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CAPÍTULO II – ANÁLISE DO ARQUÉTIPO CONSTITUCIONAL DO ICMS-

2.2 Consequente normativo

2.2.1 Critério quantitativo da regra matriz

2.2.1.1 Base de cálculo do ICMS-Importação

Seguindo-se na investigação da materialidade do ICMS-Importação temos por bem analisar a conformidade da base de cálculo escolhida pelo legislador infraconstitucional, em relação ao critério material da regra-matriz de incidência, disposto na Constituição Federal. A Lei Complementar nº 87, de 1996, estabelece a seguinte composição da base de cálculo:

Art. 13. A base de cálculo do imposto é: (...)

V - na hipótese do inciso IX do art. 12, a soma das seguintes parcelas:

a) o valor da mercadoria ou bem constante dos documentos de importação, observado o disposto no art. 14;

b) imposto de importação;

c) imposto sobre produtos industrializados; d) imposto sobre operações de câmbio;

e) quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras; (Redação dada pela Lcp 114, de 16.12.2002)

Art. 14. O preço de importação expresso em moeda estrangeira será convertido em moeda nacional pela mesma taxa de câmbio utilizada no cálculo do imposto de importação, sem qualquer acréscimo ou devolução posterior se houver variação da taxa de câmbio até o pagamento efetivo do preço.

Parágrafo único. O valor fixado pela autoridade aduaneira para base de cálculo do imposto de importação, nos termos da lei aplicável, substituirá o preço declarado.

Em análise do dispositivo acima destacado, observamos que no caso do ICMS-Importação, da mesma forma que ocorre com o ICMS incidente sobre circulação de mercadorias, a exação não recai somente sobre o valor da operação (mercantil), mas também sobre quantias que não correspondem à materialidade do imposto.

Nos termos da alínea “e” destacada acima, é permitido que componha a base de cálculo quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras, de fato, uma “carta branca” conferida ao legislador estadual e distrital, permitindo a inclusão de despesas de frete, capatazia, armazenagem, etc. Estas despesas não se relacionam com o valor da operação mercantil de forma direta, sendo estas

importâncias acessórias, que simplesmente viabilizam a operação mercantil, portanto também estranhas à materialidade do tributo, pormenorizada em nível constitucional.

O texto original da Constituição Federal fixou a materialidade do ICMS- Importação, de forma genérica, como a sendo a realização de negócio jurídico de importação relativo à aquisição de produtos regularmente nacionalizados, sendo esta a indicação mais do que suficiente quanto a base de cálculo possível para fins de ICMS-Importação. Quaisquer outros acréscimos (valor de impostos, taxas e demais despesas) não podem ser compreendidos como base de cálculo da exação, por extrapolarem o limite do que é possível escolher-se como base de cálculo, uma vez que estranhos ao montante pactuado pelo negócio jurídico no exterior.

Da mesma forma que ocorre com o ICMS incidente na circulação de mercadorias, a base de cálculo do ICMS-Importação será composta, também, pelo próprio ICMS, a chamada inclusão por dentro do imposto, conceito este que também em relação ao ICMS-Importação não pode ser recepcionado.

Entendemos, com isso, que o constituinte originário vinculou a base de cálculo possível para fins de ICMS-Importação, qual seja o valor da operação de importação de acordo com o negócio mercantil de importação. Em assim sendo, podemos concluir que a única base de cálculo possível, para o ICMS-Importação, seria o valor aduaneiro.

O conceito de “valor aduaneiro” tem origem no Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT 1994), do qual o Brasil é signatário. O mencionado acordo internacional foi inserido no ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto Legislativo nº 30 de 1994 e pelo Decreto nº 1355 de 1994, com a denominação de “Acordo de Valoração Aduaneira”, atualmente regulado pelo Decreto nº 6759 de 2009.

Segundo o art. VII daquele acordo internacional, o valor aduaneiro deverá corresponder ao valor real da mercadoria importada, ou ao de uma outra mercadoria similar, não podendo se pautar no valor de produtos de origem nacional ou sobre valores arbitrários ou fictícios. O valor real deverá ser o preço pelo qual, em tempo e lugar determinados pela legislação do país da importação, as mercadorias importadas serão vendidas ou ofertadas à venda em operações comerciais normais, efetuadas em condições de plena concorrência. O valor aduaneiro, portanto, deverá corresponder, em síntese, ao valor de mercado do bem importado.

O conceito de valor aduaneiro, decorrente do destacado acordo internacional, é escolhido expressamente pela legislação do Imposto de Importação como base de cálculo do imposto (artigo 75 do Decreto nº 6759 de 2009). Em contexto um pouco diferente compreendeu o STF que para fins de incidência do PIS e da Cofins– Importação o valor aduaneiro deveria ser considerado como base de cálculo, de forma que não poderia o ICMS compor a base de cálculo das contribuições. Decidiu o Pretório Excelso, sob o rito da Repercussão Geral, nos autos do RE nº 559.937/RS:

EMENTA Tributário. Recurso extraordinário. Repercussão geral. PIS/COFINS – importação. Lei nº 10.865/04. Vedação de bis in idem. Não ocorrência. Suporte direto da contribuição do importador (arts. 149, II, e 195, IV, da CF e art. 149, § 2º, III, da CF, acrescido pela EC 33/01). Alíquota específica ou ad valorem. Valor aduaneiro acrescido do valor do ICMS e das próprias contribuições. Inconstitucionalidade. (...)

5. A referência ao valor aduaneiro no art. 149, § 2º, III, a , da CF implicou utilização de expressão com sentido técnico inequívoco, porquanto já era utilizada pela legislação tributária para indicar a base de cálculo do Imposto sobre a Importação. 6. A Lei 10.865/04, ao instituir o PIS/PASEP -Importação e a COFINS -Importação, não alargou propriamente o conceito de valor aduaneiro, de modo que passasse a abranger, para fins de apuração de tais contribuições, outras grandezas nele não contidas. O que fez foi desconsiderar a imposição constitucional de que as contribuições sociais sobre a importação que tenham alíquota ad valorem sejam calculadas com base no valor aduaneiro, extrapolando a norma do art. 149, § 2º, III, a, da Constituição Federal. 7. Não há como equiparar, de modo absoluto, a tributação da importação com a tributação das operações internas. O PIS/PASEP -Importação e a COFINS -Importação incidem sobre operação na qual o contribuinte efetuou despesas com a aquisição do produto importado, enquanto a PIS e a COFINS internas incidem sobre o faturamento ou a receita, conforme o regime. São tributos distintos. 8. O gravame das operações de importação se dá não como concretização do princípio da isonomia, mas como medida de política tributária tendente a evitar que a entrada de produtos desonerados tenha efeitos predatórios relativamente às empresas sediadas no País, visando, assim, ao equilíbrio da balança comercial. 9. Inconstitucionalidade da seguinte parte do art. 7º, inciso I, da Lei 10.865/04: “acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições , por violação do art. 149, § 2º, III, a, da CF, acrescido pela EC 33/01. 10. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

Devemos destacar, por óbvio, que os casos não são idênticos, uma vez que a alínea “a”, inciso III, §2º do artigo 149, da Constituição Federal, faz menção expressa à base de cálculo das contribuições como o valor aduaneiro, o que no caso do ICMS não é verificado. No entanto, entendemos que permanece a concepção de respeito aos limites da materialidade constitucionalmente imposta, de forma a não permitir a inclusão de valores estranhos à materialidade na base de cálculo de tributo. Muito embora, em relação ao ICMS, a Constituição não tenha deixado expressa a base de cálculo do imposto, no caso do ICMS este critério também está circunstanciado na Constituição, não podendo admitir afronta que incorra em aumento da carga tributária, principalmente.

Em assim sendo, temos que ao procedermos a verificação do binômio base de cálculo e critério material do ICMS-Importação encontramos elementos que não guardam a coerência que deve existir entre a base de cálculo e a hipótese constante da Constituição, permanecendo duas flagrantes inconstitucionalidades. A primeira em nível infraconstitucional, permitindo a inclusão de tributos federais e outras despesas na base de cálculo do imposto sob comento, a segunda em nível constitucional, permitindo a inclusão do ICMS-Importação em sua própria base de cálculo, de acordo com a redação promovida também pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001.