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Direito ao meio ambiente como direito subjetivo público e as obrigações estatais

CAPÍTULO 2 A INFLUÊNCIA DO PARADIGMA DO DESENVOLVIMENTO

2.2 A consagração constitucional do desenvolvimento sustentável

2.2.3 Direito ao meio ambiente como direito subjetivo público e as obrigações estatais

A proteção ao meio ambiente segue o seguinte modelo de positivação constitucional: a) normas programáticas, que servem para direcionar a atuação do Estado - embora não exigíveis como direitos subjetivos; b) normas de organização, nesses casos não se aplicam sanções jurídicas, mas há importantes efeitos políticos, pois elas podem definir competência no âmbito ambiental e do desenvolvimento sustentável; c) garantias constitucionais: normas

que vinculam o legislador e servem como elemento de interpretação da Lei ou da Constituição; d) e direitos subjetivos públicos (CANOTILHO, 1998a, p. 445).

Luis Roberto Barroso (1992, p. 165) leciona que os direitos subjetivos resultam para seus titulares situações jurídicas imediatamente desfrutáveis, efetivadas por prestações positivas ou negativas, exigíveis do Estado ou de outro eventual destinatário da norma:

Por direito subjetivo entende-se o poder de ação, assente no direito objetivo, e destinado à satisfação de certos interesses. Singularizam o direito subjetivo distinguindo-o de outras posições, a presença cumulada das seguintes características: a) a ele corresponde sempre um dever jurídico; b) ele é violável, ou seja, existe a possibilidade de que a parte contrária deixe de cumprir o seu dever; c) a ordem jurídica coloca à disposição de seu titular um meio jurídico - que é a ação judicial - para exigir-lhe o cumprimento, deflagrando os mecanismos coercitivos e sancionatórios do Estado.

O direito subjetivo faz parte de uma relação subjetiva, na qual existe um sujeito passivo com um dever jurídico (do indivíduo, coletividade ou Estado) de não violar o interesse alheio. Esse interesse é protegido por expressar um valor aferido de acordo com a utilidade do bem para a satisfação das necessidades humanas.

Segundo Canotilho (1995, p. 91), o direito subjetivo público, em geral, pode ser definido “como o poder jurídico reconhecido ao particular – sobretudo através de normas do direito público - que lhe permite exigir das autoridades públicas um determinado comportamento para a presunção de interesses privados”.

O direito subjetivo público é uma categoria jurídica caracterizada por poderes- deveres predominantemente de interesse coletivo que têm eficácia imediata e podem ser exigidos pelos instrumentos jurídicos de proteção (CANOTILHO, 1998a, p. 1210).

Não dá para definir nem os direitos subjetivos, nem o seu conteúdo. Tudo o que existe até hoje é extremamente metafísico - até porque o Direito é um fenômeno ideológico. É preciso encarar os direitos subjetivos historicamente, de forma a reconhecer que eles são dinâmicos e têm determinadas finalidades. Nessa visão, o meio ambiente, enquanto direito fundamental, é um direito subjetivo público, mesmo em relação às pessoas privadas.

Porém, o conceito de direito subjetivo como interesse protegido do titular está em crise, porque não pode ser analisado fora das situações subjetivas complexas, as quais limitam os poderes pela funcionalização de uma categoria jurídica, ou melhor, exige-se do titular do

domínio o cumprimento de ônus, obrigações e deveres (PERLINGIERI, 1997, p. 108)74.

74 Categoria como conjunto normativo que tutela e regulamenta interesses juridicamente relevantes surgidos de

Essas situações subjetivas complexas possuem múltiplos aspectos incidentes no conteúdo do Direito. Merecem nota o “aspecto estático”, que dá relevância jurídica a uma situação com base no título existente, e o “aspecto funcional”, decorrente da qualificação sócio-jurídica da situação segundo os interesses da coletividade, condicionando internamente os direitos subjetivos (PERLINGIERI, 1997, p. 122).

O título é a causa da situação subjetiva que determina o aspecto funcional a ser considerado e o conteúdo jurídico mínimo do Direito. Logo, o título permite a qualificação da relação jurídica complexa, mas não garante a proteção sem o aspecto funcional.

A melhor abordagem do direito subjetivo público ao meio ambiente é vê-lo a partir das relações, pois a tradicional análise apenas do ponto de vista do direito do titular pode deixar de sopesar a importante questão dos deveres correlacionados aos poderes. O ordenamento é um sistema de relações jurídicas - direitos funcionalizados que geram obrigações para os beneficiados e para os demais membros da sociedade.

No ordenamento moderno, o interesse é tutelado se, e enquanto for conforme não apenas ao interesse do titular, mas também aquele da coletividade. Na maior parte das hipóteses, o interesse faz nascer uma situação subjetiva complexa, composta tanto de poderes quanto de deveres, obrigações, ônus. É nesta perspectiva que se coloca a crise do direito subjetivo. Este nasceu para exprimir um interesse individual e egoísta, enquanto que a noção de situação subjetiva complexa configura a função de solidariedade presente ao nível constitucional (PERLINGIERI, 1997, p. 121). No conceito clássico, a relação jurídica aparece como o vínculo entre determinados sujeitos, ligados por um feixe de direitos e deveres, tendo em vista a apropriação de algum bem. Atualmente, há três pontos principais de uma crítica ao conceito tradicional de relação jurídica: o sujeito precisa ser concreto (histórico ou contextualizado); deve existir uma correlação de forças em desigualdade de condições; e deve haver uma estrutura complexa de

situações subjetivas correlacionadas que envolvem direitos e obrigações (deveres e ônus75).

Neste trabalho, o termo obrigação será usado no sentido de um vínculo jurídico que cria o dever de realizar alguma coisa (objetivo) em favor de um sujeito ativo. O sujeito passivo dessa relação pode ser o indivíduo, a coletividade ou o Poder Público, e os credores podem até ser sujeitos indeterminados. O vínculo jurídico é o resultado de uma disciplina legal que estabelece o conteúdo das obrigações e as conseqüências da execução ou inadimplemento dos deveres.

Ao se consagrar o direito ao meio ambiente como direito subjetivo público de caráter difuso inserido numa estrutura de situação subjetiva, ficou estabelecido em lei que o

75 Ônus como a obrigação potestativa (ao arbítrio do obrigado) que atua como instrumento para o titular alcançar

Estado está obrigado a atuar em seu favor - essa postura é indispensável para formar um Estado Ambiental.

2.3 As obrigações estatais para efetivar o paradigma de desenvolvimento consagrado na Constituição Federal