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Avaliação do Desempenho Docente: Do Diagnóstico à Supervisão

4.ª geração da avaliação

4. Avaliação do Desempenho Docente: Do Diagnóstico à Supervisão

A avaliação do desempenho docente constitui atualmente, no plano discursivo e como referimos anteriormente, uma prática de que se espera não apenas o desenvolvimento do professor mas também a melhoria da qualidade do seu ensino e das aprendizagens dos alunos. Muitos autores interrogam-se e interrogam-nos sobre as possibilidades de a avaliação do desempenho docente poder ter efeitos, observáveis (e não apenas a partir de convicções arreigadas e muito difundidas), em atividades tão complexas e tão diversas na sua natureza, desde logo pela diferença abissal entre as duas populações visadas (professores e alunos), mas também pelos processos pedagógicos, psicológicos

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e sociológicos que o ensino e a aprendizagem requerem. Numa lógica mais intuitiva do que baseada na evidência argumenta-se frequentemente que os professores cuja ação educativa se observa, analisa e avalia – quer de forma controladora, quer de forma reguladora – serão mais eficazes a ensinar, porque identificam eventuais limitações da sua ação e também porque o diagnóstico dessa ação lhes permite refletir sobre a sua prática com base em informação mais objetivada, sendo esta reflexão extensível a outros atores, como a direção da escola ou as chefias intermédias de coordenação pedagógica. Na continuação desta argumentação sugere-se a articulação entre este maior conhecimento sobre a prática e a melhoria do ensino, o incremento da sua qualidade e a melhoria das aprendizagens. Assim, a avaliação do desempenho docente é concebida como estratégia para, obtendo melhores resultados escolares, satisfazer as expectativas sociais quanto à escola, retirando do debate a opinião, muito difundida, da responsabilidade dos professores pelos resultados insatisfatórios da escola (Rodrigues, 2013).

Porém, não podemos fundamentar esta argumentação em estudos conclusivos sobre esta cadeia de efeitos. Podemos relembrar as palavras de Darling-Hammond (2010) “não existem políticas capazes de melhorar as escolas se as pessoas que lá trabalham não dominarem o conhecimento e as competências de que necessitam” (p. 198), mais do que a avaliação propriamente dita requer-se um investimento sistémico maior em políticas de formação de professores. Por outro lado, são vários os estudos que nos alertam para a multiplicidade de variáveis que interferem com a aprendizagem dos alunos e com o seu sucesso escolar e que se situam fora da esfera de ingerência dos professores, como a motivação dos alunos, o seu contexto social, os meios disponíveis na escola entre muitas outras (Day, 2010; Paquay, Wouters & Nieuwenhoven, 2012; Perrenoud, 2012). Embora se reconheça valor na argumentação, há um largo consenso quanto a considerar que um sistema de avaliação do desempenho docente para poder responder aos desígnios que se lhe atribuem não pode ser concebido de forma desarticulada com outras vertentes da política educativa, nomeadamente no que à formação profissional dos professores diz respeito. As operações de avaliação em si mesmas são certamente insuficientes para fazer melhorar a prática docente e mais ainda para produzir mudanças relevantes nas aprendizagens dos alunos.

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Sem que possamos minimizar o efeito formativo que o esforço descritivo do estado atual da prática de cada professor, em ordem a um juízo avaliativo, constitui, não poderemos defender que o diagnóstico basta.

O diagnóstico exige uma tomada de decisão de índole formativa (hetero e/ou auto) e não pode ser conseguido sem passar pela observação direta, em sala de aula, da atividade docente. Nesta linha de pensamento, a supervisão pedagógica, nas suas múltiplas propostas teóricas e metodológicas (observação de práticas, descritivos dessas práticas em diferido pelas narrativas, portfólios, investigação-ação…), constitui a estratégia global por excelência recomendada por quantos, académicos e práticos, se movem nos terrenos da avaliação do desempenho docente (Rodrigues, 2013).

Na variedade de técnicas de que dispõem as práticas de supervisão, mais baseadas em dispositivos autoritários ou mais assentes em perspetivas desenvolvimentistas, a técnica mais transversal é a do feedback. Por isso dedicamos o texto que se segue, à supervisão pedagógica, à observação de aulas e ao feedback enquanto suportes fundamentais para os processos de avaliação do desempenho docente.

4.1. Conceito de Supervisão e de Supervisão Pedagógica

O termo supervisão veio dos Estados Unidos da América estando, vulgarmente, conotado com funções de inspeção, avaliação, controlo e melhoria imediata do ensino. A estas funções, associou-se depois as de regular, orientar e liderar (Alarcão & Tavares, 2013; Gaspar, Seabra & Neves, 2012; Vieira & Moreira, 2011).

Em Portugal a primeira utilização do termo parece ter surgido na década de 70, datando o primeiro registo de 1974, num artigo de Júlia Jaleco na Revista O Professor. Na década de 80, pode-se considerar que houve um desenvolvimento do tema, com a utilização do termo “supervisão clínica” por Alarcão. Mas, só em 1987, o termo foi utilizado por Alarcão e Tavares, na 1.ª edição da obra: Supervisão da prática

pedagógica. Uma perspetiva de desenvolvimento e aprendizagem.

Embora o termo supervisão seja de uso recente em Portugal, a prática da supervisão, no domínio educacional, já existia anteriormente, designada por orientação de estágios

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estando, particularmente, associada à formação inicial de professores. A reforma da formação inicial, sobretudo ligada à criação das Escolas Superiores de Educação e à formação de docentes para essas instituições de ensino superior contribuiu muito para a difusão do conceito entre nós. Porém, no quadro da formação inicial havia já uma longa tradição de acompanhamento e avaliação dos estagiários, conhecida por orientação de estágios e realizada por professores que se designaram de formas variáveis, como orientadores de estágio, orientadores pedagógicos, orientadores da prática pedagógica. A supervisão foi sendo alvo de medidas da reforma educativa, tendo merecido um desenvolvimento com uma série de medidas ao longo dos anos 1990. Continua ainda muito dependente da formação inicial com algum uso na inspeção de ensino, que se renovou também nos anos 90 (Rodrigues, 2013).

O termo supervisão foi pela primeira vez contemplado na legislação nacional, no artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 139A/90 de 28 de abril de 1990, que estabelece o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário (ECD), onde é referida a qualificação para o desempenho de outras funções educativas, obtida através da frequência com aproveitamento de licenciaturas ou cursos de estudos superiores especializados, ou de graus de mestre ou doutor, em áreas de especialização entre as quais é referida a especialização em «Supervisão Pedagógica e Formação de Formadores». O mesmo decreto-lei previa uma redução da carga letiva aos docentes que desempenhassem cargos de natureza pedagógica, designadamente de orientação educativa e de supervisão pedagógica (Artigo 80.º). O teor dessas funções e os cargos concretos a que se associam não são esclarecidos no documento. Desde esta data, o conceito de supervisão tem estado presente nas sucessivas alterações ao ECD, bem como ao regime de avaliação do desempenho docente.

A implementação da avaliação do desempenho docente e a própria reforma da gestão escolar veio dar novo reforço ao interesse pela supervisão. Verificou-se o aumento de publicações sobre o tema, sendo atualmente cada vez mais consistente e abrangente na literatura, incidindo as publicações, na sua maioria, na área da educação, em particular no âmbito da formação de professores (Alarcão & Canha, 2013; Vieira & Moreira 2011).

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Mas o que se entende por supervisão?

Numa definição que se tornou clássica entre nós, Alarcão e Tavares (1987) explicitaram o seu entendimento do que é a supervisão: “processo em que um professor, em princípio mais experiente e mais informado, orienta um outro professor ou candidato a professor no seu desenvolvimento humano e profissional” (p. 18). Sublinharam então os autores, que se tratava de uma atuação que ocorre num tempo longo – é um processo que tem como intenção o desenvolvimento profissional do professor. Esta definição, por eles retomada nos seus trabalhos posteriores e repetida em quase todos os estudos em língua portuguesa que versam a temática da supervisão, foi sofrendo os efeitos do tempo, sem contudo a substituir.

A supervisão é definida genericamente por Vieira e Moreira (2011) “como teoria e prática de regulação de processos de ensino e de aprendizagem em contexto educativo formal” (p. 11), sendo o seu enfoque a sala de aula.

Com vista a compreender melhor o conceito de supervisão, Alarcão e Canha (2013) procederam a uma tentativa de clarificação do conceito. Com base neste seu trabalho de clarificação os autores concebem a supervisão em geral “como um processo de acompanhamento de uma atividade através de processos de regulação que são enquadrados por um referencial e operacionalizados em ações de monitorização em que a avaliação está obviamente presente” (p. 19).

De acordo com estes autores a supervisão pode concretizar-se, segundo duas perspetivas: uma de caráter predominantemente formativo, visando a aprendizagem e o desenvolvimento dos indivíduos e das instituições; e outra de caráter inspetivo, fiscalizador, focada no controlo e no cumprimento de normas.

Alarcão e Canha (2013) sintetizam a sua conceptualização de supervisão no esquema representado na Figura 3.

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Figura 3. Supervisão (Baseado em Alarcão & Canha, 2013, p. 20).

O termo supervisão utiliza-se numa multiplicidade de campos de intervenção sendo necessário “especificar o domínio de ação: supervisão financeira, supervisão dos mercados de valores mobiliários, supervisão de professores, supervisão pedagógica, supervisão clínica, supervisão da investigação, supervisão da formação, supervisão curricular, supervisão institucional…” (Alarcão & Canha, 2013, p. 16).

Os mesmos autores acentuam que devido a esta multiplicidade de campos de atuação existe uma diversidade de conceitos conexos, que frequentemente se associam ao termo supervisão, nomeadamente formação, coaching, gestão/administração, coordenação,

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