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UNIVERSIDADE Nnm..m., FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

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Nnm..m.,

RELAÇÕES E CONDIÇÕES DE TRABALHO EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO APÓS A IMPLANTAÇÃO DA EBSERH

MARINA MORENA SILVA PINTO

Salvador - BA 2020

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

DISCIPLINA: TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO E ANÁLISE EM CIÊNCIAS SOCIAIS I

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MARINA MORENA SILVA PINTO

RELAÇÕES E CONDIÇÕES DE TRABALHO EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO APÓS A IMPLANTAÇÃO DA EBSERH

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, da Universidade Federal da Bahia – UFBA, como requisito obrigatório para obtenção do título de Mestre em Ciências Sociais. Orientadora: Profª. Drª Maria da Graça Druck de Faria

Salvador - BA 2020

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__________________________________________________________________________________

Pinto, Marina Morena Silva.

P659 Relações e condições de trabalho em um Hospital Universitário após a implantação da EBSERH. / Marina Morena Silva Pinto. – 2020.

180 f.: il.

Orientadora: Profª Drª Maria da Graça Druck de Faria.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Filosofia e Ciências humanas, Salvador, 2020.

1. Terceirização - Serviço público. 2. Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. 3. Hospital das Clínicas (Salvador, BA). 4. Trabalho. I. Faria, Maria da Graça Druck de. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. III. Título.

CDD: 331.11

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MARINA MORENA SILVA PINTO

RELAÇÕES E CONDIÇÕES DE TRABALHO EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO APÓS A IMPLANTAÇÃO DA EBSERH

BANCA EXAMINADORA

Prof.ª Dr.ª Maria Graça Druck de Faria (orientadora) Universidade Federal da Bahia

Prof.ª Dr.ª Cristiana Mercuri de Almeida Bastos Universidade Federal da Bahia

Prof.ª Dr.ª Stella Maria Leal Bastos Senes

Universidade Federal da Bahia

Prof.ª Dr.ª Tatiane Araújo dos Santos

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AGRADECIMENTOS

Momento de reconhecimento, de buscar na memória a trajetória percorrida até aqui e saber que, assim como a vida, esta pesquisa não é fruto apenas de um esforço individual, pois o tempo me fez aprender que nada é construído de forma solitária, e por isso a minha gratidão coletiva, por findar este trabalho, é grande.

Agradeço a todos aqueles envolvidos, com os quais compartilho minhas inquietações a respeito do mundo do trabalho.

Agradecimento especial à minha orientadora, Prof.ª Graça Druck, que me acompanha desde a iniciação cientifica. São cinco anos trabalhando juntas, uma figura crucial para que eu conseguisse realizar a pesquisa. Gratidão pela orientação em cada detalhe respeitando a minha opinião, pelas cobranças essenciais para o meu rendimento, pelo companheirismo e carinho nos processos de adoecimento. Gratidão por toda atenção e dedicação à minha formação.

Agradeço aos funcionários do CRH -Eunice, Carlos, Alexandre e Nem- por esses anos de convivência, há sete estou presente no grupo de pesquisa. Um agradecimento especial a Edna Pestana, por todo acolhimento e momentos de risos e choros durante esse tempo.

Agradeço ao meu primeiro orientador, o prof.º Jair Batista, que me ensinou que a dedicação solitária, de horas sentada em uma cadeira, faz toda diferença, agradeço pelas conversas, fundamentais para os primeiros passos como pesquisadora.

Ás professoras Tatiane Santos, Stella Senes e Cristiana Bastos pelas importantes contribuições.

Aos trabalhadores do Hospital Universitário Prof. Edgar Santos, que pararam o tempo de suas atividades e se dispuseram a falar sobre as suas realidades no trabalho, contribuindo de forma fundamental para a realização da pesquisa.

À todos os professores que passaram pela minha trajetória desde o IFBA- campus Camaçari, pois tive a honra de conviver com grandes mestres, que possibilitaram a visão da realidade com outro olhar. Os agradeço por me tirarem da zona de conforto e compartilharem seus conhecimentos. Em especial, o trio de humanas, os professores Hingryd Freitas, Igor Gomes e Theo Barreto, o último, por despertar em mim a paixão pela sociologia.

Gratidão ao TrabArt, grupo de sociologia do trabalho e da arte, por todo apoio no processo de seleção e durante o curso, em especial ao prof. Antônio Câmara.

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Aos meus colegas do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, pelos momentos de descontração e trocas.

À CNPq pelo apoio prestado, sem o qual a execução da pesquisa seria inviável. Aos meus amigos que são a minha família. Mayara por ser a irmã mais velha - e as vezes mãe- obrigada pela permanência em minha vida, apesar de todas as mudanças desde a adolescência até a vida adulta, e por todo amor ao fazer de Theo meu afilhado.

À Gabriela, por toda ajuda com a revisão do texto, se dispondo a ouvir e debater os resultados da pesquisa, mas principalmente por ser minha amiga de todas as horas. Agradeço também a sua mãe Miriam por fazer da sua casa o meu lar, pós momento de mudança, e pela ajuda na tentativa de entrevistas com os médicos.

À Rafaela, minha querida amiga que sempre será minha pessoa. Agradeço a Daiana, Patrícia e Cassio que estiveram presentes e foram minha base em diferentes momentos de trajeto.

À Jeovana pelas leituras e olhar crítico, e a Rafael pela formatação e leitura. À Janaína por ser fundamental na construção do nosso lar em Pará de Minas e por ser uma engenheira ‘de humanas’. Agradeço por ler o texto da dissertação com tanto carinho.

Agradeço a Mariana, a melhor vizinha que poderia ter, e a Cris por me darem apoio nessa cidade nova e compartilharem momentos de desespero. Minas me trouxe boas amigas.

Aos meus tios, Madalena e Welton, por todo carinho e amor na chegada em Minas, por abrirem a porta de sua casa e transformarem em abrigo no processo tão dolorido de mudança. Muito obrigada por serem minha família.

Aos colegas de trabalho Ednamara, Anderson, Juliana, Carla e Belisária, da Escola Estadual Nossa Senhora Auxiliadora, por me acolherem e tornarem viável a ida a campo, etapa crucial deste estudo. Obrigada por acreditarem na luta pela educação pública.

Gratidão aos meus pais, Maria e Milton, e ao meu sobrinho Arthur, a existência de vocês me fortalece. Em especial a minha mãe, por ser uma mulher forte, sempre em luta pelos filhos, obrigada por apoiar as minhas escolhas e entender a minha ausência nessa caminhada.

Por fim minha gratidão a Deus, fonte de alimento do espirito, pela força oculta que despertava em mim nos momentos de cansaço e pelo poder de fazer com que o universo me presenteasse com todos que contribuíram nessa jornada.

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RESUMO

Esta pesquisa teve por objetivo compreender as vivências, as relações e as condições de trabalho dos funcionários do Hospital Universitário Professor Edgar Santos (HUPES), após a transferência de gestão da Universidade Federal da Bahia para a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), o que caracteriza um processo de terceirização no serviço público. A adesão à empresa acirrou algumas situações dentro do hospital, pois os novos trabalhadores contratados sob o regime da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) foram considerados empregados públicos federais. Os servidores que há algum tempo vinham convivendo com outros vínculos empregatícios dentro do Hospital Universitário (HU), agora passaram a conviver com mais um, o que gerou conflitos e embates, como aponta o estudo. A coleta dos dados foi realizada pela aplicação de um questionário semiestruturado a diferentes categorias, garantindo que diversas vozes fossem ouvidas, além de uma entrevista com um membro da gestão de uma das unidades hospitalares. A análise foi realizada via triangulação de dados: textos teóricos, documentos e dados do campo empírico. Os resultados evidenciam que a EBSERH representa um ataque direto ao vínculo do Regime Jurídico Único (RJU), sendo a principal mudança para os novos trabalhadores. A pesquisa apontou para a existência de um conflito entre eles, o que interfere tanto no clima organizacional quanto na organização sindical, haja vista a existência de uma segmentação entre as diferentes categorias. Verificou-se ainda que permanecem os problemas com a infraestrutura do Hospital como elevadores quebrados, calor e falta de segurança. Questões relativas a assédio moral também foram mencionados pelos participantes do estudo. Com o decorrer do tempo, os poucos servidores que ainda estão lotados no HUPES, hoje minoria, irão se aposentar e apenas trabalhadores CLT irão existir. O modelo da EBSERH, empresa pública de direito privado, já vem sendo apresentado como “modelo ideal” a ser imposto em outras instituições públicas, como o caso das Universidades. Diante disso, considera-se necessário defender o servidor público, elemento essencial para a democracia liberal, pois esses sujeitos passaram a ter a sua função menosprezada socialmente, vistos como inúteis ou até mesmo representando atraso para o Estado. O cargo público é fundamental para o Estado republicano, democrático e social porque são esses sujeitos que executam as políticas públicas, logo

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não podem ficar à mercê do jogo político, comprometendo a democracia e a sua responsabilidade de atuar em prol de todos e para bem comum. O modelo gerencial do setor privado, não pode ser o mesmo no setor público, visto que ambos possuem um perfil de atendimento e ética profissional diferenciados.

Palavras-chave: Terceirização no serviço público. EBSERH. Trabalho no Hospital das

Clínicas. Empregado público.

ABSTRACT

The aim of this research was to understand the experiences, relationships and working conditions of employees at the Professor Edgar Santos University Hospital (HUPES) after its management was transferred from the Federal University of Bahia to the Brazilian Hospital Services Company (EBSERH), which characterizes a situation typical of outsourcing in the public sector. The entry of the company exacerbated certain situations within the hospital due to the entry of new workers contracted through the Consolidation of Worker's Rights (CLT), being considered federal public servants. The workers who had been operating under other contractual relationships within the University Hospital (HU) for some time, were now submitted to another employment regime, which generated conflict and tension as the study highlights. Data collection was carried out with different categories responding to a semistructured questionnaire to guarantee that diverse perspectives were heard, in addition to an interview with an individual who works in hospital management. The analysis of the data was undertaken through triangulation: theoretical texts, documents and data from the empirical field. Results showed that the EBSERH represents a direct attack on the Single Judicial Regime (Regime Jurídico Único) (RJU) condition of employment, with the main change being for new employees. The research uncovered a conflict between them, which interferes both in organizational dynamics as well as with union organization, as can be seen in the segmentation of the different categories. Problems with the hospital infrastructure were also noted such as broken elevators, overheating and a lack of secutiry. Issues related to bullying were also mentioned by study participants. Over

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time, the few employees who are still employed at the HUPES, today the minority, will retire and only CLT employees will remain. The EBSERH's model, a private rights public institution, is already being touted as the 'ideal model' to be adopted in other public institutions, such as Universities. Given this, it is considered necessary to defend the public servant as an essential element for liberal democracy, given that they have had their role socially devalued, seen as useless or even represented as regressive for the State. Public servants are essential for a republican, democratic and socially responsible State, since it is they who carry out public policy, and therefore should not be at the mercy of political contingencies, thereby compromising democratic process and its responsibility to act in the interests of all and for the common good. The private sector management model cannot be applied in the public sector, given that both should have differentiated professional ethics and attendance profiles.

Key-wrods: Outsourcing in the public service. Brazilian Hopital Services Company. Work

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANDES-SN

Sindicato Nacional dos Docentes das Universidades

ANDIFES Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior

CEP Comitê de Ética em Pesquisa

CF Constituição Federal

CFM

Conselho Federal de Medica CLT Consolidação das Leis Trabalhistas

CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

CSP-CONLUTAS

Central Sindical e Popular Conlutas

CTB

Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil CUT

Central Única dos Trabalhadores

DASP Departamento Administrativo do Serviço Público DC

Decreto Lei DCE

(10)

DOU

Diário Oficial da União EBSERH

Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares EENF-UFBA

Escola de Enfermagem da UFBA FASUBRA

Federação Nacional dos Servidores das Universidades FENASPS

Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social

FHC

Fernando Henrique Cardoso FMB

Faculdade de Medicina da Bahia FMI Fundo Monetário Internacional HC

Hospital das Clínicas HU

Hospital Universitário HUPES

Hospital Universitário Professor Edgar Santos ICS

Instituto de Ciências da Saúde ISC

Instituto de Saúde Coletiva LOS

Lei Orgânica da Saúde MARE

Ministério da Administração e Reforma do Estado COM

Maternidade Climério de Oliveira MEC

Ministério da Educação MS

Ministério da Saúde PDRAE

Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado PIBIC

Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica PNP

Programa Nacional de Publicização PROPLAN

Pró-Reitoria de Planejamento e Orçamento

REHUF Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais REUNI

Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais

RMS

Região Metropolitana de Salvador STAE

(11)

TCLE

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido UFBA

(12)

LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 Quantitativo de trabalhadores por vínculos empregatícios no HUPES ano 2018

102

GRAFICO 2 Avaliação da qualidade dos materiais pelos servidores UFBA.

118

GRÁFICO 3 Diagnósticos de doenças do trabalho entre entrevistados.

124

GRÁFICO 4 Número de servidores estatutários e empregados públicos do HUPES (2013 e 2018)

140

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 Quantitativo de entrevistados e número de trabalhadores em atividade, conforme o E-SIC.

104

TABELA 2 Relação entre idade e vínculo empregatício no HUPES – 2019.

106

TABELA 3 Análise comparativa da remuneração nos regimes CLT e RJU da carreira de Enfermeiro

109

TABELA 4 Análise comparativa da remuneração nos regimes CLT e RJU da carreira de Técnico de Enfermagem

110

TABELA 5 Plano de cargos em comissão e funções gratificadas para hospitais de grande, médio e pequeno porte, maternidades e hospitais especializados.

112

TABELA 6 Diagnósticos de doenças do trabalho entre os entrevistados

124

TABELA 7 Discriminação devido ao vínculo empregatício do (a) entrevistado (a).

125

LISTA DE QUADROS

(13)

HUPES, ano 2019

QUADRO 2 Avaliação da qualidade dos materiais pelos servidores UFBA.

118

LISTA DE FIGURA

FIGURA 1 Mapa do Com-HUPES. 89

FIGURA 2 Formato do HUPES em H. 89

FIGURA 3 Instalações Hospitalares precárias 130

FIGURA 4 Rampa improvisada 130

FIGURA 5 Escadas sem corrimão e deterioradas 130

FIGURA 6 Trabalhadora no dormindo no chão 130

FIGURA 7 Geladeira da copa 130

(14)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 16

2. DESENHO DA PESQUISA ... 21

2.1 Descrição da técnica de produção e de análise de dados... 23

2.2 Instrumentos elaborados e as técnicas de utilização ... 26

2.3 Metodologia de Análise de dados ... 28

3. O ESTADO NEOLIBERAL E A ESPECIFICIDADE BRASILEIRA ... 29

3.1 A racionalidade neoliberal ... 29

3.2 O Estado neoliberal, o caso brasileiro ... 38

3.3 O lugar do servidor público no neoliberalismo ... 52

3.3.2 A desmoralização dos serviços públicos ... 62

3.3.3 A terceirização no serviço público ... 65

4. A REESTRUTURAÇÃO DAS UNIVERSIDADES E DOS HOSPITAIS UNIVERSITÁRIOS ... 69

4.1A experiência do REUNI ... 72

4.2 O programa FUTURE-SE ... 75

4.3 Hospital Universitário e o programa REHUF ... 77

4.4 A Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) ... 82

4.5 O Hospital Universitário Professor Edgar Santos (HUPES) ... 89

4.5.1 O processo de adesão à EBSERH ... 92

5. O TRABALHO NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO ... 102

5.1 Informações metodológicas ... 102

(15)

5.3 O perfil dos entrevistados ... 105

5.4 Processos e condições de trabalho ... 110

5.4.1 Metas ... 115

5.4.2 Insalubridade ... 117

5.4.3 Instalações hospitalares, condições de higiene e segurança dos trabalhadores ... 118

5.4.4 A saúde do trabalhador ... 123

5.5 As relações entre os trabalhadores da EBSERH e os servidores da UFBA .... 126

5.5.1 Principais dificuldades ... 130

5.5.2 Satisfação no emprego ... 135

5.6 Os trabalhadores e a organização sindical ... 140

5.7 Ponderações finais realizadas pelos entrevistados ... 147

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 153

7. REFERÊNCIAS ... 159

8. APÊNDICE ... 172 Apêndice A – Fotos

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16 O mundo do trabalho é dinâmico e se altera no tempo e no espaço. As mudanças ocorridas nas últimas décadas com a acumulação flexível sob a hegemonia neoliberal acentuaram significativamente o processo de precarização social do trabalho (DRUCK, 2011; HARVEY, 1992). Neste aspecto, a quebra do padrão fordista de organização do trabalho e o advento do modelo japonês de produção, que em seu bojo traz a flexibilização do trabalho, pode ser entendida como sinônimo do processo de precarização, alterando as condições e relações de trabalho, assim como os marcos regulatórios.

Autores como Pierre Dardot e Christian Laval (2016) apontam que o neoliberalismo assumiu uma centralidade na organização social disseminando seus valores para todas as esferas da sociedade, seja econômica, privada ou política. Segundo Katia Lima (2012, p. 442) não se tratou de uma diminuição das funções do Estado, mas da “redefinição de suas funções no sentido de criar um arcabouço jurídico1 que garanta tanto a movimentação do capital por novas áreas lucrativas como a intensificação do trabalho”. Houve uma redução do Estado social, característico do padrão fordista nos países centrais e que de maneira branda também existiu em alguns países periféricos. As reformas no aparelho burocrático do Estado ditam as novas regras do seu funcionamento que, no caso brasileiro, teve seu marco nos anos 1990 com a Reforma do Estado de 1995 desenhada por Bresser-Pereira e executada no Governo Fernando Henrique Cardoso.

O capitalismo tem demonstrado uma particular capacidade de se reinventar em situações de crise e, no atual cenário, o neoliberalismo se consolidou para além do campo político e econômico, tornando-se presente em todas as esferas sociais e seus valores são reproduzidos nas ações dos sujeitos. Tal configuração possibilita compreender a centralidade da precarização social do trabalho e seu poder de controle sobre os indivíduos – no caso os servidores públicos – por meio da terceirização e da dinâmica flexível que marca a atual acumulação capitalista.

1 “Fundamenta um conjunto de ações que vão da privatização das estatais (setores estratégicos da economia nacional) à desregulamentação de direitos sociais e trabalhistas” (LIMA, 2012, p. 2).

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17 Neste contexto, é importante compreender que o comportamento do Estado, instituição que assume o papel de regulador social ou de mediador dentro da luta de classes, continua ativo como defensor de políticas de interesse capitalista, mudando a sua forma, agora constituído como Estado neoliberal, em que se alteraram as políticas de saúde e educacionais. A educação, vista como um empecilho no jogo de redução deste Estado social passou a sofrer transformações significativas, principalmente nas Universidades Públicas, vistas por agentes neoliberais como um peso desnecessário para o Estado. Com o olhar voltado para atender cada vez mais interesses do mercado, surge um projeto de desmonte dessas Universidades, epor sua vez, do funcionalismo público presentes nela.

É no bojo desta forma de Estado que foi desenhado um modelo novo de gestão para os Hospitais Universitários (HU) - importante segmento que compõe as universidades públicas brasileiras, que reúnem estudantes, professores e trabalhadores das áreas de saúde vinculados à Universidade. Em 2011 foi criada a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), com o intuito de gerir e sanar as crises nesses hospitais.

Os Hospitais Universitários passaram por uma mudança de gestão nos últimos anos, após aderirem à EBSERH, transferindo sua administração e toda sua estrutura das Universidades para a empresa pública de direito privado, tendo como sua principal alteração a contratação de novos trabalhadores, não mais por meio do Regime Jurídico Único (RJU) e sim por meio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O interesse por compreender o funcionamento da gestão da EBSERH e as relações e condições de trabalho nela presentes surgiu após a minha inserção como bolsista de iniciação científica, em 2015, no projeto Terceirização na UFBA: um estudo de caso, coordenado pela Professora Doutora Graça Druck. O estudo teve continuidade numa pesquisa PIBIC entre os anos 2016-17 com um projeto voltado diretamente para a EBSERH: A terceirização na UFBA: o caso da EBSERH, na qual foram realizados levantamento bibliográfico e entrevistas sobre o processo de adesão da EBSERH ao Hospital Universitário Professor Edgar Santos (HUPES). Dadas às próprias limitações da iniciação científica, viu-se a necessidade de compreender e investigar o que é a

(18)

18 EBSERH e que mudanças representa para o corpo de trabalho do HUPES de maneira mais aprofundada.

A relevância deste estudo se evidencia pela necessidade de compreender se a alteração da gestão e das diferentes formas de inserção interferem nos desdobramentos das relações e condições de trabalho de um hospital-escola, no qual se desenvolve a pesquisa, o ensino e a extensão e, em parceria com o Ministério da Saúde, realiza atendimento público e gratuito de média e alta complexidade. Segundo dados disponibilizados pelo “UFBA em números” (2019), em 2018 foram realizados em torno de 390.557 consultas entre as múltiplas especialidades e 825.834 exames laboratoriais. De acordo com Antônio Carlos Lemos (2015), foram feitas 2.265 cirurgias em 2014 no HUPES.

Para realizar a pesquisa, partiu-se da compreensão do conceito de condições de trabalho apresentado como “um conjunto de circunstâncias sob as quais se desenvolvem as atividades laborais e incidem significativamente na experiência laborativa e nas dinâmicas das relações estabelecidas no ambiente de trabalho” (BLANCH, 2003 apud COSTA; BORGES; BARROS, 2015, p. 47).

As mudanças no início dos anos 2000 com o Programa de Reestruturação e posteriormente a adesão do HUPES à EBSERH, em 2013, causaram alterações nos eixos básicos deste hospital de ensino, isto é, a pesquisa, o ensino e a formação de trabalhadores da saúde. Foi pensando nessas transformações e na lacuna de estudos existentes na área de sociologia do trabalho, em âmbito nacional, que se escolheu o hospital escola, dada também a sua visibilidade e a sua importância social. Na época, na bibliografia sobre a EBSERH, não foram localizadas pesquisas acerca das relações trabalhistas que se desenvolvem no ambiente dos hospitais universitários pelo viés da sociologia do trabalho, o que demonstra a relevância do recorte empírico sugerido por esta pesquisa.

Este estudo tem por objetivo examinar as implicações nas relações e condições de trabalho no HUPES, após instalação da EBSERH. A partir disso, estabeleceu-se os seguintes objetivos específicos:

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19 1- Analisar a proposta da EBSERH dentro das novas formas de gestão dos serviços públicos de saúde e educação no quadro da terceirização, buscando entender o processo de criação da empresa, a partir da implementação do Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (REHUF) até a criação da Lei 12.550/11, além de analisar o modelo de gestão da EBSERH.

2- Compreender as implicações das mudanças relativas à EBSERH na estrutura do campo laboral para o funcionalismo público. Com este objetivo, pretende-se realizar um debate teórico a respeito do novo modelo de terceirização, via EBSERH, e suas implicações para o funcionalismo público, pensando a importância dessa categoria.

3- Compreender as condições de trabalho dos dois principais vínculos contratuais no HUPES, a partir do estudo dos seguintes indicadores: estrutura de cargos e salários, jornada de trabalho e as principais diferenças entre os dois vínculos. Foram consideradas as informações coletadas em campo, além de leituras e estudos que fundamentam a interpretação da implantação da EBSERH como uma forma de terceirização.

Norteado por esses objetivos, o presente trabalho se constitui com mais quatro capítulos, conforme descrição a seguir:

No capítulo 2, intitulado Desenho da Pesquisa, apresentam-se os elementos metodológicos da pesquisa qualitativa, justificando a escolha pelo estudo de caso, assim como os elementos presentes nesse tipo de abordagem. Também se expõe os instrumentos elaborados e as técnicas de utilização deles ao longo da pesquisa, explicando as opções para o tratamento dos dados.

No terceiro capítulo, O Estado Neoliberal e a especificidade brasileira, busca-se compreender o sistema neoliberal numa perspectiva mais ampla, entendendo suas origens e suas principais ideias como o desenvolvimento do Estado regulador e os valores de competitividade, individualismo e concorrência que extrapolam o campo econômico e são disseminados na sociedade neoliberal e, principalmente, suas implicações no mundo do trabalho. Ainda nesse capítulo procura-se examinar como o projeto neoliberal chegou ao Brasil, apresentando os argumentos de defesa da reforma do aparelho de estado e as principais táticas utilizadas para essa reforma, como as

(20)

20 privatizações e a difusão da terceirização no serviço público. Por fim, discute-se o lugar do funcionalismo público, qual a sua importância de acordo com o tipo de Estado que se constitui a cada momento histórico.

No capítulo 4, A Reestruturação das Universidades e os Hospitais

Universitários, é feita uma reflexão acerca do Programa de Apoio a Planos de

Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) e do projeto FUTURE-SE. Também foi contextualizado o surgimento dos Hospitais Universitários (HU), suas particularidades e a crise que levou a criação do Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (REHUF). Versa também sobre a origem da EBSERH, criada com a Lei nº 12.550/11 e as características da sua personalidade jurídica (empresa pública de direito privado), buscando caracteriza-la como exemplo de terceirização no serviço público. Investiga-se a atual situação da EBSERH nos HUs: adesões e resistências. Utiliza-se do levantamento bibliográfico e da pesquisa documental. Apresenta-se o HUPES – uma breve história do hospital – e o processo de adesão à EBSERH, trazendo as opiniões da comunidade acadêmica presentes sobre o processo de aprovação da empresa, utilizando-se dos registros de atas e relatórios do CONSUNI e de entrevistas realizadas pelo projeto PIBIC A terceirização na UFBA: o caso da EBSERH.

Finalmente, no quinto capítulo, O Trabalho no Hospital Universitário, são apresentados os resultados da pesquisa de campo. Um balanço dos dados obtidos com aplicação de questionários à luz do marco teórico. Com base na pesquisa empírica, trabalha-se os indicadores de precarização do trabalho, analisando as transformações que ocorreram dentro do HUPES, após o a transferência de gestão à EBSERH.

(21)

21 Considerando-se que a metodologia tem por função auxiliar o pesquisador no processo de reflexão, compreendendo o conjunto de métodos e técnicas para melhor construção e realização da pesquisa (PIRES, 2010), , além de ser, nas ciências sociais, um dos aspectos mais importantes para o sucesso na compreensão do fenômeno que se pretende pesquisar, constituindo “o caminho” a ser trilhado no desenvolvimento do estudo, a escolha das técnicas metodológicas do presente trabalho ocorreu a partir do recorte dado ao objeto. Para analisar as implicações nas relações e nas condições de trabalho no HUPES, após instalação da EBSERH, visando compreender o que mudou no ambiente de trabalho constituído por servidores públicos e empregados da EBSERH, foi escolhida abordagem via estudo de caso.

Na literatura a respeito do fenômeno abordado, o estudo de caso é um procedimento consolidado, tanto no campo amplo da sociologia do trabalho quanto na esfera dos estudos sobre terceirização no serviço público, tendo em vista os trabalhos desenvolvidos por pesquisadores como Graça Druck, Ricardo Antunes, Paula Marcelino, Helder Amorim, Yuri Rodrigues da Cunha, entre outros. Observa-se também sua adoção em trabalhos de pesquisadores que estudam diretamente a terceirização nos serviços de saúde como Maria de Fátima S. Andreazzi, Sara Granemann e Claudia March. Segundo John W. Creswell (2014), “a abordagem do estudo de caso é familiar aos cientistas sociais devido à sua popularidade na psicanalise (Freud), na medicina (análises de caso de um problema), no direito (casos jurídicos) e nas ciências políticas (relatos de casos)” (CRESWELL, 2014, p.87).

Por definição, o estudo de caso é “um procedimento metodológico [...], na medida em que procura apreender diversas dimensões de um fenômeno ou evento social específico” (ALMEIDA, 2016, p.60). Em outras palavras, o estudo de caso pode ser definido como um “estudo aprofundado de uma [ou reduzido número de] unidade(s) (fenômeno relativamente delimitado) em que o objetivo do pesquisador é esclarecer características de classe mais ampla de fenômenos similares” (GERRING, 2004 apud EV e GOMES, 2014, p. 83).

(22)

22 Ronaldo Almeida (2016) destaca três principais acusações que são feitas comumente a este método: a) falta de rigor científico: segundo ele, é necessário sim o cuidado com a produção do conhecimento com diversas técnicas, entretanto, a complexidade é parte da realidade social; b) procedimento longo devido à variedade de métodos; c) dificuldade de generalizações: por se referir apenas a um caso, que para o autor trata-se de um preconceito com o método, visto que o estudo de caso permite generalizações dada a intensidade e complexidade que um caso pode oferecer, apesar das particularidades de cada objeto de estudo.

Este estudo, por exemplo, volta-se para a terceirização dos Hospitais Universitários, fenômeno que vem sendo observado em todo país. Acredita-se que a pesquisa sobre o caso específico do HUPES na UFBA poderá contribuir para compreensão do fenômeno a nível nacional e desenvolver uma caracterização mais geral a respeito do tema. Conforme defende Pires (2010) “em um estudo de caso, não nos interessamos unicamente pelas especificidades do caso em questão (ainda que elas possam ser valorizadas e importantes), mas também por sua capacidade de servir de via de acesso a outros fenômenos ou a outros aspectos da realidade” (PIRES, 2010, p.18).

O estudo de caso pode ser de caso único ou de múltiplos casos, o que definirá tal característica são os objetivos da pesquisa ou a excepcionalidade do caso em estudo. Entretanto, pode ocorrer de ser composta de mais de um caso (EV e GOMES, 2014; FLICK, 2009; PIRES, 2010; CRESWELL, 2014). Este estudo ficou restrito a unidade do Hospital Universitário Professor Edgar Santos, o hospital das clínicas da Universidade Federal da Bahia.

Um elemento importante no estudo de caso, que permite inferir sobre o objeto, é a triangulação de fontes, usando entrevistas, observação, documentos, entre outros. Segundo Ev e Gomes (2014, p. 77) “são estudos de um ou mais casos a partir de uma metodologia de estudo de caso que proporcionam explicações para uma categoria mais ampla de fenômenos e, portanto, possibilitam generalizações e a geração de teorias”. Os autores resgatam a pesquisa de Gary King et al. (1994) na qual alegam que “a pesquisa científica, seja ela qualitativa ou quantitativa, deve sempre se atentar para procedimentos e conceitos primordiais para a produção de inferências válidas” (EV e GOMES, 2014, p. 79). E para tal assertiva é necessário ter atenção com quatro

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23 elementos: pergunta de pesquisa, teoria, dados e manipulação. Conclui-se que o estudo de caso possibilita a construção de inferências válidas cientificamente, não constituindo verdades absolutas, sobre fenômenos complexos da realidade, considerando-se inclusive as limitações do pesquisador e de suas inferências.

Um caso tem diversas dimensões de análise e requer múltiplas estratégias de investigação (YIN, 2001; ALMEIDA, 2016; EV e GOMES, 2014; CRESWELL, 2014). Nesta pesquisa serão utilizadas entrevistas, survey (questionários), análise documental e observação direta, a fim de abarcar todas as dimensões do estudo. Decisão influenciada pela escolha da abordagem qualitativa, que permite e até mesmo exige o uso de diversas técnicas. O HUPES foi escolhido como um caso a ser estudado por ser um hospital de alta complexidade e por possuir uma importância local e regional.

O tratamento eminentemente qualitativo da pesquisa está diretamente relacionado com a teoria utilizada no projeto. Ressalta-se que o estudo de caso possibilita tanto abordagens quantitativas – sendo aconselhável o uso de diferentes estratégias num estudo, quanto qualitativas, mesmo possuindo maior conexão com a última (EV e GOMES, 2014). A opção pela abordagem qualitativa foi induzida por alguns critérios: a escolha da base teórica da pesquisa, como supracitado; o modo como a pergunta de pesquisa entende o fenômeno a ser estudado; natureza do que se pretende conhecer; e também, com o tipo retorno a ser testado e inferências a serem feitas. O pesquisador qualitativo, conforme Creswell (2014) está disposto a realizar uma descrição densa, a passar muito tempo em campo, a participar do processo de coleta de dados, sendo o sujeito que realiza a pesquisa um elemento de interação com a mesma, além de possuir um cuidado extremo com as questões éticas que permeiam todo o processo de pesquisa (projeto, coleta/análise/divulgação dos dados).

2.1 Descrição da técnica de produção e de análise de dados

De acordo com Yin (2001), para se realizar uma boa exploração num estudo de caso é preciso considerar muitas fontes de evidências, das quais ele destaca seis:

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24 documentação, registros em arquivos, entrevistas, observação direta, observação participante e artefatos físicos. Todavia, nesta investigação, dada às limitações de tempo e viabilidade, serão utilizados como técnica de produção de dados apenas a documentação, o registro em arquivos, a observação direta, a entrevista e o survey.

O primeiro procedimento foi o levantamento bibliográfico, processo essencial desde a formulação do projeto. Criou-se um banco de dados bibliográficos de pesquisas realizadas com características semelhantes às desta pesquisa. Como critério de seleção do material encontrado, foram utilizadas pesquisas que apresentassem “ligações com a pergunta de partida; dimensão razoável do programa de leitura; elementos de análise e de interpretação e abordagens diversificadas” (QUIVY e CAMPENHOUDT, 2005, p. 57). Foram analisados artigos, monografias, dissertações, teses e livros que apresentassem conteúdos cuja temática fosse política neoliberal, reforma do estado brasileiro, Programa nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (REHUF) e Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH). Além de estudos sobre terceirização no serviço público e trabalhos na área de saúde (principalmente os lotados em hospitais de ensino). A finalidade da análise bibliográfica é colocar o pesquisador em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto, com o intuito de permitir ao pesquisador “o esforço paralelo na análise de suas pesquisas ou manipulação das informações” (LAKATOS e MARCONI, 1992, p. 43 - 44).

No segundo momento foi feita a avaliação de documentos e registros em arquivos, dedicando atenção às mensagens importantes dos mesmos e informações contidas nas entrelinhas. Os documentos permitem a verificação de termos, conceitos, datas, entre outros elementos que podemtta ser ditos nas entrevistas, além de permitir realizar inferências que poderão ser utilizadas se corroboradas com outras fontes. É importante também ter cautela ao averiguar em que condições foram produzidas, por quem, para quem, e o grau de precisão dessa fonte (YIN, 2001; CELLARD, 2010).

A observação direta ocorreu no mesmo período em que foram realizadas as entrevistas, atentando principalmente para as condições físicas e o espaço de trabalho permitidos. Como afirmado por Yin (2010, p.115), “as provas observacionais são, em

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25 geral, úteis para fornecer informações adicionais sobre o tópico que está sendo estudado”.

O survey, apesar de ser comumente utilizado em pesquisas quantitativas, foi escolhido como técnica de coleta de dados, visto que o seu resultado será avaliado na perspectiva qualitativa. O survey tem como objetivo captar a dimensão dos trabalhadores – aqueles que não ocupam cargo de gerência- e as alterações no modelo de gestão do hospital. Por fim, realizou-se entrevistas semiestruturadas com os critérios mencionados abaixo. Entretanto, não se perdeu de vista o cuidado de encadeamento de evidências e sua coerência, transparecendo todo o processo de coleta de dados, que o autor Yin (2001) destaca como essencial para o estudo. A pesquisa teve cuidados com seu desenho, não perdendo de vista que:

um bom desenho de pesquisa torna a pesquisa administrável em termos de recursos e tempo e é claro nas decisões sobre amostragem e nas razões para se usar determinados métodos. Também está bem relacionado ao pano de fundo teórico e baseado na perspectiva de pesquisa de estudo[...]. Entretanto, um bom desenho deve, ao mesmo tempo, ser sensível, flexível e ajustável às condições em campo, e, nesse sentido, estar aberto a novas visões resultantes dos primeiros passos ou durante o processo de pesquisa (FLICK, 2009, p.72-73).

Desta maneira, o desenho da pesquisa ficou organizado na seguinte ordem: o levantamento bibliográfico; a análise baseada na pesquisa documental a fim de compreender o processo de adesão a EBSERH, seu funcionamento, o modelo de gestão, os planos de carreira/trabalho dentre outros assuntos. Por fim, foi realizada a aplicação de questionários com trabalhadores e uma entrevista semiestruturada com a gestão.

A respeito da pesquisa de campo - importante etapa da pesquisa - alguns elementos devem ser considerados. Por se tratar de um estudo realizado dentro do Hospital das Clínicas, o projeto foi submetido à Plataforma Brasil. A professora e orientadora, assumiu a função de pesquisadora responsável- requisito obrigatório para o Comitê do HUPES. Por não possuir um comitê próprio nas ciências sociais, nem a orientadora possuir vínculo com algum comitê, a Plataforma Brasil encaminhou primeiramente o projeto ao Comitê de Enfermagem e posteriormente ao Comitê do HUPES, a instituição coparticipante. O projeto teve seu parecer de aprovação com o

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26 número 3.144.892, no dia 13 de fevereiro de 2019. A partir desse momento foi liberado a confecção do crachá para entrada e a autorização da pesquisa dentro do HUPES.

A realização do campo ocorreu entre os meses de abril, março e julho de 2019. O levantamento de documentos ocorreu desde o processo de seleção para o mestrado até início de 2020, quando foi solicitado novos dados pelo Sistema Eletrônico do Serviço de Informações ao Cidadão (e-SIC), assim como ocorreu com a bibliografia que novas leituras tornaram-se necessárias pós pesquisa empírica.

2.2 Instrumentos elaborados e as técnicas de utilização

O instrumento apresentado é a entrevista semiestruturada. Esta que se apresenta como uma das mais importantes fontes para obtenção de informação num estudo de caso, além de ser uma técnica consolidada nas pesquisas sociais (YIN, 2001; FLICK, 2009; BAUER, 2015; CRESWELL, 2014). Foram realizadas entrevistas com os principais gestores, baseada na construção preliminar de um roteiro para auxiliar na condução das entrevistas. Segundo Solange Simões e Maria Aparecida Pereira, “o roteiro de avaliação da entrevista permite a sistematização da avaliação e dos comentários dos entrevistadores em relação ao entendimento das questões e outras dificuldades enfrentadas durante a condução da entrevista pelos entrevistados e pelos próprios entrevistadores” (SIMÕES e PEREIRA, 2007, p. 250). Por sua vez, Uwe Flick (2009) destaca que ao mesmo tempo que o entrevistador deve manter um rigor, o roteiro deve ser flexível, visto que as melhores entrevistas “se beneficiam da flexibilidade dos pesquisadores para adaptar suas perguntas ao participante individual e ao desenvolvimento da entrevista concreta” (FLICK, 2009, p. 91). Já para Maria Cecília Minayo, a entrevista pode ser compreendida como a estratégia mais utilizada no desenvolvimento do trabalho de campo, pois possibilita colher “informações diretamente construídas no diálogo com o indivíduo entrevistado e tratam de reflexão do próprio sujeito sobre a realidade que vivencia” (MINAYO, 2007, p. 65).

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27 No que se refere à amostra do campo de pesquisa, destaca-se que o Hospital possui três grandes áreas de gerência: Gerência de Atenção à Saúde, Gerência de Ensino e Pesquisa e Gerência Administrativa. A primeira possui 34 postos de gerência, a segunda 5 postos e a terceira 13, segundo o Plano Diretor Estratégico (HUPES, 2016). À princípio, pretendia-se entrevistar um membro de cada gerência, totalizando 3 pessoas. Contudo, o fato da pesquisadora ser exógena ao Hospital, trouxe dificuldades e apenas uma entrevista foi realizada.

A aplicação dos questionários foi realizada para trabalhadores RJU e CLT. A amostra inicial era de 5% dos cargos e deveria ser aplicada aos dez postos de trabalho mais representativos numericamente do HUPES. Contudo, a porcentagem da amostra dos questionários foi alterada para 5% do total de vínculos RJU e 9,7 % do total contratados via EBSERH, dado o acesso aos sujeitos, não interferindo na confiabilidade da pesquisa por se tratar de um estudo qualitativo. Este tipo de situação foi previsto por Pires (2010), ao afirmar que na pesquisa qualitativa a amostra pode, às vezes, se alterar durante o processo de investigação dado o próprio processo de saturação que pode ocorrer.

Para condução da entrevista foi utilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que orientava o participante quanto ao procedimento da pesquisa e as normas éticas que conduziam a realização do trabalho, chamando atenção para o procedimento de análise dos dados coletados, que exclui qualquer possibilidade de identificação do entrevistado. No TCLE estão presentes as questões a respeito da divulgação dos resultados da pesquisa, o que prevê um retorno aos sujeitos envolvidos. O Termo foi assinado pela pesquisadora responsável (orientadora), pela pesquisadora assistente (mestranda) e pelo entrevistado. Para os sujeitos que foram apresentados os questionários foi realizado o mesmo procedimento das entrevistas, um TCLE além do consentimento no preâmbulo do instrumento.

Para sensibilizar o entrevistado, foi apresentada a importância do estudo para averiguar as reais condições e relações de trabalho após a mudança estrutural da gestão do hospital, destacando a importância desse mapeamento, até então não realizado no hospital, para avaliar o processo de adesão ao modelo de gestão da EBSERH, cujo contrato tem 20 anos de duração.

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2.3 Metodologia de Análise de dados

Segundo Gomes (2004) a “palavra categoria, em geral, se refere a um conceito que abrange elementos ou aspectos com características comuns ou que se relacionam entre si. Essa palavra está ligada à ideia de classe ou série” (GOMES, 2004, p.70). A construção de categorias pode surgir do campo ou da revisão bibliográfica e visa ajudar na organização, classificação, separação, união das respostas encontradas em entrevistas e questionários. “As categorias são construtos linguísticos, não tendo por isso limites precisos. Daí a importância de sua descrição cuidadosa, sempre no sentido de mostrar aos leitores e outros interlocutores as opções e interpretações assumidas pelo pesquisador” (MORAES e GALIAZZI, 2006, p.116).

Nesta pesquisa as categorias utilizadas foram construídas com base no aporte teórico. Também foi realizada a análise de todo conteúdo coletado, tanto dos documentos selecionados quanto dos questionários e transcrições feitas. Por fim, foi utilizada a triangulação de dados. Cruzou-se os dados empíricos resultantes da aplicação dos questionários, das entrevistas e da observação direta. Após a ida a campo a análise foi feita com base na bibliografia, com a releitura de alguns documentos e a solicitação de novos dados pelo e-SIC. O campo também indicou a necessidade de novas leituras para chegarmos nas considerações finais. Contudo, quaisquer técnicas de análise e metodologia possuem limitações, assim como o próprio recorte da pesquisa realizado. Assim sendo, reconhece-se a importância de ev as escolhas feitas durante a pesquisa, no intuito de possibilitar um efetivo conhecimento da realidade.

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3.1 A racionalidade neoliberal

Na contemporaneidade, especificamente a partir do final do século XX, há uma forma particular de mundialização do capital que atua sob a égide neoliberal nos âmbitos político, social e econômico. Desse modo, é importante traçar uma breve análise sobre estes fenômenos, que são essenciais para compreender as transformações no mundo do trabalho, e por consequência, as alterações dentro do serviço público brasileiro e nas condições e relações de trabalho presentes no Hospital das Clínicas da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

O neoliberalismo emerge após a II Guerra Mundial, em resposta política e teórica ao Estado de bem-estar e ao keynesianismo. É considerado marco inicial o lançamento do livro O Caminho da Servidão (1944) de autoria do austríaco Friedrich Hayek, que realiza uma defesa do livre mercado e tece críticas às políticas da socialdemocracia. À princípio, suas ideias não tiveram boa aceitação e, em 1947, Hayek convoca uma reunião na Suíça para fundar a Sociedade Mont Pelèrin, constituída por ele e outros teóricos que tinham em comum a luta contra as políticas do Estado de bem-estar e o New Deal (DARDOT e LAVAL, 2016). Um dos mais influentes desses intelectuais foi o norte americano Milton Friedman. Assim como Hayek, ele acreditava que a democracia jamais havia sido um valor para o neoliberalismo, logo a sua existência não era condição sine qua non para o desenvolvimento das políticas neoliberais (ANDERSON, 1995; PUELLO-SOCARRÁS, 2015).

No início dos anos 1970, ocorreu a grande crise do modelo fordista de produção. Foi no final dessa década que o projeto neoliberal se fortaleceu e se consolidou. A Inglaterra capitalista foi precursora na implantação de um programa neoliberal, com

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30 Margareth Thatcher. Na América Latina, em 1973, ocorre um golpe contra o governo popular de Salvador Allende e a instauração da ditadura de Pinochet - uma das mais violentas ditaduras do pós-guerra, que também se constituiu nos moldes neoliberalistas. A ditadura chilena foi marcada por: desemprego massivo, combate à representação sindical, políticas de redistribuição de renda em prol dos ricos e uma série de outras ações antipopulares. Em seguida, em 1980, Ronald Reagan chegou à presidência dos Estados Unidos com a mesma proposição.

É importante frisar que o crescimento e o fortalecimento da hegemonia neoliberal não ocorreram apenas devido às suas próprias estratégias. Outros processos que influenciaram esse fenômeno foram: o fim da União Soviética, a queda do Muro de Berlin, a vitória do Ocidente na guerra fria - o que marcou a derrota do comunismo e, associados diretamente ao governo de Reagan e Thatcher, o enfraquecimento da esquerda e a falta de alternativa possível para o sistema capitalista. Esses acontecimentos fortaleceram o discurso de que o Estado de bem-estar era o culpado pela crise e pela falta de desenvolvimento (ANDERSON, 1995; DARDOT E LAVAL, 2016).

Segundo Dardot e Laval (2016), o neoliberalismo criou uma nova razão de mundo, ampliando a lógica de funcionamento do capital em todas as relações sociais e esferas da vida. Nesse sentindo, é possível estabelecer um diálogo entre os autores citados e os escritos do teórico António Gramsci sobre hegemonia, em que os subordinados são convencidos pelos setores dominantes, reproduzindo seus valores e ideais, especialmente no que denominam de “razão neoliberal”. Outro aspecto do neoliberalismo é a sua capacidade de se retroalimentar das crises que ele mesmo produz e da destruição das instituições e de direitos sociais. O neoliberalismo construiu uma “forma de existência”, influenciando diretamente as relações subjetivas e interpessoais. É isto que expressam Dardot e Laval, quando afirmam:

As circunstâncias desse sucesso normativo foram descritas inúmeras vezes. Ora sob seu aspecto político (a conquista do poder pelas forças neoliberais), ora sob os aspectos econômicos (o rápido crescimento do capitalismo financeiro globalizado), ora sob o aspecto social (individualização das relações sociais às expensas das solidariedades coletivas, a polarização extrema entre ricos e pobres), ora sob seu

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31 aspecto subjetivo (o surgimento de um novo sujeito, o desenvolvimento de novas patologias psíquicas). Tudo isso são dimensões complementares da nova razão do mundo (DARDOT e LAVAL, 2016, p. 16).

Tais aspectos desse sistema político demonstram seu poder global perante a sociedade. Logo, os impactos sobre a esfera da produção afetaram igualmente as relações e as condições do mundo do trabalho. Os autores utilizam do conceito foucaultiano de governamentalidade2 e explicam que a dita racionalidade política é vista como uma racionalidade “governamental” que está presente nos governantes e nos governados. Por sua vez, governo é definido como atividade que tem por função gerir a conduta dos sujeitos no interior de um quadro e com aparelhos de Estado (Dardot e Laval, 2016).

Um dos valores centrais desse sistema é a concorrência, que se torna um princípio de conduta. A concorrência é estabelecida como regra universal do governo, ou seja, o Estado concorrencial rege suas ações para fazer da concorrência a lei da economia nacional. Na racionalidade neoliberal, a concorrência se apresenta “como norma da construção do Estado e de sua ação e, por fim, da concorrência como norma do Estado-empresa à concorrência como norma da conduta do sujeito-Estado-empresa” (Ibid., p.379). O Estado passa a agir feito uma empresa tendo em seu bojo o pensamento concorrencial, sempre em busca de potencializar seus resultados.

José Francisco Puello-Socarrás (2008) compartilha de pensamento semelhante ao dos autores supracitados, pois compreende que o neoliberalismo não veio apenas como uma resposta pronta à crise econômica do capitalismo, mas se configura em um potente projeto sociopolítico que tem a intenção de prolongar-se no tempo e espaço, solidificando-se em todo o conjunto social. Para este autor:

El neoliberalismo hoy lejos de agotarse se reedita. Presenciamos alguna suerte de reactualización que se prolonga en el tiempo y en el espacio, tanto a nivel global como local. Aunque –también es cierto que, a su vez– las crisis 2 “O termo governamentalidade foi introduzido precisamente para significar as múltiplas formas dessa atividade pela qual homens, que podem ou não pertencer a um governo, buscam conduzir a conduta de outros homens, isto é, governa-los” (DARDOT e LAVAL, 1996, p. 18).

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32 neoliberales manifiestan cada vez más que los márgenes de su autogestión van estrechándose con la profundización de sus contradicciones3 (PUELLO-SOCARRÁS, 2008, p. 81).

Desta forma, o autor demonstra que o neoliberalismo passa por transformações que o fortalecem – mesmo aprofundando as contradições nesse processo de reedição constante - o que Dardot e Laval (2016) chamam de autofortalecimento. Trata-se de um projeto político de classe para a perpetuação daqueles que dominam continuarem no poder. Para que isso ocorra, conseguir se renovar é essencial para sua eficiência. O neoliberalismo é mais uma fase do capitalismo, marcado por continuidades e rupturas presentes na lógica da acumulação do capital. Falar do neoliberalismo é principalmente falar das estratégias ofensivas contra o trabalho e que se apresentam como resposta às crises estruturais, cíclicas e globais do capitalismo tardio (PUELLO-SOCARRÁS, 2015).

Nesse sentido, é preciso compreender outros elementos que foram influenciados pelo neoliberalismo, como a reestruturação produtiva. O neoliberalismo enquanto modelo econômico e ideológico veio para consolidar a reestruturação produtiva, fenômeno que surge no princípio dos anos 70 nos países capitalistas centrais como solução à redução da produtividade, à queda nos níveis de crescimento, ao aumento do desemprego e déficits públicos, à aceleração das taxas de inflação - todos indicadores da crise do padrão fordista de produção e do Estado de bem-estar social (FILGUEIRAS, 1997; GRANEMANN, 2011; HARVEY, 1992).

Na perspectiva industrial, a reestruturação se manifesta na reordenação e reconversão das indústrias, com investimento no setor de informática, química, biotecnologia, além da modernização e da automatização do setor automobilístico, petroquímico, dentre outros mais dinâmicos. Nesse mesmo compasso ocorre a queda nos setores mais tradicionais como a indústria têxtil e a siderúrgica (DRUCK, 1996; FILGUEIRAS, 1997).

3 “O neoliberalismo hoje, longe de estar esgotado, está sendo reeditado. Estamos testemunhando algum tipo de atualização que continua no tempo e no espaço, tanto global quanto localmente. Embora - também é verdade que, por sua vez - as crises neoliberais mostram cada vez mais que as margens de sua autogestão estão se estreitando com o aprofundamento de suas contradições (Tradução via Google Tradutor).

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33 Nesse contexto, são introduzidas as novas formas de gestão do trabalho. O capitalismo como sistema de produção é marcado pela exploração da mais-valia e pela alienação do trabalho. Ao longo da história passou por diferentes transformações com o intuito de minimizar suas próprias contradições. O modelo japonês ou toyotismo surge carregado de novos propósitos, entre eles: padrões de qualidade total, produção “enxuta” direcionada a exigências do mercado, produção diversificada e com baixos custos, o princípio do just in time, uso de novas tecnologias e o protagonismo da terceirização (DRUCK, 1996). A terceirização aqui é compreendida como a transferência do custo da gestão da força de trabalho e de seus direitos para outra empresa (DRUCK et al., 2018). Segundo Helder Amorim (2009), constrói-se um novo modelo, para atender aos anseios de recomposição de poder do capital, que necessitava viabilizar o corte de custos de mão-de-obra e, ao mesmo tempo, vencer o poder dos sindicatos, conquistado pelo proletariado na era fordista.

De acordo com Druck (1996), a globalização, assim como a reestruturação produtiva, possuem um caráter estrutural, pois são processos de longo prazo. Dentre os objetivos da reestruturação produtiva destacam-se, além da redução de custos, o estímulo à produtividade e à competitividade. A nova estrutura de produção também é regida diretamente pela flexibilização do trabalho, impactando diretamente nas suas condições.

O processo de reestruturação produtiva impulsiona a globalização. Nos anos 1980, a globalização se fortalece marcada pelo processo transnacional de expansão de mercados e a ampliação da competição dos mesmos, que por sua vez, determina mudanças na esfera produtiva nas diferentes áreas do mundo (DRUCK, 1996; FILGUEIRAS, 1997). A globalização redefine as relações de poder, principalmente entre os países centrais e periféricos. Somado a isso, outro fenômeno da globalização, além das implicações nos planos social e político, é a velocidade do tempo social que se estabelece no século XX.

Druck (1996), em consonância com o pensamento do historiador Eric Hobsbawm, reflete sobre como essa velocidade potencializa as transformações e, por conseguinte, aparenta encurtar a memórias dos indivíduos, rompendo com as ligações da história passada, deixando-se levar por qualquer fragmento do momento presente e sem

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34 formular e refletir sobre o futuro. Ainda nos seus escritos, Druck (2011) fala de “uma rapidez inédita do tempo social, sustentado na volatilidade, efemeridade e descartabilidade sem limites de tudo o que se produz e, principalmente, dos que produzem – os homens e mulheres que vivem do trabalho”. Os trabalhadores sentem em seus corpos a nova rotina que exige mais velocidade e lhes impõe trabalhos com contratos cada vez mais flexíveis e curtos, os trabalhadores tornam-se obsoletos e precisam constantemente se adaptar e renovar para não serem descartados (DRUCK, 2011, p.24).

Apesar de complementares, a reestruturação produtiva, a globalização e o neoliberalismo não são sinônimos. A reestruturação consolida as necessidades da globalização que, por sua vez, possibilita o fortalecimento do projeto político, econômico e ideológico do neoliberalismo (DRUCK, 1996). Há algo de comum entre os fenômenos da reestruturação produtiva e o neoliberalismo, que é a acumulação flexível: “o capital, em seu movimento de valorização, deve estar livre de empecilhos e restrições de qualquer natureza” (FILGUEIRAS, 1997, p. 914). Para David Harvey (1992), a partir de 1972, o mercado financeiro se transformou e cresceu de maneira inédita, estabelecendo uma grande autonomia diante da produção real. Aí tem início a acumulação flexível.

Harvey (1992) utiliza o termo “acumulação flexível” para se referir ao conturbado período de reestruturação econômica e de reajustamento social e político, que vai contra a rigidez fordista, apoiando “flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo” (HARVEY, 1992, p.141). Noutros termos, o processo de acumulação tornou-se mais “flexível” em relação ao modelo fordista e no regime jurídico de regulamentação do mercado de trabalho, mantendo-se a essência da apropriação do trabalho pelo capital (DRUCK, 2011). Esse processo é resultado da queda da produtividade nos principais países do mundo acometidos pela saturação de mercadorias dentro do modelo fordista de produção, a supracitada crise fordista. Verificou-se, por sua vez, a transferência deliberada do capital do setor produtivo para a esfera financeira, resultando em novas práticas produtivas e modos de gestão de trabalho (DRUCK, 2011). Evidencia-se, assim, o enraizamento da reestruturação produtiva e o padrão de acumulação flexível. A palavra de ordem, no jogo do mercado, é a flexibilidade e a eficiência. É a produção com novos ritmos, com a

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35 diminuição máxima de custos e a racionalização nos processos de trabalhos. Todos os elementos fundamentais para a consolidação do neoliberalismo.

O fortalecimento desse sistema tem um grande impacto social, na medida em que intensifica a precarização do trabalho. Nota-se que esse fenômeno, mundialmente difundido e intensificado nas últimas décadas, ocorreu com o desenvolvimento da agenda neoliberal e de sua racionalidade (DARDOT E LAVAL, 2016; FILGUEIRAS, 1997).

Segundo Pierre Bourdieu (1998), a precariedade não é natural e está atualmente em todo lugar, por todos os setores, público e privado, nas empresas, nas instituições de difusão cultural, na educação, nas mídias sociais, etc. Ela afeta a todos, independente das suas qualificações, de maneira muito parecida. No entanto, há um grupo em especial que sente a precariedade ainda mais forte, os desempregados, causando-lhes “a desestruturação da existência, privada, entre outras coisas, de suas estruturas temporais, e a degradação de toda a relação com o mundo e, como consequência, com o tempo e o espaço” (BOURDIEU, 1992, p.72).

A precariedade lembra ao trabalhador de que ele não é insubstituível, mostra a fragilidade das suas relações trabalhistas e como ele pode se tornar ultrapassado a qualquer momento. Dissemina-se uma insegurança subjetiva generalizada que tem em sua base a insegurança objetiva, além da concorrência por emprego e no emprego (Bourdieu, 1998). A concorrência, que é fruto do projeto econômico do neoliberalismo, ramifica-se para a esfera governamental e se entranha em todas as relações. E passa a predominar na gestão de recursos humanos, tanto na esfera pública feita pelo Estado, quanto nas empresas e indústrias privadas.

Evidencia-se, dessa maneira, que a precariedade é fruto de uma vontade política e não uma fatalidade econômica, como demonstra Bourdieu (1998), e identifica a flexibilização como uma excelente estratégia para sua mundialização. Consequentemente, falar desse momento histórico é perceber a centralidade da precarização social do trabalho para o desenvolvimento capitalista. (CASTEL, 1998 apud DRUCK, 2011). Logo, dizer que a precarização social do trabalho adquire caráter central nessa nova dinâmica capitalista, é compreendê-la como estratégia de dominação, de acordo com Druck (2011). A autora aponta que força e consentimento

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36 são instrumentos que o capital utiliza para possibilitar esse grau de acumulação que não possui limites morais e materiais. Ao analisar o mercado de trabalho brasileiro, ela identifica outras dimensões da precarização, além da terceirização, e que se encontram relacionados. São eles: vulnerabilidade das formas de inserção no mercado; intensificação do trabalho; insegurança e riscos à saúde do trabalhador; perda das identidades individual e coletiva; fragilização das organizações laborais e condenação do Direito do Trabalho.

É importante compreender que a precarização social do trabalho é resultado de um processo histórico, em que a precariedade, que é um fenômeno inerente ao próprio sistema capitalista e sua lógica de acumulação, se metamorfoseia (DRUCK, 2013). Nas palavras de Bourdieu: “ a precariedade se inscreve num modo de dominação de tipo novo, fundado na instituição de uma situação generalizada e permanente de insegurança, visando obrigar os trabalhadores à submissão e à aceitação da exploração” (BOURDIEU, 1998, p.75). Em conformidade com Bourdieu (1998) e Druck (2013), Thébaud-Mony (2007) ressalta que a precarização deve ser compreendida como “processo social constituído pela amplificação e institucionalização da instabilidade e da insegurança, expressa nas novas formas de organização do trabalho – onde a terceirização/subcontratação ocupa um lugar central” (THÉBAUD-MONY, 2007, 37).

O que se altera nesse sistema é a própria relação do indivíduo com a realidade, pois o neoliberalismo cria uma nova situação de mercado, onde se intensifica a mercadorização da vida e seus serviços, é todo um jogo econômico que leva o indivíduo a pensar que só existe uma regra dentro desse jogo. Em acordo com Dardot e Laval (2016), utiliza-se aqui o conceito de sociedade neoliberal, não que a mesma tenha deixado de ser capitalista, mas por que a atual sociedade é uma figura singular do capitalismo que possui uma “irredutível especificidade” (DARDOT e LAVAL, 2016, p.26).

No atual momento da hegemonia neoliberal, verifica-se o fomento do individualismo. Dardot e Laval argumentam que para os teóricos neoliberais “se o indivíduo é o único responsável por seu destino, a sociedade não lhe deve nada; em compensação, ele deve mostrar constantemente seu valor para merecer as condições de sua existência” (Ibid., p.213) O individualismo deixa de pertencer a esfera do mercado

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