• Nenhum resultado encontrado

Capítulo III A Emergência do Ambiente como Questão Social e Política

2. Os Portugueses e as questões ambientais

2.2. Consciência ou sensibilidade ambiental em Portugal?

Podemos começar por dizer, de acordo com Mansinho e Schmidt (1994), que a manutenção de uma industrialização relativamente fraca no país num contexto que foi, durante muito tempo, vincadamente rural e agrícola, teve como consequência, em termos ambientais, a relativa conservação dos recursos e elementos naturais. Esta consequência

76

Como salienta Nunes Correia (1994), no domínio das questões ambientais, como em outros, não existem os

portugueses. Como vimos no capítulo II, a percepção das questões ambientais, as práticas face ao ambiente e as próprias

concepções de ambiente e de natureza, encerram uma grande diversidade. Os valores sociais, as condições de existência objectivas, assim como a exposição a situações concretas de degradação ambiental ou de risco, constituem a base dessa diversidade.

Capítulo III – A emergência do ambiente como questão social e política em Portugal

positiva não ficou, no entanto, a dever-se a uma política de conservação da natureza e de protecção do ambiente, mas sim à inércia ou ao que no capítulo precedente identificámos (com Mela, Belloni e Davico, 2001) como laxismo. No entanto, as autoras mencionadas, referem que o Estado Novo não deixou o ambiente totalmente incólume. Lembremos, apenas como exemplo do que acabámos de referir, a campanha do trigo e os seus efeitos nefastos sobre os solos no sul do país. Lembremos ainda a florestação massiva, primeiro com pinheiro e posteriormente com eucalipto, que foi também responsável por alterações significativas nos sistemas agrários, na forma de organização das sociedades rurais e pelo desequilíbrio económico em muitas dessas sociedades. Depois de 1974, os problemas ambientais existentes, pouco visíveis e ainda menos mediatizados até então, tenderam para um agravamento, sobretudo devido a “um aligeiramento das estruturas de controlo e de regulação social” (Mansinho e Schmidt, 1994: 453), mas igualmente e não menos relevante, devido à necessidade de um crescimento económico rápido do país.

O contexto histórico, social e económico português não pode ter deixado de condicionar a forma como os portugueses percepcionaram o ambiente, ao longo dos anos. Efectivamente, antes do 25 de Abril de 1974 e mesmo até depois desta data, as preocupações sociais com as questões ambientais eram praticamente inexistentes. Vários autores têm argumentado que a questão ambiental eclodiu tarde e foi inicialmente mais induzida por factores externos (como as pressões que resultaram da adesão à UE) do que por dinâmicas internas (e.g. Figueiredo e Martins, 1992; 1994; 1996c; Lima e Schmidt, 1996; Soromenho Marques, 1998; Schmidt, Valente e Pinheiro, 2000). Reis e Lima (1998: 335) dizem-nos que “foram e são ainda os problemas ligados à urbanização e ao ordenamento caótico do território, mais do que o desenvolvimento industrial ou agrícola, que ressuscitaram a emergência de uma preocupação ambiental no país”. Com a adesão de Portugal à UE, como veremos no ponto seguinte, o quadro legal passou a integrar novas leis e directivas relativamente às questões do ambiente e, naquilo a que Schmidt, Valente e Pinheiro (2000) chamam o ‘país real’, foram realizados investimentos em infra-estruturas que beneficiaram do apoio dos fundos comunitários. Estes investimentos, contudo “andaram mais depressa do que a transposição das directivas e, se a muitos níveis, o país se modernizou, acabaram por se gerar efeitos negativos na sua qualidade ambiental” (idem: 35). Os autores argumentam ainda que na dialéctica entre desenvolvimento e ambiente, Portugal está próximo de uma fase em que “perante a maximização do crescimento económico, feito à custa do desordenamento e da agudização dos problemas ambientais, a sociedade ressente-se e requer com urgência a sua resolução” (idem, ibidem). Deste processo de descoincidência entre a urgência de um desenvolvimento económico e a negligência dos aspectos associados ao ambiente e ao ordenamento do território, resultam pelo menos duas consequências:

1. “por um lado, ao nível das condições objectivas, a degradação ambiental (…) dos últimos anos, a par da divulgação de que foram alvo, tornou-se suficientemente visível para que a sociedade portuguesa não lhe seja insensível” (Schmidt, Valente e Pinheiro, 2000: 35);

2. por outro lado, ao nível das condições subjectivas, há uma tendência para a alteração de valores sociais, já mencionada antes, particularmente a alteração daquilo a que Ferreira de Almeida (1994) chama o modelo ruralista (associado aos valores colectivos e familiares) para um modelo individualista (centrado, como vimos, em valores de tipo hedonista, na realização pessoal e na tolerância). “Entre um e outro modelo, os portugueses balançam, com ritmos diferenciados, conforme as diferentes situações socioculturais em que se encontram” (Schmidt, Valente e Pinheiro, 2000: 35). O processo de mudança é lento e nem todos os sectores da população, como referimos antes, o iniciaram já.

A seguir a 1974 e essencialmente após a adesão de Portugal à UE, podemos dizer que a evolução das preocupações sociais com o ambiente indicia uma tendência para uma maior sensibilidade da opinião pública, ainda que tal facto só se tenha tornado visível após o início da década de noventa. Neste sentido, diversos dados e conclusões de algumas sondagens (e.g. CCE, 1986 a 1999; Ferreira de Almeida, 2000 e 2001; Gallup International Institute, 1992) indicam justamente um crescimento significativo da preocupação global com as questões do ambiente em Portugal, principalmente na última década.

Relativamente aos factores de formação desta crescente sensibilidade para as questões ambientais, observamos que ela é fomentada pelo mesmo tipo de entidades, agentes e actores que apontámos no capítulo II a nível global. Entre esses factores não podemos negligenciar o papel das associações de defesa do ambiente, cujo número aumentou de modo significativo a partir dos anos oitenta e cuja importância foi definitivamente reconhecida a nível institucional após o início da década de noventa. Também não são de negligenciar os mass media cuja expansão foi muito importante na última década; as investigações científicas; mais recentemente a Escola que, através da implementação dos novos planos curriculares, veio dar um contributo importante neste domínio; assim como a publicidade e o discurso e a prática política. Destes factores, destacamos o papel desempenhado pelos mass media. Como vimos no ponto anterior a sua influência na sociedade portuguesa não cessou de aumentar desde os primeiros anos da democracia (e.g. Mesquita, Reis e Nunes 1994), desempenhando também as funções que lhe são características e que já abordámos antes. A propósito dos problemas ambientais, Mansinho e Schmidt (1994: 465) referem que os mass media, “passaram a ter um papel progressivamente proeminente na mobilização da opinião pública, denunciando os problemas, efectuando uma informação com componentes pedagógicas”. Com os novos jornais criados na década de noventa, com as novas rádios e

Capítulo III – A emergência do ambiente como questão social e política em Portugal

com as televisões privadas, o ambiente adquiriu um lugar de destaque na agenda mediática, passando a ser considerado um factor susceptível de conquistar a atenção do público. As noticias veiculadas principalmente pela televisão, (a importância do uso da imagem a que aludimos antes), sobre esta temática “têm frequentemente um carácter alarmista e catastrófico, denunciando um quadro ambiental essencialmente negativo. Assim, podemos dizer que em Portugal a sensibilidade ambiental se tem formado muito através da percepção do ambiente mediatizado e deriva menos de factores que podemos considerar positivos, como a educação e a formação específicas nesta matéria” (Figueiredo e Martins, 1996c: 5977).

No que se refere ao papel do discurso e prática políticos em Portugal, na construção e consolidação de uma consciência ou sensibilidade ambiental, salientamos os trabalhos de Figueiredo e Martins, desenvolvidos desde 1992, sobre esta matéria. Como defendem as autoras, apesar da instabilidade do discurso e da prática política face aos problemas do ambiente, não podemos negar a existência de um contributo relevante para a formação de uma sensibilidade social para estas questões, contributo que está mais relacionado com a função de tradutor e de mediador das pressões e exigências sociais neste domínio do que com o papel de formador. Ainda a nível institucional, a adesão à UE, assim como a necessidade de, a partir dessa data, adoptar várias directivas comunitárias em matéria de ambiente, teve igualmente muita influência junto da opinião pública. A ambos os aspectos voltaremos detalhadamente no ponto seguinte.

Como dissemos, no contexto da crescente consciencialização e/ou sensibilização da opinião pública para o ambiente, são muito relevantes as acções reivindicativas que têm sido desenvolvidas em Portugal pelas associações de defesa do ambiente. A maioria destas associações constitui-se na segunda metade da década de oitenta, embora o movimento ambientalista tenha conhecido alguma expansão após o 25 de Abril de 1974 (e.g. Rodrigues, 1995). Esta expansão pode ser explicada segundo Melo e Pimenta (1993: 147) “por razões (…) associadas ao regime político do Estado Novo” e a que já aludimos antes, nomeadamente o facto de ser um regime autoritário que controlava de forma eficaz qualquer tipo de participação social. Por outro lado, é de considerar também o facto de a sociedade portuguesa ser, até àquela data, uma sociedade relativamente fechada, com escassa circulação de informação, com mecanismos de censura e ainda, com baixos níveis de instrução. Tal como Schmidt e Mansinho (1994), também Melo e Pimenta utilizam como argumento para a pouca expressão das associações de defesa do ambiente em Portugal, o facto de os problemas ambientais terem, até então, pouca expressão e encontrarem-se muito localizados. Segundo Melo e Pimenta (1993) e Rodrigues (1995), os anos oitenta marcam

77 Ver também outros trabalhos desenvolvidos pelas autoras, em Figueiredo e Martins, 1994; 1996a; 1996b e 1999 e

uma viragem (sobretudo os anos de 1986 a 1988) no movimento ambientalista nacional. Com a crescente estabilidade política criaram-se as condições para que a opinião pública acolhesse com maior interesse preocupações de carácter ambiental e de qualidade de vida. Em 1987, com a publicação da Lei de Bases do Ambiente e da Lei das Associações de Defesa do Ambiente “o ambiente tornou-se institucional e socialmente respeitável” (Melo e Pimenta, 1993: 151). O ano de 1987 foi também o Ano Europeu do Ambiente, permitindo a criação de várias associações locais e o desenvolvimento de acções de educação ambiental. Como referem ainda os autores mencionados, neste período, “a maior parte das associações tornou-se mais pragmática, abandonando a filosofia de ruptura radical com o sistema (…). As associações passaram a tentar alterar o sistema por dentro” (idem: 152). Com a criação da Confederação Portuguesa das Associações do Ambiente, estas ganharam maior visibilidade pública e também maior peso institucional. Como refere Rodrigues (1995), algumas associações, como a Liga para a Protecção da Natureza (LPN)78, a Quercus e o Grupo de Estudos sobre o Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA) afirmaram-se junto do público e do poder político e no panorama associativo nacional, detendo aí uma posição que a autora classifica como hegemónica79.

Como referem Figueiredo e Martins (1994), a existência de um contexto educativo rico quer em meios formativos, quer em meios informativos, constitui um elemento de extrema importância na transformação dos valores existentes, como antes mencionámos. Uma análise breve ao conteúdo dos programas saídos da última Reforma do Sistema Educativo, para os anos de escolaridade obrigatória, demonstra que o ambiente se constitui como um novo objectivo geral. Esta realidade permite, segundo a Direcção Geral do Ensino Básico e Secundário, a possibilidade de uma nova aprendizagem acerca das interacções entre o indivíduo e o ambiente e em consequência, permite fomentar uma responsabilização individual e colectiva na resolução dos problemas ambientais existentes, assim como na prevenção de outros. Figueiredo e Martins (1994) referem que este objectivo geral está presente em todos os graus do Ensino Básico (desde o 1º Ciclo do Ensino Básico (CEB), mas a sua interligação com as diferentes disciplinas leccionadas assume contornos diversos. Passa-se de uma visão globalizante (1º CEB) para uma crescente especificação dos itens programáticos relacionados com o ambiente (nos 2º e 3º CEB). A esta especificidade crescente, encontra-se associada um alargamento do leque de disciplinas envolvidas no tratamento da temática ambiental. Esta maior exposição dos indivíduos a este assunto, num

78 Esta associação foi fundada em 1948, sendo a mais antiga do país. Foi criada num período em que não só as condições

de associação eram difíceis, como os problemas ambientais não tinham grande expressão em Portugal. Foi um grupo impulsionado “por cientistas ligados aos movimentos conservacionistas internacionais da época e cuja maior preocupação

era a destruição do mundo rural” (Mansinho e Schmidt, 1994: 462). Esta associação manteve durante anos características

académicas e científicas, sem que tivesse visibilidade política ou pública.

79 Um estudo muito interessante e detalhado acerca das associações de defesa do ambiente em Portugal, do modo como

têm influenciado o poder político e como implementam processos de comunicação para a acção colectiva ambiental, pode ser visto em Gil Nave (2000).

Capítulo III – A emergência do ambiente como questão social e política em Portugal

contexto de aprendizagem formal, terá teoricamente uma tradução no desenvolvimento de representações e práticas tendentes a integrar uma nova forma de qualificação do ambiente na vida quotidiana.

Apesar do desfasamento temporal mencionado no que se refere à emergência de uma sensibilidade para as questões e problemas ambientais em Portugal, em termos dos factores influenciadores e formadores denotamos uma grande proximidade com a maior parte das sociedades ocidentais e desenvolvidas. O mesmo podemos referir no que se refere à partilha de valores sociais nesta área. Assim, no que concerne a algumas das características mais marcantes da opinião pública portuguesa no que se refere às questões ambientais, podemos começar por salientar a aproximação crescente da opinião pública portuguesa com a opinião pública europeia e internacional. De um modo geral, os portugueses revelam-se preocupados com o mesmo tipo de questões ambientais que os europeus e os habitantes dos países ocidentais, revelando também as mesmas atitudes globais. Tem vindo a notar-se, como referimos antes, sobretudo a partir do início dos anos noventa, um crescente envolvimento e participação dos cidadãos portugueses nestas questões, particularmente quando são os interesses locais ou individuais que estão em jogo80.

Na análise do tipo de sensibilidade ambiental dos portugueses as sondagens da CCE (1986 a 1999) e os dois Inquéritos Nacionais às representações e práticas dos portugueses relativamente às questões do ambiente, realizados pelo Observa, revelam-se como dissemos antes, um material essencial81, que utilizaremos. Começando por uma análise às concepções de ambiente tidas pelos portugueses, em 1997, verificamos que este termo é frequentemente associado à natureza, ou seja, ao meio exclusivamente biofísico (52% dos inquiridos pelo Observa referem esta categoria). Apenas 16% dos indivíduos identificam o ambiente como um conceito cujo conteúdo é socio-biofísico. De salientar ainda, que 11% dos inquiridos associam o ambiente ao ambiente social e humano, ou seja, às relações de vizinhança ou familiares, ao convívio social e às formas de sociabilidade. Tendo subjacentes estas concepções de ambiente, é importante referir que este ocupava, também em 1997, um lugar

80 A título de exemplo mencionemos os casos de Barqueiros (contra a exploração de caulino), os levantamentos populares

contra a lixeira nuclear de Aldeavavila e, muito mais recentemente, os casos de Estarreja, Sines, Vagos e Souselas, contra a instalação, nos dois primeiros casos, de unidades de incineração de resíduos industriais; contra a instalação de um aterro destinado ao armazenamento do mesmo tipo de resíduos no terceiro caso e contra a co-incineração deste tipo de resíduos por uma cimenteira, no último caso. Estes casos demonstram, de um modo mais ou menos evidente, a existência em Portugal, de uma opinião pública de carácter Nimby. Como vimos no capítulo anterior, esta expressão ilustra bem um tipo de sensibilidade face às questões ambientais que é muito direccionada para os problemas que afectam directa e imediatamente a vida quotidiana das populações. Nogueira, Figueiredo, Bastos e Rosa Pires (1994), Figueiredo e Fidélis (2000) e Figueiredo, Fidélis e Rosa Pires (2001) demonstram justamente esta característica da opinião pública portuguesa face às questões do ambiente. Estes autores analisaram os protestos populares relativos ao ambiente (i.e. os grassroots

environmental movements) em Portugal e observaram que as principais causas desses protestos se centravam

essencialmente na recolha e tratamento de lixos e, igualmente, na construção de grandes infra-estruturas. Por outro lado, os mesmos autores concluem que a maior parte dos argumentos utilizados pelos protagonistas dos protestos, se encontram relacionados com os impactes negativos na saúde humana e na economia local. Estes aspectos reforçam a natureza Nimby destes protestos, mas também da globalidade da opinião pública portuguesa face ao ambiente, como referem Figueiredo e Martins (1994; 1996c).

81 Fundamentais, no sentido em que são as únicas bases de dados disponíveis para caracterizar as representações e as

importante entre outros problemas nacionais. Mais precisamente ele surge em quinto lugar de entre um conjunto de problemas sociais apresentados. Surge à frente de problemas que associamos ao materialismo, como o aumento do custo de vida, a segurança/violência, a habitação. No entanto, surge atrás de problemas que têm hoje bastante mediatização como a droga, o desemprego, a saúde (principalmente a SIDA) e a exclusão social. Estes dados demonstram com razoável nitidez que o ambiente se constitui como uma preocupação social em Portugal. Na mesma linha, tomando como base os dados produzidos no âmbito das sondagens efectuadas pela CCE (1986, 1988a, 1992, 1995 e 1999), observa-se que entre estas duas datas, o ambiente é sempre entendido, e de forma muito próxima à dos restantes países da UE, como um problema imediato cuja resolução é urgente. Saliente-se que as percentagens relativas a Portugal são, para o período considerado, sempre ligeiramente inferiores à dos restantes países. Em qualquer dos anos em que se realizou a sondagem mencionada, os mais jovens, os mais escolarizados e os que possuem residência urbana são aqueles que tendem a considerar de forma mais saliente o ambiente como um problema imediato e urgente. A saliência dos problemas ambientais em termos de preocupações sociais está bem patente também na prioridade que é dada à protecção do ambiente sobre o desenvolvimento económico. Assim, os inquiridos nacionais referem, à semelhança dos europeus, que a prioridade deve ser dada à conciliação de ambos os aspectos. Este aspecto é mais evidente após 1992 e a realização da bastante mediatizada Cimeira da Terra e da entrada na agenda mediática e política do conceito de desenvolvimento sustentável. Em 1986, o primeiro ano em que os cidadãos nacionais fizeram parte da sondagem, a maior parte deles considerava que a prioridade deveria ser dada à protecção do ambiente tout court. Paralelamente, existem sempre maiores percentagens de portugueses que apontam que a prioridade deve ser dada ao desenvolvimento económico, o que é também mais evidente em 1986 e se atenua depois.

Se atendermos à materialização destes níveis de preocupação ambiental – aparentemente tão próximos (e aparentemente informados pelo mesmo tipo de valores sociais) dos dos cidadãos dos restantes países da UE – em problemas ambientais concretos, somos forçados a concluir pela maior fragilidade da opinião pública portuguesa. Esta fragilidade é visível através de dois factores principais:

1. a elevada percentagem de inquiridos portugueses que declara não saber responder à questão (particularmente em 1986 e 1988), o que evidencia uma incapacidade de materialização das preocupações gerais com o ambiente, em problemas concretos; 2. a também elevada percentagem de inquiridos nacionais que (também especialmente

em 1988 e 1986), aponta a diminuição da qualidade de vida como o aspecto mais gravoso dos problemas ambientais. Na medida em que qualidade de vida é um

Capítulo III – A emergência do ambiente como questão social e política em Portugal

conceito bastante vago que pode esconder dificuldades de concretização, consideramos este aspecto uma faceta da fragilidade mencionada.

Nunes Correia (1994: 130-131) a propósito dos dados da mesma sondagem, refere que “é curioso notar que em 1986 Portugal se encontrava sensivelmente em quarto lugar, no conjunto da UE, no que diz respeito às razões de queixa sobre problemas de ambiente mais directamente sentidos. Nessa época, os portugueses revelavam um desagrado ligeiramente superior à média comunitária em todas as questões, excepto nos problemas de lixo, em que esse desagrado era bastante maior e à degradação estética da paisagem que, algo surpreendentemente, parecia perturbar bastante menos os portugueses”. Em 1992 e nos anos seguintes, os inquiridos portugueses estavam entre os inquiridos europeus com menos razões de queixa sobre o seu ambiente, pelo que “parece haver assim uma tendência para a reconciliação com o ambiente envolvente, explicada talvez pelos progressos registados no que diz respeito a problemas básicos, como os lixos urbanos ou os esgotos” (Nunes Correia, 1994: 131). Esta diminuição das razões de queixa sobre os problemas directamente sentidos