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Capítulo I –Introdução

2. Âmbito da investigação

Esta tese apoia-se na mobilização de um conjunto de conhecimentos da área das ciências sociais, essencialmente da sociologia do ambiente, da sociologia rural e do desenvolvimento rural, como domínios capazes de contribuir para a compreensão das questões que o argumento principal deste trabalho coloca. Obviamente, cada uma das áreas apontadas contribui de modo específico para o esclarecimento e validação desse mesmo argumento. Assim, a sociologia do ambiente revela-se fundamental na análise das interacções entre os actores sociais e os elementos naturais, permitindo compreender e explicitar não só a natureza particular dessas interacções, como as representações e as práticas que são construídas e desenvolvidas a partir delas.

No que se refere ao contributo da sociologia rural, ele situa-se, nesta tese, principalmente ao nível da compreensão das transformações ocorridas nas áreas rurais ao longo dos tempos, permitindo explicitar as causas, tendências e orientações dessas transformações, bem como a composição e recomposição sucessiva das áreas rurais em termos sociais, económicos e demográficos. Situa-se também ao nível da análise da alteração das suas funções (e da forma como são encaradas) no âmbito da sociedade globalmente considerada e ainda dos impactes de tais transformações na organização interna e nas relações com o exterior, das sociedades rurais. As teorias relativas ao desenvolvimento rural orientam a compreensão e análise dos processos de tomada de decisão e de implementação dos vários programas e medidas para as áreas rurais, os aspectos privilegiados nesses processos e as consequências que deles decorreram e decorrem. Mais ainda, estas teorias permitem a discussão do processo de elaboração das políticas públicas, assim como a produção de recomendações no que se refere a esse processo. Se em relação aos dois últimos contributos, a literatura científica é bastante rica e, podemos dizê-lo, encontra-se razoavelmente consolidada, no caso da sociologia do ambiente estamos perante uma área de investigação ainda pouco desenvolvida na maior parte dos países europeus (e principalmente em Portugal). Efectivamente, uma constatação imediata para quem, como nós, procura realizar uma investigação sobre o ambiente no domínio das ciências sociais, é a de que estas análises se encontram ainda pouco desenvolvidas e escassamente consolidadas, ficando tal a dever-se ao seu carácter de campo de investigação recente. Neste sentido, parece-nos pertinente fazer aqui um pequeno ponto de situação, relativo ao debate corrente no âmbito da sociologia do ambiente.

Podemos dizer que a história das ciências sociais em geral, e da sociologia em particular, até à actualidade tem sido marcada por uma ruptura sistemática com o mundo natural2. Esta prolongada ruptura entre a sociologia e o estudo das questões naturais (e consequentemente ambientais), ocorre, num primeiro momento, por razões de distanciamento e demarcação das ciências sociais face às ciências naturais, ou seja, por razões relacionadas com a necessidade de afirmação da especificidade dos seus objectos de estudo, dos seus métodos e das suas técnicas de investigação. Como refere Buttel (1986: 359) “a história da sociologia é a crónica das suas relações ambíguas com a biologia e as outras ciências naturais”.

Se observarmos os contributos dos chamados fundadores da sociologia (ou seja, Émile Durkheim, Karl Marx e Max Weber) veremos que os aspectos naturais e os aspectos de articulação entre estes e os contextos sociais (i.e. as dimensões ambientais) detém pouca

2 Excluímos parcialmente desta ‘tradição de ruptura’ entre as ciências sociais e o mundo natural, disciplinas como a

Antropologia e a Geografia Humana que, pelo carácter do seu objecto de estudo, não puderam nunca negligenciar a relação entre o Homem e a natureza.

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relevância nas suas análises3. Todavia, qualquer um dos três autores mencionados reconhece, sem a explorar devidamente – ou mesmo sem a tornar evidente – a necessidade de ancorar os factos sociais no espaço físico e natural em que têm lugar. Assim, “no campo sociológico a primeira definição sistemática da relação sociedade/natureza é expressa por Émile Durkheim, que procura definir a relação existente entre o mundo da natureza e os factos sociais. Durkheim reconhece que os factos sociais têm uma espécie de alocação física, graças à existência de um substrato sobre o qual assenta toda a vida social, que, por um lado, é determinado pelas características daquele a que hoje chamaríamos o território, nas suas componentes espaciais e climáticas e por outro lado, se constitui com base na amplitude e na densidade da população que aí vive. Este substrato, por sua vez, é capaz de influenciar a constituição e as próprias características dos factos que formam a sociedade.” (Mela, Belloni e Davico, 2001: 56).

Mela, Belloni e Davico (2001) consideram que apesar deste reconhecimento de Durkheim, prevaleceu a incapacidade ou a impossibilidade de integrar plenamente na sua análise as duas esferas. Esta posição não encontrará desenvolvimentos significativos no pensamento sociológico da época, nem em Max Weber (apesar deste autor procurar compreender as formações sociais que estão indubitavelmente localizadas num dado território: como a família, a aldeia, a nação), nem em Karl Marx que tende a interpretar a relação estrutura/supra estrutura essencialmente em termos das relações económicas e de poder, muito embora estas dimensões também se realizem histórica e territorialmente. Podemos encontrar perspectivas semelhantes sobre a integração dos aspectos naturais no que pode ser designado como as primeiras análises sociológicas em Kalaora e Lárrere (1989), Kalaora, (1993); Benton e Redclift (1994), Goldblatt (1996), Buttel (2000), Franklin (2002) e Cudworth (2003). A este respeito Dunlap e Catton Jr. (1994a: 14) referem que o “legado de Durkheim sugeria que o ambiente físico devia ser ignorado, enquanto o legado de Weber sugeria que podia ser ignorado, porque era pouco importante para a vida social”4. Assim, apesar de Durkheim distinguir o social do físico, do biológico e do mineral e de considerar que a sociedade é, em certa medida, um fenómeno da natureza, toda a sua análise “sugere que a natureza é tanto uma pré-condição para a sociedade como uma realidade dela separada” (Redclift e Woodgate, 1994: 51). Estes autores sugerem ainda que a ênfase de Durkheim na explicação dos factos sociais através apenas dos próprios factos sociais, permite fundamentar a sociologia moderna em diversos dos seus aspectos, mas não acomoda

3 Ver a propósito dos contributos dos fundadores da sociologia para a análise das questões ambientais os trabalhos de

Lutas Craveiro (1993); Redclift e Woodgate (1994); Buttel (2000); Mela, Belloni, Davico (2001); Franklin (2002) e Cudworth (2003).

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Irwin (2001) refere justamente que Durkheim e Weber foram os principais responsáveis pela exclusão do natural do social. A título de exemplo este autor diz-nos que “a primeira reunião da Associação Alemã de Sociologia (ocorrida em

1910) conteve um debate bastante vivo sobre se a discussão sociológica deveria dar algum crédito às categorias ‘naturais’ como ‘raça’ ou biologia. Max Weber foi um dos mais vigorosos opositores à inclusão destes elementos na sociologia”

facilmente a visão moderna de que “muitos dos nossos problemas sociais são o resultado da forma como vimos a natureza” (Redclift e Woodgate, 1994: 52). Os autores acrescentam que “no entanto, as abordagens de Durkheim [bastante mais do que as de Weber ou Marx] dão autoridade à visão actual de que os problemas ambientais só podem ser entendidos num determinado contexto de produção e reprodução social” (idem: 52).

De acordo com Mela, Belloni e Davico (2001) a corrente sociológica que encara pela primeira vez de forma directa a relação entre a natureza e a sociedade ou entre a natureza e a cultura é a Escola de Chicago. Destacam-se sobretudo os trabalhos desenvolvidos por Burgess e Park que, partindo da análise da cidade e das suas transformações, propõe a fundação de uma disciplina definida como ecologia humana. Esta disciplina consistiria no estudo das relações espaciais e temporais dos indivíduos, influenciados pelas forças selectivas, distributivas e adaptativas que actuam no ambiente (noções aliás importadas da biologia). Apesar destes trabalhos tomarem o espaço como variável central das suas análises, não é clara a forma como os aspectos especificamente naturais se articulam com os contextos sociais considerados por estes autores.

Esta negligência prolongada e sistemática da natureza e do ambiente pela sociologia, deve-se, então, sobretudo ao contexto sociocultural no qual a disciplina se desenvolveu - i.e., um contexto que radica na crença de que os seres humanos estão isentos dos constrangimentos ambientais (e.g. Dunlap e Catton Jr, 1983; Irwin, 2001). Ou como afirmava Durkheim, na sua obra As Regras do Método Sociológico, a convicção de que os factos sociais só podem ser explicados por outros factos sociais. Neste sentido, foi justamente esta crença de que só o isolamento dos factos sociais do seu ambiente natural e de todos os factores que se pensem metassociais, nos permitiria o conhecimento da sociedade, que se constituiu como uma regra de afirmação e demarcação das ciências sociais face às ciências naturais. Inversamente, segundo Kalaora e Larrére (1989) também a maior parte das ciências naturais excluíram o Homem e as suas realizações materiais e imateriais das suas investigações.

A negligência da natureza e do ambiente pela sociologia foi igualmente muito condicionada pela influência daquilo a que Dunlap e Catton Jr (1994b), Dunlap (1993) e Smith (1995) chamam a visão dominante do mundo ocidental (‘dominant western worldview’) ou o paradigma social dominante (‘dominant social paradigm’) nesta ciência social. As características destes paradigmas podem sintetizar-se na crença social, generalizada no mundo ocidental, no progresso científico e tecnológico ilimitado e na abundância e carácter inesgotável dos recursos naturais. Uma tal visão do mundo não tem dominado apenas o conhecimento científico mas, como veremos no Capítulo II deste trabalho, também a própria sociedade.

Capítulo I - Introdução

Outros autores, como por exemplo Luhmann (1993), referem que a negligência das questões ambientais e naturais pela sociologia se deve essencialmente à fraca preparação teórico-metodológica que os sociólogos possuem para abordar aquelas questões. Esclarece este autor que: “a sociologia está muito mal preparada para levar a cabo a tarefa de responder a questões como: em que medida estamos preocupados? E que podemos nós alterar [no que se refere aos problemas ambientais]? Desde a constituição da sociologia moderna, no século XIX, que o seu objecto é a sociedade, mais precisamente o social como um objecto específico. A sociologia tem um objectivo nitidamente intra-social. O ambiente fica, assim, de fora do seu campo de análise, talvez porque muito simplesmente outras disciplinas dele se encarregaram” (Luhmann, 1993: 73-74). No mesmo sentido, Goldblatt (1996: 6) refere que os sociólogos, em geral, “não possuem um quadro conceptual adequado para compreender as interacções complexas entre as sociedades e os seus ambientes”. Luhmann (1993), reconhecendo, igualmente, a demarcação entre o ambiente e a sociedade na análise sociológica como uma inevitabilidade inerente à própria natureza das questões analisadas por esta disciplina, refere que, num contexto como este, as dificuldades para a sociologia são de diversa ordem. Neste sentido o autor interroga-se: “como fazer para que não seja apenas tido em conta o objecto da sociologia – a sociedade – mas também o seu ambiente, i.e., tudo o resto?” (Luhmann, 1993: 74). Ao mesmo tempo que identifica a tradição da análise sociológica como responsável pelas dificuldades que esta disciplina encontra na análise do mundo natural e do ambiente, Luhmann reconhece a importância do seu contributo neste domínio, tal como a reconhecem Newby (1991), Buttel e Taylor (1994); Benton e Redclift (1994); Redclift e Woodgate (1994, 1997); Shove (1994) e como Dunlap na maior parte dos trabalhos que desenvolveu desde a década de 70. Por exemplo, Newby (1991) refere que, apesar da prolongada ausência do ambiente das preocupações sociológicas, esta ciência é cada vez mais importante para o estudo e para a compreensão do mundo natural mas que, para tal, são necessários reajustamentos teóricos e metodológicos significativos. Este autor interroga-se ainda acerca das causas subjacentes ao silêncio da sociologia relativamente aos problemas ambientais, dado que “as alterações ambientais não podem ser apenas vistas como um assunto científico e tecnológico. Os avanços nas ciências naturais permitem o estabelecimento de parâmetros para medir as alterações ambientais, mas descrevem os sintomas, negligenciando a explicação das causas. As causas repousam nas sociedades humanas e nos seus sistemas de desenvolvimento económico” (Newby, 1991: 2).

No âmbito da sociologia do ambiente ou sociologia ambiental5, como refere Benton (1994)

a principal tendência dos sociólogos tem sido a abordagem dos aspectos socioculturais dos

5Vem a propósito citar aqui o trabalho de Lutas Craveiro (1993) em que é feita uma distinção entre as correntes americana

e francesa da sociologia das questões ambientais. O autor refere que na corrente americana o termo utilizado é

movimentos ambientalistas e das percepções e valorizações sociais do ambiente, negligenciando bastante mais a abordagem relativa aquilo a que Newby (1991) chama “os aspectos materiais” da relação entre a sociedade e o ambiente. Benton salienta igualmente (à semelhança dos autores referidos anteriormente) a necessidade de uma revisão teórica e metodológica no âmbito das ciências sociais em geral e da sociologia em particular. Segundo este autor, esta revisão teórico-metodológica deve passar por uma ruptura com a tradição da análise sociológica e, pelas razões que expusemos anteriormente, muito particularmente com as teorias explicativas que perspectivam uma dicotomia entre a cultura e a sociedade e a natureza e o ambiente. Obviamente que uma tal ruptura jamais poderá ser realizada sem criar alguns problemas, uma vez que:

ƒ os dualismos existentes (mesmo o dualismo sociedade/natureza) não são meramente superficiais para que os possamos simplesmente eliminar. Na verdade, segundo a maior parte dos autores que referimos antes, estes dualismos constituem categorias organizadas que formam o pensamento e a investigação sociológicos;

ƒ as tradições sociológicas que, como se referiu, tentam separar o conhecimento sociológico sobre o ambiente do conhecimento das ciências sociais, são ainda dominantes;

ƒ há necessidade de novos conceitos e respectiva operacionalização para que se possa tratar as questões relativas ao ambiente, a partir de uma perspectiva sociológica. Neste sentido, apesar de, como dissemos antes, “o confronto entre as ciências sociais, particularmente da sociologia, com o ambiente ser muito recente”, não tendo ainda dado lugar a “a um corpo unificado de teorias e de resultados” (Mormont, 1993a: 4) há um novo campo de reflexão sociológica (particularmente na Europa) – o ambiente nas suas várias dimensões em articulação com o campo social (e.g. Zube, 1983; Arizpe, 1991, Newby, 1991; Lefeuvre e Barnaud, 1992; Mormont, 1993a; Benton, 1994; Benton e Redclift, 1994; Buttel, 2000; Franklin, 2002; Cudworth, 2003).

Para a resolução dos problemas apontados anteriormente, a inter-trans- multidisciplinaridade surge como um factor fundamental (e.g. Zube, 1983; Miller, 1991; Dunlap 1994a, 1996 e 2000), não apenas porque podem ser aplicados à análise das questões ambientais os contributos de outros ramos da sociologia (e.g. da sociologia rural, política, do desenvolvimento, do direito, etc.), mas também porque “as questões do ambiente mobilizam geralmente tanto modelos naturais como modelos sociais” (Mormont, 1993a: 6). Este último l’environnement (sociologia do ambiente). Segundo Lutas Craveiro, esta diferente terminologia esconde também

abordagens diversas, sendo que a sociologia ambiental é mais marcada pelos determinismos biofísicos e a sociologia do ambiente privilegia mais as relações entre o Homem e o meio, i.e., parece ser mais marcada pelas inter-relações que se estabelecem entre o social e o natural. Tanto num caso como noutro, cremos poder utilizar a definição de Dunlap (1994a) do que significa a sociologia do ambiente ou ambiental. Diz este autor que “a sociologia do ambiente é uma nova área de

estudo, que examina as dimensões sociais dos problemas ambientais, incluindo as relações complexas entre as sociedades humanas e os seus ambientes físicos” e acrescenta que “focar o ambiente ‘social’ representa um grande desafio”.

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reconhecimento faz apelo à diluição da fronteira histórica entre as ciências sociais e as ciências naturais na análise destas questões (e.g. Kalaora e Larrére, 1989; Arizpe, 1991; La Riviére, 1991; Lefeuvre e Barnaud, 1992; Buttel, 2000; Cudworth, 2003).

Apesar de todas as dificuldades mencionadas, é possível dar conta do debate actual (assim como da sua evolução) acerca das relações entre a sociologia e o ambiente, tal como das várias perspectivas desenvolvidas. Neste contexto, é impossível não mencionarmos – como pioneiro da tentativa de uma nova abordagem científico-social para colmatar a necessidade de investigação no domínio do ambiente – o trabalho (a nosso ver) notável de Dunlap6 e dos seus colaboradores. A proposição do novo paradigma ecológico (‘new

ecological paradigm’ – NEP) por este autor (em colaboração com Catton Jr.) foi fundamental para o reconhecimento da necessidade do contributo das ciências sociais para a análise das questões relativas à natureza e ao ambiente e para o posterior desenvolvimento da sociologia ambiental. Segundo Dunlap e Catton Jr (1978a; 1978b; 1979; 1980; 1983, 1994b) o NEP vem substituir aquilo que os mesmos autores designam como o paradigma da excepcionalidade humana (‘human exemptionalism paradigm‘– HEP). A imagem das sociedades humanas que está por detrás deste último paradigma enfatiza a natureza excepcional da espécie humana, excepcionalidade que radica na nossa herança cultural, e que se manifesta em aspectos como a língua, a organização social e a tecnologia. No entanto, embora os autores não neguem que “o homo sapiens é uma 'espécie excepcional'“ (Dunlap e Catton Jr., 1994b: 15), também referem que foi justamente pela sua ênfase nas características excepcionais dos humanos, que muitos sociólogos ignoraram totalmente o ambiente biofísico. O HEP está, então, profundamente associado à visão dominante do mundo ocidental a que aludimos antes e é igualmente uma visão “inerentemente antropocêntrica e omnisciente, no sentido em que assume que os humanos serão capazes de resolver qualquer tipo de problemas” (Dunlap e Catton Jr., 1994b: 15) Ambos os paradigmas (HEP-NEP) são profusamente explicados nas obras de Dunlap e Catton Jr., sendo que o NEP é um paradigma inovador no entendimento das questões ambientais porque deixa de reconhecer o Homem como uma espécie de excepção face ao resto da natureza, considerando-o apenas como mais uma espécie entre as outras (não obstante o Homem possua características únicas e distintivas). O NEP postula ainda a grande influência que o ambiente biofísico tem na vida social, colocando-lhe constrangimentos importantes, assim como afirma que o Homem é o grande construtor do ambiente, determinando também a sua qualidade. No quadro 1.1 procuramos sintetizar as características da ‘dominant western worldview’, do HEP e do NEP, no sentido de facilitar a sua compreensão e comparação.

6 Referimo-nos ao trabalho de Riley Dunlap como sendo notável não apenas porque foi pioneiro da análise das questões

ambientais no âmbito da sociologia, mas igualmente porque a sua contribuição ao longo dos últimos trinta anos para a consolidação desta área disciplinar foi fundamental.

Quadro 1.1 – Principais características da Visão Dominante do Mundo Ocidental, do Paradigma da Excepcionalidade Humana e do Novo Paradigma Ecológico

VISÃO DOMINANTE DO MUNDO OCIDENTAL

PARADIGMA DA EXCEPCIONALIDADE HUMANA

NOVO PARADIGMA ECOLÓGICO PERSPECTIVA SOBRE A

NATUREZA DO SER HUMANO

Os Homens são muito diferentes de todas as outras criaturas da Terra e por isso as dominam e controlam.

Os Homens têm uma herança cultural, para além da (e distinta da) sua herança genética e são, assim, muito diferentes das outras espécies animais.

Mesmo que os humanos tenham características excepcionais (a cultura, a tecnologia, etc.), eles são apenas mais uma entre outras espécies que se encontram envolvidas de forma interdependente no ecossistema global.

PERSPECTIVA SOBRE O DETERMINISMO SOCIAL

Os Homens são donos do seu destino: podem escolher os seus objectivos e podem aprender tudo o que for necessário para os alcançar.

Os factos sociais e culturais (incluindo a tecnologia) são os principais determinantes dos comportamentos humanos.

Os seres humanos são influenciados não apenas por factos culturais e sociais, mas também por relações intrincadas de causa-efeito e

feedback na rede natural.

Assim, as acções humanas têm muitas consequências inesperadas.

PERSPECTIVA SOBRE A SOCIEDADE

O mundo é vasto e dá oportunidades ilimitadas aos seres humanos.

Os contextos culturais e sociais são os factores cruciais para a acção humana. O ambiente biofísico é amplamente irrelevante

Os seres humanos vivem em, e estão dependentes de, um ambiente biofísico finito que lhes impõe poderosos obstáculos físicos e biológicos. PERSPECTIVA SOBRE OS CONSTRANGIMENTOS COLOCADOS À SOCIEDADE A história da Humanidade é uma história de progresso: Para cada problema existe uma solução e o progresso não necessita de ser parado

A cultura é cumulativa e assim a tecnologia e o progresso social podem continuar indefinidamente, solucionando todos os problemas sociais

Embora a capacidade inventiva dos seres humanos e os poderes que daí decorrem possam parecer susceptíveis de aumentar a capacidade de carga do planeta, as leis ecológicas não podem ser negligenciadas.

Fonte: Adaptado de Dunlap e Catton Jr. (1978a e 1994b)

O NEP, criticado por alguns autores (e.g. Buttel, 1986 e 1987 que propõe em alternativa a este paradigma, a eco-sociologia ou ecologia humana) e bastante valorizado por outros (e.g. Freudenburg e Gramling (1989) que consideram que este paradigma foi o mais importante contributo para a evolução da sociologia das questões ambientais, nos Estados Unidos da América (EUA) ou ainda Kalaora (1993) que o considera como o paradigma dominante na actualidade), aparentemente fracassou na sua tentativa de estimular o reconhecimento da importância das questões ambientais e ecológicas para as modernas sociedades ocidentais e industrializadas. Aliás, este fracasso é reconhecido pelos próprios Dunlap e Catton Jr. que