• Nenhum resultado encontrado

A insatisfação permanente: os paradoxos

No documento Psicologia Facil - Ana Merces Bahia Bock (páginas 164-166)

MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

4. Outro filme que discute os limites éticos dos meios de comunicação é O quarto poder (Mad

16.4 A insatisfação permanente: os paradoxos

A felicidade – o que quer que isso signifique para cada um – passou a ser um valor cultural, um valor de consumo.

Ao tomar como referência uma pesquisa na capital francesa, Lipovetsky constatou que nove entre 10 franceses se diziam felizes (!). E o autor pergunta: o que significa isso se o estresse, a

depressão dominam os consultórios médicos e psicológicos; se os pais se esforçam de modo irracional – além de suas possibilidades – para satisfazer as necessidades e desejos (de

consumo) dos filhos; se o número de desempregados aumenta em todas as partes do mundo; se não conseguimos saber tudo o que se produz de informação e conhecimento; se a pobreza persiste e o dinheiro não é suficiente? E, no caso dos franceses, é importante também contrapor os dados da pesquisa com as imagens dos jovens franceses em manifestações reivindicando inclusão no mercado de trabalho, protestando contra a violência da polícia ou criticando o sistema de ensino ou as reações xenófobas aos imigrantes argelinos e tunisianos (ex-colônias francesas na África).

É possível reconhecer algum aspecto positivo na sociedade de consumo?, indaga Lipovetsky.

O consumo não garante a felicidade… mas “é a garantia de satisfações reais”.12 O autor assinala que felicidade e satisfação são diferentes. E esclarece que há, ao mesmo tempo, uma garantia de satisfação – o objeto de satisfação está à disposição no mercado – mas há,

também, uma insatisfação permanente pela impossibilidade do consumo de todos os bens oferecidos… quer seja pela própria incapacidade de consumir bulinicamente, quer seja pelo ideal de justiça social que exclui da cidadania os não consumidores. E aí, outro paradoxo: precisamos de menos consumo ou de um consumo menos voraz, de comportamentos menos magnetizados pelas satisfações por meio do consumo e, ao mesmo tempo, precisamos de mais consumo: para os pobres, para garantir uma qualidade de vida.

Freud afirmava que a felicidade é episódica e, agora, Lipovetsky afirma que a satisfação também é episódica. Mas acrescenta, em uma reflexão alentadora:

É menos a aquisição das coisas que a relação consigo e com os outros que condiciona nossas maiores felicidades e nossos maiores infortúnios. São os outros, muito mais que as coisas, que despertam as paixões mais imoderadas, as alegrias, mas também as dores, mais vivas… o desejo das coisas está longe de ter colonizado inteiramente os ideais e os objetivos da existência.13

Considerações finais

As considerações ao longo do texto vão demonstrando que esse é um tema que suscita muitas ilações. E o leitor deste capítulo também tem suas posições, seus pontos de vista a respeito dos vários aspectos do tema tratado aqui, a partir de suas vivências pessoais ou daquilo que pretende para sua trajetória existencial. Portanto, nestas palavras finais, em vez de concluir, pôr um ponto final no capítulo, vamos deixar algumas das muitas questões que permanecem.

Atualmente, há, particularmente em setores da juventude, uma crença de que o caminho para obter a felicidade é um percurso “para dentro”, em busca da própria verdade interior (autoconhecimento). E imediatamente surge uma mercantilização de ofertas de caminhos: as drogas (ayauhasca, por exemplo), pedras da sorte, amuletos, mantras, mestres e guias, banhos de purificação. Há aqueles que acreditam que é possível, no “mercado das almas”, comprar essa sabedoria, e outros que buscam a origem disso nos ritos, na tradição em conexão com as novas descobertas da ciência (a física quântica, por exemplo) e novos modos de acessar e produzir conhecimento. Nessa segunda alternativa, o caminho da busca interior leva, segundo

relatos de jovens, a uma sintonia com os princípios da natureza, com a beleza e à boa convivência com os próximos. Será esse um caminho?

Quais as novas funções e potencialidades humanas que ainda desconhecemos e que poderão nos garantir bem-estar e satisfação?

É possível não confundir bem-estar material e felicidade?

Havia uma promessa no século XX: o desenvolvimento da ciência propiciaria maior bem- estar a toda a humanidade. No final do século houve uma desilusão: a ciência não cumpriu sua promessa – por exemplo, o controle de fenômenos da natureza – e, naqueles aspectos em que ocorreu grande desenvolvimento, seus benefícios foram distribuídos desigualmente para a população do planeta ou para a população de um mesmo país, como no caso das ciências da saúde (o controle da aids, a cura do câncer, as vacinas). É possível depositar na ciência a esperança de uma vida com menos temores? Ou na religião, com suas promessas de “outros reinos”, de virgens à espera de mártires?

Freud e muitos autores, como Zygmunt Bauman, Eric Hobsbawm, William Golding,14 afirmam que os homens (e mulheres) construíram um mundo – instituições, regulamentos – muito difícil para viver, para ser feliz. Ou seja, construímos um mundo social que depende de restrições às singularidades e às satisfações de cada um de seus membros para continuar a existir. E concluem: a felicidade continua sendo algo que todos perseguem e impossível de realizar. Você concorda?

Nós, os autores, concordamos que entre mergulhar no labirinto de um pessimismo

insuperável ou acreditar nos novos tempos tal como eles se apresentam, há outros percursos possíveis em direção a um futuro humano e desejável para todos. Mas, para isso, precisamos realinhar nossas prioridades de vida – onde investir nossa razão, nossos pensamentos e sentimentos – quer como indivíduos, quer como uma comunidade de destino, “no sentido de recompor um mundo que, em muitos aspectos, se descaracterizou para nós como humano e desejável”.15

Atividades complementares

1. Faça um levantamento entre seus amigos, familiares ou colegas de trabalho sobre o

No documento Psicologia Facil - Ana Merces Bahia Bock (páginas 164-166)