• Nenhum resultado encontrado

Sujeito ativo do dano ambiental: o poluidor

3.2 Dano Ambiental

3.2.5 Sujeito ativo do dano ambiental: o poluidor

O Poluidor, responsável juridicamente, definido pela lei da PNMA99, pode tanto ser

pessoa física como jurídica, seja de direito público ou privado. Assim, não apenas as pessoas físicas serão responsabilizadas pelas lesões causadas ao bem ambiental, mas também as pessoas jurídicas.

A Carta Magna reforçou tal entendimento ao atribuir, em seu caput, ao Poder Público (pessoas jurídicas de direito público) e à coletividade (pessoas físicas e pessoas jurídicas de direito privado) o poder-dever de defender e preservar o meio ambiente sadio, e ao conceituar, em seu parágrafo 3º, os infratores, responsáveis pelas condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, como pessoas físicas ou jurídicas, podendo estes ser responsabilizados nas três esferas (civil, administrativa e penal) de responsabilidade.

A sensibilidade do legislador e do constituinte em atribuir a responsabilidade pelos danos ambientais não somente às pessoas físicas, mas igualmente às pessoas jurídicas, tanto no âmbito da reparação civil, como nas esferas administrativa e penal, foi de extrema importância para a tutela do meio ambiente, eis que os maiores responsáveis pelas degradações ambientais são as empresas, e não a população de forma geral.

Mister salientar que os entes da Administração Pública direta ou indireta também estão insertos na acepção legal de poluidor - plenamente recepcionada pela Constituição Federal -, em virtude da sua inegável responsabilidade na defesa e preservação do meio ambiente, devendo estes efetivar não apenas uma adequada política pública voltada à proteção ambiental, mas igualmente responder pelas lesões que decorram de suas atividades ou omissões que lesem, direta ou indiretamente, o bem-estar ambiental.

Sobre a responsabilidade do Estado Milaré100 afirma:

As pessoas jurídicas de direito público interno, como vimos, podem ser responsabilizadas pelas lesões que causarem ao meio ambiente. De fato, não é só

99 Lei 6.938/81, art. 3º, IV - “poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (BRASIL, 1981)

como agente poluidor que o ente público se expõe ao controle do Poder Judiciário (p. ex., em razão da construção de estradas, aterros sanitários, troncos coletores e emissários de esgoto sanitário, sem a realização de estudo de impacto ambiental), mas também quando se omite do dever constitucional de proteger o meio ambiente (falta de fiscalização, inobservância das regras informadoras dos processos de licenciamento, inércia quanto à instalação de sistemas de disposição de lixo e tratamento de esgotos, p. ex.).

Assim, o Poder Público, como gestor dos bens ambientais, deve assegurar a existência e/ou manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para permitir ao Poder Público o cumprimento desse dever, a Constituição Federal e diversas normas específicas, preveem a intervenção estatal, manifestada por diversos mecanismos que vão desde a prevenção, por meio de licenciamento e Estudo Prévio de Impacto Ambiental, até a suspensão das atividades, assegurando o pleno exercício do poder de polícia ambiental.

No caso de não cumprimento do poder-dever estatal em prestar efetiva tutela ao bem ambiental, deve o Poder Público responder solidariamente com aqueles que contribuíram com do dano ao meio ambiente. Isto porque não pode a sociedade assumir os riscos e consequências das atividades ou omissões estatais (lato sensu), sendo a absorção dos impactos negativos de responsabilidade daqueles que lesam, direta ou indiretamente, inclusive das pessoas jurídicas de direito público.

Machado101 registra que, nos casos de ineficiência dos entes da Administração

Pública, direta ou indireta, em garantir a todos um equilíbrio ambiental adequado, deve ensejar em responsabilidade, como forma de compelir o Poder Público a ser prudente e cuidadoso no vigiar da saúde ambiental:

Os Estados passam a ter responsabilidade em exercer um controle que dê bons resultados, e devem ser responsáveis pela ineficiência na implementação de sua legislação. A co-responsabilidade dos Estados deverá atingir os agentes políticos e funcionários, para evitar que os custos da ineficiência ou das infrações recaiam sobre a população contribuinte, e não sobre os autores dos danos ambientais.

O Superior Tribunal de Justiça tem aplicado a responsabilidade solidária aos entes do Poder Público, no caso de danos indiretos à qualidade e ao equilíbrio ambiental. Neste sentido, colaciona-se o seguinte precedente:

PROCESSUAL CIVIL. AMBIENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE DO ESTADO DE SÃO PAULO FIGURAR NO PÓLO PASSIVO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ.

101 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 17. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 52.

OFENSA AO ART. 535 DO CPC REPELIDA.

1. Não existe ofensa ao art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de modo claro e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, é cediço nesta Corte que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos listados pelas partes se ofertou a prestação jurisdicional de forma fundamentada.

2. A decisão de primeiro grau, que foi objeto de agravo de instrumento, afastou a preliminar de ilegitimidade passiva porque entendeu que as entidades de direito público (in casu, Município de Juquitiba e Estado de São Paulo) podem ser arrostadas ao pólo passivo de ação civil pública, quando da instituição de loteamentos irregulares em áreas ambientalmente protegidas ou de proteção aos mananciais, seja por ação, quando a Prefeitura expede alvará de autorização do loteamento sem antes obter autorização dos órgãos competentes de proteção ambiental, ou, como na espécie, por omissão na fiscalização e vigilância quanto à implantação dos loteamentos.

3. A conclusão exarada pelo Tribunal a quo alinha-se à jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, orientada no sentido de reconhecer a legitimidade passiva de pessoa jurídica de direito público para figurar em ação que pretende a responsabilização por danos causados ao meio ambiente em decorrência de sua conduta omissiva quanto ao dever de fiscalizar. Igualmente, coaduna-se com o texto constitucional, que dispõe, em seu art. 23, VI, a competência comum para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que se refere à proteção do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas. E, ainda, o art. 225, caput, também da CF, que prevê o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

4. A competência do Município em matéria ambiental, como em tudo mais, fica limitada às atividades e obras de "interesse local" e cujos impactos na biota sejam também estritamente locais. A autoridade municipal que avoca a si o poder de licenciar, com exclusividade, aquilo que, pelo texto constitucional, é obrigação também do Estado e até da União, atrai contra si a responsabilidade civil, penal, bem como por improbidade administrativa pelos excessos que pratica.

5. Incidência da Súmula 83/STJ. 6. Agravo regimental não-provido.102

Neste sentido, caso a Administração Pública tenha licenciado irregularmente uma atividade ou um empreendimento potencialmente poluidor, ou tenha se omitido de fazê-lo ou de fiscalizá-lo adequadamente, e, em decorrência disso, tenha ocorrido um dano ambiental, será o Poder Público responsável solidariamente por repará-lo e indenizá-lo.

Consoante anteriormente destacado, a responsabilidade civil pelos danos ambientais é de caráter objetivo, sendo necessário para a sua configuração apenas aquilatar o nexo causal entre o dano e a atividade poluidora, sem importar o fator culpa. A responsabilidade civil objetiva pelos danos causados ao meio ambiente foi prevista pioneiramente na Lei da PNMA, em seu art. 14, parágrafo 1º, o qual estabelece que “é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”, havendo tal artigo sido recepcionado pela Carta Magna

102 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 973.577/SP. Rel.

Ministro Mauro Campbell Marques, segunda turma, julgado em 16/09/2008, publicado em 19/12/2008. Disponível em <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2353490/agravo-regimental-no-agravo-de- instrumento-agrg-no-ag-973577-sp-2007-0275202-0-stj>. Acesso em 16 de jun. 2012.

de 1988, no suso mencionado art. 225, parágrafo 3º.

Contudo, é preciso anotar que algumas decisões dos tribunais pátrios têm se posicionado no sentido de que, para impor a responsabilidade civil aos entes públicos, nos casos de omissão, deve-se apurar se houve descumprimento de previsão normativa expressa, sendo esta, excepcionalmente, de aplicabilidade subjetiva. Observe-se o seguinte julgado do STJ:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO AMBIENTAL. EMPRESAS MINERADORAS. CARVÃO MINERAL. ESTADO DE SANTA CATARINA. REPARAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR OMISSÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.

1. A responsabilidade civil do Estado por omissão é subjetiva, mesmo em se tratando de responsabilidade por dano ao meio ambiente, uma vez que a ilicitude no comportamento omissivo é aferida sob a perspectiva de que deveria o Estado ter agido conforme estabelece a lei.

2. A União tem o dever de fiscalizar as atividades concernentes à extração mineral, de forma que elas sejam equalizadas à conservação ambiental. Esta obrigatoriedade foi alçada à categoria constitucional, encontrando-se inscrita no artigo 225, §§ 1º, 2º e 3º da Carta Magna.

3. Condenada a União a reparação de danos ambientais, é certo que a sociedade mediatamente estará arcando com os custos de tal reparação, como se fora auto- indenização. Esse desiderato apresenta-se consentâneo com o princípio da eqüidade, uma vez que a atividade industrial responsável pela degradação ambiental – por gerar divisas para o país e contribuir com percentual significativo de geração de energia, como ocorre com a atividade extrativa mineral – a toda a sociedade beneficia.

4. Havendo mais de um causador de um mesmo dano ambiental, todos respondem solidariamente pela reparação, na forma do art. 942 do Código Civil. De outro lado, se diversos forem os causadores da degradação ocorrida em diferentes locais, ainda que contíguos, não há como atribuir-se a responsabilidade solidária adotando-se apenas o critério geográfico, por falta de nexo causal entre o dano ocorrido em um determinado lugar por atividade poluidora realizada em outro local.

5. A desconsideração da pessoa jurídica consiste na possibilidade de se ignorar a personalidade jurídica autônoma da entidade moral para chamar à responsabilidade seus sócios ou administradores, quando utilizam-na com objetivos fraudulentos ou diversos daqueles para os quais foi constituída. Portanto, (i) na falta do elemento "abuso de direito"; (ii) não se constituindo a personalização social obstáculo ao cumprimento da obrigação de reparação ambiental; e (iii) nem comprovando-se que os sócios ou administradores têm maior poder de solvência que as sociedades, a aplicação da disregard doctrine não tem lugar e pode constituir, na última hipótese, obstáculo ao cumprimento da obrigação.

6. Segundo o que dispõe o art. 3º, IV, c/c o art. 14, § 1º, da Lei n. 6.938/81, os sócios/administradores respondem pelo cumprimento da obrigação de reparação ambiental na qualidade de responsáveis em nome próprio. A responsabilidade será solidária com os entes administrados, na modalidade subsidiária.

7. A ação de reparação/recuperação ambiental é imprescritível.

8. Recursos de Companhia Siderúrgica Nacional, Carbonífera Criciúma S/A, Carbonífera Metropolitana S/A, Carbonífera Barro Branco S/A, Carbonífera Palermo Ltda., Ibramil - Ibracoque Mineração Ltda. não-conhecidos. Recurso da União provido em parte. Recursos de Coque Catarinense Ltda., Companhia Brasileira Carbonífera de Ararangua (massa falida), Companhia Carbonífera Catarinense, Companhia Carbonífera Urussanga providos em parte. Recurso do Ministério Público provido em parte.

(Grifo nosso)103

Portanto, em conformidade com este último posicionamento do STJ, somente em casos de irregularidade no licenciamento ambiental, o órgão ambiental e os servidores envolvidos no ilícito administrativo seriam responsáveis objetivamente pelos danos ambientais causados pelo empreendimento licenciado irregularmente, e desde que haja o nexo causal entre a irregularidade administrativa e o dano havido. Nas hipóteses de omissão estatal, a responsabilidade do Poder Público pelos danos causados ao meio ambiente seria, excepcionalmente subjetiva, sendo necessário averiguar, em cada caso em concreto, o descumprimento de uma obrigatoriedade legal firmada para a fiscalização da atividade pelo Poder Público.

Ocorre que, se pensarmos de forma mais abrangente, a incumbência do Poder Público de defender e tutelar o meio ambiente já está firmada de forma clara e expressa nos artigos 225, caput e demais parágrafos, 23, inc. III, VI e VII, 170, VI, e vários outros aqui já mencionados, todos da Constituição Federal, razão obvia pela qual prescinde de previsão legal a obrigação estatal de defender o bem tutelado na esfera ambiental.

Destarte, discordamos deste último posicionamento do STJ, para afirmar, de forma categórica, que o constituinte permite a aplicabilidade da responsabilidade solidária ao Poder Público omisso no seu dever de proteger o equilíbrio ambiental, desde que demonstrado o nexo de causalidade entre a sua omissão e o dano instaurado, independentemente da averiguação de norma legal específica nesse sentido.

Segundo entendemos, toda pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que contribuir, direta ou indiretamente, através de uma ação ou omissão, para uma lesão ao equilíbrio ambiental, será sujeito ativo do dano ao meio ambiente, e deverá responder objetivamente na esfera civil, de forma individual ou solidária, pelos danos, potenciais ou efetivos, por ele ocasionados.