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A avaliação do desempenho docente e o desenvolvimento profissional do professor.

4.ª geração da avaliação

2. Finalidades da Avaliação do Desempenho Docente: Melhoria e/ou Controlo

2.1. Necessidade de Melhorar o Ensino

2.1.1. A avaliação do desempenho docente e o desenvolvimento profissional do professor.

O desenvolvimento profissional dos professores é um dos elementos determinantes no contexto das mudanças em educação. O modo como é encarado depende da visão que se tem do sistema de ensino num dado momento e das suas finalidades (Flores & Simão, 2009).

Nos dias de hoje os saberes adquiridos pelos professores aquando da formação inicial não podem permanecer isolados do mundo e imutáveis no tempo. É necessário que o professor esteja em constante atualização, para poder reagir prontamente perante as mudanças que ocorrem quotidianamente no exercício da docência, quer sejam de teor curricular ou por reorganização das condições de trabalho. Existe atualmente uma grande diversidade de razões que podem ser apontadas para que os professores sejam diariamente postos à prova, fazendo todo o sentido considerar que o desenvolvimento profissional contínuo dos professores seja uma necessidade (Day, 2007).

O conceito de desenvolvimento profissional é, frequentemente, confundido com o conceito de formação contínua (Herdeiro & Silva, 2013). São, no entanto, conceitos distintos.

A formação contínua é “um acontecimento planeado, um conjunto de eventos ou um programa amplo de aprendizagens acreditadas e não acreditadas, de modo a distingui-la de atividades menos formais de desenvolvimento profissional dentro da escola, de redes de parcerias e fora da escola” (Day, 2001, p. 203). Já o desenvolvimento profissional “tem uma conotação de evolução e continuidade que, em nosso entender, supera a tradicional justaposição entre formação inicial e formação contínua dos professores” (Marcelo García, 2009b).

Na tentativa de estabelecer um confronto semântico entre os dois conceitos, Ponte (1998) chegou a considerações como as que se sintetizam no quadro seguinte:

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Contrastes entre a Formação Contínua e o Desenvolvimento Profissional (Baseado em Ponte, 1998)

Formação Contínua Desenvolvimento Profissional

Está muito associada à ideia de frequentar cursos.

Concretiza-se através de múltiplas formas e processos, tais como, frequência de cursos, mas também outras atividades, projetos, troca de experiências, leituras, reflexões.

Constitui-se como um movimento

essencialmente de fora para dentro, cabendo ao professor assimilar os conhecimentos e a informação que lhe são transmitidos.

Constitui-se como um movimento de dentro para fora, cabendo ao professor as decisões fundamentais relativamente às questões que quer considerar, aos projetos que quer empreender e ao modo como os quer executar. Atende essencialmente àquilo em que o

professor é carente.

Dá especial atenção às potencialidades do professor.

Tende a ser vista de modo compartimentado, por assuntos ou disciplinas.

Tende a implicar a pessoa do professor como um todo, nos aspetos cognitivos, afetivos, relacionais.

Parte, invariavelmente, da teoria e muitas vezes não chega a sair da teoria.

Tende a considerar a teoria e a prática de forma interligada.

No desenvolvimento profissional dá-se grande importância à combinação de processos formais e informais, sendo a formação (inicial, contínua, especializada e avançada) um suporte fundamental do desenvolvimento profissional, mas não é o único e, talvez, não seja o decisivo (Imbernón, 1994, 2009; Ponte, 1998).

Encontrar uma definição do conceito de desenvolvimento profissional que possa ser consensual não parece ser uma tarefa fácil. É, contudo, possível determinar o entendimento que existe acerca deste conceito. Vários autores (Alarcão & Roldão, 2009; Avalos, 2007; Benedito & Imbernón, 2000; Bredeson, 2002; Cardona, 2002; Cochran-Smith & Zeichner, 2005; Day, 2001; Díaz & García, 1992; Flores & Pacheco, 1999; Flores & Simão, 2009; Formosinho, 2000, 2002; Imbernón, 1994, 2009; Jaworski, 1993; Kelchtermans, 2004; Loucks-Horsley, Stiles, Mundry, Love & Hewson, 2009; Maia, 2008; Marcelo García, 1999, 2009a, 2009b; Ponte, 1986, 1998; Villegas– Reimers, 2003, entre outros) apresentam nas suas obras definições que apontam algumas características que permitem compreender o conceito de desenvolvimento profissional, revelando-nos um conceito recente mas de crescente complexidade e importância. No âmago desta questão estará, certamente, a visão atual do profissional de educação em permanente desenvolvimento, resultante dos desafios constantemente renovados que se colocam à escola pela evolução tecnológica, pelo progresso científico

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e pela mudança social, bem como das teorias educacionais e pedagógicas contemporâneas e da investigação realizada.

A investigação concetual e empírica mostra que o desenvolvimento profissional docente pressupõe evolução, é um processo contínuo de aprendizagem, altamente complexo e multidimensional (Avalos, 2011; Kelchtermans, 2004), no qual interferem diferentes tipos de variáveis de ordem pessoal e profissional, tais como as características do contexto sociopolítico nacional, a diversidade dos contextos institucionais, onde vai decorrendo a formação e o exercício da profissão, e as vivências resultantes da história individual de cada professor (Cardona, 2002).

Esse processo contínuo de aprendizagem envolve a aquisição de novas competências, resultantes de práticas de inovação escolar, bem como a consolidação de competências adquiridas e mantidas ao longo da carreira profissional, visando melhorar a prática e os conhecimentos profissionais do professor, de forma a aumentar a qualidade do seu trabalho, tornando-o mais apto a conduzir o ensino e a contribuir para melhorar as instituições educativas (Flores & Pacheco, 1999).

Admitir o desenvolvimento profissional como um processo contínuo de aprendizagem equivale a entendê-lo como uma necessidade permanente, que acompanha o professor ao longo da carreira, tendo como objetivo a melhoria da sua prática docente. É um processo em que se atribui ao próprio professor o papel de sujeito fundamental, visto ser ele a tomar as principais decisões relativamente aos projetos que pretende efetuar e à forma como os quer pôr em prática. Durante a sua vida, o professor participa num processo de desenvolvimento e crescimento pessoal, profissional e social, alcançado com base em conhecimentos sobre ciência, didática, currículo e contexto, influenciados por fatores de natureza cognitiva, afetiva e social (Avalos, 2007, 2011; Benedito & Imbernón, 2000; Cochran-Smith & Zeichner, 2005; Day, 2001; Díaz & García, 1992; Imbernón, 1994, 2009; Loucks-Horsley et al., 2009; Marcelo García, 1999; Pires, Alves & Gonçalves, 2016; Ponte, 1986, 1998). O professor “passa a ser concebido como um participante ativo de um processo permanente de construção e (re)construção de saberes e práticas, com reflexos nos contextos educativos e na qualidade da educação” (Lopes & Silva, 2010, p. 107).

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Tal processo deve ser concretizado no local onde o professor desenvolve a sua ação: a escola. É na escola, enquanto espaço privilegiado de ação do professor, que o processo de desenvolvimento profissional ganha mais pertinência e significado. É experimentando e confirmando na prática a exequibilidade das aprendizagens, a par da reflexão sobre a sua própria prática, que o professor produz novo conhecimento prático e é capaz de aprender a partir da sua experiência (Marcelo García, 1999, 2009b). O ato de refletir pode ser visto como a ligação que falta entre experiências e aprender a partir da experiência (Jaworski, 1993).

Implicando um envolvimento pessoal ativo, sustentado por uma partilha de saberes e experiências, ligado a um determinado contexto, o desenvolvimento profissional surge como uma oportunidade de aprendizagem que promove nos professores capacidades criativas e reflexivas que lhes permitem a melhoria profissional e também a melhoria institucional (Bredeson, 2002; Díaz & García, 1992; Monteiro, 2014).

Marcelo García (2009b) sintetiza da seguinte maneira as principais características do desenvolvimento profissional:

• Baseia-se no construtivismo, entendendo o professor como alguém que aprende de forma ativa, ao envolver-se em tarefas concretas de ensino, avaliação, observação e reflexão.

• É encarado como um processo a longo prazo, que reconhece o facto de que os professores aprendem ao longo do tempo. Deste modo, entende-se que as experiências são mais eficazes se permitirem que os professores relacionem as novas experiências com os seus conhecimentos prévios, o que requere um adequado acompanhamento e supervisão, indispensável para que a mudança ocorra.

• Assume-se como um processo que tem lugar em contextos concretos. Contrariamente às práticas tradicionais de formação, que não relacionam as situações de formação com situações práticas, as experiências mais eficazes para o desenvolvimento profissional são aquelas que ocorrem na escola e que se inscrevem nas atividades quotidianas dos professores.

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• Está muito relacionado com os processos de reforma da escola, na medida em que é entendido como um processo que tende a reconstruir a cultura escolar, onde se incluem os professores como profissionais.

• Concebe o professor como um prático reflexivo, isto é, como alguém que acede à profissão com conhecimentos prévios e que vai adquirir mais conhecimentos a partir da sua reflexão sobre a experiência.

• É concebido como um processo colaborativo, embora também se reconheça que devem existir oportunidades para o trabalho individual e para a reflexão. • Deve ser adaptado aos diferentes contextos. Não existe um modelo de

desenvolvimento profissional que seja eficaz no geral e que se possa aplicar em todas as escolas. Cada escola e cada docente deve avaliar as suas próprias necessidades, crenças e práticas culturais, para poder decidir qual o modelo de desenvolvimento profissional que pode ser mais benéfico em cada circunstância.

O desenvolvimento profissional é um processo a longo prazo que envolve diversos tipos de oportunidades e experiências planificadas, visando o desenvolvimento dos professores em diferentes dimensões: desenvolvimento pedagógico, conhecimento e compreensão de si mesmo, desenvolvimento cognitivo e desenvolvimento teórico (Marcelo García, 1999). É, em suma, um processo que

envolve todas as experiências espontâneas de aprendizagem e as atividades conscientemente planificadas, realizadas para benefício, direto ou indireto, do indivíduo, do grupo ou da escola e que contribuem, através destes, para a qualidade da educação na sala de aula. É o processo através do qual os professores, enquanto agentes de mudança, reveem, renovam e ampliam, individual ou coletivamente, o seu compromisso com os propósitos morais do ensino, adquirem e desenvolvem, de forma crítica, juntamente com as crianças, jovens e colegas, o conhecimento, as destrezas e a inteligência emocional, essenciais para uma reflexão, planificação e prática profissionais eficazes, em cada uma das fases das suas vidas profissionais. (Day, 2001, p. 21).

O desenvolvimento profissional ao longo de toda a carreira é, hoje em dia, um aspeto essencial da profissão docente, sendo este um meio para melhorar o seu desempenho em sala de aula (Day, 2001). Promover o desenvolvimento profissional dos professores

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poderá contribuir para elevar os padrões de ensino e melhorar os resultados e a aprendizagem dos alunos (Avalos, 2007; Flores & Simão, 2009).

Esta perspetiva é advogada pelo discurso político, ao eleger como um dos objetivos da avaliação do desempenho docente “proporcionar orientações para o desenvolvimento pessoal e profissional” (Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de fevereiro, artigo 40.º, n.º 2) e ao pretender:

incentivar o desenvolvimento profissional, reconhecer e premiar o mérito e as boas práticas, como condições essenciais da dignificação da profissão docente e da promoção da motivação dos professores. Neste sentido, promove-se uma avaliação do desempenho docente assente na simplicidade, na desburocratização dos processos e na sua utilidade, tendo em vista a revitalização cultural das escolas e uma maior responsabilidade profissional. (Preâmbulo, Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de fevereiro)

Também o Decreto-Regulamentar n.º 26/2012, de 21 de fevereiro, artigo 3.º, n.º 1, estipula que o sistema de avaliação do desempenho do pessoal docente “visa a melhoria da qualidade do serviço educativo e da aprendizagem dos alunos, bem como a valorização e o desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes”, objetivos esses defendidos por autores como Flores (2010) e Torrecilla (2006).

Ou seja, a avaliação do desempenho docente será, na leitura dos normativos portugueses e de alguns autores, uma das formas de promover o desenvolvimento profissional dos professores, tendo como objetivo a melhoria da sua prática docente, visando elevar a qualidade da educação e o sucesso escolar dos alunos. O desenvolvimento profissional deverá incluir formação adequada, treino, e reflexão sobre a prática, desejavelmente em trabalho colaborativo, como é sugerido pela OCDE (2009a):

Effective professional development is on-going, includes training, practice and feedback, and provides adequate time and follow-up support. Successful programmes involve teachers in learning activities that are similar to ones they will use with their students, and encourage the development of teachers’ learning communities. There is growing interest in developing schools as learning organisations, and in ways for teachers to share their expertise and experience more systematically. (p. 49)

É aqui enfatizada a dimensão reguladora da avaliação, surgindo, por exemplo, nas Normas Profissionais para o Ensino da Matemática ([NCTM], 1994), como um “veículo

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que liga o método de ensino de um professor ao desenvolvimento profissional indispensável para permitir a esse professor melhorar o seu ensino” (p. 77).

Durante os últimos anos, a avaliação do desempenho docente e o conceito de

accountability têm vindo a mudar o seu enfoque, passando do campo económico e de

gestão ao didático. Progressivamente, os modelos de avaliação do desempenho docente têm vindo a centrar-se mais nos processos que afetam a qualidade do ensino, com o intuito de conciliar os dois tipos de avaliação formativa-sumativa, a fim de satisfazer as necessidades organizativas e institucionais das escolas e as exigências de desenvolvimento profissional dos professores, de modo a melhorar as suas práticas (Darling-Hammond, 1997).

Em síntese, a mudança de paradigma que se verificou no campo das ciências sociais teve repercussões no âmbito da educação, evoluindo também para uma perspetiva contextual e interacionista, na qual o conceito de desenvolvimento profissional assumiu grande relevância. Neste sentido, a avaliação do desempenho docente, enquadrada numa cultura de escola, implicando os próprios professores e uma reflexão contextualizada sobre o trabalho produzido, permitiria não só o desenvolvimento profissional, como também organizacional.

2.1.2. A avaliação do desempenho docente e o desenvolvimento da