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As respostas políticas às preocupações sociais com a questão ambiental

Capítulo II – A Emergência do Ambiente como Questão Social e Política

3. As respostas políticas às preocupações sociais com a questão ambiental

A partir de meados/finais dos anos sessenta, a degradação ambiental começou a ser considerada um problema social em quase todos os países industrializados. Embora os problemas associados à degradação do ambiente se fizessem sentir antes, apenas nesta década eles começaram a atrair a atenção do público e, igualmente, a dos responsáveis políticos. A maior parte dos autores consultados argumenta que o interesse político pelas questões ambientais se deve sobretudo a esta crescente sensibilidade da opinião pública (e.g. Dwivedi, 1986; Gyomard, 1987; Garner, 1996). Como refere Garner (1996: 6) o ambiente tornou-se um assunto político “porque as pessoas suficientes ou as certas se aperceberam que existia um problema que necessitava de ser resolvido”. Segundo este autor, isto aconteceu devido às catástrofes e acontecimentos ambientais, a que já aludimos no ponto 2.1, que vieram sustentar o crescimento do sentimento da existência de uma crise ambiental objectiva. Por outro lado, para além do aumento dos problemas ambientais (fruto também, como vimos, da sua maior mediatização), houve também uma alteração qualitativa na percepção desses problemas. Os problemas ambientais deixaram de ser apreendidos apenas no contexto local, com consequências negativas para um reduzido número de indivíduos, para passarem a ser entendidos como globais. Ou seja, “a preocupação central tornou-se a sobrevivência humana num planeta que, é hoje reconhecido, não pode continuar indefinidamente a cooperar com um consumo de recursos não renováveis ou com a absorção de resíduos industriais em níveis como os presentes” (Garner, 1996: 6). Como refere Dwivedi (1986) a crise ambiental é global e os níveis de degradação ambiental que lhe estão associados são susceptíveis de afectar todos e cada um, na medida em que potencialmente conduzem à destruição de todo o ambiente favorável à sobrevivência da espécie humana (entre outras). A incerteza quanto ao futuro do planeta, associada aos problemas ambientais, principalmente pelo seu carácter de problemas globais, cresceu não apenas no domínio dos valores sociais, como vimos no ponto precedente, mas alastrou-se a todas as esferas de organização social (ou seja, à esfera económica, cultural, científica, tecnológica e política) (e.g. Chase e Panagopoulos, 1995). Ainda que de extrema importância, como refere Garner (1996), a associação níveis de preocupação pública/níveis de preocupação política com o ambiente não pode ser considerada isoladamente como uma explicação para o crescimento das respostas políticas aos problemas ambientais. Garner (1996: 8) assinala igualmente que “não devemos exagerar a importância dos problemas ambientais objectivos como uma explicação para a existência de políticas do ambiente (ou de preocupações políticas com o ambiente). Estes problemas objectivamente definidos podem de facto ser distintos de uma consciência subjectiva em relação a ou de uma preocupação com o ambiente, mas não podem explicar isoladamente porque é que o ambiente se tornou um assunto político tão

importante”, sobretudo nas últimas duas décadas. O autor argumenta que há uma série de factores que lançam algumas dúvidas sobre as explicações anteriores, a saber:

ƒ em primeiro lugar, muitos problemas ambientais não são directamente observáveis ou, pelo menos, não são muito fáceis de visualizar. Normalmente os problemas são mediatizados através dos media, dos grupos de pressão e também, dos cientistas cujas conclusões raramente são universalmente aceites;

ƒ em segundo lugar, mesmo que a maior parte dos indivíduos tenha indirectamente experimentado desastres ou problemas ambientais, muitos deles têm relações bastante longínquas com os seus efeitos imediatos. Por exemplo “mesmo que nos tenham dito que fomos afectados pelo desastre de Chernobyl, os efeitos continuam a ser imperceptíveis” (Garner, 1996: 8);

ƒ finalmente, mesmo que os problemas ambientais sejam reconhecidos, não conduzem imediatamente a respostas e soluções por parte do poder político. Isto acontece, segundo o mesmo autor, porque as causas de um problema visível podem ser disputadas e também porque, por vezes, as soluções possuem custos elevados. Ambos os factores estão subjacentes à décalage comum, em termos políticos, entre a identificação dos problemas e a sua resolução.

Fundamentalmente, o autor chama-nos a atenção para a miríade de causas subjacentes ao interesse político pelas questões e problemas ambientais e, consequentemente, à entrada definitiva dessas questões e problemas na agenda política, quer a nível dos países, quer a nível internacional. Por um lado, é extremamente simplista procurar apenas um factor como determinante na formação daquele interesse, mas por outro lado, é impossível determinar com exactidão qual o papel dos vários factores que nele intervêm. Podemos dizer que é da intrincada relação entre a pressão dos grupos ambientalistas, o crescimento do interesse público, a divulgação dos media, o trabalho dos cientistas e as consequências da modernidade, que se forma o interesse político pelos assuntos ambientais (e.g. Connelly e Smith, 2003), ou como refere Garner (1996: 10) “importantes são os processos sociais, económicos e políticos envolvidos na colocação do ambiente no topo da agenda política”.

O carácter da política ambiental, reflexo imediato da preocupação política com o ambiente, é produto então de processos complexos que importa clarificar e conhecer. Isto significa que, para perceber porque é que o ambiente se tornou um assunto político tão importante como o é nos dias de hoje e também para perceber as políticas de ambiente (nas suas várias dimensões), é necessário conhecer os problemas ambientais, mas conhecer igualmente que estruturas políticas se mostram mais adequadas para proteger o ambiente e ainda quais os processos subjacentes à tomada de decisão nesta matéria. De facto e como refere Dwivedi (1986: 405), a política do ambiente integra fundamentalmente um processo que é político e ainda o estudo dos problemas ambientais: “ou seja a acção dos sistemas governativos e dos

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poderes públicos e a problemática do ambiente”. Desta forma, deveríamos ter em conta o papel dos partidos políticos e dos grupos de pressão, a actividade e culturas políticas, as ideologias, a elaboração e a aplicação das políticas públicas, na medida em que estes aspectos determinam os beneficiários, as circunstâncias e as modalidades de exploração do ambiente. Por outro lado, todos estes aspectos derivam da política de ambiente e tornam-na, igualmente, cada vez mais complexa e controversa42.

Foi sensivelmente a partir das anos setenta que os governos começaram a modificar progressivamente as suas políticas com o objectivo de medir e resolver os problemas ambientais (e.g. Dwivedi, 1986). No final desta década, a maior parte dos países industrializados, segundo o mesmo autor, encontrava-se já dotada de instituições que permitiam aos diferentes governos agrupar o conjunto de acções e programas relativos ao ambiente numa única estrutura político-administrativa. Nas últimas duas décadas, sobretudo, tornou-se claro que apenas organismos de nível nacional não seriam suficientes para lidar com os problemas ambientais. Estes são, como já referimos, cada vez mais globais e em consequência disso as respostas políticas terão de ser, igualmente, globais (e.g. Dwivedi, 1986; Caldwell, 1992; Ogrizek, 1993; Dunlap, 1996; Garner, 1996 e Yearley, 1996). No final da década de oitenta, Dwivedi referia que apenas instituições internacionais investidas de autoridade e poder reais, poderiam elaborar e implementar políticas e programas de carácter global, em matéria de ambiente. Como diz Caldwell (1992: 63), “assuntos globais como as alterações climáticas, a destruição da camada de ozono, a poluição do ar e da água, as espécies ameaçadas e os usos do espaço natural, deram uma dimensão internacional às políticas ambientais”. No fundo, este autor advoga que a descoberta dos riscos associados às alterações globais do ambiente, deram novas dimensões à política e aos próprios processos de tomada e implementação de decisões neste domínio. Nesta internacionalização crescente das políticas ambientais desempenham um papel muito importante as relações Norte/Sul e a questão do desenvolvimento do chamado Terceiro Mundo. Não apenas a internacionalização das políticas ambientais envolve os países industrializados e desenvolvidos como atinge também, de modo crescente, os países em vias de desenvolvimento ou subdesenvolvidos. Em certa medida isto acontece devido ao carácter transfronteiriço de grande parte dos problemas ambientais actuais, a que já aludimos, mas igualmente devido ao agravamento destes problemas em termos de degradação dos recursos naturais e do crescimento populacional. Estes problemas estão agora inextrincavelmente associados ao desenvolvimento do Terceiro Mundo e aos processos económicos mundiais (globais). Como refere Garner (1996: 111) “o ambiente global tem potencialidades para se tornar na maior fonte de problemas entre o Norte e o Sul. Por outras palavras, é agora impossível separar o

42Não vamos abordar aqui todos estes aspectos, uma vez que eles ultrapassam o âmbito desta tese e constituiriam em si

ambiente do desenvolvimento (…). Só a cooperação internacional pode esperar resolver estes problemas”43. Ou como nos diz Ogrizek (1993: 10) “cada vez mais os projectos transfronteiriços serão as plataformas de comunicação privilegiadas para fazer face à crise ecológica”.

Torna-se, assim, evidente que os problemas do ambiente são problemas políticos e neste sentido todos os elementos da regulação social (a ciência, o direito, a opinião pública, os mass media, as instâncias éticas) estão mobilizados para esta questão, não apenas ao nível nacional como, essencialmente, ao nível internacional. Mas o que podemos nós entender por respostas políticas à crescente preocupação social com o ambiente? Fundamentalmente e, ainda que, como vimos, a resposta a esta questão mobilize várias dimensões, trata-se de analisar as políticas ambientais. No âmbito da literatura da especialidade, a definição de ambiente refere-se ao conjunto dos recursos naturais e a eventuais alterações causadas pela intervenção humana. Exclui tradicionalmente os recursos directamente produzidos pelo Homem, que entram noutra esfera da política, por exemplo na política urbanística ou na dos bens culturais. A este respeito podemos considerar interessantes algumas definições expressas em manuais de ciência política, nos quais geralmente o ambiente se apresenta diverso de tudo quanto é socialmente construído. Uma definição que podemos apontar, como exemplo, é a proposta por Lewanski (1997) (citada por Mela, Belloni e Davico, 2001: 189): “a política ambiental corresponde ao conjunto de intervenções realizadas por autoridades públicas (…) com o fim de disciplinar as actividades humanas que reduzem a disponibilidade dos recursos naturais ou agravam as suas qualidades e a sua fruição”. Ainda que relativamente linear, esta definição traduz em certa medida, a necessidade actual de proteger a natureza dos seus agentes de degradação principais – os Homens. Outras perspectivas sobre o que é a política ambiental são aquelas que se referem à esfera das grandes escolhas, por assim dizer – o dilema democrático, como o define Parker (1995) – entre os valores certos e os processos certos no âmbito das políticas públicas; ou ainda os dilemas sociais como os designam Chase e Panagopoulos (1995). Trata-se claramente de uma esfera a que podemos chamar ética. O ambiente de que nos fala esta perspectiva é então o do ecossistema na sua acepção mais lata, i.e., como condição essencial à existência e sobrevivência de todo o planeta Terra. Nesta perspectiva das grandes escolhas ou dos dilemas, o ponto central, segundo Mela, Belloni e Davico (2001: 190) é “o problema do equilíbrio, cuja perda provocaria a activação de processos sistémicos que levariam

43 Exactamente como refere Chokor (1993) a protecção ambiental é um tópico controverso no desenvolvimento

contemporâneo do Terceiro Mundo. O autor diz-nos que embora existam pressões e interesses crescentes por parte dos governos dos países industrializados e das agências internacionais na resolução dos problemas ambientais nos países em vias de desenvolvimento, pouco tem sido feito por parte destes últimos. Por outro lado, o autor examina as políticas ambientais da Nigéria, argumentando que se têm mostrado desadaptadas à realidade do país, já que envolvem aspectos daquilo a que Chokor chama o ambientalismo moderno, aspectos esses especialmente concebidos para enfrentar os desafios da degradação do ambiente nos países desenvolvidos.

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provavelmente à inviabilidade do planeta para a espécie humana”. Esta perspectiva associa- se à necessidade, já apontada antes, de considerar a política ambiental como global, muito embora não excluindo a diferenciação inerente às situações dos diversos países (nomeadamente em termos de nível de desenvolvimento económico). Como vimos e como esta perspectiva reforça, a orientação actual das políticas ambientais parece ser a adopção de abordagens internacionais ou globais.

Para além desta orientação geral, outra tendência pode ser observada nas políticas ambientais das últimas duas décadas – a tendência para o alargamento progressivo do seu âmbito. Este alargamento, como referem Mela, Belloni e Davico (2001) vai no sentido da superação da oposição tradicional natureza/cultura, que inclui não apenas os contextos construídos e antropizados, mas igualmente os aspectos históricos e sociais. Mela, Belloni e Davico traçam justamente um quadro das principais correntes de políticas a que “numa definição alargada podemos atribuir o adjectivo ‘ambientais’” (idem: 187). A figura 2.5 mostra- nos justamente as correntes das políticas ambientais consideradas pelos autores.

Figura 2.5 – Correntes principais das políticas ambientais na actualidade

Domínios Não Sociais Domínios Socioculturais

Ambiente interior individual Ambiente sociocultural interiorizado

1 Políticas de prevenção e Políticas de prevenção e intervenção 5 mal estar físico e psíquico sobre o mal estar social

Ambiente interior colectivo Ambiente sociocultural do sistema

2 Políticas demográficas Políticas de Defesa das culturas 6

Ambiente exterior biológico Ambiente biológico antropizado

3 Políticas relativas à esfera Políticas relativas à agricultura, 7 biótica (fauna, flora) às áreas agro-florestais, etc.

Ambiente exterior físico Ambiente físico antropizado

4 Políticas relativas à esfera Políticas de conservação e 8 abiótica (recursos de energia, de valorização dos ambientes

clima, hidrosfera, solo, etc.) construídos e bens históricos

Fonte: Adaptado de Mela, Belloni e Davico (2001)

Na figura, a intensidade da tonalidade do fundo de cada domínio, representa o processo de alargamento do âmbito das políticas ambientais. O tom mais escuro corresponde ao núcleo original de formulação e implementação das políticas. Assim, justamente, os domínios 3, 4 e 7 são aqueles em que se exprime há mais tempo e com maior organização, a esfera típica das competências das políticas ambientais - no fundo, os domínios sobre os quais tradicionalmente actua a política pública em matéria de ambiente. A análise da evolução do debate e das políticas, permite-nos observar a sua progressiva ampliação para uma visão que tende a considerar, no que se refere ao ambiente, também aspectos relativos às características biológicas das populações humanas, às formas das suas localizações e das

suas expressões culturais e até aspectos associados à saúde individual e à saúde dos sistemas sociais (cf. na figura os domínios 2, 8, 1, 5 e 6 respectivamente). Nestes termos, como Mela, Belloni e Davico (2001: 188) referem “o elemento unificador das políticas ambientais é constituído sobretudo pelo carácter de ‘salvaguarda’ e de ‘defesa da integridade’ dos elementos e entidades (físicas ou culturais) que caracterizam um território”. Como mencionámos antes, dados os vários agentes e domínios de actuação envolvidos, a política ambiental é cada vez mais complexa e controversa, ou seja, “a definição e a conceptualização das políticas ambientais apresentam-se como operações especialmente problemáticas, quer pela complexidade do objecto e as ligações sistémicas que apresenta, quer pela ambiguidade da relação entre a natureza e o sistema social, mediado pela difícil avaliação de custos e benefícios” (Mela, Belloni e Davico, 2001: 193). Na sequência disto, os autores citados, propõem dois campos principais de reflexão:

ƒ O primeiro diz respeito à natureza dos problemas relativos ao ambiente e à sua articulação com os indivíduos e os sistemas sociais.

ƒ O segundo refere-se às competências necessárias para uma definição das políticas ambientais.

A estes pode ainda juntar-se um terceiro campo de reflexão, relativo à esfera das decisões e à teia das mediações exercidas tanto por lobbies políticos como económicos, que são essencialmente activados quando se definem regras limitativas de acesso aos recursos. Seguindo a lógica dos autores mencionados, no que diz respeito aos dois primeiros campos de reflexão, podemos apresentar como principais problemas na definição e conceptualização das políticas ambientais, os seguintes (e.g. Mela, Belloni e Davico, 2001: 193 – 195):

1. o carácter complexo e planetário dos problemas ambientais que são hoje objecto das políticas, que se traduz em questões como a determinação da origem dos problemas. Isto pode conduzir a uma sensação de impotência ou de indiferença quanto aos resultados das acções políticas e limitar, assim, a responsabilidade individual e colectiva em relação às decisões e aos processos de implementação;

2. a natureza de ‘bem público ou comum’ do ambiente que faz apelo à impossibilidade de excluir da sua fruição qualquer agente ou actor social, sob pena de “dar lugar a um ‘efeito perverso’ que conduziria a um consumo maior dos recursos (que são um bem finito) e comprometer a utilização futura dos mesmos” (idem: 194);

3. os efeitos relativamente prolongados no tempo de algumas intervenções humanas que provocam alterações no meio ambiente. Estas não são compatíveis com os horizontes temporais dos actores nelas implicados e igualmente com as acções políticas para solucionar aqueles efeitos negativos. Como referem os autores mencionados, isto favorece a perda de visibilidade ou a diminuição “da tangibilidade do problema, por parte dos agentes não directamente envolvidos nos processos decisórios e a

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acentuação negocial de escolhas a breve e médio prazo, por parte dos agentes directamente interessados” (idem: 194);

4. o facto de os processos de tomada de decisão, no domínio do ambiente, se caracterizarem por níveis mais elevados de não coincidência entre os interesses interiorizados e os interesses manifestos e negociáveis, i.e., entre os agentes envolvidos e os agentes potenciais e entre as dimensões locais e as globais;

5. as políticas relativas ao ambiente ressentem-se de uma espécie de vulnerabilidade estrutural, decorrente da sua “condição de paradigma não central, relativamente ao paradigma dominante nas sociedades industrializadas, baseado no desenvolvimento” (idem: 195) que assentava no crescimento económico e na acumulação de capital; 6. actualmente o âmbito da política ambiental tem, como vimos, um acentuado carácter

ético e uma acentuada dimensão de orientação para o futuro. Este carácter ético, frequentemente abstracto e não negociável de forma directa, tende a limitar a sua operacionalidade;

7. finalmente, o domínio das políticas ambientais está cada vez mais dependente de saberes especializados. Isto compromete potencialmente o processo de controlo democrático, podendo criar concentrações de poder por parte dos detentores do conhecimento ou ainda de grupos de pressão susceptíveis de controlar os processos de produção e difusão de informação.

Estes problemas associam-se de forma clara aos enunciados por Mormont (1993a; 1994a). Mormont enfatiza essencialmente a questão da legitimidade destas políticas que, na lista de problemas anterior, se associa particularmente ao segundo, quarto e último pontos. A legitimidade, no âmbito desta tese, diz respeito a duas ordens de factores relacionados: a primeira está interligada de modo mais evidente com a legitimidade que é atribuída aos processos políticos e a segunda com as legitimidades sociais associadas a determinadas representações e práticas, neste caso concreto relativas ao ambiente. Assim, no âmbito deste trabalho:

ƒ a problemática da legitimidade é entendida, em primeiro lugar e seguindo de perto Godard (1989), como os processos através dos quais os sujeitos sociais elaboram ou reconhecem os princípios de ordem geral, susceptíveis de se constituírem como uma matriz de referência apreendida como legitima para a regulação de conflitos ou para a constituição de acordos, envolvendo os interesses comuns;

ƒ em segundo lugar, entendemos a legitimidade como os procedimentos que os actores sociais utilizam para racionalizar e justificar as suas condutas perante si próprios e perante os outros actores.

Mormont (1993a, 1994a) advoga que a ausência de legitimidade das políticas do ambiente pode ser atribuída a vários aspectos. Em primeiro lugar, à ausência de clareza da definição

do próprio ambiente que se traduz no facto de não estar estabelecido nenhum corpo de experts reconhecido44, tornando esta matéria bastante fragmentada. Em segundo lugar, o deficit de legitimidade é também um deficit de representação dos vários actores e interesses. Finalmente e em associação com o anterior, outro aspecto subjacente à ausência de legitimidade das políticas do ambiente prende-se com a sua falta de eficácia na prevenção, resolução ou minimização das situações de degradação ambiental. No mesmo sentido, é importante assinalar o contributo de Godard (1989), cujo questionamento da legitimidade e eficácia das políticas do ambiente se centra sobretudo nas condições do acordo social. A