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É possível diferenciar bem-estar, prazer, satisfação e felicidade?

No documento Psicologia Facil - Ana Merces Bahia Bock (páginas 161-163)

MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

4. Outro filme que discute os limites éticos dos meios de comunicação é O quarto poder (Mad

16.2 É possível diferenciar bem-estar, prazer, satisfação e felicidade?

Sigmund Freud, o fundador da psicanálise, em sua obra O mal-estar na civilização1 se propõe a pensar a finalidade da vida que as pessoas expressam em suas condutas, o que esperam alcançar em suas existências. Considera, inicialmente, que não há resposta satisfatória, que o sentido da vida é dado pelas artes, pela religião ou pela ciência –

produções humanas superiores –, e responde que em suas condutas as pessoas revelam aspirar à felicidade: evitar a dor e experimentar o prazer.

Essa dualidade de objetivos – evitar a dor, experimentar o prazer – leva a pessoa, dependendo de sua escolha, para caminhos diferentes em seu percurso existencial. A

felicidade, em sentido estrito, refere-se à busca de prazer, e esse objetivo vital é estabelecido pelo princípio do prazer, um princípio regulador do aparelho psíquico que, contudo, ao se defrontar com o mundo objetivo (princípio da realidade), sofre restrições e não é possível realizá-lo (completamente). Então, a felicidade se caracteriza por ser episódica e por contraste – necessidades acumuladas que alcançam um nível de tensão e são abruptamente satisfeitas; o prolongamento da sensação associado a essa satisfação produz bem-estar.

Freud lembra que a nossa própria constituição não nos permite gozar (ter prazer)

ininterruptamente, porque o gozo existe pelo contraste entre tensão (necessidade acumulada) e relaxamento; portanto, diz ele, a possibilidade de ser feliz está restringida pela nossa própria constituição biológica. E a isso se acrescem as restrições do mundo social, da cultura, com suas leis e normas. Nas palavras do autor: “Aquilo a que chamamos ‘felicidade’, no sentido mais estrito, vem da satisfação repentina de necessidades altamente represadas e, por sua natureza, é possível apenas como fenômeno episódico”.2

Em contrapartida, a possibilidade de sofrimento, de experimentar a infelicidade, é permanente, e por isso, com frequência, as pessoas escolhem o outro caminho – evitar o sofrimento. São três as fontes de sofrimento indicadas por Freud: a degeneração do próprio corpo, algo inexorável que produz angústia; as forças destrutivas de fenômenos da natureza sobre os quais o homem não tem controle; as relações humanas (toda relação humana é relação amorosa) – e esse último fator é a fonte dos maiores sofrimentos.

Diante dessas adversidades, as pessoas rebaixam suas pretensões de felicidade e a finalidade de evitar o sofrimento substitui a busca de prazer. Os métodos para evitar o

sofrimento são vários. Pode depender da fonte de desprazer: o isolamento voluntário quando o sofrimento é provocado pelos outros, a busca de domínio da natureza pela ciência, as drogas lícitas e ilícitas para minimizar os estímulos ou sensações desagradáveis do corpo. Freud assinala também que o controle dos impulsos pelas instâncias psíquicas superiores (o

pensamento) produz menos sofrimento porque, quanto menor a intensidade do impulso, menor é o desprazer ou sofrimento com sua não satisfação (postergação ou frustração), e exemplifica com o depoimento dos praticantes de ioga. Outra estratégia para evitar o sofrimento é a

sublimação, porque reorienta os impulsos no sentido de substituir o “objeto” que produz o prazer. Nesse sentido, Freud dá como exemplos o trabalho intelectual e o trabalho artístico, embora ressalte que nenhum deles oferece proteção completa contra o sofrimento,

psíquicos internos, a imaginação e a ilusão são fontes de gozo. A fruição da beleza também é um “poderoso lenitivo”, segundo as palavras do fundador da psicanálise.

W. Reich, discípulo de Freud, em sua obra A função do orgasmo afirma que o prazer é um estado instantâneo representado pelo orgasmo, quando após um período de tensão (inclusive muscular) que atinge um ponto máximo (clímax), há o relaxamento. Ele afirma que a condição de existência do prazer é a tensão que o antecede seguida do relaxamento (bem-estar)

posterior que produz, e não é possível viver ininterruptamente esse ciclo (tensão-clímax- relaxamento) porque nossa constituição biológica não suporta.

Ou seja, a experiência do prazer ocorre por contraste. Reich afirma que as três grandes fontes de prazer que deveriam regular a vida são: o sexo, o conhecimento e o trabalho. Em sua extensa obra, analisa os fatores sociais, políticos e culturais que furtam a todos e,

particularmente, à juventude (lembrando que ele escreveu sua obra na primeira metade do século XX) a experiência do prazer em função da repressão sexual.

Giddens, analisando a obra de Reich, esclarece que para uma expressão adequada da sexualidade – fonte de felicidade – é necessária, além de reformas políticas, a reforma do caráter de massa, considerando que “o caráter é uma formação defensiva, uma ‘armadura’ protetora desenvolvida para resistir às vicissitudes da vida […] para se proteger contra os perigos externos e internos, embora a um alto custo psíquico”.3 Para Reich, a reforma política sem liberação sexual é impossível, porque liberdade e saúde sexual são a mesma coisa;

portanto, ele deu particular importância aos direitos sexuais das crianças e dos adolescentes, considerando que práticas educativas menos repressivas poderiam transformá-los em agentes de mudança social.

Em uma perspectiva bastante diferente, surge um movimento na década de 1990, nos Estados Unidos, nomeado de Psicologia Positiva, que faz uma crítica à psicologia produzida (inclusive aos autores anteriormente citados) pela ênfase na compreensão de problemas e nas práticas curativas, e postula que a psicologia deve se preocupar com o desenvolvimento das potencialidades humanas. A proposta da Psicologia Positiva é partir do estudo da saúde mental e do bem-estar para identificar por que e sob quais condições é possível promover o desenvolvimento de emoções positivas nas pessoas, pois a finalidade da psicologia deve ser criar uma “ciência das qualidades humanas”. Nesse sentido, o conhecimento e as práticas produzidas devem “compreender tanto os aspectos que levam ao sofrimento e ao desajuste emocional, mas também enfocar os aspectos que podem produzir a felicidade[…] aumentem a felicidade e o bem-estar da pessoa”.4 As emoções positivas são indicadores de um estado de bem-estar, produzindo, quase sempre, efeitos positivos. O conceito de bem-estar subjetivo “se refere ao que as pessoas pensam e sentem sobre suas vidas e as conclusões cognitivas e afetivas alcançadas a partir da avaliação da sua existência”.5

Uma área da psicologia que utiliza essa abordagem é a psicologia do esporte, ao enfatizar a vivência do prazer e da diversão na prática esportiva. Esses aspectos são considerados

importantes pelos psicólogos que a utilizam para incrementar, por exemplo, a aderência de esportistas de alto rendimento; ou seja, a possibilidade de o atleta encontrar sensações de prazer, de diversão, satisfação, autorrealização aumenta a probabilidade de utilizar o máximo de seu potencial e alcançar o nível mais elevado de seu rendimento.

No documento Psicologia Facil - Ana Merces Bahia Bock (páginas 161-163)