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A MATERIALIDADE DO ICMS-IMPORTAÇÃO E A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 33 DE 2001 MESTRADO EM DIREITO

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LEONARDO VANNI

A MATERIALIDADE DO ICMS-IMPORTAÇÃO E A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 33 DE 2001

MESTRADO EM DIREITO

SÃO PAULO

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LEONARDO VANNI

A MATERIALIDADE DO ICMS-IMPORTAÇÃO E A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 33 DE 2001

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito, sob a orientação da Professora Doutora Elizabeth Nazar Carrazza.

SÃO PAULO

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BANCA EXAMINADORA

____________________________________

____________________________________

(4)

A esta universidade, seu corpo docente, direção e administração que oportunizaram, direta e indiretamente, a promoção do presente estudo, o qual tem grande significado em minha vida pessoal e profissional.

À minha orientadora, Professora Elizabeth Nazar Carrazza, pelo suporte, mas principalmente pelo exemplo de mestre e pessoa.

Aos meus pais, pelo amor, incentivo e apoio incondicional.

Aos amigos Isabela e Fernando Bonfá, pelo incentivo e pela confiança.

(5)

De fato nada aprendi sem que tenha partido, nem ensinei ninguém sem convidá-lo a deixar o ninho. Partir exige um dilaceramento que arranca uma parte do corpo à parte que permanece aderente à margem do nascimento, à vizinhança do parentesco, à casa e à aldeia dos usuários, à cultura da língua e à rigidez dos hábitos. Quem não se mexe nada aprende. Sim, parte, divide-te em partes. Teus semelhantes talvez te condenem como um irmão desgarrado. Eras único e referenciado. Tornar-te-ás vários, às vezes incoerente como o universo que, no início, explodiu, diz-se, com enorme estrondo. Parte, e tudo então começa.

Partir. Sair. Deixar-se um dia seduzir. Tornar-se vários, desbravar o exterior, bifurcar em algum lugar. Eis as três primeiras estranhezas, as três variedades de alteridade, os três primeiros modos de se expor. Porque não há aprendizado sem exposição.

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O presente trabalho tem a intenção de investigar a respeito dos efeitos decorrentes da inserção proposta pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001, a qual entendemos ter criado uma nova exação tributária semelhante ao Imposto de Importação, mas de competência dos Estados e do Distrito Federal.

Neste sentido, buscamos compreender a opinião da mais moderna doutrina sobre a matéria, a fim de estarmos munidos de instrumentos capazes de compreender quanto à adequação da referida Emenda ao contexto constitucional atual.

A investigação em tela inicia pelas particularidades do imposto sobre circulação de mercadorias (ICMS), de forma a cotejá-lo com a incidência deste mesmo imposto sobre operações de importação. Neste ponto, defenderemos que o imposto estadual incidente sobre importação de mercadorias não constitui espécie tributária autônoma, devendo ostentar coerência com a materialidade do imposto incidente nas operações internas.

Seguindo no mesmo sentido, o estudo em questão atingirá seu objetivo ao adentrar especificamente nas alterações promovidas pela referida Emenda constitucional, de forma a demonstrar que ao “alargar” a competência tributária dos Estados e do Distrito Federal, o legislador constituinte derivado restou por ferir direito fundamental do contribuinte, portanto incorrendo em inconstitucionalidade nos termos do inciso IV, §4º, artigo 60 da Constituição Federal.

Finalmente, iremos investigar casos emblemáticos da jurisprudência envolvendo as particularidades da alteração promovida pela Emenda Constitucional nº33 de 2001, de acordo com os conceitos apreendidos nos capítulos anteriores, firmando opinião quanto aos casos analisados.

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This paper intends to investigate into the effects related to the insertion proposed by Constitutional Amendment No. 33 of 2001, which we understand to have created a new tax exaction similar to import duty, but to be imposed by the States and the Federal District.

In this sense, we seek to understand the views of the more modern doctrine on the matter, in order to be equipped with instruments capable of understanding the appropriateness of the amendment to the current constitutional context.

Research on screen starts with the details of tax on merchandise operations (ICMS), in relation with the incidence of this same tax on import operations (ICMS-Importação) with merchandise. At this point, we will hold that the incident on the import of goods does not constitute an autonomous state tax tax species and should bear consistency with the materiality of the tax levied on domestic operations (ICMS).

Following the same lines, the study in question will reach it´s goal entering specifically into the changes performed by that Constitutional amendment in order to demonstrate the "extension" of the taxing power of the states and the Federal District, made by the constitutional legislator derived, hurting taxpayer individual guarantee, thus being unconstitutional under item IV, § 4, Article 60 of the present Federal Constitution.

Finally, we will investigate the emblematic cases involving the particularities of change promoted by Constitutional Amendment No. 33, 2001, in accordance with the concepts learned in previous chapters, firming opinion about the cases analyzed.

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INTRODUÇÃO ... 10

CAPÍTULO I – SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO... 14

1.1 Sistema do direito positivo ... 14

1.2 Sistema constitucional brasileiro ... 18

1.2.1 Conceito de constituição ... 20

1.2.1.1 Limites ao poder constituinte derivado ... 22

1.3. Sistema constitucional tributário ... 27

1.3.1 Competência tributária ... 28

1.4 Diferença entre princípios e regras constitucionais ... 36

1.5 Princípios que devem ser observados ... 40

1.5.1 Princípios gerais relacionados com a matéria ... 40

1.5.1.1 Princípio republicano ... 41

1.5.1.2 Princípio federativo ... 46

1.5.2 Princípios especialmente relacionados em matéria tributária ... 49

1.5.2.1 Princípio da legalidade ... 50

1.5.2.2 Princípios da igualdade (isonomia) e da capacidade contributiva ... 53

1.5.2.3 Princípio da proibição de tributação com efeito de confisco ... 60

1.5.2.4 Princípio da não-cumulatividade ... 65

1.5.2.4.1 Violação do princípio da não-cumulatividade em função da Emenda Constitucional nº 33 de 2001 no caso do ICMS-Importação ... 73

CAPÍTULO II – ANÁLISE DO ARQUÉTIPO CONSTITUCIONAL DO ICMS-IMPORTAÇÃO ... 76

(9)

2.1.1.2 Vocábulo operação ... 86

2.1.1.3 Vocábulo mercadorias ... 88

2.1.2 Critério espacial da regra matriz ... 92

2.1.3 Critério temporal da regra matriz ... 95

2.2 Consequente normativo ... 100

2.2.1 Critério quantitativo da regra matriz ... 100

2.2.1.1 Base de cálculo do ICMS-Importação ... 106

2.2.2 Critério pessoal da regra matriz ... 110

CAPÍTULO III - DA MATERIALIDADE DO ICMS-IMPORTAÇÃO NA REDAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº33 DE 2001 ... 119

3.1 Direito fundamental de apenas ser tributado nos termos da Constituição ... 126

3.1.1 Direito fundamental de apenas ser tributado nos estritos termos da redação original da Constituição Federal ... 127

3.2 ICMS-Importação incidente sobre a pessoa física e sobre não-contribuintes do imposto ... 131

3.3 ICMS-Importação incidente sobre o Ingresso de bens em contratos de arrendamento mercantil ... 140

CONCLUSÃO ... 152

(10)

INTRODUÇÃO

Em função do princípio da estrita legalidade tributária, a cobrança de tributo somente pode existir uma vez que instituída por lei, de forma pormenorizada, de acordo com todos os critérios da regra-matriz de incidência da exação em questão.

A lei instituidora do tributo, por sua vez, deverá buscar seu fundamento de validade na Constituição Federal, na qual restam elencadas todas as materialidades tributárias possíveis, de acordo com o ente político que tem a capacidade de criá-la. em sistema constitucional de repartição de competências tributárias.

O objeto do presente trabalho consiste no fato da Emenda Constitucional nº 33, de 11 de dezembro de 2001, ter promovido modificação no âmbito do sistema de atribuição de competências, o que veremos não poderia ter ocorrido. Isso porque a referida alteração da Lei Maior teve por efeito a criação de um novo tributo, capaz de ser exigido no ingresso de bens e mercadorias em território nacional, independentemente do objetivo da importação, tributo este também albergado sob sigla ICMS.

Em relação ao ICMS incidente sobre as Importações (ICMS-Importação), o Texto Constitucional, em sua redação original, limitava a competência tributária dos Estados e do Distrito Federal às entradas de mercadorias. Na redação original, assim dispunha a alínea “a”, inciso IX do artigo 155 da Constituição Federal de 1988 (CF/88):

Art. 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.

(…)

§2º - O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...)

IX - incidirá também:

(11)

De acordo com a redação original da alínea “a”, IX, §2º, do artigo 155 da Constituição Federal, verificamos que o ICMS incidente nas operações de importação ostenta coerência material com o ICMS incidente sobre as operações internas, sendo somente possível a instituição do imposto em relação aos bens que ingressem no país com objetivo comercial.

Advertimos que incidência do ICMS não se relaciona com a importação propriamente dita, uma vez que a competência para a tributação deste fato foi outorgada à União, por meio do Imposto de Importação1. No caso do ICMS-Importação, o que é possível tributar é a incorporação de determinada mercadoria a ciclo econômico, que será desenvolvido em território brasileiro. Há, claramente, a distinção necessária para que se delimite a competência tributária de cada um das pessoas políticas. Em sendo assim, correta a classificação do ICMS-Importação em conjunto com o “imposto sobre a circulação de mercadorias”, como destacado no item anterior. Contrario sensu, de acordo com a distinção apontada, entende-se que não incide o ICMS-Importação nos casos de importação de bens de consumo, promovida por não-contribuinte do imposto, por exemplo, conforme já se manifestou o STF nos autos do RE nº 185.789-7/SP.

Neste contexto, a partir da edição da Emenda Constitucional nº 33 de 2001 (EC nº 33/01), passou a ser a disposição constitucional da alínea “a”, inciso IX do artigo 155 da Constituição Federalque o ICMS incidirá também:

a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço; (grifo nosso)

Constatamos, portanto, que a referida emenda promoveu ‘alargamento” das materialidades passíveis de incidência pelo ICMS, de forma que qualquer entrada pode ser escolhida pelo legislador infraconstitucional como objeto de incidência do ICMS-Importação. Esta, no entanto, não é a posição defendida pelo presente trabalho, como veremos a seguir.

A nosso ver, a alteração constitucional objeto do presente estudo fez surgir um novo tributo, o que desrespeita garantia fundamental do contribuinte, de apenas

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ser tributado nos estritos termos exauridos pelo legislador constituinte originário, em afronta direta ao artigo 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal.

De modo a demonstrar as inconstitucionalidades que permeiam a alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001 o presente trabalho propõe análise dividida em duas partes, sendo a primeira relacionada a conceitos gerais aplicáveis à matéria e a segunda dedicada especificamente às alterações promovidas pela referida emenda.

Nesta parte geral, o estudo busca traçar o conceito de sistema constitucional, demonstrando hierarquia existente entre as normas constitucionais, bem como a hierarquia existente entre os poderes constituintes, se originário ou derivado.

Ainda no âmbito do estudo geral da matéria constitucional aplicável, buscamos analisar o sistema constitucional tributário, principalmente no que diz respeito à sistemática de repartição das competências tributárias. No mesmo sentido, ainda, buscaremos analisar os mais implicados princípios constitucionais, úteis na verificação da inconstitucionalidade promovida pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001.

Dando continuidade ao estudo, buscaremos investigar o ICMS-Importação em contraposição com o estudo a respeito da regra-matriz do ICMS incidente nas operações internas com mercadorias, de forma a demonstrar a inexistência de uma materialidade completamente dissociada no caso das operações provenientes do exterior.

Avançando na parte especifica do presente estudo, analisaremos pormenorizadamente a alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001, de forma a demonstrar que a referida emenda deve ser compreendida por inconstitucional, sendo que para tal nos valeremos de conceitos construídos na parte geral deste estudo.

Finalmente, o estudo em tela tratará em específico de dois casos já debatidos no âmbito da jurisprudência, diretamente implicados pelas alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001, o caso das importações promovidas por pessoas físicas e não-contribuintes do ICMS e o caso das importações decorrentes de contratos de arrendamento mercantil.

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CAPÍTULO I – SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO

1.1 Sistema do direito positivo

Preliminarmente, devemos aqui observar que o estudo em tela tem como premissa a percepção do direito positivo organizado como um “sistema”, o que nos auxiliará a compreender melhor nosso objeto de estudo, bem como nos possibilitará a interpretação mais adequada do problema a que aqui nos dedicamos.

Para tal, devemos num primeiro momento advertir que o conceito que aqui se busca do vocábulo “sistema” é específico, de maneira que deveremos descartar quanto às ambiguidades que pairam sobre este conceito, conforme adverte Tércio Sampaio Ferraz2. Como explica o referido autor, o termo “sistema” encontra sua origem etimológica na expressão grega systema, a qual corresponderia à noção de junção, de conglomerado, sendo que atualmente ao termo é agregada a ideia de ordem ou organização.

Por sua vez, Norberto Bobbio3 também adverte quanto à pluralidade de significados que o vocábulo sistema alberga, fazendo especialmente menção a três significados do termo em matéria jurídica. O primeiro significado compreende que o ordenamento jurídico pode ser compreendido como um sistema quando todas as normas derivem de uma mesma matriz, quais sejam os “princípios gerais do direito”. A segunda concepção do termo sistema é oposta à anterior, propondo raciocínio no sentido inverso, partindo do conteúdo de simples normas para atingir conceitos gerais em direito. O terceiro sentido refere-se à ideia de coerência, que deve ostentar aquilo a ser denominado de sistema, a qual se afirmaria nas hipóteses de antinomia de normas, uma vez que ambas as normas, ou uma delas, deverá ser expulsa, promovendo coerência que permite seja verificado um verdadeiro sistema.

2 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio.

Conceito de sistema no direito: uma investigação histórica a

partir da obra jusfilosófica de Emil Lask. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976, p.8.

3 BOBBIO, Norberto.

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Por sua vez, Lourival Vilanova4 refere-se ao conceito de sistema aplicado ao direito nos seguintes termos, os quais certamente auxiliam a construir um conceito que buscamos:

As proposições normativas integrantes do sistema jurídico têm o mais variado conteúdo. São formas que se saturam com referências a fatos-do-mundo. A unidade do sistema jurídico é formal. Não provém da homogeneidade de uma região de objetos. Objetos de regiões diversas no sistema do Direito se encontram: um fato geográfico, como o curso de um rio; um fenômeno biológico, como a vida; outro psicológico como a intenção dolosa;

(....)

O que interliga proposições normativas tão variadas em conteúdo é o fundamento-de-validade que cada uma tem no todo.

(...)

Na norma fundamental reside o fundamento-limite de validade e dela, por inferência, não se podem sacar as proposições da Constituição positiva, ou as leis ordinárias ditadas com o apoio nos preceitos da Constituição.

Conforme se verifica em todos os conceitos trazidos, a percepção de sistema pressupõe a concepção de classe, de forma a somente pertencer ao sistema aquelas normas que ostentem pertinência com este, satisfazendo a condição específica que permite a distinção de determinada classe.

A fim de verificar-se a relação entre sistema e classe, podemos trazer à tona a fórmula empregada na teoria das classes, qual seja “x pertence a K”, significando dizer que todo indivíduo x que satisfizer as características definitórias da classe K a esta pertencerá.

Por meio da teoria das classes e em relação aos sistemas normativos, como o que aqui buscamos estudar, o doutrinado argentino Ricardo Caracciolo, em entendimento aproximado ao de Hart, destaca a existência de dois critérios verificáveis, os quais desempenham a condição de pertinencialidade: a dedutibilidade e a legalidade:

Herbert Hart sostiene la tesis según la cual, la existencia de un sistema jurídico depende necesariamente de la utilización compartida de criterios de validez jurídica.

(...)

El contenido mínimo de la formulación lingüística de semejante regla es la mención de criterios de validez, o lo que es lo mismo - al

4 VILANOVA, Lourival.

Estruturas Lógicas e o Sistema de Direito Positivo. 4.ed. São Paulo: Noeses,

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menos, en principio – de criterios de identificación,; una norma pertenece al sistema jurídico S, si, y sólo si, satisface alguno de los criterios formulados en la regla de reconocimiento de S.5

A distinção aqui proposta em relação aos critérios de pertinencialidade do sistema normativo leva em consideração a concepção de Kelsen6, para o qual se poderia perceber o sistema como estático ou dinâmico. O sistema é percebido como estático, quando em relação à norma fundamental é possível ser deduzida a partir das demais normas do sistema, apresentando também clara identificação de conteúdo. Em relação aos sistemas dinâmicos, são identificados nos casos onde a norma fundamental somente promove o fundamento de validade das demais, não havendo identificação de conteúdo que permita que uma norma seja deduzida em função da outra. O sistema de norma que se apresenta como uma ordem jurídica tem essencialmente um caráter dinâmico, já que uma norma jurídica não vale porque tem determinado conteúdo pressuposto e fixo por outra norma, o que permite seja o sistema mutável, dinamicamente sensível às mudanças sociais.

A distinção em tela quanto às percepções possíveis do fundamento de validade que define um sistema normativo nos leva a outra distinção conceitual, entre os vocábulos “sistema do direito positivo” e “ordenamento jurídico”. Por

sistema do direito positivo compreendemos o conjunto de normas estaticamente consideradas, de forma que por ordenamento jurídico compreendemos o conjunto de normas dinamicamente sobrepostas, sendo que o último leva em consideração a existência de diversos sistema distintos, de acordo com o tempo e com as normas, as quais são recepcionadas e expulsas pelo próprio sistema.

Tárek Moysés Moussallem7 bem define a distinção que aqui se busca tração, ao referir-se a respeito dos critérios que definem o ordenamento jurídico (OJ), a partir da conjunção de diversos sistemas de direito positivo (SDP), existentes no tempo:

Assim o conjunto OJ é composto por vários subconjuntos denominados SDP1, SDP2, SDP3, SDPN, sucessivos nos t1, t2, t3, tN, modificados por expansão, contração ou revisão de acordo com as regras constitutivas de introdução e de eliminação. O

5 CARACCIOLO, Ricardo.

Sistema jurídico y regla de reconocimiento. Espanha: Universidad de

Alicante, 1991, p. 10.

6 KELSEN, Hans.

Teoria Pura do Direito. 1.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011, p. 215.

7 MOUSSALLEM, Tárek Moysés.

Revogação em matéria tributária. 2.ed. São Paulo: Noeses, 2011, p.

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ordenamento jurídico não é um conjunto de normas, mas, sim, uma sequência temporal de conjuntos de normas.

De forma clara, também explana Geraldo Ataliba8, a respeito do conceito de sistema, em obra inteiramente dedicada ao tema na área tributária:

5- Assim, o estudo de qualquer realidade, seja natural, seja cultural – quer em nível científico, quer didático, será mais proveitoso e seguro, se o agente é capaz de perceber e definir o sistema formado pelo objeto e aquêle maior, no qual este se insere. Se se trata de produto cultural ainda que o esforço humano que o produziu não tenha sido consciente de elaborar um sistema, previamente deliberado nesse sentido, deve procura-lo e apreendê-lo o observador ou intérprete. 6- O objeto deste estudo é o sistema constitucional tributário brasileiro composto de realidades jurídica produto da inteligência e da vontade do homem: o conjunto de normas constitucionais, chamado de constituição.

Conforme podemos observar das definições trazidas acima, o conceito de sistema compreende a aglomeração de elementos, os quais restam agrupados uma vez que apresentam característica comum. Esta característica vem a ser o critério de pertinencialidade que classifica os elementos nesta classe, garantindo unidade e coerência ao sistema.

Pelas razões acima expostas, compreendemos que o direito positivo constitui verdadeiro sistema, o qual é formado a partir do conjunto de enunciados, em relação aos quais são formuladas as normas jurídicas. As normas em questão estão organizadas de forma coerente, uma vez que todas derivam umas das outras e foram criadas de acordo com os critérios da legalidade.

Neste sentido, tornamos presente a compreensão de Hans Kelsen, para o qual os enunciados prescritivos e os instrumentos introdutórios de outras normas são verificados de forma hierarquizada, de forma que as normas buscam sua validade nas normas escalonadas imediatamente acima. De acordo com a doutrina de Kelsen, o fundamento máximo das normas presentes no sistema seria a Constituição, a qual deverá também encontrar fundamento em norma superior, a qual, no entanto, não estaria posta no sistema. Neste sentido, refere-se o autor9:

8 ATALIBA, Geraldo.

Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais,

1968, p. 4.

9 KELSEN, Hans.

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A norma fundamental de uma ordem jurídica ou moral positivas – com evidente do que precedeu – não é positiva, mas meramente pensada, e isto significa uma norma fictícia, não o sentido e um real ato de vontade, mas sim de m ao meramente pensado. Como tal, ela é uma pura ou verdadeira ficção no sentido vaihingeriana Filosofia do Como-Se, que é caracterizada pelo fato de que ela não somente contradiz a realidade, como também é contraditória em si mesma. (...)

O fim do pensamento da norma fundamental é: o fundamento de validade das normas instituintes de uma ordem jurídica ou moral positiva, é a interpretação do sentido subjetivo dos atos ponentes dessas normas como de seu sentido objetivo; isto significa, porém, como norma válidas, e dos respectivos atos como atos ponentes de norma. Este fim é atingível apenas pela via da ficção.

O conceito de sistema consiste na reunião ordenada de várias partes que formam um todo, desempenhando neste contexto cada qual sua função, de acordo com previsão constante e produzida pelo próprio sistema, de forma que umas dão razão às demais.

1.2 Sistema constitucional brasileiro

O conceito de sistema constitucional está fundamentado na noção de que as normas existentes encontram-se organizadas de forma hierárquica, buscando sempre fundamentação em norma superior, até a Constituição. Inexistindo a relação de subordinação em tela, a norma perde seu fundamento de validade, devendo ser expelida do sistema, na forma também prescrita pelo próprio sistema, seja por revogação ou declaração de inconstitucionalidade, conforme previsão atualmente vigente no Brasil.

O conceito de sistema constitucional pressupõe, necessariamente, a ideia de supremacia da Constituição. Isso significa dizer que as demais normas, emitidas em qualquer nível do sistema, sejam gerais ou individuais, abstratas ou concretas, deverão estar em conformidade com a Constituição.

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A rigidez constitucional serve para afirmar quanto à supremacia da Constituição em relação aos demais textos legais, como bem observa José Afonso da Silva:

Significa que a Constituição se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em que ela os reconheça e na proporção do ela distribuídos. É, enfim, a lei suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estruturação deste e a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas fundamentais de Estado, e só nisso se notará sua superioridade em relação às demais normas jurídicas.

(....)

Nossa Constituição é rígida. Em conseqüência, é a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro. Toda autoridade só nela encontra fundamento e só ela confere poderes e competências governamentais. Nem o governo federal, nem os governos dos Estados, nem os dos Municípios ou do Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. Exercem suas atribuições nos termos nela estabelecidos.

Por outro lado, todas as normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se conformarem com as normas da Constituição Federal10.

Também em relação à supremacia da Constituição, bem resume Roque Antonio Carrazza:

O que estamos procurando ressaltar é que a Constituição não é um mero repositório de recomendações, a serem ou não atendidas, mas um conjunto de normas supremas que devem ser incondicionalmente observadas, inclusive pelo legislador infraconstitucional, pelo administrador público e pelo juiz. Afinal, são elas que protegem os cidadãos das eventuais arbitrariedades estatais11.

Devemos observar, ainda, que a supremacia da Constituição confere a esta caráter de imperatividade, impondo àqueles que a elas se submetem, até mesmo o Estado, dever de obediência. Esta supremacia, formal e material, se deve ao fato de que na Constituição estão albergados os mais importantes valores de uma sociedade, que constam da Constituição para que sejam protegidos.

10 SILVA, José Afonso da.

Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Ed. Malheiros, 2009,

p. 47.

11 CARRAZZA, Roque Antonio.

Curso de Direito Constitucional Tributário. 29.ed. São Paulo: Ed.

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De acordo com o conceito de sistema, dotado de unicidade e harmonizado, observamos que as normas publicadas deverão encontrar sua validade em outras normas, de hierarquia superior, de maneira que, em última análise, estas normas deverão ser válidas em relação à Constituição Federal.

Em assim sendo, passemos ao estudo do conceito de Constituição, o qual se faz necessário para compreendermos qualquer matéria tributária no âmbito do direito brasileiro, haja vista o extenso tratamento dado à matéria em nível constitucional.

1.2.1 Conceito de constituição

Conforme já podemos conceituar do quanto vimos acima, por Constituição compreendemos a norma de maior hierarquia dentre as normas postas do sistema, em relação a qual todas as demais normas extraem validade, em última análise. No entanto, o conceito de Constituição, tão importante em matéria tributária, alberga outras características, as quais veremos a partir dos conceitos extraídos da doutrina. Comecemos pela posição de Paulo Gustavo Branco e Gilmar Ferreira Mendes, os quais advertem em relação à pluralidade de conceitos albergados sob o signo Constituição, trazendo à tona as diversas posições da doutrina, em relação as quais destacamos a anotação que faz sobre Konrad Hesse, nos seguintes termos 12:

Mas, voltando a Konrad Hesse, diz-nos esse publicista que a Constituição deve ser entendida como a “ordem jurídica fundamental de uma comunidade ou o plano estrutural para a conformação jurídica de uma comunidade, segundo certos princípios fundamentais”, uma tarefa cuja realização só se torna possível porque a Lei Fundamental:

- fixa os princípios diretores segundo os quais se deve formar a unidade política e desenvolver tarefas estatais;

- define os procedimentos para a solução dos conflitos no interior da comunidade;

- disciplina a organização e o processo de formação da unidade política e da atuação estatal; e,

12 BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira.

Curso de Direito Constitucional. 6.ed.

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- cria as bases e determina os princípios de ordem jurídica global.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho13 destaca a Constituição a partir do exercício de poder que esta representa, nos seguintes termos:

Aplicando ao Estado, o termo “Constituição” em sua acepção geral pode designar a sua organização fundamental total, quer social, quer política, quer jurídica, quer econômica. E na verdade tem ele sido empregado – às vezes – para nomear a integração de todos esses aspectos – a Constituição total ou integral.

(...)

Por organização jurídica fundamental, por Constituição em sentido jurídico, entende-se, segundo a lição de Kelsen, o conjunto das normas positivas que regem a produção do direito. Isto significa, mais explicitamente, o conjunto de regras concernentes à forma de Estado, à fora do governo, ao modo de aquisição e exercício do poder, ao estabelecimento de seus órgãos, aos limites de sua ação.

No mesmo sentido, José Afonso da Silva, verbis:

A constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria, então, a organização dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que organizam os elementos constitutivos do Estado14.

Nas palavras de J.J. Gomes Canotilho 15 sobre o atual papel das Constituições, denota-se que o entendimento de que na Carta Magna encontraremos apenas limites ao poder legiferante, nos seguintes termos:

A pirâmide jurídica deve ser superada impondo-se uma visão muito mais complexa e realista do direito da ordem jurídica.

(...)

E o que fica da constituição como norma? E o que fica da constituição como ordem? Ficam as duas coisas – norma e ordem –

13 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.

Curso de direito constitucional. São Paulo: Ed. Saraiva,

2012, p. 37.

14 SILVA, José Afonso da.

Curso de Direito Constitucional Positivo. 32.ed. São Paulo: Ed. Malheiros,

2009, p. 39.

15 CANOTILHO, J.J. Gomes.

Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7.ed. Coimbra:

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mas com um sentido diverso do tradicional. A constituição continua a ser uma ordem-quadro moral e racional do discurso político e uma norma fundamente e superior do ordenamento jurídico, estruturada com base em regras e princípios identificadores de nossa comunidade jurídica.

Observamos como núcleo das definições acima relacionadas que a Constituição existe como fundamento do Poder do Estado, de forma que a todos os demais, inclusive ao Estado, é devida obediência à Constituição, a partir de conceito de que somente o poder derivado da Carta Magna é soberano. No entanto, mais merece ser observado a respeito do poder constituinte.

1.2.1.1 Limites ao poder constituinte derivado

Ainda em relação ao poder constitucional, importante destacarmos a diferença entre o poder constituinte originário e o poder constituinte derivado ou reformador, o que se faz ainda mais importante, pois o tema do presente estudo é exatamente em torno da alteração promovida na Constituição por meio do poder constituinte derivado.

Poder constituinte originário é aquele que cria um novo Estado ou substitui outro já existente, de forma que nenhum outro poder lhe antecede, ou existe acima desse. O constituinte originário tudo pode; a ele cabe descrever o Estado, dispor como ele será. Por estes motivos, o poder constituinte originário possui três características básicas, a saber: é inicial, ilimitado e é incondicionado.

Por sua vez, o poder constituinte reformador é aquele que deriva de Constituição já existente, conforme construída pelo legislador originário. Vemos aí grande diferença existente entre ambas as sortes de poder constituinte, quer dizer, o poder derivado observa, sim, limite ao seu exercício, uma vez que existe somente em função de previsão do próprio texto constitucional, carecendo da autonomia e incondicionalidade que observamos no poder constituinte originário.

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petrificadas no ordenamento jurídico. De acordo com o dispositivo acima referido, “não poderão ser objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais.

Além do limite material especificado acima, a Constituição ainda faz referência aos limites circunstanciais, quais sejam os constantes do §1º, artigo 60, da Constituição Federal, o qual prescreve que a Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.

Encerrando o rol das condições impostas ao poder constituinte derivado, destacamos as limitações procedimentais, as quais são encontradas no §5º, artigo 60, da Constituição Federal, no sentido de que a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. No mesmo sentido, o § 2º do artigo 60 da Constituição Federal ordena que a alteração constitucional será votada em dois turnos, por cada uma das casas do Congresso Nacional, devendo ser aprovada por três quintos dos respectivos membros.

Para o estudo que aqui propomos, destacamos que o dispositivo em questão impede que qualquer deliberação seja proposta em relação à forma federativa de organização dos Estados. De acordo com o mesmo dispositivo, não são permitidas alterações em relação às garantias individuais, ao voto direto, secreto e universal, bem como em relação à separação dos Poderes, termos estes corolários lógicos do que compreendemos como república.

Nesse sentido, também observava Geraldo Ataliba, nos seguintes termos:

Não pode o órgão de reforma, o Congresso Nacional, sequer discutir qualquer projeto tendente (que abrigue tendências; que leve; que conduza; que encaminhe; que facilite; que possibilite, mesmo indiretamente) à abolição dos dois princípios, reputados tão importantes, tão fundamentais, tão decisivos, que tiveram tratamento sacro, proteção absoluta, erigidos que foram em tabus jurídicos16. O poder constituinte derivado existe no ordenamento no intuito de que também a Constituição seja reformada, de forma a manter o Texto Constitucional

16 ATALIBA, Geraldo.

(24)

atualizado em relação à evolução das condutas intersubjetivas, como o próprio ordenamento prevê, por meio do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que assim dispõe:

Art. 3º - A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.

Conforme se observa das limitações expressamente impostas ao constituinte derivado, notamos que este legislador em muito se distancia da soberania e independência conferida ao legislador originário, de forma que este deverá desempenhar sua função sempre de forma contida.

Portanto, o poder constituinte derivado deverá se submeter ao Poder Judiciário, o qual poderá declarar a inconstitucionalidade de emenda constitucional, uma vez que esta não esteja em consonância com disposição estabelecida pelo poder constituinte originário. Deve-se manter aquilo que claramente existe na Constituição, qual seja a indicação de um poder constituinte de segundo grau17, o qual é necessariamente limitado, tanto material quanto formalmente. Neste sentido, também são as lições de José Afonso da Silva o qual, ainda, refere em relação às limitações materiais de duas sortes:

Desde a Constituição de 1934, tronou-se prática corrente estatuir um tipo de limitação circunstancial ao poder de reforma, qual seja a se não se procederá à reforma da Constituição na vigência do estado de sítio. A Constituição vigente mudou um pouco nesse particular. Veda emendas na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio. Introduziu a vedação referente à intervenção federal nos Estados, que não era prevista antes (art. 60, §1º.).

A controvérsia sobre o tema mais se aguça, quanto a saber quais os limites materiais do poder de reforma constitucional. Trata-se de responder à seguinte questão: o poder de reforma pode atingir qualquer dispositivo da Constituição, ou há certos dispositivos que não podem ser objeto de emenda ou revisão?

Para solucionar a questão, a doutrina distingue entre limitações materiais explícitas e limitações matérias explícitas18.

17 SILVA, José Afonso da.

Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Ed. Malheiros, 2009,

p. 67 .

(25)

No que diz respeito às limitações materiais explícitas, estas seriam aquelas constantes do já referido §4º, do artigo 60, da Constituição Federal, o qual indica expressamente as matérias que não podem se sujeitar a modificações. Resgatamos aqui a citação da obra de Geraldo Ataliba, no que diz respeito ao fato de que as modificações impedidas não são somente aquelas que visam diretamente revogar, por exemplo, a organização federativa, mas também eventuais alterações que busquem contribuir negativamente para a forma federativa do Estado brasileiro. Destacamos, mais uma vez, a posição de José Afonso da Silva:

A vedação atinge a pretensão de modificar qualquer elemento conceitual da Federação, ou do voto direto, ou indiretamente restringir a liberdade religiosa, ou e comunicação ou de outro direito e garantia individual; basta que a proposta de emenda se encaminhe ainda que remotamente, tenda (emendas tendentes, diz o texto) para a sua abolição19.

No que diz respeito aos limites materiais implícitos, estes se restringiriam a três, quais são: (i) impossibilidade de mudança quanto ao titular do poder que cria o próprio poder reformador; (ii) impossibilidade de mudança quanto ao titular do poder reformador; e, (iii) impossibilidade de mudança do processo de emenda à Constituição. Em relação às limitações implícitas, acreditamos serem plenamente existentes, vez que se assim não o for nada adiantaria estabelecer vedações materiais a este poder, se fosse possível alteração de ordem ainda mais profunda, como nos três casos acima.

Aproximando os conceitos acima à matéria tributária, destacamos que já decidiu o Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 939 (ADI 939), de forma que no âmbito tributário a anterioridade é uma garantia individual do contribuinte, sendo portanto uma cláusula pétrea da Constituição Federal. Vejamos o entendimento veiculado pela ADI 939, de relatoria do Ministro Sydney Sanches, do Tribunal Pleno:

EMENTA: - Direito Constitucional e Tributário. Ação Direta de Inconstitucionalidade de Emenda Constitucional e de Lei Complementar. I.P.M.F. Imposto Provisório sobre a Movimentação

(26)

ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira - I.P.M.F. Artigos 5., par. 2., 60, par. 4., incisos I e IV, 150, incisos III, "b", e VI, "a", "b", "c" e "d", da Constituição Federal.

1. Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação a Constituição originaria, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua e de guarda da Constituição (art. 102, I, "a", da C.F.).

2. A Emenda Constitucional n. 3, de 17.03.1993, que, no art. 2., autorizou a União a instituir o I.P.M.F., incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no parágrafo 2. desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica "o art. 150, III, "b" e VI", da Constituição, porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas imutáveis (somente eles, não outros): 1. - o princípio da anterioridade, que e garantia individual do contribuinte (art. 5., par. 2., art. 60, par. 4., inciso IV e art. 150, III, "b" da Constituição); 2. - o princípio da imunidade tributaria recíproca (que veda a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que e garantia da Federação (art. 60, par. 4., inciso I,e art. 150, VI, "a", da C.F.);

3. - a norma que, estabelecendo outras imunidades impede a criação de impostos (art. 150, III) sobre: "b"): templos de qualquer culto; "c"): patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; e "d"): livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão; 3. Em conseqüência, e inconstitucional, também, a Lei Complementar n. 77, de 13.07.1993, sem redução de textos, nos pontos em que determinou a incidência do tributo no mesmo ano (art. 28) e deixou de reconhecer as imunidades previstas no art. 150, VI, "a", "b", "c" e "d" da C.F. (arts. 3., 4. e 8. do mesmo diploma, L.C. n. 77/93).

4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente, em parte, para tais fins, por maioria, nos termos do voto do Relator, mantida, com relação a todos os contribuintes, em caráter definitivo, a medida cautelar, que suspendera a cobrança do tributo no ano de 1993.

(27)

1.3. Sistema constitucional tributário

A Constituição, por sua vez, também pode ser segmentada como um sistema em si, a partir de um primeiro corte metodológico. Este sistema, composto estritamente pelas normas constantes da Constituição, será formado por normas que deverão ostentar coerência entre si e principalmente com os princípios constitucionais, estes últimos normas de hierarquia superior e função diferenciada.

Em nenhuma outra Constituição o legislador constitucional teve tamanho cuidado com a matéria tributária, dispensando 27 artigos ao assunto, tratando por vezes de forma detalhada a respeito da materialidade das exações. Ao capítulo dedicado à matéria tributária, o legislador escolheu exatamente o nomear de “Sistema Constitucional Tributário”.

A existência de um sistema constitucional tributário é o segundo corte metodológico que deve ser feito, tendo o primeiro sido pela existência de um sistema constitucional. Conforme visto, a percepção de um sistema constitucional nos parece imperiosa, haja vista a supremacia da Constituição e a forma como as normas do ordenamento jurídico relacionam-se entre si.

O corte metodológico ora proposto não é dotado do mesmo imperativo, mas se justifica como possibilidade do intérprete analisar o conjunto de normas de maneira sistematizada. Roque Antonio Carrazza compreende que este corte metodológico traz à tona a existência de um subsistema, o que explica a respeito do tratamento que propomos:

II – A Constituição, porém, não é um ajuntamento de perceptivos, cada qual girando em sua estreita órbita, sem sofrer nenhuma atração dos demais. Pelo contrário, como elucida Caros Ayres Britto, eles “(...) se articulam em feixes orgânicos, em blocos unitários de sentido, como peças de uma mesma engrenagem e instrumentos de uma só política legislativa”20. Em realidade, o jurista deve ordenar as

normas constitucionais em grupos de fundamentação unitária, formando sistemas e subsistemas (como o tributário).21

20 CARRAZZA, Roque Antonio.

Curso de Direito Constitucional Tributário. 29.ed. São Paulo:

Malheiros, 2013, p. 50.

21 BRITTO, Carlos Ayres. Inidoneidade do decreto-lei para instituir ou majorar tributo, in RDP 66/45.

Apud Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29.ed. São Paulo: Malheiros, 2013,

(28)

Por sistema constitucional tributário pretende-se identificar as normas constitucionais que tratam de matéria tributária, bem como a relação destas normas com o restante do sistema constitucional, tudo no sentido de regular juridicamente a obrigação de pagar tributo.

Conforme visto, o conceito de sistema pressupõe sistematizar, estruturar em um conjunto lógico e organizado, em relação ao qual se verifique coerência entre as normas, as quais encontrarão fundamento de validade em norma superior, a Constituição Federal.

Além de atribuir validade às demais normas do sistema, a Constituição indica o modo de produção das demais normas, bem como aqueles que têm competência para legislar a cada respeito.

Em assim sendo, o sistema constitucional tributário brasileiro deverá ser compreendido levando-se em consideração a minuciosa repartição das competências legislativas, dentre elas a tributária, impondo limite ao legislador infraconstitucional e, em última análise, ao Estado como polo ativo da relação tributária.

1.3.1 Competência tributária

No que diz respeito ao estudo sob comento, faz-se de extrema importância trazer à tona o conceito de competência tributária, principalmente no que tange à relevância constitucional que o tema alberga.

Primeiramente, devemos destacar que por repartição de competências compreendemos a indicação constitucional dos fatos econômicos que podem ser utilizados pelo legislador infraconstitucional como materialidade para a criação de tributos.

(29)

necessariamente, concluir pela rigidez que esta demarcação fixa, de acordo com a necessidade de nosso sistema constitucional vigente. Neste sentido, esclarece Geraldo Ataliba22:

27 – Em matéria tributária – ou, melhor dizendo, em matéria de fixação de competência tributária e formas de seu exercício – a nossa Constituição não foi genérica e sintética. Ao contrário, foi particularizada e abundante, não deixando margem jurídica – para grandes desenvolvimentos e integração pela legislação ordinária e, menos ainda, pelos costumes, pela construção ou outras formas.

A rigidez da atual Constituição vigente no Brasil, fazemos atenção à grande atenção dispensada à matéria tributária, demarcando pormenorizadamente o âmbito das competências de cada um dos entes políticos. Também é aspecto de uma constituição rígida, o fato da Constituição brasileira atualmente vigente traçar, pormenorizadamente, a forma de alteração do texto constitucional, estabelecendo as matérias que podem ser objeto de emenda, bem como aquelas que não podem, as cláusulas pétreas.

A respeito da rigidez presente em nível constitucional em relação à matéria tributária, Humberto Ávila refere:

Como já mencionado, o Sistema Constitucional Tributário é um sistema rígido. Essas há muito conhecidas rigidez e exaustividade decorrem de dois fundamentos: de um lado, as regras de competência e a repartição das receitas são intensamente reguladas pela própria Constituição. Todos os impostos da União (art. 153), dos Estados (art. 155) e dos Municípios (art. 156) são definidos pela própria Constituição. Os requisitos normativos para sua instituição são estabelecidos pela Constituição mesma23.

Em assim sendo, a rigidez do sistema constitucional vigente manifesta-se em diversas oportunidades, mas principalmente em relação à matéria tributária, conforme a opinião dos autores destacados.

Desta forma, foi escolha do legislador constitucional a repartição das competências tributárias entre União, Estados e Municípios, em decorrência do princípio federativo e da autonomia municipal e distrital, de forma a proporcionar

22 ATALIBA, Geraldo.

Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais,

1968, p. 15.

23 ÁVILA, Humberto.

(30)

verdadeira autonomia das pessoas políticas. Sobre o tema, verifiquemos o entendimento de Luís Eduardo Schoueri:

Numa primeira aproximação, não haveria razão para o constituinte ter repartido as competências tributárias. A discriminação de competências tributárias não é requisito de um sistema federal. Este exige que se assegure às pessoas jurídicas de direito público autonomia financeira. Entretanto, autonomia financeira implica discriminação de rendas, o que não se confunde com discriminação de competências24.

No entanto, em que pese a competência tributária proporcionar autonomia financeira aos entes políticos, a competência tributária encerra em si limite objetivo, no sentido de que somente poderão ser tributadas as hipóteses previstas pela Constituição.

Devemos observar que, de acordo com nosso ordenamento, por força de uma série de garantias previstas em nível constitucional, não há se falar em um poder tributário, absoluto e total, implicando dizer que o exercício da atividade tributante está restrito àquilo determinado pelo legislador constitucional, no mero exercício de autorização para tributar. Neste sentido, ensina Roque Antonio Carrazza:

De fato, entre nós, a força tributante estatal não atua livremente, mas dentro dos limites do direito positivo. Como veremos em seguida, cada uma das pessoas políticas não possui, em nosso País, poder tributário (manifestação do ius imperium do Estado), mas competência tributária (manifestação da autonomia da pessoa política e, assim, sujeita ao ordenamento jurídico-constitucional). A competência tributária é determinada pelas normas constitucionais, que, como é pacífico, são de grau superior às de nível legal, que – estas, sim – preveem as concretas obrigações tributárias 25.

Ainda na doutrina do mesmo autor, em outra obra, ainda a respeito da competência tributária, destaca o grau de positivação que encontramos na delegação da competência tributária26, nos seguintes termos:

De fato, a Constituição brasileira, ao discriminar as competências tributárias, traçou a regra-matriz (a norma padrão de incidência) de

24 SCHOUERI, Luis Eduardo.

Direito Tributário. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 238.

25 CARRAZZA, Roque Antonio.

Curso de Direito Constitucional Tributário. 29.ed. São Paulo: Ed.

Malheiros, 2013, p. 573.

26 CARRAZZA, Roque Antonio.

Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Ed. Noeses, 2010,

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cada exação. Noutro falar, apontou, ainda que de maneira implícita, a hipótese de incidência possível, o sujeito ativo possível, o sujeito passivo possível, a base de cálculo possível e, num certo sentido, até o mesmo a alíquota possível das várias espécies e subespécies tributárias.

Por este motivo, a Constituição não cria tributos, mas apenas traz a previsão daqueles tributos que podem ser criados, por meio da lei, pelo correspondente ente político. Isso porque, o legislador constitucional se vale de técnica de repartição de competências, implicando na indicação, em muitos casos pormenorizada, do fato que poder ser tributado, principalmente no caso dos impostos.

Noutros casos, a indicação é menos objetiva, como nas contribuições sociais e, mesmo em relação aos tributos vinculados – como as taxas – há na Constituição indicações precisas a respeito dos critérios para a sua criação.

A respeito dessa distinção, bem explica Sacha Calmon Navarro Coêlho, verbis:

No concernente aos impostos, não é suficiente às pessoas políticas a previsão do art. 145. Com esforço nele, não lhes seria possível instituir os seus respectivos impostos. O art.145 não declina os fatos jurígenos genéricos que vão estar na base fática dos impostos que, precisamente, cada pessoa política recebe a Constituição. É que, no caso dos impostos, a competência para instituí-los é dada de forma privativa sobre fatos específicos determinados. Concluindo, as taxas e as contribuições de melhoria são atribuídas às pessoas políticas, titulares do poder de tributar, de forma genérica e comum, e os impostos, de forma privativa e determinadas. Como corolário lógico, temos que os impostos são enumerados pelo nome e discriminados na Constituição um a um27.

Em relação à repartição de competências das taxas, Luis Eduardo Schoueri expõe doutrina alemã que, em função do caráter sinalagmático da relação, refere quanto às taxas como competência anexa:

Se o tributo se justifica e é devido em virtude de uma atuação estatal que pode ser imputada a um contribuinte, ou a um grupo de contribuintes, a competência tributária não pode ser desvinculada da atribuição constitucional para a atuação que justificou a tributação. Por essa razão é que para as taxas surgiu, na doutrina alemã, o conceito de competência anexa. Naquela país, o texto constitucional sequer cogita da competência para instituir taxas. Refere-se apenas aos impostos. Entretanto, a doutrina e

27 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro.

Curso de Direito Tributário Brasileiro. 13.ed. Rio de Janeiro:

(32)

a jurisprudência entenderam que a competência para instituir taxas está

vinculada (anexa) à competência material (...)28

De acordo com o mesmo autor29, a referência pertinente ao conceito de competência anexa consta positivada em norma nacional, qual seja o artigo 80 do CTN:

Art. 80. Para efeito de instituição e cobrança de taxas, consideram-se compreendidas no âmbito das atribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, aquelas que, segundo a Constituição Federal, as Constituições dos Estados, as Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios e a legislação com elas compatível, competem a cada uma dessas pessoas de direito público.

Podemos abstrair corresponder ao conceito de competência anexa, que aquele possuidor de atribuição para atividade estatal terá, igualmente, competência tributária. Em assim sendo, não havendo atribuição do Estado naquela atividade, não estará União, Estado, Distrito Federal ou Município legitimado a cobrar taxa.

Desta forma, anexa ou principal, em nenhum caso podemos admitir uma norma aberta, a qual permitiria ao Fisco instituir tributo indiscriminadamente, em coerência com o conceito de sistema constitucional rígido tratado acima. Neste sentido, forte a doutrina de Sacha Calmon Navarro Coêlho, destacada acima, muito menos poder-se-ia imaginar tamanha liberdade no caso dos impostos, uma vez que especificamente pormenorizados pela Constituição Federal.

Como veremos mais a seguir, como decorrência desta extensa positivação a respeito das materialidades tributária compreendemos que foi intenção do legislador constituinte originário encerrar em seu turno a possibilidade de criação de novos tributos, à exceção dos casos relacionados à competência residual. A competência residual, por sua vez, reafirma em relação à rigidez que aqui argumentamos, como veremos mais adiante.

Pelos argumentos trazidos até aqui a respeito da competência tributária, já podemos concluir que a demarcação da competência tributária é escolha, necessariamente, do legislador superior (constituinte), capaz de prescrever limite

28 SCHOUERI, Luis Eduardo.

(33)

preliminar ao exercício da atividade de criação de tributos por meio de normas inferiores (leis ordinárias).

A necessidade de uma correta repartição de competências, de acordo com os fatos tributáveis, não somente garante a autonomia financeira das pessoas políticas, mas também assegura respeito ao princípio da capacidade contributiva, presente no artigo 150 da Constituição Federal. A divisão de competências de acordo com os fatos econômicos tributáveis evita a tributação cumulativa de mais de um ente político sobre o mesmo fato. Ou seja, se a competência para tributar o fato econômico renda é da União, somente esta poderá criar tributo que incide sobre o referido fato.

Ainda, merece estaque o fato de que a competência para criação de tributos não deve ser confundida com a competência para legislar sobre direito tributário, uma vez que esta última cogita a respeito do poder de legislar sobre normas gerais em tributação30, ao passo que a primeira permite a criação de tributos em abstrato, bem como cobrar pelos mesmos tributos.

Ao que até aqui dispusemos, é possível percebermos o que significa competência tributária, sendo importante, finalmente, trazer à tona a plenitude do campo semântico deste conceito. Para tal, promoveremos análise dos conceitos já definidos pela doutrina, a fim de buscarmos firmar conceito próprio.

Na lição de Regina Helena Costa, ao tratar do tema das imunidades tributárias em obra dedicada ao tema, esclarece a respeito da competência tributária:

Com efeito, se a competência tributária, tal como contemplada no Texto Fundamental, já se revela privada dos campos imunes, pode-se afirmar que a competência tributária é a aptidão para legislar sobre tributos, nela já considerados as situações de intributabilidade constitucionalmente estabelecidas. A imunidade é, portanto, “área estranha e alheia à competência”31.

Também em nível constitucional, e auxiliado a delimitar a abrangência da capacidade, do ente político, de instituir tributos, surge a figura das imunidades tributárias. Estas, por sua vez, são normas negativas, que estabelecem limites à norma positiva, aquela que outorga competência tributária.

30 Ibid., p. 237.

31 COSTA, Regina Helena.

(34)

Assim, ao mesmo tempo, desempenhando a função de “desenhar” a competência tributária, convivem duas figuras normativas distintas: a primeira positiva, que possibilita a criação do tributo, e a segunda norma negativa, que impede que ocorra a criação de tributo.

Em sendo assim, o instituto da imunidade tributária consiste no impedimento constitucional à instituição de tributos sobre determinadas pessoas e/ou situações, restringindo as dimensões do âmbito de competência tributária da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

O que buscamos aqui tratar é que o conceito de competência pode ser observado, indiretamente, a partir de seu conceito negativo, aquilo que a competência não é. A norma de imunidade é norma impeditiva da competência tributária.

Destacamos que aqui o conceito de competência tributária restringe-se à faculdade das pessoas políticas para inovar na ordem jurídica, desenhando o perfil jurídico de um determinado gravame. Com isso, queremos deixar claro que aqui não estamos confundindo com o conceito de capacidade tributária ativa, sendo esta última verificada pela capacidade de integrar o polo ativo da relação tributária. Neste sentido, define Paulo de Barros Carvalho32:

(...) tomaremos competência tributária como a significação acima especificada, vale dizer, de legislar (pelo Poder Legislativo, já que o “legislador”, em sentido amplo, todos nós o somos), firmando que não se confunde com a capacidade.

Não se confunde com a capacidade tributária ativa. Uma coisa é poder legislar, desenhando o perfil jurídico de um gravame ou regulando os expedientes necessários à sua funcionalidade; outra é reunir credenciais para integrar a relação jurídica, no tópico do sujeito ativo.

A competência tributária é, pois, matéria exclusivamente constitucional e significa a autorização dada aos legisladores para criarem, em abstrato, tributos. Conforme visto, a delegação de competência tributária está diretamente aliada à autonomia financeira dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, o que já nos indica que a correta percepção dos limites da competência tributária devem ser observados a partir de interpretação sistêmica da Constituição.

32 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 23.ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2011, p.

(35)

A doutrina atual33, amplamente aceita34, destaca características que devem ser ostentadas pela competência tributária, quais são: privatividade, indelegabilidade, incaducabilidade, inalterabilidade, irrenunciabilidade e facultatividade, esta última tendo por exceção o próprio ICMS. Não iremos aqui adentrar em cada uma delas, mas faremos distinção em relação àquela que denota a inconstitucionalidade promovida pele Emenda Constitucional nº 33 de 2001.

Em relação ao tema do presente trabalho, destacamos, desde já, que aqui se concentra o cerne da discussão que considera inconstitucional as alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001, pois restou por criar em abstrato novo tributo denominado também pela sigla ICMS, iniciativa esta que passa ao largo da estrita demarcação de competências estabelecida para os impostos.

Como se observar das características acima trazidas da doutrina a respeito da competência tributária, podemos destacar que não foi respeitada a privatividade, pela qual a competência tributária somente pode ser usufruída por um único ente político, exclusivamente. O que se percebe da emenda em questão, pelo contrário, é que se adentrou na competência reservada à União por meio do imposto de importação. Destacamos ainda que a competência é inalterável, sendo este conceito utilizado para descrever a impossibilidade do próprio ente político competente vir a dilatar os limites da competência que foi outorgada. Sobre o tema, destaca Roque Antonio Carrazza:

Se, porventura, uma pessoa política pretender, por meio de norma legal ou infralegal, dilatar as rais de sua competência tributária, de duas, uma: ou esta norma invadirá seara imune à tributação ou vulnerará competência tributária alheia. Em ambos os casos será inconstitucional35.

Em assim sendo, passemos à análise da relação existente entre princípios e regras constitucionais, o que também será de grande valia ao estudo em tela.

33 CARRAZZA, Roque Antonio.

Curso de Direito Constitucional Tributário. 29.ed. São Paulo: Ed.

Malheiros, 2013, p. 590.

34 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 23.ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2011, p.

270.

35 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29.ed. São Paulo: Ed.

(36)

1.4 Diferença entre princípios e regras constitucionais

Conforme visto, a noção de sistema constitucional prevê o conceito de que as normas têm competências e hierarquias diferenciadas, de forma que algumas têm prevalência sobre as outras em função da posição ostentada dentro do sistema. No ponto mais alto da hierarquia em questão, encontra-se a Constituição, a qual irradia fundamento ao sistema.

No mesmo sentido, ao nos aproximarmos das normas do sistema que se encontram na própria Constituição, devemos observar que algumas normas são também diferenciadas em relação às demais, devendo-se distinguir em nível constitucional as regras constitucionais e os chamados princípios constitucionais.

Não devemos, contudo, compreender que e existência de princípios poderá ser verificada em outros níveis do sistema, também, como princípios legais, infralegais, etc.. No entanto, aqui cuidaremos dos princípios constitucionais, pelo fato de que estes operam função singular no sistema que buscamos analisar no presente estudo.

Por princípios compreendemos os valores do ordenamento jurídico, aquilo existente no sistema dando origem a este, pelo que não devemos confundir por normas sem caráter normativo. Os princípios, os que entendemos, são normas para todos os fins, mais gerais que as demais, mas que demonstram este caráter em função de serem invocados, como as demais normas, no sentido de regular determinada situação, especialmente nos casos onde desempenham a função de preencher lacunas do sistema.

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