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A essência e a existência

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3. EXISTENCIALISMO SARTREANO E SAPIENCIALIDADE COELETIANA:

3.6 A essência e a existência

Se a existência vem antes da essência, como defende o existencialismo (SARTRE, 1978, p. 216), aqui já considerando as instruções de Coélet em todo o seu conteúdo reflexivo acerca do mundo que o circunda, significa que ao passo em que o ser humano se propõe algo neste mundo, ele se propõe à sapiencialidade (Ecl 1,13-14).

Neste aspecto, a existência é única para cada homem e para descoberta da essência. Se o ser humano deseja ser algo, primeiramente há necessidade de ser existência, vivenciar as etapas do processo de se lançar rumo às possibilidades de sê-lo. Ser possibilidades é lançar-se continuamente em busca do novo incerto.

Por isso disse a mim mesmo: "A sorte do insensato será também a minha; para que então me tornei sábio?" Disse a mim mesmo: "Isso também é vai- dade". Não há lembrança durável do sábio e nem do insensato, pois nos anos vindouros tudo será esquecido: o sábio morre com o insensato (Ecl 2,15 -16).

Relacionando o pensamento coeletiano com o pensamento sartreano, pensa- os na mesma perspectiva, só o homem, em seu processo de ser existencial, reco- nhecerá a real situação das coisas, do mundo e do outro. Dado a este reconheci- mento tanto o homem sábio quanto o insensato morrem, sendo assim tanto o ho- mem em consciência sapiencial e existencial, portanto em consciência fenomenoló- gica, quanto o homem em consciência natural morrem.

Também se compreende, então, que somente o homem, em seu ser sapien- cial, para alcançar os fins utiliza-se da força da sua consciência sapiencial para des- vendar o perceptível, projetando-se em situações. Seria o exemplo, em que o ser humano deseja agir em nome de Deus, então irá se dedicar ao ato de anunciar, de- nunciar e profetizar em nome de Deus, estudando e conhecendo o texto sagrado e as manifestações de um povo, desenvolverá os mecanismos para que a sua ação seja eficaz.

Neste aspecto, coeletianamente situando e mais ainda sartreanamente apoi- ando-se, a existência vem antes do ato de anunciar, denunciar e profetizar em nome de Deus.

É a existência que antecede o ato de afirmar que Deus existe. Sob o ponto de vista de Sartre, embora ele não mencione Deus nesta situação, tudo é desejado pelo homem, tudo vem depois da existência; este ato não inviabiliza o próprio ho- mem de conhecer a Deus.

Enquanto a este ato primeiro, ele é exclusivamente do homem que não crê na existência de Deus; crê sim na própria existência potencializada para afirmar o poder de Deus sobre o outro, sobre o mundo.

O homem neste reconhecimento do poder de Deus sobre todas as coisas constrói significados para si mesmo. Este ato representa o alcance da essência e é o que o define como um ser crente, porém, antes ateu. A partir deste ponto de vista, homem é existência, Deus é essência. Esta situação se equipara na afirmação de que [...] “o homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo; e que poste- riormente se define” (SARTRE, 1978, p. 213). Ou seja, o homem define-se como ser que existe diante de Deus.

Igualmente situação, em Eclesiastes, o ser sapiencial do homem vive o ser para descobrir de fato que tudo é vaidade (Ecl, 1,2; 12,8); assim como Sartre, Coélet não inviabiliza o homem a conhecer Deus119 em sua sapiencialidade.

Deus, primeiramente, sempre está para o outro, para o mundo, pois Ele é o outro, Ele é o mundo e jamais é o ser existencial ou sapiencial do homem. Isto signi- fica que o homem se faz em consciência para conhecer a realidade do ser, obvia- mente se constituindo um ser que existe. “Para a realidade humana, ser se reduz a

fazer; pois nele não há nada dado, adquirido ou inato” (SARTRE, 2007, p. 587).

Deus, quem o nomina é o ser sapiencial do homem, assim induz Coélet. Há aqui um quê de má-fé motivado pela convicção de que o homem“[assume] a sua condição [humana] com todos os limites” (GLASSER, 1975, p. 261). O homem as- sume sua condição em possibilidades, diga-se de passagem, possibilidades huma- nas.

Porquanto, o homem é existência e elege Deus como essência; prova disto é que Deus se torna perceptível na natureza em movimento (Ecl 1, 4-8). Em movimen- to, mas que não muda.

“O homem é um ser que se realiza no tempo oportuno de decisões pessoais” (ANDERSON; GORGULHO, 1991, p. 97). É ele quem toma a decisão se o ser per- ceptível é Deus ou não é Deus e acaba afirmando que Deus é Deus no movimento perceptível.

Este aspecto de que a existência do homem vem antes de qualquer manifes- tação do ser perceptível é pulsante no pensamento de Sartre. Deus não cria nada. “Deus não produz o homem segundo técnicas e percepção (SARTRE, 1978, p. 214). Para o ser existencial do homem não há determinismo, não há fim a ser atingido; há sim, situações a serem projetadas, compreendendo que o ser humano só se projeta quando há possibilidades de existenciar-se diante do ser que recebe a projeção.

Com a visão de que a existência precede a essência, Sartre (1978, p. 216) consegue contrapor o pensamento de que o ser, Deus, domina tudo, ou seja, de que a essência vem primeiro e, a existência humana em segundo plano, colocando o homem como uma existência posterior, uma existência criada.

No entanto, não é função no existencialismo negar Deus, aliás, para o exis- tencialismo Deus não é existência, mas, sim, essência advinda do próprio ato exis- tente do homem, esta constatação é dada, portanto, pelo caráter existencial do ho- mem, aí sim, Deus ou o ser Deus poderá ser conhecido, aspecto este defendido por Coélet.

Para Sartre (1978, p. 213), a compreensão de que só existe essência se o homem de fato vive em existência é marcada porque ele é livre. O homem pode es- colher em negação a outros seres, os quais não possuem a condição de escolher, pois já o são; sendo assim, o homem é a própria a existência, enquanto o ser é ser, é essência, o homem, mesmo sendo um ser, é existência.

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