunto das diretrizes apresentadas neste trabalho. Esta etapa foi realizada com base na experiência profissional adquirida pela autora e através de extensa revisão bibliográfica, através da qual as diretrizes levantadas foram confrontadas com a literatura científica.

O protocolo proposto nesta pesquisa decorre, ainda, da experiência da autora desta tese em sua atuação em inovação no CTBE, onde teve a oportunidade de negociar pessoalmente as condições de vários acordos de P&D com indústrias, dos quais vale destacar: Jacto (projeto na área agrícola), Dow e DSM (processo de produção de etanol 2G), BP (fermentação de alto teor alcoólico, Rhodia (química de renováveis) e Dow (química de renováveis). Todos estes acordos foram efetivados, alguns ainda estão em andamento e outros já foram finalizados. Além destes, houve a negociação de acordos de P&D que não chegaram a se concretizar, mas que atingiram níveis adiantados de negociação, através dos quais foi possível gerar considerável aprendizado.

É importante destacar, ainda a respeito da proposição do protocolo de relacionamento entre ICTs e indústria, sobre a importância da experiência profissional da autora desta tese, antes de sua contribuição no CTBE, decorrente de sua atuação: i) na Agência de Inovação da Unicamp, onde negociou mais de 200 acordos com indústrias de vários segmentos tecnológicos (farmacêutico, alimentos, tecnologia da informação, química, entre outros); e ii) na Imprimatur Capital, investidor de capital de risco para empresas nascentes, onde teve a oportunidade de entender as características deste tipo de investimento e sobre a criação de

spin-outs. Também foram experiências profissionais enriquecedoras as trocas de

conhecimentos com escritórios de transferência de tecnologias, dos quais vale destacar o

National Institute of Health – EUA, NEOS – Chile, Yssum – Israel, Universidade de

Rochester (EUA) e Universidade do Texas (EUA), bem como com profissionais de diversas partes do mundo atuantes na área, através de encontros da Association of University

Technology Managers - AUTM e da Licensing Executives Society – LES.

O quinto e último passo consistiu na aplicação das diretrizes levantadas em dois estudos de caso, apresentados no Capítulo 6.

(23)

3.

HISTÓRICO DO SETOR SUCROENERGÉTICO SOB O

PONTO DE VISTA DA INOVAÇÃO

3.1 Os primórdios da indústria sucroenergética brasileira2 e sua evolução até o início

do século XXI

A cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil no período colonial. Trazida por Martin Afonso de Souza em 1532, para a Capitania de São Vicente, as mudas de cana-de-açúcar eram provenientes da Ilha da Madeira. Já no século XVII o Brasil tornou-se o maior exportador de açúcar do mundo, o qual era destinado ao abastecimento da Europa.

Em 1535, a plantação de cana-de-açúcar foi desenvolvida na Capitania de Pernambuco, com mudas também originárias da Ilha da Madeira. As lavouras prosperaram intensamente - dada a maior fertilidade destas terras - e outras Capitanias receberam orientação para o cultivo da cana nos primeiros tempos da colonização, como a Bahia, em 1538, e a de Alagoas, em 1575.

A cana-de-açúcar, encontrando características climáticas favoráveis e solos férteis, expandiu-se rapidamente pelo Nordeste do país (Bahia, Piauí, Alagoas e Paraíba). Na década de 1580, o Brasil já detinha o monopólio mundial de produção de açúcar e havia assegurado a Portugal elevada lucratividade com esse mercado. Como consequência, as regiões produtoras tornaram-se prósperas. A cana, desde o início, contribuía com o desenvolvimento do país e com grande relevância econômica na produção de produtos como o açúcar, o melado, a rapadura e a cachaça.

Entretanto, em 1578, com a morte inesperada de D. Sebastião, então rei de Portugal, seguida da anexação de Portugal à Espanha por Felipe II, então rei da Espanha, o cenário começa a se transformar. Felipe II dificultou a comercialização do açúcar para a Holanda e Inglaterra, o que levou os holandeses a invadirem e se apoderarem da área produtora em Pernambuco em 1630, onde permaneceram até 1654.

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Após, os holandeses iniciaram o cultivo da cana-de-açúcar no Caribe e nas Antilhas, acabando com o monopólio brasileiro no mercado europeu. Além disso, ao final do século XVII, a sede pelo ouro descoberto em Minas Gerais, estimulou muitos dos trabalhadores que eram dedicados à cultura canavieira a deixarem suas terras e dedicarem-se à mineração. Ainda assim, o açúcar continuou a ocupar a primeira posição na geração de riqueza para Portugal (Antonil, 1711).

Em 1808, Dom João VI transfere-se para o Rio de Janeiro, em função do cenário de guerra que se passava na Europa. Nesta fase, foi promovida a abertura dos portos, acarretando aumento das exportações e dos preços dos produtos agrícolas no mercado exterior. Novas tecnologias foram introduzidas, tais como o arado, a intensificação do uso do bagaço nas fornalhas, o cultivo de nova variedade de cana-de-açúcar - a Caiana, oriunda da Guiana Francesa, muito mais rica em açúcar, em substituição da variedade Creoula, em degenerescência.

O açúcar da cana-de-açúcar constituiu, portanto, a primeira atividade econômica dos colonos portugueses no Brasil. No início do século XX, o Brasil possuía um excedente de produção de açúcar e foi quando, por estímulo do governo, o setor começou a produzir o segundo produto da cana: o etanol combustível, para que este fosse misturado à gasolina importada. Esta mistura de etanol à gasolina foi promovida a partir dos anos 1930.

Foi neste século que o setor energético entrou em uma nova fase. Dados os dois choques do petróleo, ocorridos em 1973 e 1979, o novo produto teve o incentivo do governo, visando sua produção e expansão da indústria. O setor obteve um aprendizado e uma competitividade incríveis na produção do etanol, os quais se estenderam para o açúcar. Nesta fase surgiram os carros movidos exclusivamente a álcool e o combustível passou a ser o produto prioritário com relação ao açúcar. O auge da frota destes veículos ocorreu entre 1983 e 1988, quando as vendas de carros à álcool atingiram entre 88% a 96% das vendas totais de veículos do Ciclo Otto para o mercado interno. Entretanto, o setor teve altos e baixos. Ao final dos anos 1980, o preço do petróleo volta a cair e o setor não consegue atender a demanda dos veículos a álcool, cuja frota havia crescido vertiginosamente. A frota de carros a álcool é drasticamente reduzida no início dos anos 1990 chegando a praticamente zero entre 1997 e 1998. Com isto, a produção de etanol hidratado cai e o açúcar passa novamente a ser o principal produto do setor, conforme explicado na seção 2.2.1.1.

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No início do século XXI, mais precisamente em 2003, é lançado o primeiro veículo

flex-fuel no mercado brasileiro. Estes veículos passaram a ser a força motriz da demanda por

etanol hidratado no Brasil e o combustível voltou a ter papel importante na indústria. Esta situação perdurou até 2008, com a ocorrência de uma crise econômica mundial que atingiu o setor sucroenergético. O Brasil chegou a ter cerca de 400 usinas de açúcar e álcool. Muitas fecharam nesta fase (cerca de 60) e várias foram compradas por multinacionais, as quais, por terem investido na aquisição, não colocaram recursos em expansão e a produção do setor ficou estagnada. Como a tecnologia para produção de etanol de cana-de-açúcar (primeira geração) é totalmente brasileira (a curva de aprendizado é nossa, conforme seção 2.2.1.3), não houve a entrada de tecnologias destas multinacionais no setor, nem agressividade destas na inovação referente ao etanol 1G.

No segundo semestre de 2011, o governo brasileiro impediu o aumento do preço da gasolina no país (por mais uma redução do Cide, decreto 7.591 de 28/10/2011, ao mesmo tempo que a Petrobras reajustou o preço do combustível)3, reduzindo consequentemente a

competitividade do etanol. Nesta fase o setor voltou a priorizar o açúcar, apesar do mercado mundial estar com um excesso de oferta. Esta foi uma fase árdua para o setor, a qual perdurou até fevereiro de 2015, quando o governo voltou a aumentar PIS e COFINS (de imediato), além do Cide (três meses após) sobre a gasolina (decreto 8.395 de 28 de janeiro de 2015) e a demanda por etanol hidratado voltou a crescer. Também no segundo semestre de 2015 houve elevação cotações de açúcar. Atualmente, em 2015, é previsto um déficit de açúcar no mercado nos dois anos seguintes.

O Brasil chegou a ser o maior produtor e exportador de etanol do mundo (posições posteriormente perdidas para os EUA em 2005 e 2011, respectivamente). Entretanto, o país continua a ser o maior produtor e exportador mundial de açúcar.

A seção subsequente deste Capítulo apresentará, do ponto de vista da inovação, maiores detalhes sobre a evolução do setor sucroenergético brasileiro a partir do século XX.

3 A aplicação da Cide aos combustíveis foi estabelecida por meio da Emenda Constitucional no 33, de

11/12/2001 (parágrafo 4º, art. 177) e regulamentada pela lei no 10.336 de 19/12/2001em 2001. A partir de 2004

(Decreto no 5.060/2004), a Cide foi sendo reduzida progressivamente até ser zerada em 2012 pelo Decreto no

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3.2 O Sistema de inovação da indústria sucroenergética no Brasil

Sistemas de inovação compreendem não somente empresas e organizações de pesquisa e desenvolvimento (P&D), mas também agências governamentais, organizações de ensino e formação, organizações de crédito, políticas industriais, de ciência e de tecnologia, entre outras. Todos estes elementos estão envolvidos com a geração e difusão de conhecimento para a inovação dentro de um sistema econômico (FREEMAN, 1987; LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993; FURTADO et al., 2011).

No Sistema Nacional de Inovação, a palavra “Nacional” diz respeito aos limites geográficos do sistema (MENDES, 2015; LUNDVALL, 1992).

Nas definições de FREIRE (2002) e CARLSSON et al., (2002), os Sistemas Setoriais de Inovação (SSI) devem ser considerados como uma rede de agentes que interagem em uma área tecnológica específica, de uma dada “indústria” ou “setor”, objetivando gerar, difundir e utilizar tecnologias, dando ênfase nas relações sistêmicas na absorção de conhecimentos concernentes à inovação.

Nesta seção será abordada a evolução do Sistema Nacional de Inovação do Setor Sucroenergético no Brasil, mais especificamente, o desenvolvimento do setor, as políticas públicas empregadas em sua promoção, as organizações e atores chave envolvidos, bem como as interações entre eles.

Os principais atores dos sistemas de inovação nacionais têm sido o governo, a indústria, as universidades e institutos de pesquisa.

As seções seguintes descrevem o papel de cada um destes atores do sistema de inovação do setor sucroenergético no Brasil.

3.2.1 O papel do Estado

O governo brasileiro se envolveu de forma decisiva no progresso do setor de açúcar e álcool no país.

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Já no início do século XX, o governo tentava estimular a indústria de açúcar a produzir álcool, com o intuito de buscar soluções para a produção excedente de açúcar e para o fardo pesado da importação da gasolina. Em 1923, o governo brasileiro, através do Instituto Nacional de Tecnologia, criou um programa para experimentar o etanol puro como combustível em motores do ciclo Otto, para criar um novo mercado ao setor açucareiro. Nesta época, um veículo Ford movido a álcool hidratado participou da primeira corrida de automóveis realizada pelo Automóvel Clube do Brasil (CORREIA, 2007).

Na primeira metade do século XX, em 1931, o governo definiu políticas para promover a produção e consumo de etanol de cana-de-açúcar, estabelecendo a mistura de 5% de etanol na gasolina importada (WALTER et al., 2014; CORREIA, 2007; MAIA, 2009).

Entre 1930 e 1975, a média de adição de etanol à gasolina comum, estabelecida pelos dispositivos legais, foi em torno de 7,5% (MAPA, 2011). A Tabela 1 apresenta os percentuais de mistura até 2012.

Tabela 1: Mistura de álcool anidro na gasolina

Fonte: Anuário SINDICON 2013, citando o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) Valores em porcentagem Mês/Ano 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Janeiro 24 20 24 25 25 25 25 23 25 25 25 25 20 Fevereiro 24 20 24 20 25 25 20 23 25 25 20 25 20 Março 24 20 24 20 25 25 20 23 25 25 20 25 20 Abril 24 20 24 20 25 25 20 23 25 25 20 25 20 Maio 24 20 24 20 25 25 20 23 25 25 25 25 20 Junho 24 22 24 25 25 25 20 23 25 25 25 25 20 Julho 24 22 25 25 25 25 20 25 25 25 25 25 20 Agosto 20 22 25 25 25 25 20 25 25 25 25 25 20 Setembro 20 22 25 25 25 25 20 25 25 25 25 25 20 Outubro 20 22 25 25 25 25 20 25 25 25 25 20 20 Novembro 20 22 25 25 25 25 23 25 25 25 25 20 20 Dezembro 20 22 25 25 25 25 23 25 25 25 25 20 20 Média ano 22,3 21,2 24,5 23,3 25,0 25,0 20,9 24,0 25,0 25,0 23,8 23,8 20,0

Durante o ano de 2013, o percentual de etanol anidro na gasolina comum foi fixado em 25% (Portaria MAPA no 105), em 2014 a Lei 13.033/2014 autorizou o Poder Executivo a elevar o percentual até o limite de 27,5%, desde que constatada a viabilidade técnica, ou redução a 18%, em caso contrário (Lei publicada no DOU no 185, de 25 de setembro de 2014) e em 2015 o percentual obrigatório de etanol anidro combustível na gasolina comum

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foi fixado em 27%, conforme Portaria no 75, de 5 de março de 2015, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e Resolução no 1, de 4 de março de 2015, do Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (CIMA).

Em 1933 foi criado o Instituto do Açúcar e Álcool (IAA) (FONSECA et al., 2007), através do qual o governo pode intervir no setor de açúcar e álcool. O IAA definia quotas de produção de açúcar e fixava preços. Estas intervenções do governo duraram até os anos de 1990. O IAA também esteve envolvido em programas de modernização do setor e de promoção da produção de etanol, para estimular o rápido crescimento da produção de cana-de-açúcar e do biocombustível que foi observado em meados dos anos de 1970. Com relação a novas variedades de cana, o IAA implementou o Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar (PLANALSUCAR) (FRONZAGLIA e MARTINS, 2006; FONSECA et al., 2007; UEKI, 2007).

O choque do petróleo ocorrido em 1973 motivou o governo federal a lançar, em 1975, o Proálcool - como parte de sua política de combustível automotivo. O Decreto número 76.593, de 14 de novembro de 1975, declarou que a produção de etanol de cana-de-açúcar, mandioca e outras matérias primas seria estimulada através da expansão no fornecimento de insumos, com especial ênfase no aumento da produção agrícola, na modernização e expansão das destilarias existentes e instalação de novas unidades de produção (UEKI, 2007, MAIA, 2009).

O programa Proálcool teve duas fases. A primeira, entre 1975 e 1979, tinha o objetivo de converter o açúcar excedente em álcool anidro, em resposta ao baixo mercado mundial de açúcar, bem como ao elevado preço do barril de petróleo. A Petrobras, nesta fase, misturava o etanol anidro na gasolina em 22% e distribuía este combustível para uso em veículos movidos à gasolina (UEKI, 2007; COSTA, 2008). Em 1979, a FIAT lança no mercado brasileiro o primeiro automóvel movido exclusivamente a etanol hidratado, um modelo do FIAT 147.

Na segunda fase do Proálcool, entre 1979 e 1985, com a segunda crise do petróleo, o programa colocou ênfase na expansão da produção de álcool hidratado utilizando destilarias autônomas de etanol. Durante este período, veículos movidos exclusivamente a etanol foram introduzidos no mercado doméstico (UEKI, 2007).

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Em 1985, o cenário internacional do mercado petrolífero foi alterado. Os preços do barril de óleo bruto caíram de um patamar de US$ 30 a US$ 40 para um nível de US$ 12 a US$ 20. Este novo período, denominado “contra-choque do petróleo”, colocou em xeque os programas de substituição de hidrocarbonetos fósseis e de uso eficiente da energia em todo o mundo. Na política energética brasileira, seus efeitos foram sentidos na segunda metade dos anos 1980, coincidindo com um período de redução dos recursos públicos para subsidiar a expansão do Proálcool e com a evolução favorável dos preços do açúcar no mercado internacional. Nesta época, iniciou-se um processo de estagnação do Proálcool (COSTA, 2008). Os baixos preços pagos aos produtores de álcool a partir da abrupta queda dos preços internacionais do petróleo (que se iniciou no final de 1985) impediram a elevação da produção interna do produto. Por outro lado, a demanda pelo etanol, por parte dos consumidores, continuou sendo estimulada por meio da manutenção de preço relativamente atrativo ao da gasolina e da manutenção de menores impostos nos veículos a álcool comparados aos à gasolina. Essa combinação de desestímulo à produção de álcool e de estímulo à sua demanda, pelos fatores de mercado e intervenção governamental assinalados, gerou a crise de abastecimento da entressafra em 1989-1990.

A escassez de etanol em 1989/1990, gerada pelo desabastecimento do vasto mercado nacional que havia sido criado, levou a uma extrema queda nas vendas de carros a álcool, impactando significativamente o consumo de etanol hidratado durante a década de 1990 (WALTER et al., 2014, CORREIA, 2007; COSTA, 2008). As vendas de carros a álcool atingiram níveis entre 88% e 96% das vendas totais de veículos de ciclo Otto para o mercado interno entre 1983 e 1988, no auge do programa, caindo para 13% no início dos anos 1990 e a praticamente zero entre 1997 e 1998 (CORREIA, 2007). Apesar de seu caráter efêmero, a crise de abastecimento de álcool do fim dos anos 1980 afetou a credibilidade do Proálcool.

Na Era Collor (1990 a 1992), dada à aderência do governo aos postulados neoliberais consolidados no Consenso de Washington – cujas 10 diretrizes convergem para a drástica redução do papel do Estado na economia e abertura às importações de bens e serviços e à entrada do capital de risco no país (UNICAMP, 2007) - houve uma mudança radical na forma de ver os incentivos e serviços dados à produção sucroalcooleira e iniciou-se um processo de gradativa desregulamentação do setor. Uma das primeiras ações foi extinguir o IAA e abolir o sistema de quotas de produção.

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Em 1990 o IAA foi extinto, o governo liberou os preços do etanol anidro a partir de 1º de maio de 1997 (portaria MF no 294 de 13 de dezembro de 1996) e do álcool hidratado para fins carburantes e não carburantes, da cana-de-açúcar, do açúcar cristal e do mel residual, em 1º de fevereiro de 1999 (portaria MF/MME no 275 de 16 de outubro de 1998) (MORAES, 2000). Os mercados de álcool combustível, tanto anidro quanto hidratado, ficaram liberados em todas as suas fases de produção, distribuição e revenda sendo os seus preços determinados pelas condições de oferta e procura. Atualmente, o governo controla somente o percentual de etanol misturado à gasolina, que varia entre 18% a 27%4, com base na

avaliação do equilíbrio oferta/demanda (WALTER et al., 2014, com adaptações da autora). Cabe salientar que, desde a década de 1980, o teor de etanol anidro em toda a gasolina comercializada nos postos revendedores esteve acima de 20% (BNDES e CGEE, 2008). Com o processo de desregulação, o Proálcool foi encerrado.

Em 2003, foram lançados os veículos flex-fuel no Brasil e o consumo doméstico de etanol voltou a crescer. Nesta fase, o etanol passou a ser consumido como combustível alternativo à gasolina. Em 2005, estes veículos já representavam 49% dos automóveis vendidos no Brasil. Os veículos flex-fuel mudaram completamente o comportamento dos consumidores e dos produtores de etanol. Os consumidores passaram a escolher o combustível mais barato para seus veículos diretamente nos postos de abastecimento. Os produtores, monitorando os preços de etanol e açúcar, podiam decidir qual dos dois produtos possibilitaria a maximização dos seus lucros (UEKI, 2007).

4Desde 16 de março de 2015 o percentual obrigatório de etanol anidro combustível na gasolina comum é de

27%, conforme Portaria no 75, de 5 de março de 2015, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

(MAPA) e Resolução no 1, de 4 de março de 2015, do Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool

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3.2.1.1 A crise do setor energético a partir de 2008 – inovação, trajetória, perspectivas e mercado

A partir de 2008, devido aos desdobramentos da crise financeira mundial iniciada nos Estados Unidos, o setor sucroenergético entrou em crise e, em 2011, a produção de álcool foi drasticamente reduzida. WALTER et al. (2014) listam como fatores importantes que contribuíram para isto: as usinas tradicionais, devido a restrições financeiras, passaram a investir menos na cadeia produtiva, em especial pela redução abrupta do crédito, que era abundante até então, e o rendimento da cana-de-açúcar caiu; novos players entraram no setor comprando as empresas quebradas financeiramente, os quais não investiram em novas plantas industriais ou no crescimento da área plantada; condições climáticas adversas; os altos preços do açúcar no mercado internacional entre a segunda metade de 2009 e julho de 2011; preços da gasolina foram controlados desde 2008 para evitar a inflação, reduzindo a competitividade do etanol combustível e o apelo da produção do etanol. Como resultado, grande parte das empresas encontrava-se muito endividada, cenário que foi potencializado pelo aumento da oferta mundial de açúcar que se iniciou na safra 2010/2011 e se estendeu até 2014/2015.

De modo geral, o fornecimento de etanol não cresceu de acordo com o potencial de demanda da frota flex-fuel no Brasil e, como consequência, os preços do etanol subiram, mas, para que o combustível fosse viável, o preço deveria ser limitado em 70% do preço da gasolina. Os investimentos para aumentar o fornecimento de cana-de-açúcar e produzir mais etanol foram reduzidos. Somente a partir de 2011 foram tomadas ações como o fornecimento de crédito para os produtores de cana (WALTER et al., 2014). Entretanto, os créditos liberados pelo BNDES (em torno de R$3 bilhões) são baixos para as necessidades do setor. Por exemplo, se fossem aplicados à renovação do canavial, seriam suficientes para a renovação de somente 500.000 ha, cerca de 1/3 do que precisa ser renovado anualmente (LEAL, 2016).

A Figura 1 apresenta a evolução da produção de etanol no Brasil (hidratado e anidro) de 1970 a 2014. A Figura mostra o acentuado crescimento no volume de produção de álcool a partir de 1979, devido ao surgimento dos veículos movidos exclusivamente a álcool, e uma

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relativa estagnação da produção a partir de 1985, quando também se inicia a estagnação do Proálcool. Uma profunda queda da produção é verificada ao final dos anos 1990, com o volume de veículos movidos a álcool atingindo praticamente zero. Nos anos 2003 a 2008, há uma ascenção na produção do combustível, devido ao sucesso dos veículos flex-fuel. Atualmente, os veículos flex-fuel são a principal força-motriz do consumo doméstico de etanol, representando mais de 90% dos carros novos vendidos.

De 2014 a 2015 não houve mudança na produção de etanol (BRASIL, 2015) e os maiores players do setor são Copersucar, Raízen e Biosev.

A Figura 2 mostra a participação em volume do etanol combustível em veículos leves, em percentual, com relação à gasolina. Desde 2009, esta participação vem sendo reduzida devido à crise instalada a partir de 2008. A maior participação foi ao final dos anos 1980, logo antes da crise de abastecimento do combustível, quando o Proálcool e a venda de carros movidos exclusivamente a álcool estavam no auge. Após, a participação do álcool foi se reduzindo (os usineiros passaram a exportar açúcar) e a da gasolina aumentando, dada a queda do preço do petróleo. A ascenção só é retomada nos anos subsequentes a 2003, devido ao crescimento da frota de veículos flex-fuel.

Figura 1: Volume de produção de etanol no Brasil de 1970 a 2014.

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Figura 2: participação do etanol combustível em veículos leves no Brasil, em percentual com relação à gasolina.

Fonte: elaboração própria, a partir de dados do Balanço Energético Nacional (EPE, 2015).

3.2.1.2 A recuperação do setor

No primeiro semestre de 2015, é observada a elevação do consumo do álcool no Brasil, devido ao reajuste do preço da gasolina, somado a um momento favorável para o aumento das exportações do açúcar, beneficiado pela valorização do dólar frente ao real, dando competitividade ao Brasil em relação a outros países e resultando em uma onda de crescimento para o setor sucroalcooleiro. Entretanto, a previsão é a de falta do etanol combustível no mercado doméstico, dada a demanda crescente por veículos flex-fuel. Segundo as previsões do Ministério de Minas e Energia (MME), haverá uma carência de combustíveis de Ciclo Otto5 em menos de uma década. O setor está aguardando um

posicionamento do governo quanto à participação do etanol na matriz energética para dar próximos passos.

5Ciclo Otto: ciclo termodinâmico, do funcionamento de motores de combustão interna de ignição por centelha,

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São necessários, portanto, investimentos no setor sucroenergético para possibilitar sua expansão e atendimento da demanda por etanol, bem como da demanda por energia elétrica, através da cogeração6, tendo em vista a crise do setor elétrico vigente, além da demanda de

açúcar, pois há a percepção de que haverá um déficit deste produto em 2016 e 2017, após o superávit ocorrido desde a safra 2010-2011.

Além disso, no mercado internacional, a demanda por etanol de cana-de-açúcar também tende a crescer. Nos EUA, foi estabelecida uma política para os combustíveis renováveis em 2009, visando a introdução de uma parcela crescente de biocombustíveis avançados, que reduzem as emissões de gases do efeito estufa (GEE) em pelo menos 50% em relação à gasolina. Apenas o etanol de cana-de-açúcar satisfaz estes requisitos, posicionando o Brasil como o principal fornecedor para suprir esta demanda. Além dos EUA, outros países introduzem o etanol na matriz energética e o déficit entre a oferta e a demanda mundial desse produto abre uma oportunidade para o Brasil como importante fornecedor. Além dos investimentos em expansão, o setor também precisa passar por avanços tecnológicos, que repercutam em ganhos de produtividade. Dentre estes avanços, um dos mais importantes atualmente é o etanol celulósico, que utiliza a celulose do bagaço e da palha de cana-de-açúcar como matéria-prima, possibilitando um aumento de rendimento de cerca de 40% na produção de álcool utilizando a mesma área plantada (VELRAEDS, 2015). Adicionalmente, o etanol 2G tem menores emissões de GEE do que o etanol 1G, vindo a atender as demandas por redução destas emissões e aumento da segurança energética.

No Brasil, as políticas governamentais relacionadas à pesquisa e desenvolvimento (P&D) do etanol celulósico se iniciaram na década de 1970, sendo que a primeira iniciativa ocorreu em 1977 na Fundação de Tecnologia Industrial (FTI) em Lorena, com pesquisa sobre hidrólise ácida com ácido sulfúrico concentrado e madeira como matéria-prima. A partir de então, outras pesquisas de hidrólise ácida continuaram a ser desenvolvidas, como o projeto da COALBRA (Coque e Álcool da Madeira S/A), empresa pública vinculada ao Ministério da Agricultura que implementou tecnologia estrangeira (processo

6 Cogeração é a produção simultânea e de forma sequenciada, de duas ou mais formas de energia, a partir de um único combustível. O processo mais comum é a produção de eletricidade e energia térmica (calor ou frio) a partir do uso de gás natural e/ou de biomassa, entre outros.

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Madison) a partir da importação da planta pronta (turn key), também utilizando madeira como matéria-prima. No entanto, já na década de 1980, a empresa foi extinta e o projeto interrompido, dado que seus resultados indicaram sua inviabilidade.

3.2.1.3 A curva de aprendizado do etanol

Além de viabilizar a produção de etanol no Brasil, um dos resultados positivos da implantação do Proálcool consistiu no aumento dos investimentos em P&D (FONSECA et al., 2007). Este último tipo de investimentos vem permitindo a ampliação da base produtiva diversificada da indústria, bem como o desenvolvimento de novas variedades de cana-de-açúcar - variedades mais produtivas e com maior capacidade de transformação de cana-de-açúcar. Os investimentos em novas variedades de cana já existiam desde o início do Planalsucar, que foi o programa criado pelo antigo IAA, mencionado anteriormente.

Em meados de 1980, quando o subsídio ao álcool começou a cair, foi ficando mais difícil competir com a gasolina e as usinas buscaram ganhar eficiência.

Os esforços produtivos e os ganhos de rentabilidade obtidos à época do Proálcool asseguraram uma confortável base competitiva para a agroindústria de açúcar e álcool mesmo após o fim deste Programa e após a demanda de álcool voltar a cair e o mercado da

commodity açúcar voltar a ser a principal referência para os produtores brasileiros. Mais

importante, ao final do período de intervenção estatal, a agroindústria sucroalcoleira brasileira passou a contar com um importante sistema de pesquisa e desenvolvimento, um sistema que articula instituições privadas e públicas de forma inédita no Brasil (FONSECA et al., 2007).

O aumento na competitividade do etanol de cana-de-açúcar no Brasil foi contínuo nas últimas três décadas (GOLDEMBERG et al., 2004; VAN DEN WALL BAKE et al., 2009; LAGO et al., 2012; VAN DEN WALL BAKE, 2006). No período de 1974 a 2004, os custos de produção de cana-de-açúcar foram reduzidos em 60%, os custos de produção do etanol hidratado em 70% e os custos totais de produção do etanol hidratado também em 70% (VAN

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DEN WALL BAKE et al., 2009). A evolução dos custos totais do etanol hidratado é mostrada através da curva de aprendizado da Figura 3.

Figura 3: Curva de experiência do etanol hidratado (custos totais: produção da matéria-prima e produção industrial do etanol)

Fonte: VAN DEN WALL BAKE et al. (2009)

A Figura 4 mostra maiores detalhes deste aprendizado. De 1975 a 2008, a produtividade do etanol por área de cana plantada aumentou em 125%. A produtividade da produção da açúcar cresceu em 65,6%. Os custos tanto do etanol como da cana-de-açúcar foram reduzidos em 69% no período.

As Figuras 3 e 4 refletem os esforços de pesquisa, desenvolvimento e inovação realizados nos períodos.

Conforme explicado por Goldenberg (2004), desde a criação do Proálcool em 1975 os preços do etanol praticados pelos produtores eram determinados pelo governo federal, que concedia subsídio aos produtores. Os preços só foram liberados em 1997 para o etanol anidro e em 1999 para o etanol hidratado, como exposto anteriormente.

Os custos de produção do etanol eram próximos a US$100 o barril nos estágios iniciais do Programa, em 1980. Até 1985, à medida que a produção crescia, os preços pagos aos produtores refletiam custos médios de produção, determinados pelo governo através da Fundação Getúlio Vargas. Durante esta fase inicial, os preços caíram lentamente refletindo

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os ganhos de produtividade agroindustrial e de economia de escala capturada pelos produtores, os quais eram transferidos aos consumidores através de um esquema de regulação de preços. Após 1985, entretanto, os preços foram fixados abaixo dos custos médios de produção, enquanto o governo federal tentava frear a inflação através do controle dos preços públicos, inclusive dos combustíveis. Devido a este fator e a economias de escala, o custo caiu muito rapidamente, conforme mostrado nas curvas de aprendizado das Figuras 3 e 4. No médio e longo prazo, a elevada competição na atividade do etanol fez com que os preços fossem movidos em direção aos custos de produção.

Figura 4: Crescimento nos rendimentos e redução nos custos de produção para produtos da agroindústria brasileira de cana-de-açúcar de 1975 a 2008.

Fonte: LAGO et al. (2012)

Desta forma, nos estágios iniciais do Proálcool, o uso do etanol tornou-se viável aos consumidores devido à política de preços aplicada aos combustíveis no Brasil (o etanol tinha preços fictícios devido aos subsídios aplicados). À medida que a produção de etanol se tornou eficiente e competitiva, os preços foram liberados e o mercado tornou-se de livre concorrência. Com esta desregulamentação do setor a partir dos anos 1990, as usinas mais competitivas sobreviveram, as quais buscaram expansão no mercado internacional de açúcar, devido à estagnação do mercado de etanol. A Figura 5 apresenta a curva de crescimento das exportações de açúcar a partir de 1990, passando de 926 mil toneladas em 1990 para 27 milhões em 2013.

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0 5000 10000 15000 20000 25000 30000 1989 1991 1993 1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013

Quantidade (MIL T)

Figura 5: Evolução da quantidade de açúcar brasileiro exportado, por ano civil.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Anuário Estatístico da Agroenergia, 2009 e 2014 – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Obviamente, o aumento na produção e exportação de açúcar influencia fortemente o preço do etanol, dado que o aumento de volume do primeiro produto acarreta redução do segundo, e, consequentemente, o aumento de preço do segundo, refletindo as condições de oferta e demanda. Entretanto, segundo Melo e Sampaio (2016), nos últimos 15 anos a relação de preços entre etanol e açúcar caiu cerca de 60%.

Vale ressaltar que foi o álcool a força motriz para o aumento da competitividade. Entretanto, toda eficiência ganha no álcool também foi transferida para o açúcar, fazendo o Brasil aumentar em competitividade nos 2 produtos, tornando-se o maior produtor e exportador mundial de açúcar, o maior produtor de etanol até 2005, quando os EUA assumiram a liderança, e o maior exportador de etanol, posição esta tomada pelos EUA em 2011, perdida novamente um ano depois e recuperada em 2014 (NOVACANA, 2015).

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3.2.1.4 Outras ações do Estado que impactaram a inovação em biocombustíveis

Na década de 1990, a Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/1996) consistiu em uma política pública importante para os esforços de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) no país, dado que regula direitos e deveres em relação à propriedade industrial, no que tange à concessão de patentes, modelos de utilidade, desenho industrial, marca e indicações geográficas. Sendo importante à PD&I, também impacta no desenvolvimento de biocombustíveis avançados.

No entanto, foi na última década que a inovação passou a fazer parte efetivamente da agenda governamental, dada a criação de mecanismos públicos de incentivo à inovação, como a Lei de Inovação (Lei 10.973/2004) e da Lei do Bem (Lei 11.196/2005), bem como a disponibilização de maiores orçamentos e atenção do governo às entidades que promovem, regulam e avaliam os esforços em inovação (CORRÊA, 2014).

A Lei de Inovação cria incentivos à pesquisa científica e tecnológica e à inovação no sistema produtivo, estimulando inventores independentes, empresas e a participação de ICTs no processo inovativo. Além disso, estabelece que cada ICT deve criar um NIT (Núcleo de Inovação Tecnológica) para cuidar da proteção da propriedade intelectual da ICT. Este é um ponto fundamental, dado que a propriedade intelectual é essencial para viabilizar as parcerias entre indústrias, ICTs e outras instituições, além de atrair e estimular os investimentos nacionais e estrangeiros. Este entendimento é consagrado nos países desenvolvidos, mas relativamente recente nos países em desenvolvimento, os quais, em geral, possuem um baixo volume de patentes próprias (de residentes e não de estrangeiros depositantes no país).

A Lei do Bem concede incentivos fiscais às pessoas jurídicas que realizarem pesquisa e desenvolvimento com inovação tecnológica, tanto internamente como em parceria com ICTs. Com isso, busca aproximar as empresas das universidades e institutos de pesquisa, potencializando os resultados em P&D.

Em 2004 foi inaugurado no campus da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ), da Universidade de São Paulo (USP), o Polo Nacional de Biocombustíveis, pelo então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Ministro da Agricultura e o Diretor da ESALQ. Este programa deveria ter tido papel chave na coordenação de esforços, definição de

Referências

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