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A excepcionalidade do Licenciamento Ambiental em áreas não-edificantes

4 LICENCIAMENTO AMBIENTAL: O CONTROLE ESTATAL PREVENTIVO DAS

4.7 A excepcionalidade do Licenciamento Ambiental em áreas não-edificantes

174 Disponível em: <http://www.jb.com.br/ambiental/noticias/2012/06/12/dilma-diz-que-nenhuma-nova- lei-pode-enfraquecer-protecao-ao-meio-ambiente/>. Acesso em: 15 maio 2012.

O Licenciamento Ambiental é o procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente autoriza o projeto, a instalação/construção e o funcionamento/operação dos empreendimentos ou das atividades potencialmente poluidoras, ou capazes, de alguma forma, de causar degradação ambiental, ou, ainda, que utilizem diretamente os recursos ambientais.

Como destacado, o gestor ambiental deverá observar os impactos positivos e negativos de tais empreendimentos e/ou atividades, para decidir, em conformidade com os princípios e demais normas ambientais, se deve ou não conceder a licença pertinente. Contudo, não poderá deixar de atentar, previamente, ao pré-requisito da avaliação da procedência do requerimento de licenciamento, qual seja: a edificabilidade da área.

É condição sine qua non que o órgão licenciador verifique, inicialmente, a área do projeto, devendo esta ser edificável, sob pena de indeferimento imediato da pretensão do empreendedor. Se não é possível intervir diretamente numa determinada área, não sendo possível alterar suas características originais, nem nela edificar ou exercer qualquer tipo de atividade potencialmente degradadora do meio ambiente, em tais casos tampouco se pode cogitar o licenciamento.

As áreas especialmente protegidas resguardam um tratamento especial, regido por leis específicas, e há muitas situações em que serão firmadas como áreas non aedificandi, ou seja, não-edificantes, como é o caso da faixa de praia, das áreas de preservação permanente e da unidades de conservação de proteção integral.

As praias são bens de uso comum do povo, devendo o Poder Público assegurar para a coletividade o sempre livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica, consoante estabelece o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei nº 7.661, de 16 de maio de 1998). Faixa de praia é definida pelo PNGC como “a área coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da faixa subsequente de material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece um outro ecossistema”, não sendo esta passível de construção, como forma de garantir o seu equilíbrio fundamental e o direito difuso a este bem ambiental. Caso seja cogitado o licenciamento em faixa de praia, deverá o licenciador vetar a instalação da obra, ou excluí-la do projeto inicial, com exceção daquelas considerados de interesse de segurança nacional.

Quanto às Áreas de Preservação Permanente (APPs), previstas no art. 4º do Código Florestal, estas também são consideradas não-edificantes, não sendo possível instalar-se

nenhum empreendimento potencialmente poluidor nas mesmas, razão pela qual não poderão ser licenciadas nas mesmas obras, planos, atividades ou projetos.

A Lei 12.651/2012 prevê excepcionalmente algumas hipóteses de intervenção em APP, o que somente ocorrerá em casos de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental. Assim, os órgãos ambientais competentes somente poderão licenciar em APP as atividades previstas expressamente em lei, como é o caso da autorização de intervenção excepcional, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, para execução de obras habitacionais e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda.

Por último, cabe destacar que as Unidades de Proteção Integral (UPIs), previstas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação, tem como objetivo básico a preservação da natureza, somente sendo permitido o uso indireto dos seus recursos naturais. Neste sentido, não podem existir em UPI atividades que envolvam consumo, coleta, ou uso, comercial ou não, de seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos na Lei nº 9.985/2000 (SNUC), sempre de acordo com os seus objetivos e atendendo ao seu Plano de Manejo.

Portanto, nas cinco categorias de UPI (Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural e Refúgio de Vida Silvestre), não será possível o licenciamento de atividades potencialmente poluidoras, por não coadunarem com seus objetivos.

Destarte, é proibida a implementação de empreendimentos ou atividades em áreas especialmente protegidas, de caráter não-edificante, guardadas as exceções legais. Caso tenha havido construção, sem licenciamento ambiental, neste tipo de área, a mesma não será passível de regulamentação, podendo ser determinada a sua demolição ou paralisação, sem prejuízo das demais responsabilidades civis, administrativas e penais cabíveis.

Neste sentido é a jurisprudência pátria, observe-se:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA, OBJETIVANDO A

DEMOLIÇÃO DA CONSTRUÇÃO REALIZADA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE SEM AUTORIZAÇÃO. ANGRA DOS REIS.

SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. DANOS AMBIENTAIS. CORTE DE ÁRVORES E ESPÉCIES ARBUSTIVAS. ÁREA NÃO EDIFICANTE.

REFORMA DA SENTENÇA PARA DETERMINAR A DEMOLIÇÃO DO IMÓVEL NO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS COM A RECOMPOSIÇÃO DA ÁREA E O REPLANTIO DA VEGETAÇÃO CARACTERÍSTICA, NO PRAZO DE 90 (NOVENTA) DIAS. DANOS MORAIS COLETIVOS.

AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL AO APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PREJUDICADO O RECURSO DO MUNICÍPIO DE

ANGRA DOS REIS. 175 (Grifo nosso).

Em idêntico sentido, veja-se:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA, OBJETIVANDO A DEMOLIÇÃO DA CONSTRUÇÃO REALIZADA NA FAIXA MARGINAL DE CÓRREGO, SITUADO NO INTERIOR DO CONDOMÍNIO PORTOGALO. ANGRA DOS REIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. DANOS AMBIENTAIS. PROVA PERICIAL QUE CONCLUIU PELA DESNECESSIDADE DA DEMOLIÇÃO DO IMÓVEL. LOCALIDADE DEGRADADA POR OUTRAS CONSTRUÇÕES. VIOLAÇÃO AO PLANO DIRETOR MUNICIPAL E AO

CÓDIGO FLORESTAL. ÁREA NÃO EDIFICANTE. INEXISTÊNCIA DE

LICENÇA AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO NÃO PASSÍVEL DE

REGULARIZAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA PARA DETERMINAR A DEMOLIÇÃO DO IMÓVEL, NA PARCELA INSERIDA EM FAIXA MARGINAL DE PROTEÇÃO. PROVIMENTO AO RECURSO.176 (Grifo nosso).

Também existem casos onde a atividade ou o empreendimento foi licenciado pelo órgão ambiental em área não passível de construção, em desrespeito às normas de tutela ambiental, lesando direito fundamental ao meio ambiente sadio. Em tais situações, não pode o Judiciário permitir a validade do ato administrativo, haja vista que nulo de pleno direito. É o que se vê do julgado a seguir colacionado:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. BARRACA DE PRAIA

CONSTRUÍDA EM ÁREA NÃO EDIFICANTE. REMOÇÃO. VERIFICADO O

DEVIDO PROCESSO LEGAL. ART 255, CAPUT, DA CF/88. PREVALÊNCIA

DO DIREITO DIFUSO SOBRE O DIREITO INDIVIDUAL. PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. 255CF/88. Versam os autos a respeito da possibilidade ou

não de remoção de barraca de praia, localizada em área não edificante.2.

Documento anexado aos autos que comprova pedido do impetrante de "inscrição de ocupação de imóvel", tendo sido indeferido em razão da construção encontrar-se fincada em área não passível de ocupação, uma vez que corresponde a uma área de praia e bem público de uso comum do povo.

Nove meses depois, foi enviado o ofício pelo Gerente Regional do Patrimônio da União no Estado do Rio grande do Norte, com ordem de remoção, no prazo de 10 dias, dando oportunidade do impetrante interpor recurso com efeito suspensivo à decisão administrativa que concluiu pela irregularidade da edificação de sua barraca. Verificada a obediência ao devido processo legal. 3. O ato administrativo

municipal que permitiu ao impetrante ocupar o bem de uso comum do povo é nulo. Por conseguinte, identificando o erro, seus efeitos são invalidáveis ex tunc, não sendo possível serem convalidados pela Administração Pública, muito menos pelo Judiciário. A situação jurídica em relevo nunca esteve consolidada porque sempre houve uma ilegalidade insanável, um desvio de finalidade pública na sua ocupação do bem de uso comum do povo. Não poderiam a

175 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 42080920068190003 RJ 0004208-

09.2006.8.19.0003. Sexta Câmara Cível. Relatora: Claudia Pires. Data do julgamento:18 de janeiro de 2012. Data da Publicação: 30 de janeiro de 2012. Disponível em

<http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21276391/apelacao-apl-42080920068190003-rj-0004208- 0920068190003-tjrj>. Acesso em: 24 de abr. de 2012.

176 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 208380920078190003 RJ 0020838-

09.2007.8.19.0003. Sexta Câmara Cível. Relatora: Claudia Pires. Data do julgamento:03 de novembro de 2011. Data da Publicação: 28 de setembro de 2011. Disponível em

< http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/20615299/apelacao-apl-208380920078190003-rj-0020838- 0920078190003-tjrj >. Acesso em: 24 de abr. de 2012.

União, o Estado e o Município expedir qualquer ato administrativo para permitir a sua ocupação, em razão da indisponibilidade do patrimônio público.4. O artigo 225, caput, da Constituição Federal, menciona o meio ambiente

como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. O direito difuso do meio ambiente equilibrado deve prevalecer sobre o direito individual de livre uso de uma propriedade. A construção desordenada de barracas de praias e

a sua consequente produção de esgotos termina por contaminar a praia e o mar, causando poluição e degradação de todo o meio ambiente praieiro, afetando gravemente a balneabilidade das praias e, consequentemente, a saúde de seus frequentado. Res. 5. Apelação provida.177 (Grifo nosso).

Em casos como este, não apenas o poluidor responderá objetivamente pelos danos causados ao meio ambiente, mas também o órgão que licenciou em desconformidade com a Constituição Federal, princípios e demais normas do direito ambiental, eis que prevista legalmente a responsabilidade solidária do Poder Público.