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4 FEDERALISMO, (DES)CENTRALIZAÇÃO E EDUCAÇÃO

4.3 CONCEITO E MODELOS DE RELAÇÕES

A discussão sobre as formas e características das relações entre as esferas de governo se constitui num elemento basilar nos estudos sobre federalismo. O conceito de Relações Intergovernamentais surgiu na década de 1930, como fruto da reflexão sobre o sistema federal dos Estados Unidos da América. O termo passou a ser utilizado "com o advento do New

Deal28 e do amplo esforço de governo nacional para combater o caos econômico e social causado pela Grande Depressão". (WRIGHT, 1997, p. 68 apud CAMPOS, 2000, p. 19) O surgimento desse termo, bem como sua progressiva conceituação posterior, esteve ligada ao Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) e às políticas utilizadas para viabilizá-lo. Anderson (1960 apud TEDESCHI, 2003, p. 28) define relações intergovernamentais como um importante contingente de atividades ou interações que tem lugar entre unidades de governo de todo tipo e nível dentro de um sistema federal.

Cada realidade histórica conforma um tipo de federação, de acordo com suas condições econômicas, políticas, sociais, as quais se modificam no tempo. As relações intergovernamentais se caracterizam de diferentes formas a depender do modelo de federação, o que significa ser difícil estabelecer uma tipologia que consiga enquadrar todas as experiências existentes neste campo.

Lijphart (2003, p. 18) declara que as variações históricas nos países que adotaram o federalismo concorreram para muitos conceitos, de maneira que é possível identificar três matrizes segundo o nível das relações intergovernamentais entre os entes federados:

a) o federalismo dual, modelo original dessa forma de organização elaborada e implementada nos EUA;

b) o federalismo centralizado, transformação do modelo dual em que as unidades subnacionais se tornam, praticamente, agentes administrativos do governo central, como no período das medidas de intervenção do New Deal e;

c) o federalismo cooperativo, em que as unidades subnacionais e o governo

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O New Deal foi o nome dado à série de programas implementados nos Estados Unidos entre 1933 e 1937, sob o governo do Presidente Franklin Delano Roosevelt, com o objetivo de recuperar e reformar a economia norte- americana.

nacional têm ação conjunta e capacidade de autogoverno, como na Alemanha.

Desta forma, do ponto de vista das relações entre esferas de governo, Lijphart (2003) apresenta três tipos de arranjos federativos. O federalismo centralizado implica a transformação dos governos estaduais e locais em agentes administrativos do governo federal, que possui forte envolvimento nos assuntos das unidades subnacionais, primazia decisória e de recursos. Já o federalismo cooperativo comporta graus diversos de intervenção do poder federal e se caracteriza por formas de ação conjunta entre instâncias de governo, nas quais as unidades subnacionais guardam significativa autonomia decisória e capacidade própria de financiamento. Por sua vez, o federalismo dual tem por característica central uma rígida separação de competências entre a entidade central, representada pela União, e os demais federados. Estas instâncias se constituem soberanias distintas e atuam de forma separada e independente, nas esferas que lhes são próprias, conforme se adota nos Estados Unidos da América.

Tomando como base a experiência histórica do sistema político norte-americano e como critério o tipo de relação de autoridade entre os diversos níveis de governo, Wright (1988 apud CAMPOS, 2000, p. 32-33) apresenta os seguintes modelos de relações intergovernamentais: inclusivo, separado e superposto.

No modelo inclusivo, a relação básica é de hierarquia, prevalecendo uma interação em que as esferas subnacionais são meras extensões administrativas do governo central, além de inteiramente dependentes do centro. A manutenção do poder sobre as outras esferas por parte do governo central se daria mediante o enfraquecimento dos demais níveis.

O modelo separado propõe uma perfeita e necessária separação entre as esferas de governo e tenderia a prevalecer uma relação de interdependência entre elas. Geralmente, neste modelo, só são legalmente reconhecidos os governos nacional e estadual. As unidades locais têm existência condicionada aos governos estaduais e ao arbítrio do centro.

O modelo superposto constitui paradigma do funcionamento de Estados em que se produzem complexas relações intergovernamentais de esferas territoriais de governo distintas e prevalece nas democracias ocidentais atuais. Apesar de esse modelo supor certas áreas de competência privativa de alguma esfera específica de governo, estas costumam ser muito restritas, pois, em prevalecendo esta perspectiva, o exercício de uma boa parte das funções do Estado não pode ser levado a bom termo sem a participação de todas as esferas de governo. Daí o alto grau de interdependência entre elas.

Na vigência do modelo superposto também existiria a tendência, ou, mesmo, o imperativo, da negociação como principal instrumento de interação governamental, já que esta seria, naturalmente, a forma mais viável de se evitar conflitos e promover a imprescindível cooperação entre os níveis de governo. Contudo, esta tendência não impede que o modelo, muitas vezes, apresente simultaneamente traços de cooperação e competição.

Para Garcia (2002), os modelos federativos guardam relação ou resultam das condições existentes em cada etapa histórica de desenvolvimento do sistema capitalista e também da busca de soluções para ajustar e aprimorar o arranjo federativo diante de situações mais complexas em dadas realidades que adotaram este modelo de organização política de seu território.

Cury (2006, p. 115) identifica no contexto político brasileiro três tipos distintos em que o federalismo se caracterizou:

1) O federalismo centrífugo se remete ao fortalecimento do poder do Estado- membro sobre o da União, em que, na relação concentração/difusão do poder, prevalecem relações de larga autonomia dos Estados-membros. Pode-se assinalar como tal a Velha República, especialmente entre 1898- 1930.

2) O federalismo centrípeto se inclina ao fortalecimento do poder da União, em que, na relação concentração/difusão do poder, predominam relações de subordinação dentro do Estado Federal. Pode se dar como exemplo o Brasil entre os anos 1930 e 1980, embora com uns acentos diferenciados para os períodos específicos, como o de 1946-1964.

3) O federalismo de cooperação busca um equilíbrio de poderes entre a União e os Estados-membros, estabelecendo laço de colaboração na distribuição das múltiplas competências por meio de atividades planejadas e articuladas entre si, objetivando fins comuns. Esse federalismo político é registro jurídico de nossa atual Constituição

Adentrando nesse contexto, veremos, a seguir, uma breve trajetória da configuração do federalismo brasileiro em que se entrecruzam velhas e novas formas de relações federativas.

4.4 O FEDERALISMO NO BRASIL: MÚLTIPLAS FORMAS EM BUSCA DE UM