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3 ESTADO, POLÍTICAS PÚBLICAS E REGULAÇÃO

3.2 POLÍTICAS PÚBLICAS: DISCUTINDO CONCEITOS

3.2.1 Educação como Política Pública

Para Dye (1984), políticas públicas são tudo aquilo que um governo faz ou deixa de fazer. Dessa forma, políticas públicas educacionais são tudo aquilo que um governo faz ou deixa de fazer em educação.

A educação se constitui como política pública social, de responsabilidade do Estado, contudo, não pensada somente por seus organismos. As políticas sociais, inclusive a educação, situam-se no interior de um tipo particular de Estado, visando à manutenção das relações de determinado projeto social. Portanto, constituem-se em formas de intervenção do Estado, tendo em vista a manutenção das relações sociais de determinada formação social.

Convém destacar que educação é um conceito muito amplo. Isso quer dizer que políticas educacionais são um foco mais específico do tratamento da educação, que em geral se aplica às questões escolares.

Em outras palavras, pode-se dizer que políticas públicas educacionais referem-se à educação escolar. Tal observação se faz necessária tendo em vista que educação é algo que vai além do ambiente escolar. Tudo o que se aprende socialmente – na família, na igreja, na escola, no trabalho, na rua, no teatro etc. –, resultado do ensino, da observação, da repetição, da reprodução, da inculcação, é educação. Em termos da legislação brasileira isto é reconhecido na Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional n. 9.394/96 (BRASIL, 1996), que em seu artigo 1º destaca: ―A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações

culturais‖. Porém, a educação só é escolar quando ela for passível de delimitação por um sistema que é fruto de políticas públicas.

Concebida esta premissa, torna-se imprescindível a existência de um ambiente específico próprio do fazer educacional, ―a escola, a secretaria de educação e seus órgãos‖, o qual agrega partes distintas de um processo complexo: alunos, professores, servidores, dirigentes, pais, comunidade e Estado (enquanto sociedade política que define o sistema através de políticas públicas). Por conseguinte, políticas públicas educacionais dizem respeito às decisões do governo que têm incidência em espaços educacionais.

As políticas sociais determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, à redistribuição dos benefícios sociais, visando à manutenção das relações sociais de determinada formação social. Para que este direito seja garantido com qualidade e de forma universal, é implementada a política educacional.

De acordo com Azevedo (2004), abordar a educação como uma política social requer diluí-la na sua inserção mais ampla: o espaço teórico-analítico próprio das políticas públicas, que representam a materialidade da intervenção do Estado, ou o ―Estado em ação‖. Nestes termos, a educação é considerada uma política pública social, de responsabilidade do Estado – mas não pensada somente por seus organismos.

Sendo a política educacional parte de uma totalidade maior, torna-se prudente pensá-la sempre em sua articulação com o planejamento global que a sociedade constrói como seu projeto e que se realiza por meio da ação do Estado. São, pois, as políticas públicas que dão visibilidade e materialidade ao Estado e, por isso, são definidas como sendo ―o Estado em ação‖. (JOBERT; MULLER, 1987 apud AZEVEDO, 2004, p. 60)

Nessa perspectiva, a gestão pública, pautada por uma concepção de Estado que considere sua função atender a sociedade como um todo, não privilegiando os interesses dos grupos detentores do poder econômico, poderá estabelecer como prioritários programas de ação universalizantes, que possibilitem a incorporação de conquistas sociais pelos grupos e setores desfavorecidos, objetivando a reversão do desequilíbrio social.

Portanto, numa sociedade extremamente desigual e heterogênea como a brasileira, espera-se que a política educacional desempenhe papel importante. Mais do que oferecer ―serviços‖ sociais – entre eles a educação – as ações públicas, articuladas com as demandas da sociedade, devem se voltar para a construção de direitos sociais. (HOFLING, 2001)

Uma das questões centrais na discussão sobre as tendências das políticas educacionais é a análise das posturas/ações/intervenções do Estado, inclusive, contemplando vários períodos históricos, pois o capitalismo desenvolvido, apesar de não poder suportar a expansão

do Estado do Bem-Estar social19, conforme já mencionado no início desta tese, não pode sobreviver sem ele. Nesse sentido, em termos de bem-estar social, sempre se presume que seja o Estado o agente principal na implementação de políticas.

Historicamente o Estado capitalista vem assumindo duas posições clássicas: uma concorrencial e outra estatizante. A primeira tem a liberdade econômica como preocupação central e define-se nas seguintes características: a livre concorrência e o fortalecimento da iniciativa privada com a competitividade, a eficiência e a qualidade de serviços e produtos, dentre outras. A segunda tendência, a estatizante, dentre outras características tem como preocupação central um conteúdo igualitarista-social, com o objetivo de efetivar uma economia de mercado planejada e administrada pelo Estado e promover políticas públicas de bem-estar-social. (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2012, p. 96)

O modelo estatizante, proposto pelo paradigma keynesiano tornou-se questionável a partir da eclosão da crise do petróleo em 1973, que causou um quadro de instabilidade na economia mundial, época em que se desencadeou no mundo capitalista profunda recessão, baixas taxas de crescimento e elevada taxa de inflação. Para Fiorese (2006) a crise foi identificada como consequência do modelo do Estado de Bem-Estar Social, no sentido de regular os desequilíbrios gerados pelo desenvolvimento. Desse modo, as políticas sociais foram fortemente criticadas e responsabilizadas pela crise do capitalismo.

Daí urge a necessidade de uma reorganização nas funções do Estado: de um modelo de Estado pautado em políticas Keynesianas, garantindo políticas públicas na área social (educação, saúde, previdência, social, habitação) para um Estado baseado na lógica do mercado, tido como eficiente, ágil, capaz de oferecer serviços de qualidade à população e organizado dentro de um modelo gerencial que privilegia a ótica da eficiência, da eficácia e da produtividade. Desta forma, emerge a regulação nos processos de recomposição do papel do Estado e na alteração dos seus modos de intervenção governativa, tendo em vista a adaptação, conformidade e estabilização do sistema capitalista.

A gestão pública, mesmo em países como o Brasil, em que não houve definidamente, uma atuação do Estado como agente da promoção social e organizador da economia, passa a ser influenciada em todos os setores, inclusive o educacional por essas novas ideias, desencadeando alterações substantivas no padrão de regulação e controle dos serviços públicos.

19

Organização política e econômica surgida após a segunda guerra mundial que coloca o Estado como agente da promoção (protetor e defensor) social e organizador da economia. Cabe ao Estado do Bem-Estar Social (Welfare State) garantir serviços públicos e proteção à população.

De fato, a gestão pública no Brasil não ficou alheia a esse processo de mudança, vindo a empreender, ao longo do século passado, algumas alterações fundamentais na sua estrutura organizacional, o que culminou na década de 1990, com a reforma administrativa do Estado brasileiro, que alterou profundamente a configuração do federalismo brasileiro a partir da intensificação da política de descentralização.

As políticas educacionais no Brasil, nas últimas duas décadas vêm sendo desenvolvidas tendo como referência os pressupostos de uma nova gestão pública. Desta maneira, tais políticas estão pautadas sobremaneira, em aspectos que possam revelar resultados, atingir metas, controlar as ações, atuar no sentido da responsabilização e promover os ajustes reguladores necessários ao processo de acordo com essa lógica.

De acordo com o que já enunciamos na Introdução desta tese, nesse contexto, surge o PDE, objeto de estudo desta pesquisa, instituído pelo MEC, em abril de 2007. Este é um plano gestado no processo de mudanças na gestão da educação básica brasileira, num cenário que aponta a necessidade de implementação de modalidades de planejamento e de avaliação de larga escala como instrumentos de regulação para mensurar o desempenho dos sistemas de ensino.

Parte-se do princípio que a política da educação básica presente no PDE se constitui como elemento das reformas empreendidas no setor público, iniciadas na década de 1990 e ainda em curso, fazendo emergir um novo modo de regulação das políticas sociais.

Diante disso, torna-se relevante esboçar o contexto que melhor possibilite uma compreensão sobre a atuação do Estado em relação às formas como são produzidas e aplicadas as regras que orientam as políticas educacionais (regulação).