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“Jesus vai voltar e eu não aprendo a ler”: práticas de leitura e escrita de mulheres em condição de analfabetismo

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CURSO DE MESTRADO

LINHA DE PESQUISA EDUCAÇÃO E LINGUAGEM

JOSEMAR GUEDES FERREIRA

“JESUS VAI VOLTAR E EU NÃO APRENDO A LER”:

PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DE MULHERES EM CONDIÇÃO DE ANALFABETISMO

Recife 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CURSO DE MESTRADO

LINHA DE PESQUISA EDUCAÇÃO E LINGUAGEM

JOSEMAR GUEDES FERREIRA

“JESUS VAI VOLTAR E EU NÃO APRENDO A LER”:

PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DE MULHERES EM CONDIÇÃO DE ANALFABETISMO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientadora: Drª. Eliana Borges Correia de Albuquerque.

Recife 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

JOSEMAR GUEDES FERREIRA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

TÍTULO: “JESUS VAI VOLTAR E EU NÃO APRENDO A LER”: PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DE MULHERES EM CONDIÇÃO DE ANALFABETISMO.

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________________ Profa Dra. Eliana Borges Correia de Albuquerque

1a Examinadora/Presidente

______________________________________________ Profa. Dra. Dayse Cabral de Moura

2a Examinadora

______________________________________________ Profa. Dra. Andréa Tereza Brito Ferreira

3a Examinadora

______________________________________________ Profa. Dra. Ana Maria de Oliveira Galvão

MENÇÃO DE APROVAÇÃO: APROVADO

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Essa é a importância de eu querer saber ler: é pra ler a Bíblia.

Eva (aluna da pesquisa)

Eu vou aprender, sim, a ler, para cantar hino na igreja.

Ana (aluna da pesquisa)

Eu queria tá lendo, assim, a Palavra, pra passar [...] o amor de Deus.

Rebeca (aluna da pesquisa)

Eu gostaria de ler [...] tudo.

Sara (aluna da pesquisa)

Já estou com idade avançada, só quero mesmo aprender a ler. Tudo isso, só que eu quero

Rute (aluna da pesquisa)

Jesus vai voltar e eu não aprendo a ler!

Raquel (aluna da pesquisa)

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5 A Deus, em quem “estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento”. (Colossenses 2:3)

Às seis mulheres da pesquisa, cuja sabedoria e conhecimento são um tesouro para mim.

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AGRADECIMENTOS

A meu Deus, pois nele encontro o sentido da minha existência e vida e somente em quem nos tornamos verdadeiramente humanos.

À Profa. Doutora Eliana Borges Correia de Albuquerque, estimada e competente orientadora, que me ajudou antes mesmo do mestrado e sem suas preciosas contribuições e direção seria muito mais difícil a conclusão desta pesquisa.

À Profa. Doutora Andréa Tereza Brito Ferreira, pela amizade, pela atenção sempre dispensada e pelas valiosas orientações, quando da qualificação deste trabalho.

À Profa. Doutora Dayse Cabral de Moura, pela amizade, por ter permitido acompanhá-la em suas aulas de EJA e nos encontros do grupo de estudo e pelas orientações durante a qualificação desta pesquisa.

À Profa. Doutora Ana Maria de Oliveira Galvão, por atender prontamente ao convite de participar da defesa desta pesquisa, pelas suas orientações esclarecedoras e por contribuir para minha formação acadêmica com os seus trabalhos.

Às mulheres da pesquisa, que são para mim companheiras de fé e mães e sem as quais esta pesquisa simplesmente não existiria.

À professora alfabetizadora, que me permitiu observar suas aulas, pela sua colaboração na realização deste trabalho e pela sua atenção e respeito para comigo.

Ao Pr. Adrian Stewart, pela sua amizade e ajuda na construção do abstract.

A amada Irly da Silva Ferreira, mulher, esposa, mãe, companheira de fé e presente de Deus para mim.

A Ana Sophia Guedes Ferreira e Ana Carolina Guedes Ferreira, minhas filhas, que, apesar de não saberem ainda a dimensão deste empreendimento, elas nem imaginam o quanto me ajudaram.

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7 Aos meus pais, Manoel Patrocínio Ferreira e Darcy Guedes Ferreira (em memória), que sempre me amaram e me educaram incondicionalmente. A ambos, a minha honra e dívida eternas.

A meus irmãos e as minhas irmãs, que carrego no coração, Wylma Guedes Ferreira do Nascimento, Uilza Guedes Ferreira Carvalho, Jean Guedes Ferreira, Leile Guedes Ferreira, Manoel Patrocínio Ferreira Júnior e seus respectivos esposos, esposa, filhos e filhas.

A Ivonete Bastos Ferreira, pela atenção e frutíferos debates.

Aos professores e às professoras do curso de Pedagogia da UFPE e do Mestrado, especialmente ao Professor Doutor Artur Gomes de Morais e à Profa. Doutora Magna do Carmo Silva Cruz, pela sua simplicidade e comentários esclarecedores.

À Profa. Doutora Célia Maria Rodrigues da Costa Pereira, por sua simplicidade e competência, pela amizade, pelo constante estímulo e por ter contribuído significativamente para o meu amadurecimento no exigente caminho da pesquisa científica.

Aos colegas e às colegas do curso de Pedagogia, especialmente Aldenize (em memória), Daniela Luiza Lemos Machado, Jane Rafaela Pereira da Silva e Vânia Rocha da Silva.

À amiga e Profa. Cristiana Vasconcelos do Amaral e Silva (Cris), que sempre demonstrou, em nossa caminhada, preciosas qualidades como humildade, cortesia, serviço abnegado, respeito e competência profissional.

À UFPE, enquanto instituição e aos funcionários e às funcionárias, especialmente os (as) de Serviços Gerais, os (as) da Secretaria do Programa de Pós-Graduação em Educação, os (as) do laboratório, e os (as) da Biblioteca, notadamente Adilson dos Ramos, Ênio Barbosa de Lima, Francisco Bezerra de Lima, Kátia Tavares e Maria das Neves Maranhão, sempre atenciosos (as) e competentes profissionais.

Ao CNPq, pelo financiamento da pesquisa.

À Igreja Evangélica Congregacional em Cajueiro Seco, pela amizade, cuidado, compreensão, companheirismo na fé e intercessão constante em meu favor.

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8 Ao Seminário Teológico Congregacional do Nordeste, pela amizade, confiança e oportunidades na minha iniciação à pesquisa, em especial ao Pr. Glenn Thomas

Every-Clayton e a Profa. Joyce Elizabeth Winifred Every-Clayton.

À Igreja Evangélica Congregacional em Juazeiro – BA, que sempre cooperou comigo no sentido mais amplo dessa palavra, e Cleunice David de Sena (Nicinha), amiga, companheira de fé, intercessora, cujo cuidado comigo é mesmo como de uma mãe.

À Igreja Evangélica Congregacional em Juazeiro V, na cidade de Juazeiro – BA, por ter me ensinado, na prática, a vivência dos ensinos de Jesus Cristo.

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LISTA DE SIGLAS

CONFINTEA- Conferência Internacional de Educação de Adultos EJA – Educação de Jovens e Adultos

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IEC – Igreja Evangélica Congregacional

INAF – Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional JA – Jovens e Adultos

LDB – Lei de Diretrizes e Bases

MEC– Ministério da Educação e Cultura

MOBRAL- Movimento Brasileiro de Alfabetização PBA – Programa Brasil Alfabetizado

PIBIC - Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica PLE - Práticas de Leitura e Escrita

SEA - Sistema de Escrita Alfabética

UNESCO– Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UFPE – Universidade Federal de Pernambuco

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RESUMO

A presente pesquisa buscou analisar as práticas de leitura e escrita de mulheres analfabetas no contexto da escola e da igreja. A metodologia utilizada teve como fundamento teórico e prático uma abordagem de natureza qualitativa. Os sujeitos da pesquisa corresponderam a 6 (seis) mulheres alunas do Programa Brasil Alfabetizado e a professora da turma que elas frequentavam, em uma comunidade de Jaboatão dos Guararapes-PE. Como procedimentos metodológicos, realizaram-se observações de aulas e observações das práticas de leitura e escrita de três dessas mulheres no âmbito da igreja; entrevistas com as alunas sujeitos da pesquisa e com a professora; aplicação de uma atividade diagnóstica de escrita de palavras no início e no final do período de escolarização e análise de documentos (das atividades no caderno e no livro didático adotado). Os dados da pesquisa revelaram que as alunas, ao ingressarem no Programa, já tinham conhecimentos sobre a escrita e se encontravam na hipótese silábico-alfabética de acordo com a abordagem da Psicogênese da língua escrita. Além disso, observou-se que as mulheres lidavam com a leitura, muito mais que a escrita, no seu dia-a-dia, em diversos eventos de letramento. Na escola elas se depararam com atividades pedagógicas que não as ajudaram a avançar em seus conhecimentos, uma vez que a maioria delas concluiu o ano na mesma hipótese de escrita que possuíam ao ingressar no Programa. As atividades de alfabetização se baseavam no trabalho com uma palavra geradora extraída de um texto ou de uma situação de conversa e, com base nessa palavra, eram realizadas principalmente atividades de escrita no quadro pela professora de outras palavras que começavam com a mesma letra para que as alunas copiassem e a separação silábica de algumas das palavras. Assim, as atividades envolviam basicamente a memorização e cópia de palavras. Em relação à leitura de textos, ela não era realizada diariamente. Em apenas 12 (doze) aulas, das 31 (trinta e uma) observadas, houve leitura de textos, retirados, muitos deles, do livro didático que os alunos receberam. No geral, a professora lia o texto, fazia uma discussão da temática e depois trabalhava alguma palavra chave do texto. A alfabetizadora não proporcionou às alunas a leitura de textos que faziam parte de suas experiências fora da escola, no caso, na igreja, ou leitura de textos que poderiam ser interessantes para ampliar as experiências de letramento das alunas, como os literários. Atividades de produção de textos não foram vivenciadas ao longo das observações. Enfim, a análise dos dados da pesquisa apontou que as mulheres analfabetas possuíam conhecimentos de mundo, que envolviam também aqueles relacionados com o sistema de escrita e seus usos, mas ao concluírem o Programa Brasil Alfabetizado, suas expectativas de aprender a ler e escrever não foram atendidas e elas continuavam se achando analfabetas ou, no caso de duas delas, tomaram consciência desse estado. Nessa perspectiva, propostas de formação de professores que contemplem a construção de práticas de alfabetização, na Educação de Jovens e Adultos, que priorizem tanto as atividades de leitura e produção de textos, como aquelas relacionadas com a apropriação da escrita alfabética, precisam ser efetivamente desenvolvidas.

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ABSTRACT

This research sought to analyse the reading and writing practices of illiterate women in the context of school and church. The basis of the methodology, both in theory and practice, was an approach of qualitative nature. The subjects of the study were six women, students of the

Brazilian Literacy Programme plus the teacher of the class they attended, based in a

community of Jaboatão dos Guararapes – PE. In terms of methodological procedures: classroom observations were conducted; observations of reading and writing practices of three of the women in a church context; interviews with the research subjects and their teacher; the application of a diagnostic test for writing at the beginning and end of their period of schooling, and the analysis of documents (from their work as prescribed by the workbook they used). The results of the survey showed that, on entering the study programme, they already had some writing knowledge and were in the alphabetical syllabic stage according to the Psychogenesis approach to written language. Furthermore, it was observed that the women dealt with reading, much more than with writing, in their daily life, in a variety of literary moments. At the school they encountered educational activities which did not help to advance their understanding, since most of them concluded the year at the same writing stage as they had when they joined the study programme. Literacy activities were based on exercises with a generative word taken from a text or conversation, and, using the word as a basis, the teacher conducted writing activities, principally on the board, writing other words which began with the same letter so that the pupils could copy them noting the syllabic separation of some of the words. In this way the classroom exercises basically involved the memorization and copying of words. As to the reading of texts, this was not a daily occurrence. There were readings of texts in only twelve of the thirty-one classroom observations, mostly taken from the workbook which the pupils had received. In general the teacher read the text, encouraged a discussion of the theme and then worked on a keyword from the text. The literacy teacher did not provide the students with the reading of texts that were part of their experiences beyond the school, for example, in the church, or the reading of texts that could have been helpful in expanding their literary experiences, as readers. Exercises to produce texts were not observed. Ultimately, the analysis of the survey data showed that the illiterate women had some understanding of the world which involved aspects related to writing and its uses, but in completing the Brazilian Literacy Programme their hopes of learning to read and right were not met and they continued to consider themselves illiterate, or, as in the case of two of the subjects, they became aware of this. From this perspective, proposals for teacher training which address the construction of literacy practices in youth and adult education, prioritizing both reading exercises and the production of texts, such as those related to the ownership of alphabetic writing, need to be effectively developed.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Diagnose inicial da aluna Eva (nível silábico-alfabético) ... 128

Figura 2:Diagnose inicial da aluna Sara (nível silábico-alfabético) ... 130

Figura 3:Diagnose inicial da aluna Rebeca (nível silábico-alfabético) ... 132

Figura 4:Diagnose inicial da aluna Raquel (nível silábico-alfabético)... 135

Figura 5:Diagnose inicial da aluna Rute (nível silábico-alfabético) ... 138

Figura 6:Diagnose inicial da aluna Ana (nível alfabético) ... 142

Figura 7: Diagnose final da aluna Eva (nível silábico-alfabético) ... 182

Figura 8: Diagnose final da aluna Sara (nível alfabético) ... 184

Figura 9: Diagnose final da aluna Rebeca (nível silábico-alfabético) ... 186

Figura 10: Diagnose final da aluna Raquel (nível silábico-alfabético) ... 188

Figura 11: Diagnose final da aluna Rute (nível silábico-alfabético) ... 190

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Perfil do sujeitos da pesquisa ... 78

Quadro 2: Quantitativo de aulas previstas e aulas dadas pela professora ... 89

Quadro 3: Quantitativo de aulas observadas ... 89

Quadro 4: Frequência e motivos de ausência das alunas às aulas ... 90

Quadro 5: Quantitativo de observações feitas na igreja ... 90

Quadro 6: Tópicos temáticos das entrevistas com cada aluna... 92

Quadro 7: Quantitativo de entrevistas feitas na igreja ... 93

Quadro 8: Como as mulheres se viram durante o PBA? ... 107

Quadro 9: O que as mulheres liam antes do PBA?... 110

Quadro 10: O que as mulheres escreviam antes do PBA ... 115

Quadro 11: O que as mulheres gostariam de ler ... 116

Quadro 12: Material que cada uma das mulheres gostaria de ler ... 117

Quadro 13: O que as mulheres gostariam de escrever... 121

Quadro 14: Proposta de prática de escrita pela professora ... 150

Quadro 15: Leituras feitas pela professora em sala de sala ... 169

Quadro 16: Atividades comuns nas tarefas de casa ... 174

Quadro 17: Proposta de prática de leitura pela professora ... 178

Quadro 18: O que as mulheres disseram sobre a prática pedagógica da professora ... 178

Quadro 19: Avanços das mulheres na leitura ... 194

Quadro 20: O não avanço das mulheres na leitura e na escrita ... 198

Quadro 21: Leituras realizadas na igreja ANTES do ingresso na escola ... 206

Quadro 22: Relação com a Bíblia e sua leitura ANTES do ingresso na escola ... 207

Quadro 23: Estratégias usadas na leitura daBíblia ANTES do ingresso na escola ... 208

Quadro 24: Dificuldades na leitura da Bíblia na igrejaANTES do ingresso na escola ... 211

Quadro 25: Estratégias usadas na leitura daBíblia APÓS do ingresso na escola ... 220

Quadro 26: Dificuldades na leitura da Bíblia na igreja APÓS o ingresso na escola ... 224

Quadro 27: Estratégias usadas na leitura do Hinário APÓS do ingresso na escola ... 226

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LISTA DE TABELA

Tabela 1 -Brasil: Evolução do analfabetismo entre pessoas de 15 anos ou mais–1920/2000. . 49 Tabela 2- Brasil: Evolução da população em milhões ... 50 Tabela3 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais, não – alfabetizados por sexo segundo os grupos de idade - 2000 ... 51

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LISTA DE ATIVIDADES

Atividade 1: Cópia do alfabeto ... 151

Atividade 2: Leitura e cópia de palavras ... 151

Atividade 3: Cópia de palavras ... 152

Atividade 4: Cópia de texto coletivo construído oralmente ... 153

Atividade 5: Oralização e escrita de palavras pelas alunas ... 156

Atividade 6: Formação de palavras a partir de sílabas ... 156

Atividade 7: Formação de frases ... 157

Atividade 8: Desenho e escrita de nome de figuras... 158

Atividade 9: Oralização e cópia de palavras ... 160

Atividade 10: Separação de palavras em sílabas ... 161

Atividade 11: Contagem de sílabas de palavras ... 162

Atividade 12: Escrita de palavras ditadas ... 163

Atividade 13: Não correção de “erros” ortográficos ... 173

Atividade 14: Formação de palavras com as letras do próprio nome ... 175

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LISTA DE IMAGENS

Imagem 1: Texto do Evangelho de João 3:16 ... 213

Imagem 2: Letra do Hino 333... 227

Imagem 3: Letra da música Diante da cruz ... 229

Imagem 4: Letras das músicas Rio de vida e Bendito serei ... 232

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 20

CAPÍTULO 1: REFERENCIAL TEÓRICO ... 27

1.1. O jovem e adulto analfabeto no Brasil: história, identidade e realidade escolar ... 27

1.1.1 Um panorama histórico da alfabetização de jovens e adultos no Brasil ... 27

1.1.2 Quem é o jovem e adulto analfabeto no Brasil e sua realidade escolar... 45

1.2 Alfabetização, letramento e EJA ... 55

1.3 Alfabetização e letramento: relação e especificidades ... 65

CAPÍTULO 2. FUNDAMENTOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 76

2.1 Caracterização e apresentação das mulheres da pesquisa, da professora da escola e professores (as) da igreja ... 76

2.1.1 Caracterização e apresentação das mulheres da pesquisa ... 76

2.1.2 Apresentação das mulheres sujeitos da pesquisa ... 79

2.1.3 Caracterização e apresentação da professora do Brasil Alfabetizado ... 80

2.1.4 Caracterização e apresentação dos professores da igreja ... 81

2.2 Apresentação dos espaços da pesquisa e suas caracterizações ... 82

2.2.1 A escola ... 82

2.2.2 A igreja ... 84

2.3 Fundamentos metodológicos ... 85

2.4 Procedimentos e instrumentos metodológicos ... 88

2.4.1 Observações ... 89

2.4.2 Entrevistas com os sujeitos ... 91

2.4.3 Diagnose ... 95

2.4.4 Análise de documentos ... 96

2.5 Análise dos dados ... 96

CAPÍTULO 3. MULHERES ADULTAS “ANALFABETAS” E/OU POUCO ESCOLARIZADAS: QUEM SÃO? COMO SE VEEM? O QUE SABEM? E QUAIS AS SUAS EXPECTATIVAS? ... 99

3.1 Quem eram as mulheres participantes da pesquisa? ... 99

3.2 Como as mulheres se viam em relação à leitura e à escrita? ... 106

3.3 O que as mulheres liam e escreviam antes de entrar na escola? ... 110

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3.4.1 O que gostariam de ler e escrever ... 116

3.4.1.1 O que gostariam de ler ... 116

3.4.1.2 O que gostariam de escrever ... 121

3.4.2 Por que as mulheres voltaram à escola? ... 123

CAPÍTULO 4. PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DE MULHERES ANALFABETAS NO ESPAÇO ESCOLAR: O QUE ELAS SABIAM? O QUE APRENDERAM? ... 127

4.1 O perfil de entrada das mulheres em relação à escrita alfabética ... 127

4.1.1 Eva ... 128 4.1.2 Sara ... 130 4.1.3 Rebeca ... 132 4.1.4 Raquel ... 135 4.1.5 Rute ... 138 4.1.6 Ana ... 142

4.2 Como as mulheres escreviam o seu próprio nome? ... 145

4.3 As práticas de ensino da leitura e da escrita vivenciadas pelas mulheres no Programa Brasil Alfabetizado ... 147

4.3.1 Relacionamento com a turma, frequência e horário de início das aulas... 147

4.3.2 A rotina de atividades vivenciadas pelas alunas no PBA ... 148

4.3.3 Avaliação das práticas de leitura e escrita propostas pela professora do ponto de vista das mulheres ... 178

4.4 O que as alunas efetivamente aprenderam? ... 181

4.4.1 Eva ... 182 4.4.2 Sara ... 184 4.4.3 Rebeca ... 186 4.4.4 Raquel ... 188 4.4.5 Rute ... 189 4.4.6 Ana ... 191

4.5 O que as mulheres escreviam ou não do seu próprio nome... 193

4.6 As expectativas das mulheres foram atendidas?... 194

CAPÍTULO 5. PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DE MULHERES FORA DA ESCOLA: O ESPAÇO DA IGREJA ... 206

5.1 Práticas de leitura e escrita na igreja ANTES de entrar na escola ... 206

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19

5.1.1.1 A leitura da Bíblia... 207

5.1.1.2 A leitura do Hinário e da coletânea de cânticos ... 215

5.1.1.3 A leitura de outros textos ... 215

5.1.2 Práticas de escrita ... 217

5.2 Práticas de leitura e escrita na igreja APÓS entrar na escola ... 217

5.2.1 Práticas de leitura ... 217

5.2.1.1 A leitura da Bíblia ... 218

5.2.1.2 A leitura do Hinário e da coletânea de cânticos ... 226

5.2.1.3 A leitura de outros textos ... 233

5.2.2 Práticas de escrita ... 234 CONCLUSÕES ... 237 REFERÊNCIAS ... 245 APÊNDICE A ... 260 APÊNDICE B ... 261 APÊNDICE C ... 262 APÊNDICE D ... 263 APÊNDICE E ... 264 APÊNDICE F ... 266 APÊNDICE G ... 268 APÊNDICE H ... 270

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INTRODUÇÃO

Vem crescendo, no Brasil, desde as últimas cinco décadas do século XX, uma preocupação com a educação voltada para jovens e adultos (JA)1 não escolarizados, que têm sido designados ao longo do tempo de analfabetos. Uma das razões para isso é que, num mundo letrado como o que se vive atualmente, eles enfrentam restrições, constrangimentos e preconceitos, sem que possam contar, em geral, com a presença de alguém que os ensinem, seja este um professor ou não, embora convivam com pessoas alfabetizadas em outros ambientes, como o familiar, e desenvolvam Práticas de Leitura e Escrita (PLE) em distintos espaços sociais.

Dentro de um retrospecto pessoal e da temática da pesquisa, pode-se afirmar que o interesse pelo eixo temático desse trabalho (as práticas de leitura e escrita de mulheres

analfabetas) surgiu, mesmo que ainda de maneira incipiente, na metade do curso de

Licenciatura em Pedagogia, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Contudo, a confirmação e especificações desse eixo temático ocorreram gradativamente, em três momentos cruciais, como se verá a seguir.

O primeiro momento se situa numa experiência de monitoria com a Prof.ª Dr.ª Célia Maria Rodrigues da Costa Pereira, na disciplina de História da Educação do Brasil, em 2007, na qual se estudou a educação popular, com o viés para Educação de Jovens e Adultos (EJA). Somaram-se ainda a esse momento as discussões teóricas das disciplinas de Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa I e II, em 2007 e 2008, respectivamente.

O segundo momento se deu, mais precisamente, no âmbito das pesquisas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), em 2008. A partir dessa data, e durante dois anos (até 2010), iniciou-se uma parceria com a Prof.ª Dr.ª Eliana Borges Correia de Albuquerque em um projeto, cujo título versava sobre As Práticas de Alfabetização de

Professores de Educação de Jovens e Adultos e seus Reflexos nas Aprendizagens dos Alunos,

que proporcionou a possibilidade de dois aprofundamentos: um teórico, motivado por leituras pessoais, debate com a Prof.ª Eliana e com o grupo de estudo de EJA, na UFPE, que contava com colegas-pesquisadoras e com a Prof.ª Dr.ª Andréa Tereza Brito Ferreira, e um aprofundamento prático, na medida em que nos possibilitou vivenciar mais de perto a realidade escolar em si, conhecer, ainda que superficialmente, as práticas pedagógicas de

1Atualmente, com a inclusão do termo idoso, a nomeação tem sido Educação de Jovens e Adultos e Idosos

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21 professoras da Rede Municipal de Recife e de Camaragibe – PE, bem como a realidade e as aprendizagens dos alunos de EJA, notadamente em relação ao Sistema de Escrita Alfabética (SEA). Como as pesquisas no grupo tinham como foco, em sua maioria, mulheres, se delineou esse gênero e uma faixa etária que se reportava a pessoas adultas como uma referência de investigação.

Chegou-se ao terceiro momento quando surgiu a necessidade de se definir o eixo temático e, por conseguinte, o problema da pesquisa. Essa definição só se concretizou em meio a uma experiência de vida crucial, iniciada com o pastoreio de uma igreja evangélica de classe popular, num bairro urbano em Jaboatão dos Guararapes – PE, desde 1999 até a presente data. A vivência contínua com pessoas analfabetas, ou em alfabetização, nessa Igreja (Igreja Evangélica Congregacional - IEC), e outras do bairro acima citadas, que apresentavam saberes, PLE e expectativas pessoais, sinalizou para a necessidade de um acompanhamento das referidas pessoas, no âmbito de um trabalho científico.

Com o ingresso no mestrado da UFPE (2010), e ao longo do ano seguinte, aconteceram duas situações relevantes, que ajudaram na definição da problemática: a primeira delas foi a escolha das pessoas partícipes do projeto. Após contatos iniciais com algumas mulheres, conversamos mais detalhadamente com 6 (seis) delas, 3 (três) da IEC e 3 (três) do bairro onde elas moravam, as quais prontamente aceitaram integrar a pesquisa. Dessa forma, continuou-se com a modalidade da EJA, mas agora com um público específico: o de mulheres.

A segunda situação, estritamente associada à primeira, se deveu ao fato da desistência de procurar outro grupo de mulheres, que seria formado por aqueles JA em processo de alfabetização no ambiente escolar, por dois motivos: um deles é que não se encontrou, nos limites geográficos do bairro, uma escola que tivesse uma turma de EJA e, o outro motivo, ocorreu quando as mulheres acima mencionadas decidiram voltar a estudar (para 5/cinco delas), ou começar a estudar pela primeira vez, (para 1/uma delas), o que de fato sucedeu no final de 2011.

Partiu-se, depois disso, para a definição do problema da pesquisa, propriamente dito, que passou por mudanças desde o projeto de pesquisa inicial.

Apesar da necessidade de definições mais precisas, algumas questões sobre o problema estavam respondidas. A primeira delas foi: por quê? Ou seja, por que se interessar por um problema que envolvia PLE de pessoas adultas e idosas? Como se disse anteriormente, isso teve a ver com as pesquisas realizadas por nós na EJA e o convívio com

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22 pessoas analfabetas, que inicialmente estavam fora da escola. Após o porquê, a segunda questão foi: para quê? E essa pergunta tinha relação com a necessidade em se analisar essas PLE entre pessoas adultas e/ou idosas, nos espaço escolar e no da igreja, para se identificar, por exemplo, as aprendizagens e as estratégias dos próprios sujeitos.

Finalmente, mais duas questões foram respondidas antes da construção final do problema: Onde? E quando? Em relação à primeira, ou seja, o campo espacial de investigação, a definição sucedeu por conta da vivência do pesquisador com pessoas analfabetas de um bairro no município de Jaboatão dos Guararapes, ao longo de anos. E a segunda questão, o aspecto temporal, abrangeu o período de 1 (um) ano, de 2011 a 2012.

Respondidas as perguntas acima, chegou-se à seguinte delimitação do problema:

Quais as práticas de leitura e escrita de mulheres analfabetas em Jaboatão

dos Guararapes – PE, na escola e na igreja?

Do problema acima citado se depreendeu prioritariamente o objetivo geral, conforme exposto abaixo:

 Analisar as práticas de leitura e escrita de mulheres analfabetas em Jaboatão dos Guararapes – PE, na escola e na igreja.

Como desdobramento do objetivo geral, estabeleceu-se os seguintes objetivos

específicos:

 Investigar os conhecimentos que mulheres analfabetas de uma turma de alfabetização já possuíam sobre a leitura e a escrita;

 Analisar práticas de alfabetização de mulheres na escola e como elas se relacionam – ou não – com as expectativas e experiências dessas alunas;

 Investigar as aprendizagens relacionadas à leitura e à escrita de mulheres da EJA de alfabetização;

 Analisar as experiências de letramento que mulheres analfabetas possuíam sobre leitura e escrita na igreja.

O percurso feito até aqui estabeleceu o lastro para a justificativa ou relevância da presente pesquisa.

Um primeiro motivo dessa justificativa emergiu de uma experiência pessoal associada à JA, que já vinha acontecendo no âmbito das atividades eclesiásticas, antes e durante o pastorado junto à igreja, no qual, nas práticas de ensino, contou-se com ouvintes, dentre os

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23 quais figuravam mulheres adultas analfabetas (acima dos 40/quarenta anos), que em casa e/ou nos eventos da igreja, por exemplo, demonstravam conhecimento de letras do alfabeto, sabiam escrever o próprio nome, conseguiam abrir a Bíblia, sem o auxílio de outra pessoa, e de utilizarem estratégias para identificar os livros da Bíblia.

Pesquisas já mostram que pessoas assim possuem conhecimentos do SEA, que se envolvem, no seu cotidiano, com gêneros textuais e são produtoras de conhecimento, mesmo com suas limitações no âmbito da leitura e escrita. O presente trabalho, favorecido pela interação entre pesquisador e sujeitos, permitiu conhecer mais detalhadamente o perfil de mulheres, desde a questão familiar até educacional; se as mesmas se consideravam ou não analfabetas; o que elas já liam e escreviam no período antecedente ao ingresso na escola e quais as suas expectativas mais significativas.

Um segundo motivo da relevância deste estudo foi a constatação da escassez de trabalhos voltados para uma análise, propriamente dita, de PLE de grupos de jovens e adultos no espaço escolar.

Para tanto, analisou-se as PLE realizadas pelas alunas, fruto da proposta pedagógica da professora, e viu-se em que medida esta levou as alunas a avançarem ou não na leitura e na escrita. Ao mesmo tempo, tornou-se possível destacar as reações das alunas e a avaliação delas a respeito da referida proposta.

Finalmente, um último motivo esteve associado à inclusão de um espaço extraescolar, ou seja, a igreja, no qual as mulheres desenvolveram PLE como também o fizeram na escola. Além disso, foi na igreja, especialmente, que as expectativas de vida delas e as suas estratégias encontraram sua razão de ser.

Fazer uma pesquisa que considere essas práticas fora do ambiente escolar ajudou, dentre outras coisas, a se evitar a tendência comum de se homogeneizar as experiências de vida e a não tornar tão óbvio assim, nem linear, o que é desejado, vivenciado e criado no cotidiano por essas pessoas, quando se tem em vista a educação, na escola ou fora dela.

A essa altura, é importante destacar algumas das referências teóricas norteadoras da presente pesquisa. Aqui, se entende “teoria” num sentido amplo, se referindo, como afirma Larrosa a “um gênero de pensamento e de escrita que pretende questionar e reorientar as formas dominantes de pensar e de escrever em um campo determinado” (1994, p.35). No caso aqui, o campo da educação.

Os pressupostos teóricos, portanto, apresentados no presente trabalho podem ser elencados da seguinte forma: a primeira delas diz respeito à própria concepção de educação.

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24 Compreende-se que a educação se constitui numa prática social humanizadora, sempre presente ao longo da vida e cuja ocorrência perpassa diversos espaços sociais e que, portanto, é anterior e transcende os limites da educação escolar. Nesse sentido, Brandão (1982) diz que

ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender - e - ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias: educação? Educações (p.7).

E ao considerar a educação associada àquela que é oferecida na escola, esse mesmo autor afirma que “não há uma única nem um único modelo de educação; a escola não é o único lugar onde ela acontece e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar não é a sua única prática e o professor profissional não é o seu único praticante” (ibid., p.9).

Outro pressuposto teórico importante, ligado ao primeiro, é a necessidade de se desconstruir a concepção de analfabeto, associada àquelas pessoas que não adquiriram e/ou não dominaram as técnicas de leitura e escrita ensinadas convencionalmente na escola, como se não tivessem conhecimentos e aprendizados.

Durante o século XX, pesquisas começaram a apontar uma inversão nessa concepção, isto é, de conceber a pessoa analfabeta como alguém que possui conhecimentos, práticas e aprendizagens das mais diversas, nos seus espaços de vida, antes mesmo de ingressarem na escola; e de que o fenômeno e o discurso (ideológico) do analfabetismo estão relacionados a determinantes políticos e econômicos, dentre outros.

Considerando a importância dessa inversão, se faz necessário explicitar os pressupostos teóricos em torno das concepções, complexas e diversas, de alfabetização e de

letramento, além das concepções de escolarização, de leitura e de escrita.

Alfabetização é compreendida aqui como a apropriação de uma técnica histórica e

culturalmente construída, que envolve a leitura e a escrita. Já letramento, que é indissociável da alfabetização, se refere ao uso concreto e eficiente dessa tecnologia da leitura e da escrita, nos diversos espaços sociais (portanto, não só na escola), e que envolvem diferentes gêneros textuais.

Quanto às outras três concepções, se entende aqui escolarização como o processo que tende a possibilitar o acesso à escrita de forma sistematizada pela alfabetização escolarizada.

Leitura se compreende como o ato e o processo através dos quais se apreende e compreende a

língua escrita. Já escrita (alfabética) é entendida como a apreensão e compreensão de um determinado sistema notacional, expresso num texto ou não, por meio de material (por

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25 exemplo, caneta e lápis) e em lugar próprios (por exemplo, papel e tela do computador) e, que, além disso, no seu processo inicial, hipóteses do (a) alfabetizando (a) podem ser reveladas, conforme indicam as formulações teóricas da psicogênese da língua escrita.

Tendo como referência o objeto de pesquisa e o problema ressaltado anteriormente, estabeleceu-se a metodologia.

Antes de se começar as observações das aulas propriamente ditas, já em maio de 2011, em conversa com a orientadora, a Prof.ª Eliana, um projeto piloto realizou-se para se verificar a consistência da metodologia e dos procedimentos metodológicos. No mês seguinte, em outubro, as 6 (seis) mulheres, que provavelmente participariam efetivamente da pesquisa, começaram a estudar com uma professora, também moradora do mesmo bairro e vinculada ao Programa Brasil Alfabetizado (PBA), em Jaboatão dos Guararapes.

Como a pesquisa envolveu sujeitos e mais diretamente suas práticas sociais relacionadas à leitura e à escrita, recorreu-se a uma abordagem qualitativa, de tipo participante e com características etnográficas, especialmente no espaço escolar, que exigiu uma inserção mais extensiva no campo empírico (que já existia antes da pesquisa), pois permitiu identificar, descrever e analisar as diversas experiências de leitura e escrita, que ocorrem nos espaços escolhidos para a pesquisa (a escola e a igreja2) das 6 (seis) mulheres adultas escolhidas. Os dados provenientes dos procedimentos metodológicos (observação, entrevista, diagnose e análise de documento) serão analisados tendo como base teórica a técnica de análise temática de conteúdo.

Finalmente, a presente dissertação está dividida em cinco capítulos. No capítulo 1, o

REFERENCIAL TEÓRICO - procurou-se fazer um levantamento histórico da EJA em

nosso país, com destaque para a alfabetização, para depois, dar relevo ao fato de como é visto o analfabeto no Brasil e de sua realidade escolar. Por fim, fez-se uma discussão teórica, especialmente a partir do século XX, sobre as concepções de alfabetização e letramento e suas relações no ambiente escolar e fora dele. No capítulo 2, FUNDAMENTOS E

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA - se apresentou os sujeitos

investigados e os campos da pesquisa, os fundamentos metodológicos (concepção de pesquisa qualitativa e a posição do observador), também se apresentou os procedimentos e

2De uma perspectiva teológico-cristã o termo “Igreja” não se identifica com o templo, como comumente se

entende popularmente. Também não tem a ver com número de pessoas, pois conforme Jesus, duas ou três pessoas reunidas em Seu nome é uma Igreja (nascendo e em possível desenvolvimento), nem tem a ver, essencialmente, com o processo de institucionalização da Igreja. Igreja se refere, sim, a pessoas chamadas e reunidas em Deus, numa relação de amor. Para os propósitos desta pesquisa a palavra igreja não foi utilizada no seu sentido teológico lato, mas com o sentido de espaço (geográfico) onde os sujeitos acompanhados se reuniam.

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26 instrumentos metodológicos e, por fim, a técnica usada na análise dos dados. No capítulo 3,

MULHERES ADULTAS ANALFABETAS E/OU POUCO ESCOLARIZADAS: QUEM SÃO, COMO SE VÊEM, O QUE SABEM E QUAIS AS SUAS EXPECTATIVAS? -

buscou-se apresentar algo da história de vida dessas mulheres, sua identidade, os seus saberes e seus desejos. No penúltimo capítulo, o quarto – PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA

DE MULHERES ANALFABETAS NO ESPAÇO ESCOLAR - tratou-se das observações

das aulas de uma professora e das práticas de leitura e escrita das alunas nesse espaço, suas concepções de como se veem, o que as levaram a estudar, o que liam e escreviam antes de irem à escola, o que estão aprendendo nas aulas e o que têm achado das aulas. Por fim, no capítulo cinco, PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DAS MULHERES FORA DA

ESCOLA: O ESPAÇO DA IGREJA – se destacou algumas das práticas de leitura e escrita

de três das mulheres, bem como suas estratégias de leitura na igreja, em quatro eventos: a Escola Bíblica Dominical, os cultos dominicais, os estudos bíblicos e os encontros de oração.

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27

CAPÍTULO 1: REFERENCIAL TEÓRICO

Neste capítulo, foram feitas duas abordagens: a primeira diz respeito aos jovens e adultos em si. Realizou-se, inicialmente, uma breve história da alfabetização desses adultos, em nosso país, cujo interesse se volta para como ocorreu a construção do preconceito contra o adulto analfabeto. Em seguida, se destacou as concepções a respeito dos Jovens e Adultos (JA) analfabetos e de sua realidade escolar. Por fim, apresentou-se um perfil desses JA que chegam à escola. A segunda abordagem destaca a questão da alfabetização e do letramento.

1.1 O jovem e adulto analfabeto no Brasil: história, identidade e realidade escolar

As referências teóricas, que orientam os subtópicos adiante são, especialmente, Beisiegel (1974), Furter (1974), Ricco (1979), Paiva (2003), Fávero (2004), Galvão e Soares (2004), Romanelli (2005), MEC (2006) e Galvão e Di Pierro (2007).

1.1.1 Um panorama histórico da alfabetização de jovens e adultos no Brasil

A construção de uma história da alfabetização de adultos no Brasil tem suas limitações. Galvão e Soares (2004) apontam alguns motivos dessas limitações: o primeiro deles é que “a historiografia” e, particularmente, “a historiografia da educação – reconhece que, da totalidade do passado, só temos acesso a alguns dos seus vestígios”; que esses vestígios “nem sempre foram conservados em instituições públicas”; também que “as experiências de alfabetização de adultos” no Brasil, por conta da sua diversidade, têm sido vivenciadas de forma distinta no território nacional; que não é possível “abordar mais de 500 anos de experiências de alfabetização” e, finalmente, que “são poucos e ainda incipientes os estudos que tomam como objeto a história da alfabetização” de JA no País.

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28 Apesar disso, essa história pode ser contada desde a chegada dos padres jesuítas, cuja ação cultural, educacional e religiosa (século XVI - século XVIII)3 também estava relacionada à consolidação e enriquecimento do domínio português.

Os adultos colonizados não eram uma prioridade dos jesuítas, em razão, por exemplo, da faixa etária avançada, em relação à das crianças. Não havia, por parte dos índios, práticas de leitura e escrita escolares como havia em alguma medida na sociedade do colonizador. Além disso, nesse período colonial, pode-se inferir que a transmissão do idioma português, no processo de alfabetização de adultos, era concebida “como aquisição de um sistema de

código alfabético, tendo como único objetivo instrumentalizar a população com os rudimentos de leitura e escrita (MOURA, 2004, p. 24, grifo do autor), cujos fins eram

religiosos.

Sem saber ler e escrever e sem a adesão à religião católica, os indígenas eram considerados, ao mesmo tempo, “iletrados” e “ignorantes”, no sentido escolar, e vistos como “pagãos” e “ingênuos”; que nada sabiam de Deus. Portanto, para superar esse binômio, os jesuítas começaram a institucionalizar a atividade educacional e “a primeira escola de ler e escrever foi logo aberta [no mês abril de 1549]” (PAIVA, op. cit., p.448).

Essa catequese de adultos, já bem institucionalizada, raramente abrangia “a leitura e a escrita” (PAIVA, ibid., p.66), que somadas ao cálculo se constituíam o conteúdo da alfabetização dada pelos jesuítas. Daher (1998) destaca duas “formas textuais” relevantes no que tange à “aplicação de uma lógica letrada e de práticas letradas com fins catequéticos a sociedades ágrafas”, que são “as gramáticas da língua tupi e os catecismos ou doutrinas” (p.34).

O conteúdo cultural ensinado pelos padres-educadores não levou em consideração o que os colonizados conheciam, em termos de experiências e saberes, advindo da vivência em sua própria cultura e sociedade, que passaram por um processo de aculturação, com a

3

Essa relação entre alfabetização e religião é um fenômeno anterior à colonização no Brasil. Até porque a vinda dos jesuítas às terras brasileiras está situada dentro do contexto maior das Reformas religiosas, Protestante e Católica, no século XVI, no Ocidente, embora, Graff, ao tratar da tradição oral e escrita na cultura ocidental, diz que “o impulso religioso para a leitura, tendo como objeto a propagação da fé antecede de muito” a essa época (1995, p.42). A campanha de alfabetização católica no Brasil visava um ensino com fins explícitos, cuja relação envolvia questões religiosas, com repercussões político-econômicas. A operacionalização desse ensino, durante essa colonização portuguesa, no Brasil, não representava ainda um sistema escolar que, nesse momento, era uma experiência européia até então em formação, como é o caso mesmo de Portugal, onde “o analfabetismo dominava não somente as massas populares e a pequena burguesia, mas se estendia até a alta nobreza e à família real” (KAPLAN apud PAIVA, op.cit., p.66 - 67).

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29 absorção impositiva da cultura ocidental do colonizador4, como declara Romanelli (op. cit., p.34). Da perspectiva da legislação, Paraíso (2010) diz que “há alguns pontos comuns a toda a legislação criada a partir de 1548” e um deles é “o não reconhecimento” e a não "preservação de suas peculiaridades socioculturais” (p.3).

A falta de prioridade em relação aos índios, no âmbito da educação escolar formal de adultos, igualmente, se estendia aos adultos negros e às mulheres, no período de escravidão no Brasil.

Apesar das poucas pesquisas e informações acerca desse período, é possível afirmar que a catequização de homens e mulheres negras envolvia segundo Paiva, o combate do “culto dos deuses africanos”, e a promoção das condições de apropriação do “catolicismo” (op. cit., p.67). A educação dos adultos negros, em particular, “se fazia através de sermões que os exortavam à prática da moral cristã e à fé católica” (LEITE apud PAIVA, idem).

Quanto às mulheres, os dados históricos sobre elas são escassos5, algo evidente quando se pensa este gênero no âmbito educacional. As mulheres adultas sejam elas índias,

negras ou não, estavam excluídas do processo educativo, mesmo aquelas pertencentes à classe dos donos de terra e senhores de engenho (ROMANELLI, op. cit., p.33). Pelo que se sabe “poucas parecem ter sido as experiências educacionais realizadas” e um número reduzidíssimo delas “sabiam, ao final do período colonial, ler e escrever” 6 (GALVÃO e SOARES, op. cit., p.30).

4Mesmo assim, é preciso destacar que “ainda que adotando posições baseadas em visões contraditórias da cultura

indígena”, os jesuítas “vão sempre denunciar a violência do processo da conquista com o extermínio e a exploração do índio” (MESGRAVIS, 2001, p.40).

5As pesquisas sobre uma historiografia das mulheres, na Europa e Estados Unidos da América, especialmente a

partir de 1970, feitas por feministas, esbarraram em dois problemas (que ocorrem também no Brasil): o primeiro deles diz respeito à “falta de reflexão sobre a especificidade do objeto e a aplicação de categorias de pensamento que não eram egressas da história das mulheres, mas da história ‘tradicional’” (PRIORE, 2001, p. 223). O outro problema é a constatação “do silêncio a que se era confrontado ao fazer uma interpretação das fontes” (idem).

6

Dadas às circunstâncias, não havia possibilidade de elas ingressarem na vida educacional. Das mulheres indígenas, os jesuítas testemunham mesmo, desde o início da colonização, a exploração sexual delas dentro de um processo de miscigenação (MESBRAVIS, 2001, 41). E da mulher negra, Rufino (1993) diz que ela era “um instrumento de trabalho forçado, dentro das casas, na lavoura, nas minas, no comércio”, “sujeitas ao abuso sexual do homem branco”, servindo “de ama – de - leite para os filhos dos senhores” e ainda destaca que “suas habilidades culinárias criaram a figura da vendedora de quitutes, ainda nos tempos coloniais” (p. 77).

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30 Saber ler e escrever, nesse contexto, não era uma exigência sine qua non da sociedade. Conforme Paiva,

ultrapassada a fase inicial de colonização, a educação dos indígenas adultos

perdeu sua importância; por outro lado, as atividades econômicas7 coloniais não exigiam o estabelecimento de escolas para a população adulta composta de portugueses e seus descendentes e ainda menos para a população escrava. O

domínio das técnicas de leitura e da escrita não se mostrava muito necessário ao cumprimento das tarefas exigidas aos membros daquela sociedade colonial

(ibid., p.193, grifo nosso).

Essa não exigência das técnicas de leitura e escrita para as camadas populares muito se deve ao fato da sociedade colonial estar fundamentada numa “agricultura rudimentar e no trabalho escravo” (ROMANELLI, op. cit., p.34), não havendo necessidade de uma mão de obra instruída. A relevância da alfabetização tinha mais relação com o proselitismo religioso. Independente, porém, do não uso do vocábulo analfabeto, o analfabetismo reinante em terras brasileiras desde os tempos primevos da colonização só pode ser concebido do ponto de vista dos colonizadores e não dos colonizados. E se, mesmo assim, o analfabetismo fosse considerado, isso seria resultado da política econômico-social estabelecida em nosso país, com repercussão na educação. Além disso, com a formação da elite, gradativamente foi sendo demarcada a linha entre letrados e iletrados, o que já ocorria no contexto educacional dos países dos colonizadores, mesmo que não houvesse uma exigência de se aprender a ler e escrever para a população em geral.

No século XVIII, a escolarização de adultos foi atingida em cheio, como toda a escolarização em geral no Brasil, com a atuação do marquês de Pombal, que buscava a centralização da administração da colônia por parte de Portugal. Como consequência, o já precário ensino regride (PAIVA, op. cit., p. 69).

No período pós-independência, a pessoa que não sabia ler e escrever podia exercer o direito de votar ou ser votado. As mulheres, nesse período, que representavam 50% da população livre (5.520.000 habitantes), apesar da lei de 1827, eram marginalizadas

do processo educativo escolar, sendo conhecida a ignorância [delas] durante o período do Império. Muito poucas frequentavam escolas: as mulheres do povo não recebiam instrução; as da elite eram educadas em suas casas, de modo mais ou menos sistemático, em alguns casos (PAIVA, ibid., p.73).

7

Apesar das questões econômicas nesse período não exigirem a fundação de estabelecimentos escolares e as práticas de leitura e escrita não se apresentarem necessárias, o fator econômico será crucial na história da alfabetização no Brasil e se tornará um parâmetro para se compreender as mudanças ocorridas na forma como se conceberá a alfabetização.

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31 A concepção de “libertação” da mulher “por meio da instrução” e a “crença na educação8 como chave para resolver os problemas fundamentais do país” eram ideias que circulavam na Europa e gradativamente chegavam ao Brasil (CORRÊA, 2007, p.242).

Em 1870, marcando certo crescimento numérico da educação popular, escolas noturnas para adultos surgiram nas diversas províncias, mas com aulas assistemáticas e em situação precária. Conforme Paiva, “a criação de tais escolas, entretanto, estava (com algumas exceções) ligada à valorização da educação em si mesma, sem considerar o seu aspecto instrumental e sem a adequação às reais necessidades de ensino para a faixa da população à

qual eram destinadas” (ibid., p.85, grifo nosso).

Segundo Galvão e Soares (2004), em Pernambuco, no século XIX (1885), ocorriam aulas para adultos, “que não tinham nenhuma instrução” (p.31). Além das instituições escolares, essas aulas eram dadas em outros espaços sociais, como nas “escolas dominicais”, na “Casa de detenção para presos”, na “aula dos cegos no ‘Asylo de mendicidade’ e por professores, sem remuneração e com permissão legal, na casa e com os móveis da escola diurna” (idem).

Quanto às mulheres adultas, em Pernambuco, dizem os mesmos autores que “quando ocorria [a escolarização], deveria se pautar nas funções que deveriam desempenhar na sociedade, até então predominantemente circunscritas ao espaço doméstico” (ibid., p.32), e não para o desenvolvimento de práticas de leitura e escrita em outros espaços diferentes da casa.

Galvão e Soares destacam também, tendo como base pesquisas recentes, que as experiências de alfabetização no Brasil, especialmente no espaço urbano, não se limitavam ao espaço escolar. Os escravos, por exemplo, tinham eles acesso a leitura e à escrita, e isto se constituía “um elemento fundamental para a conquista dos direitos civis” (ibid., p.33). Mesmo sem acesso à escola oficial e sendo os escravos associados tradicionalmente à oralidade, como acontecia com os índios, práticas de leitura e escrita estavam ocorrendo entre eles em espaços sociais distintos.

Em relação àqueles que viviam no contexto religioso “a alfabetização parecia fazer parte das regalias que gozavam os cativos da Igreja, ao lado da instrução profissional e da

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Dados do início da segunda metade desse período mostram um quadro educacional alarmante no país, como é o caso da província de Pernambuco. Em 1865 haviam matriculado no ensino público 3.807 homens e 918 mulheres, num total de 4.725 pessoas, e no ensino particular, 842 homens e 438 mulheres, num total de 1.280 pessoas, perfazendo um total geral no público e particular de 6.005 pessoas. Mas da população livre de Pernambuco (1.040.000 pessoas), nesse mesmo ano, somente 148.571 eram considerados capazes e recebiam instrução apenas 142.566. Logo se vê uma pequena parcela da população sendo atendida, e na sua maioria mulheres (PAIVA, ibid., p.78).

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32 educação religiosa” (WISSENBACH apud GALVÃO e SOARES, 2004, p.33). Já em relação “aos escravos urbanos, para o desempenho autônomo de seus ofícios especializados, era importante saber ler e escrever para agenciar por conta própria seus serviços” (idem).

Galvão e Soares (idem) dizem, ainda, que quando os escravos se apropriavam das técnicas de leitura e escrita, “formavam-se, em alguns casos, redes de aprendizagens informais, em que, através da leitura oralizada e do reconhecimento de trechos previamente memorizados, tornava-se possível à alfabetização”. Percebe-se, assim, que mesmo sem conhecer as convenções necessárias para diferençar os distintos gêneros textuais, que circulavam, especialmente na sociedade urbana, sabiam da existência deles, vivendo ou trabalhando em espaços sociais diferentes e/ou participando de outras práticas de leitura e escrita.

Na última década do século XIX, porém, a educação passou a merecer uma atenção mais ampla, já que começou a ser percebida como uma condição essencial para o progresso do país (aos poucos se industrializando) e outras discussões mais antigas vem à tona como a questão da educação da população adulta analfabeta (GALVÃO e SOARES, ibid., p. 82-85). Essa população analfabeta começou, contudo, a ser pensada paulatinamente como “criança”, como população “inativa” e “ignorante” e que precisava ser redimida. E no censo de 1890 os analfabetos já representavam 85% de uma população de 14.000.000 (OLIVEIRA, 2002, p. 94).

O quadro educacional do Império visto até agora, se arrastou pela República e nas suas duas primeiras décadas a situação permaneceu praticamente a mesma. Moura (2004) destaca que nesse período começaram “inúmeras campanhas, normalmente de duração curta, descontínuas, sem grande sistematização e buscando apoio e a parceria das diferentes instâncias da sociedade civil”. Para essa autora “isso mostra a falta de compromisso do poder público em definir uma política de educação institucional” (p. 24).

Apesar da situação da educação no Brasil ser muito precária ao final do período imperial, Paiva afirma que “até o final do Império não se havia colocado em dúvida a capacidade do analfabeto: esta era uma situação usual da maioria da população e a instrução não era condição para que o indivíduo participasse da classe dominante ou das principais atividades do país” (op. cit., p.93). Dessa forma, “o não saber ler não afetava o bom senso, a dignidade, o conhecimento, a perspicácia, a inteligência do indivíduo; não o impedia de ganhar dinheiro, ser chefe de família, exercer pátrio poder, ser tutor” (RODRIGUES apud PAIVA, idem). Mas por que isso ocorria? Paiva mesmo responde que “somente quando a

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33 instrução se converte em instrumento de identificação das classes dominantes (que a ela têm acesso) e quando se torna preciso justificar a medida de seleção é que o analfabetismo passa a ser associado à incompetência” (idem). Esse estereótipo contra o analfabeto o acompanhará ao longo da história do Brasil.

A Constituição de 1891 aprofundou a dualidade9 do sistema educacional, que era um legado do Império e incorpora a Lei Saraiva10, durante o Império, que selecionava as pessoas pela sua instrução, ou seja, os que sabiam e os que não sabiam ler e escrever e cresceu, assim, gradativamente a ideia de que a instrução escolar era um caminho essencial para a ascensão social11. É nesse contexto que encontramos a semente que deu “origem ao preconceito contra o analfabeto, identificado como indivíduo incapaz” (PAIVA, op. cit., p.93).

Os dados do analfabetismo no início do século XX em todo o Brasil causaram uma repercussão dentro e fora do país. A partir da Primeira Grande Guerra (1914-1918) se intensificou o movimento em favor da educação popular, que englobará a educação dos adultos e “a ideia do analfabeto como incapaz encontra sua formulação mais radical” (PAIVA, ibid., p.100), mas que receberá resistência. De qualquer forma, nas duas primeiras décadas do século XX, da Primeira República, o analfabetismo continuava acentuado em todo Brasil.

Apesar do gradativo crescimento industrial, nas primeiras décadas do século XX, o Brasil permanecia com uma economia basicamente agrícola, num contexto de latifúndios e da monocultura. Romanelli diz que “a educação realmente não era considerada como fator necessário” (op. cit., p. 45). Até porque “se a população se concentrava na zona rural e as técnicas de cultivo não exigiam nenhuma preparação, nem mesmo a alfabetização, está claro que, para essa população camponesa, a escola não tinha qualquer interesse” (idem).

De acordo com Souza (1990) “antes da década de 20, praticamente, a população jovem e adulta era considerada para uma parcela dominante da sociedade brasileira, como meros trabalhadores, sem relevância social e política” (p.73). E, ainda, segundo o autor, havia a necessidade de se “legitimar o novo poder que procura instalar no país. E o voto é

9“Era também uma forma de oficialização da distância que se mostrava, na prática, entre educação da classe

dominante (...) e a educação do povo (...). Refletia essa situação uma dualidade que era o próprio retrato da organização social brasileira” (ROMANELLI, op. cit., p. 41). Sociedade essa que ia se tornando cada vez mais complexa.

10

Lei, de 1881, que defendia o tolhimento do direito das pessoas analfabetas de votar. Segundo Paiva, “a eleição direta com restrição ao voto do analfabeto provocara a valorização daqueles que dominavam as técnicas da leitura e da escrita” (ibid., p. 196).

11

Analisando essa relação no contexto europeu em geral, Cook-Gumperz (2008) diz que “desde o começo do século XX, acredita-se inquestionavelmente que a alfabetização seja o propósito e o produto da escolarização (...) e que o fato de ser alfabetizado melhora a qualidade de vida dos indivíduos, grupos sociais e até da sociedade como um todo” (p. 29).

(35)

34 instrumento apto para essa legitimação e apenas ao alfabetizado era permitido votar. Além da necessidade de uma mão de obra um pouco mais qualificada” (idem).

Nesse momento, as ações com vistas à “redenção” do analfabeto encontraram resistências e posições radicais12. Miguel Couto, também via o analfabetismo como uma doença a ser banida, e o analfabeto como um “indolente’ e ‘rebelde”. Para ele

o analfabetismo não é só um fator considerável na etiologia geral das doenças, senão uma verdadeira doença, e da mais graves. Vencido na luta pela vida, nem necessidades nem ambições, o analfabeto contrapõe o peso morto de sua indolência ou o peso vivo de sua rebelião a toda ideia de progresso, entrevendo sempre, na prosperidade dos que vencem pela inteligência cultivada, um roubo, uma extorsão, uma injustiça. Tal a saúde da alma, assim a do corpo; sofre e faz sofrer; pela incúria contrai doenças e pelo abandono as contagia e perpetua (apud PAIVA, ibid., p.109).

Essas posições não eram compartilhadas, pelo menos não explicitamente, por todos e houve resistências quanto a essa obsessão em relação a se combater o analfabetismo, pois

os conhecimentos dos rudimentos da instrução primária não bastariam para transformar o indivíduo num cidadão útil; era preciso fazer a campanha em favor da difusão do ensino mudar de objetivo e de rumo, pois não poderíamos querer acabar com os analfabetos criando uma legião de semianalfabetos (PAIVA, ibid., p.110).

Cria-se, nesse período, a Associação Brasileira de Educação (ABE). A finalidade da ABE era

convencer a nossa gente de que, ao contrário do que habitualmente se afirma, não cabe ao analfabetismo a culpa do atraso, do desgoverno, da anarquia e dos muitos males que afligem nosso país, antes são mais nocivas, culpáveis e condenáveis as elites mal preparadas que nos governam e as legiões sempre crescentes de semianalfabetos que as sustentam (SODRÉ apud CARVALHO, 1988, p. 7).

A postura da ABE se alinhava com a opinião de outros setores, no sentido de erigir uma concepção correta do adulto sem instrução convencional e corrigir a ideia de que eles eram os responsáveis pelos males do Brasil, o que passava a ser uma ameaça para determinados setores do poder.

12

Indício dessa preocupação pode ser vista nas palavras de Carneiro Leão, citado por Paiva, que afirma que com a ampliação da educação “talvez aumentemos a anarquia social. Toda essa gente que, inculta e ignorante, se sujeita a vegetar, se contenta em ocupações inferiores, sabendo ler e escrever aspirará outras coisas, quererá outra situação e como não há profissões práticas nem temos capacidade para criá-las, desejará ela conseguir emprego público” (op. cit., p.102).

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35 Com o crescimento dos programas voltados para a promoção da educação de adultos, no período da Segunda República, tornará claro “o papel político de tais programas, mostrando seu caráter ideológico e sua função potencial como instrumento de recomposição do poder político e das estruturas sócio - econômicas” (PAIVA, op. cit., p. 187).

Na década de 30, a estruturação gradativa do Brasil, com perfil urbano-industrial exigirá da força de trabalho formação, qualificação e diversificação. Dessa forma, no campo particular do trabalho, Ventura (2011) diz que o “desafio enfrentado pela elite brasileira era o de permitir patamares mínimos de educação a todos, sem, no entanto, colocar em risco o controle ideológico e o nível de exploração exercido sobre a classe trabalhadora” (p.59). Na verdade, era necessário “um trabalhador que, além do domínio dos mecanismos da leitura, de escrita e do cálculo, apóie o novo poder que se instala no país” (SOUZA, op. cit. p.72).

Em matéria de educação de adultos, nesse sentido, a Constituição de 34 consagrou como alguns dos seus princípios o reconhecimento da educação como “direito de todos”, devendo ser o ensino “gratuito” e de “frequência obrigatória”, “extensivo aos adultos” e garante às mulheres o direito de votar, menos as mulheres analfabetas 13. Se antes a educação era instrumento para recomposição do poder político, agora se constituía mais fortemente instrumento ideológico desse poder (PAIVA, ibid., p. 141).

Na década de 40, com a educação de adultos se definindo no cenário educacional brasileiro, em meio ao crescimento do número de analfabetos, aumentará a mobilização para minimizar o analfabetismo, em busca do desenvolvimento de uma nação mais democrática. Nesse período ia se tornando mais clara a distinção entre a educação popular e a educação de adultos, que começava a ser vistas como instrumentos de redemocratização.

Ainda nessa década, surgiu, no cenário estrangeiro, ao lado do termo analfabeto o termo funcional, isto é, analfabeto funcional, que difere de outra designação, a de analfabeto

absoluto.

Paiva considera que o uso dessa expressão ocorreu “em complementação ao conceito de analfabetismo absoluto e em decorrência de muitos fracassos observados nas campanhas de massa que atravessaram o planeta desde os anos 40/50” (ibid., p.409). Ao contrário do analfabetismo absoluto, que indicava a ausência de determinados conhecimentos no domínio da leitura, da escrita e de cálculo, o conceito de analfabetismo funcional dizia respeito “à falta de domínio daqueles conhecimentos básicos necessários à realização de suas tarefas

13“Em âmbito nacional, a educação de adultos, no Brasil, não se derivou diretamente de uma constituição em

face do princípio de descentralização, mas respondeu a imperativos humanitários e desenvolvimentistas” (DI RICCO, op.cit., p. 44-45).

Referências

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