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CAPITULO 1 O PARADIGMA CIENTÍFICO DO DESENVOLVIMENTO

1.4 As teorias da sustentabilidade

1.4.7 A consagração internacional do desenvolvimento sustentável

Na década de 60 do século passado, houve aceleração da preocupação ambiental em âmbito mundial, especialmente na Europa. Nessa época, começam a surgir acordos e declarações internacionais para fins de proteção ambiental. Ganhou destaque o tema da

racionalização do uso dos recursos naturais e a ponderação quanto às necessidades socioeconômicas em face dos limites do meio.

O desenvolvimento sustentável foi mencionado pela primeira vez na 1ª Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em 1972. O documento mais importante dessa Conferência Internacional da Organização das Nações Unidas foi a Declaração de Estocolmo, a qual consagrou essa nova forma de desenvolvimento, notadamente nos princípios primeiro (defendendo que o direito ao bem- estar deve incluir a proteção ambiental), quinto (que destaca a necessidade do uso sustentável para não esgotar os recursos) e oitavo (o qual relaciona o meio ambiente ao desenvolvimento socioeconômico).

Nessa convenção, o Brasil liderou um movimento de países de terceiro mundo para que o crescimento econômico não fosse limitado em nome da conservação ambiental, como queria o Clube de Roma. Tal grupo alegava soberania nacional e alertava que não poderia ser lesado pela industrialização já consolidada nos países desenvolvidos (FERREIRA, 2003, p. 81).

Essa posição dos países subdesenvolvidos estava relacionada a uma concepção de desenvolvimento como crescimento econômico, a qual predominou na política do governo militar brasileiro, até para atrair as indústrias que estavam enfrentando problemas com o crescimento da consciência ambiental na Europa. Porém, essa forma de desenvolvimento econômico não promoveu a almejada justiça social.

Pouco depois, na década de 70, pós-Estocolmo, teve início a institucionalização da luta pela preservação ambiental e o desenvolvimento sustentável. O estudo do contexto mundial da disponibilidade física e a formulação de um conceito bem claro e genérico de desenvolvimento sustentável proposto no relatório “Nosso Futuro Comum”, apresentado em 1987 pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU

(Comissão Brundtland38) tiveram papel fundamental para que o tema ganhasse conteúdo

capaz de estar inserido nos ordenamentos jurídicos internos e internacionais. Nesse documento, o desenvolvimento sustentável foi definido como aquele “que responde às necessidades do presente sem comprometer as possibilidades das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades” (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, 1991, p. 9).

De plano, duas críticas podem ser feitas ao Relatório Brundtland. Primeiro, por usar o termo “necessidades”, quando as pessoas possuem valores e objetivos além do sentido tradicional das necessidades, que, aliás, não são facilmente generalizáveis. Depois, em virtude de não oferecer um conceito com conteúdo material, mas, sim, uma concepção tão genérica, que não diz nada, embora se deva reconhecer a dificuldade em conseguir algo nesse sentido.

O desenvolvimento sustentável começa a ser visto como paradigma do

ambientalismo contemporâneo a partir da 2a Conferência das Nações Unidas sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro em 1992 (ECO-92). Esse evento foi motivado e orientado pelo Relatório Nosso Futuro Comum. Também houve reuniões prévias para tornar a convenção mais frutífera, bem como a criação, pela ONU, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

Nessa segunda Conferência, foram produzidos quatro documentos: a Agenda 21, a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Convenção Sobre Mudanças Climáticas e a Declaração de Princípios Sobre as Florestas e da Convenção Sobre a Biodiversidade. Os dois primeiros documentos merecem destaque especial, por associarem os problemas ecológicos ao tema do desenvolvimento socioeconômico.

A Agenda 21 tem sido relevante por enunciar princípios programáticos sobre desenvolvimento sustentável, integrando a produtividade, a conservação do potencial produtivo, o combate à pobreza e a segurança alimentar. Trata-se de um plano de ações, objetivos, atividades e meios para alcançar o desenvolvimento sustentável. Nessa agenda, de forma integrada e sistêmica, foram estabelecidas dimensões econômicas, sociais e políticas da proteção ambiental. Entretanto, ela foi muito criticada por ser apenas uma carta de intenções e não dispor de recursos para implementar os programas. Apesar de orientar as partes no âmbito dos compromissos políticos e a produção do ordenamento interno, não possui caráter vinculativo.

Não obstante, a Agenda 21 possui disposições interessantes, como o reconhecimento de que a economia de países subdesenvolvidos, normalmente agrícola, é muito prejudicada pelo protecionismo e subsídios das economias avançadas (SOARES, 2004, p. 145). Essa agenda também traz um programa geral sobre desenvolvimento sustentável, inclusive para o meio rural, a ser especificado em convenções, tratados e no ordenamento interno de cada país. Ela ainda tem caráter denunciativo, dá prazos para solução de problemas e prevê responsabilidades.

Outro documento importante foi a Declaração Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, pois apregoava o desenvolvimento sustentável e algum conteúdo

axiológico em diversos princípios, entre eles: o primeiro (propõe um desenvolvimento voltado ao bem-estar humano), o terceiro (consagra a eqüidade intergeracional), o quarto (estabelece uma visão sistemática do desenvolvimento), o oitavo (prescreve a produção e o consumo sustentáveis) e o nono (defende o investimento em pesquisa). Todos esses princípios, que formam o sistema de desenvolvimento sustentável, estão consagrados na atual Constituição Federal.

Nessa segunda Conferência, os Estados também não quiseram adotar nenhum compromisso vinculante. O Norte ainda resistiu em diminuir seu padrão de compromisso, enquanto o Sul exigiu compensação pelos danos causados pelo Norte e não admitiu abandonar a busca pelo desenvolvimento.

A cúpula de Roma, realizada em 1996, foi outro momento importante na discussão do desenvolvimento sustentável. O seu principal documento - a Declaração Sobre Segurança Alimentar - reconheceu os dois principais aspectos da questão: 1º) a necessidade de aumentar a produção e manter o potencial produtivo do meio ambiente; e 2º) a necessidade de promoção de inclusão social, com geração e distribuição renda, emprego, acesso à terra, crédito e tecnologia.

A 3ª Conferência sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada em Johanesburgo, em 2002, também chamada de “Rio + 10”, não avançou muito em termos de conteúdo do desenvolvimento sustentável e vinculação jurídica das partes. Embora tenha dado continuidade à discussão a respeito da questão ambiental e dos problemas socioeconômicos, com abordagem de temas polêmicos e importantes, como a desertificação, a fome e a segurança alimentar, não houve maiores compromissos jurídicos devido aos interesses setoriais, especialmente das economias avançadas e seus grandes financiadores da iniciativa privada.

Sem dúvida, as Conferências “sociais” e ambientais de órgãos da ONU demonstram que o desenvolvimento vai além do crescimento econômico; ele exige cooperação entre Estados e tratamento diferenciado para os países mais pobres. Mas a efetivação desses valores não é tão fácil; depende da superação de interesses internos, compromissos éticos com o futuro e, principalmente, do estabelecimento de vínculos jurídicos com conteúdo concreto.