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2 A PESQUISA SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS:

2.2 A ANÁLISE DE POLÍTICAS: CONTRIBUIÇÃO DE

2.2.1 A análise de política sob a ótica neoinstitucionalista

Entre aqueles que se denominam institucionalistas, existem duas correntes teóricas principais. O primeiro subconjunto é o dos chamados neoinstitucionalistas e o segundo subconjunto é o dos que se consideram mais tradicionais e que serão apenas chamados institucionalistas.

Para Carvalho e Vieira (2003), as primeiras contribuições da perspectiva institucional aos estudos realizados no campo das organizações ocorreram a partir da década de 1950. Já Scott (1995 apud FONSECA, 2003) afirma que a origem da abordagem institucional remonta

a conceitos formulados no final do século XIX, sob o impulso do debate empreendido na Alemanha em relação ao método científico.

Neste panorama, torna-se primordial conhecer o sentido do termo ―instituição‖. Numa visão mais clássica, o termo ―instituição‖ representa órgãos do Estado ou, mais precisamente, o governo, isto é, representa estruturas materiais, como, por exemplo, gabinetes ministeriais ou presidenciais, parlamentos, burocracias, cortes, organizações militares, arranjos federais e, em algumas circunstâncias, sistemas partidários. (NASCIMENTO, 2009)

Steinmo e outros autores (1992 apud NASCIMENTO, 2009, p. 101) associam o termo ―instituição‖ às regras, procedimentos, protocolos, normas e convenções oficiais e oficiosas inerentes à estrutura organizacional da comunidade política ou da economia política. Tal posicionamento pode ser visto como complemento da definição apresentada acima.

Ainda neste campo teórico, Philip Selznick é considerado o precursor desta abordagem (MENDONÇA; AMANTINO-DE-ANDRADE, 2003), ao introduzir as bases do modelo institucional e defender um papel mais autônomo para as instituições políticas, as quais, ao longo do tempo, estão sujeitas a pressões do ambiente social.

Por seu turno, o neoinstitucionalismo é uma perspectiva teórica voltada para o estudo sociológico das instituições, entendidas como espaços em que diferentes atores sociais operam por meio de suas práticas. A concepção tradicional, baseada nos modelos racionais, torna-se desafiada a partir do conceito de organização como expressão de valores sociais, destacando sua interação com o ambiente.

Nesta perspectiva, o desenho organizacional das instituições pode influenciar de modo decisivo o encaminhamento de um processo político e a implementação das políticas públicas. Segundo Aguirre e Moraes (1997, p. 127), ―[...] esta abordagem pode ser caracterizada por se preocupar em desenvolver uma análise que engloba conjuntamente a teoria econômica e a existência de instituições‖.

Pode-se destacar que as ideias do neoinstitucionalismo emergem em resposta à alegada crise das abordagens do velho institucionalismo ancoradas no funcionalismo1, no

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Em síntese, o Funcionalismo é uma corrente sociológica que procura explicar os aspectos da sociedade em termos de funções realizadas por instituições e suas consequências para sociedade. Tal pensamento está associado às obras de Émile Durkheim, Talcot Parsons e outros. Nesta abordagem, presume-se que cada instituição exerce determinada função na sociedade e o seu mau funcionamento implica em desequilíbrios na própria sociedade. O conceito de sociedade no pensamento de Durkheim está intrinsecamente relacionado ao estudo do fato social que, por sua vez é exterior, pois existe antes do próprio indivíduo; e ao mesmo tempo, coercivo, na medida em que a sociedade se impõe, sem o consentimento prévio do indivíduo.

behaviorismo2 e no marxismo3 que foram influentes nos anos de 1960 e 1970. Desta forma, a referida abordagem é apontada na literatura especializada como alternativa de se contrapor a enfoques descritivos e deterministas, uma vez que o cerne de sua análise é a elucidação do papel desempenhado pelas instituições na determinação dos resultados sociais e políticos.

No entanto, sob a denominação de neoinstitucionalismo, encontram-se diferentes correntes teóricas; autores que se autodenominam desta forma e outros têm sido assim identificados. Portanto, apesar de aspectos comuns, torna-se recorrente afirmar que esta perspectiva não se constitui uma corrente de pensamento unificada. Pelo contrário, inclui vários ramos com relativa autonomia metodológica e epistemológica entre si.

Para Bruno Théret (2003), o neoinstitucionalismo distingue-se de outros paradigmas intelectuais ao apontar para a necessidade de se levar em conta as mediações entre estruturas sociais e comportamentos individuais. Este mesmo autor destaca que o termo neoinstitucionalismo tem sentidos diversos nos estudos sobre instituições, sendo difícil defini- lo pontualmente, já que os estudiosos concedem pouca atenção à sua definição. Os diversos neoinstitucionalismos – em Economia, Teoria das Organizações, Ciência Política, História e Sociologia – aproximam-se pela importância que dão aos elementos institucionais e aos processos sociais.

Sem entrar nas diferenças entre as correntes neoinstitucionalistas4, pode-se dizer que elas surgem com a preocupação de compreender a origem das instituições, como estas conformam as decisões dos indivíduos, em particular da burocracia estatal, e, por conseguinte, como as instituições influenciam as relações sociais e a política. As ações do Estado dependem também da forma como este foi constituído e dos interesses de seus funcionários, que buscam manter e reproduzir a capacidade e o poder da instituição da qual fazem parte. É,

2 Behaviorismo, também conhecido como Comportamentalismo é, grosso modo, uma área da Psicologia, que

tem o comportamento como objeto de estudo e surgiu como oposição ao Funcionalismo. O texto considerado o ponto inicial do Behaviorismo foi publicado por Watson (1913) em uma revista de Psicologia, sob o título A

psicologia como um comportamentalista a vê. Nele, o autor abre a discussão em que a Psicologia, tal como

concebida pelo comportamentalista, é um ramo estritamente objetivo e experimental da ciência natural. A sua proposta teórica consiste em prever e controlar o comportamento.

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Pode-se entender de forma breve, o Marxismo como um conjunto de ideias filosóficas, econômicas, políticas e sociais elaboradas primariamente por Karl Marx e Friedrich Engels e desenvolvidas mais tarde por outros pensadores. Baseia-se na concepção materialista e dialética da História e interpreta a vida social conforme a dinâmica da base produtiva das sociedades e das lutas de classes daí originadas.

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Marques (1997) identifica duas correntes: uma denominada ―neoinstitucionalismo da escolha racional‖, que se origina da teoria da escolha racional e da economia neoclássica; a segunda corrente identificada pelo autor é o ―neoinstitucionalismo histórico‖, que parte de estudos históricos de inspiração marxista e weberiana. Hall e Taylor (2003) identificam três correntes que se utilizam da perspectiva neoinstitucionalista, sendo estas: o ―neoinstitucionalismo da escolha racional‖, ―neoinstitucionalismo histórico‖ e o ―neoinstitucionalismo sociológico‖.

portanto, a constituição do Estado que ―[...] passa a explicar a natureza das políticas governamentais‖. (ROCHA, C., 2005, p. 13)

A finalidade do neoinstitucionalismo não é descrever as instituições e como elas funcionam, mas antes, explicar a produção dos resultados políticos. Neste sentido, e em afinidade ao neoinstitucionalismo histórico de Hall e Taylor (2003), é a perspectiva considerada neste trabalho, pois busca compreender as situações de distribuição desigual de poder e de recursos, ou seja, entender os modos como a organização institucional da comunidade política e das estruturas econômicas entram em conflito, de tal maneira que determinados interesses são privilegiados em detrimento de outros.

Ao desenvolver uma concepção mais ampla das instituições que têm importância e do modo como essa importância se manifesta, esta abordagem é fundamentalmente diferente das formas precedentes de análise institucional, as quais estavam primariamente preocupadas em compreender meramente, o funcionamento das instituições.

Da mesma forma que os institucionalistas, os neoinstitucionalistas rejeitam o mero determinismo presente em teorias como o marxismo e o funcionalismo. Embora reconheçam a existência das classes, a burguesia não necessariamente detém maior poder de influência na organização do Estado e em suas políticas. Isso dependerá das mediações existentes entre os partidos políticos, entre os sindicatos, das relações com a burocracia estatal, entre outros fatores analisados em cada caso.

O movimento neoinstitucionalista emergiu, em particular, no seio da academia norte- americana, nada obstante esta abordagem tenha tomado espaço entre outras academias, como por exemplo, as da Europa. Ainda que não se possa diferenciar nitidamente a escola francesa da norte-americana,

[...] não se pode deixar de observar que o que chamamos de novo paradigma institucional está longe de representar um todo unificado [...]. Enquanto a ciência política europeia tem, em suas aplicações, enfatizado os novos institucionalismos históricos, nos Estados Unidos, os estudiosos têm se dividido, principalmente, entre a tradição histórica e a de escolha racional, esta última com prioridade especial. (NASCIMENTO, 2009, p. 99)

No Brasil, a teoria neoinstitucional passa a ter visibilidade na década de 1980, ao ser utilizada em pesquisas na área de estudos organizacionais e na compreensão dos processos de institucionalização dos formatos organizacionais. (CARVALHO; VIEIRA, 2003)

O neoinstitucionalismo argumenta que a análise política é mais bem conduzida quando o foco analítico são as instituições ou, mais especificamente, quando parte das instituições.

(NASCIMENTO, 2009) Desta forma, sua ideia central, de acordo com Lima (2005, p. 26), reside no reconhecimento de um papel mais autônomo para as instituições políticas defendendo que

[...] a democracia não depende somente das condições sociais e econômicas, mas também do desenho dessas instituições. A reivindicação de uma autonomia relativa é necessária para estabelecer que as instituições políticas são mais do que simples reflexos das forças sociais.

Além de outros aspectos a destacar, a abordagem neoinstitucionalista concentra a sua atenção sobre as regras do jogo político, as quais tendem a ser associadas à estrutura material dos cenários e aos interesses. Assim, a questão mais importante não é o que as instituições são, mas o que elas representam.

Neste particular, em relação à natureza das instituições, Aguirre e Moraes (1997, p. 128) destacam que ―[...] se por um lado as instituições limitam e conformam os comportamentos individuais; por outro, elas são frutos dos comportamentos individuais cristalizados em ações coletivas‖.

Convém ressaltar que é intrínseca a relação entre os estudos sobre federalismo e os princípios do neoinstitucionalismo, já que estes estudos ―[...] só têm sentido para aqueles que consideram que as instituições têm efeitos discerníveis e relevantes na vida política, influindo sobre as decisões dos atores e sobre os resultados de suas ações‖. (ALMEIDA, M., 2001, p. 13) Logo, as instituições mudam e, mesmo através de mudanças graduais, podem pressionar o sistema, por meio de explosões, conflitos e crises, levando a mudanças de atitudes e ações. (CONCEIÇÃO, 2002, p. 123)

Estudos com base nesta perspectiva (ARRETCHE, 2004; COSTA, 2010; SOUZA, C., 2003) enfatizam a importância das instituições para compreender os processos sociais, ou seja, consideram que estas, para além de constranger as interações sociais, ―[...] também alteram a conformação das preferências dos atores‖. (MARQUES, 1997, p. 78)

Assim, a compreensão dos processos de decisão e implementação de políticas sociais, dentre elas a educação, passa pela análise da estrutura organizacional e política do Estado – sua origem, formas de permanência e mudança ao longo do tempo –, da formação de opinião da burocracia estatal e de sua inserção com a sociedade.

A importância de valorizar o papel das instituições, como fator que pode influenciar a trajetória e os resultados de uma política pública, está no fato de que elas afetam a atuação dos participantes do processo decisório político, seja porque possibilitam algumas ações, seja

porque limitam outras ou, ainda, porque representam as punições e constrangimentos à mesma atuação. Destarte, mesmo podendo persistir por longos períodos, as instituições estão igualmente sujeitas a súbitas rupturas e consequentes mudanças nas maneiras de pensar e nas ações das pessoas.

No decorrer dos anos algumas alterações foram feitas em determinadas correntes neoinstitucionalistas, a partir de algumas críticas, em especial, à concepção de autonomia do Estado e do distanciamento deste em relação aos interesses e demandas sociais. Desde então, a abordagem tem ampliado seu enfoque, de forma a equilibrar a análise entre o Estado e a sociedade. Desta forma, o Estado passa a ser considerado como ―parte da sociedade e pode, em certos casos, ser influenciado por ela em maior grau do que a influencia‖. Portanto, deixa de ser visto, a priori, como ―dotado de poder para gerar em seu interior suas políticas, conforme seus interesses ou concepções‖. (ROCHA, C., 2005, p. 16)

Assim, na perspectiva de reequilibrar o poder de ação entre o estado e a sociedade, alguns princípios são levados em consideração, dentre estes, a efetividade da atuação do Estado não depende apenas do grau de isolamento de sua burocracia, mas, principalmente, das diferentes formas pelas quais este se articula com a sociedade. O Estado deixa de ser objeto principal da análise e passa a ser concebido em uma relação recíproca com a sociedade. Logo, é por ela influenciado e também a influencia.

A necessidade de análise dos vários níveis e agências envolvidos direta ou indiretamente nas políticas governamentais e não apenas na análise da atuação do governo central é outro aspecto considerado no quadro de mudanças da perspectiva neoinstitucional. Os governos locais, para esta perspectiva, estão mais expostos e mais suscetíveis às pressões e interesses sociais. (MARQUES, 1997)

Outro aspecto destacado por essa corrente diz respeito a levar em consideração o Estado e sua constituição histórica. A atuação e importância dos sujeitos e do próprio Estado estão condicionadas a circunstâncias históricas concretas e, portanto, ―[...] não são criações deliberadas de curto prazo, mas sim dependem da história de cada nação‖. (ROCHA, C., 2005, p. 15)

Destarte, acredita-se que as análises produzidas por autores a partir do referencial neoinstitucionalista podem contribuir com este estudo, por aprofundarem significativamente a discussão a respeito do federalismo brasileiro, sua constituição histórica e as dinâmicas atuais das relações intergovernamentais no contexto da política da educação básica, instituída pelo Plano de Desenvolvimento da Educação.