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A FORMAÇÃO PARRESIASTA NAS FORÇAS ARMADAS

A personalidade que Thompson adquiriu na infância e adolescência o acompanharia pelo resto de sua vida. Criando as próprias regras de comportamento e não abrindo mão da sua maneira de ser, ele começou a apresentar cedo as características que formam o parresiasta. Tomando atitudes que muitas vezes tinham o objetivo de questionar o que estava estabelecido como norma, ele começava a ser o interpelador crítico que faz uso da sua parresía, afinal, “o parresiasta é o indefinido, o permanente, o insuportável interpelador” (FOUCAULT, 2011, p. 18). Curiosamente foi através da Força Aérea Americana, em meio à rigidez militar, que Thompson ingressou no jornalismo, fato esse que possibilitaria a ele publicar as suas ideias e o seu discurso.

Quando chegou à base militar, ele estava acostumado a ditar as suas próprias regras, e teve que se adaptar a um sistema em que tinha que se submeter a todos os tipos de autoridades, conforme relata o amigo Doug Brinkley: “Imagine um espírito rebelde que está sendo forçado a montar acampamento e fazer exercícios, comer no refeitório e ter que manter suas botas polidas perfeitamente e deixá-las brilhando” (WENNER; SEYMOUR, 2007, p. 22). O amigo lembra que Thompson tentava se vangloriar das pequenas quebras de normas, entretanto, “em 99% do tempo era „sim, senhor!‟”. Ao contrário do que poderia se esperar, conforme o depoimento de quem conviveu com Thompson no período, ele respeitava a maioria dos oficiais, inclusive, tornando-se amigo de alguns deles.

O grande problema que Thompson encontrou quando ingressou no serviço militar, não foram as autoridades, mas sim, o fato de que queriam que ele estudasse números e se tornasse um eletricista. “Ele tinha medo de eletricidade, e eles queriam transformar ele em um eletricista. Para Hunter, isso simbolizava o seu problema com o serviço militar” (MCKEEN, 2008, 21).

Nessa primeira saída de Thompson de casa, começam a aparecer outras duas características que o acompanhariam pelo resto da vida: a sua relação complicada, mas que nunca terminava, com Louisville; e a fala franca e agressiva utilizada, inicialmente, nas

cartas enviadas a amigos e familiares. Inclusive, em uma delas, Thompson escreveu: “Louisville é um bom lugar para crescer e um bom lugar para se manter distância” (MCKEEN, 2008, p. 22).

Inicialmente, quando entrou no serviço militar, Thompson queria ser piloto. Porém, os planos dos militares era torná-lo um eletricista. E assim ele foi mandado primeiramente para Scott Air Force Base, perto de Belleville, Illinois. Nas cartas, Thompson contava que havia se dado bem nos testes, tirando boas notas, mas que odiava o que fazia. Quando foi para o treinamento de inteligência militar, ele recusou a aceitar o certificado de segurança da Força Aérea, justamente por não concordar com o lema adotado no exército americano. Em depoimento resgatado por McKeen, ele disse: “Honestamente, eu não poderia me considerar um bom profissional de segurança, porque eu discordo fortemente com o slogan „Meu país, certo ou errado‟” (MCKEEN, 2008, p. 24). Mesmo ainda sem apresentar todas as características da parresía, como por exemplo, emitir o discurso no espaço público, com tal atitude Hunter começava a se expor diante dos seus superiores. Ao recusar o certificado, ele abriu a possibilidade de ser mandado de volta para a prisão. Essa coragem para falar a um militar superior de que ele não concorda com o lema do exército americano, mostra que desde cedo Hunter não hesitava na hora de assumir riscos por expor o que pensava, começando, assim, a fazer o uso de sua parresía.

A parresía, portanto põe em risco não apenas a relação estabelecida entre quem fala e aquele a quem é dirigida a verdade, mas, no limite, põe em risco a própria existência daquele que fala, se em todo caso seu interlocutor tem um poder sobre aquele que fala e se não pode suportar a verdade que este lhe diz (FOUCAULT, 2011, p. 12-13).

Porém, ao invés de ser enviado de volta para a prisão, a atitude rebelde de Thompson resultou em uma transferência para Eglin Air Force Base, na Flórida, entre Tallahassee e Pensacola. Lá a sua vida começou a mudar definitivamente. Ele passou a frequentar aulas de literatura de noite na Florida State University. Ao saber que Hunter iria começar o curso, o diretor de educação da base conversou com ele, que disse que havia odiado o serviço em Illinois. Então, o diretor convidou Hunter para ser o editor de esportes do jornal da Força Aérea. Tratava-se de um jornal semanal, chamado Command Corrier. No entanto, a sua primeira matéria assinada saiu apenas um mês depois, em 30 de agosto de 1956. E foi então que o jornalismo passou a entrar na vida dele. Hunter adorou porque fazia o trabalho praticamente sozinho, então, ele tinha liberdade para programar a sua agenda e os seus horários. “Ser um jornalista para o jornal da base era o mais perto que ele

poderia chegar de ser um civil” (MCKEEN, 2008, p. 26). Para o seu trabalho, ele consultava a biblioteca da base, lendo textos sobre jornalismo e linguagem jornalística. Assim, como ele já tinha um bom conhecimento sobre linguagem esportiva, ele passou a escrever facilmente para o jornal. Isso também garantiu um bom relacionamento entre ele e os seus superiores.

O jornal da força aérea foi uma boa escola para o que Hunter iria fazer no futuro, pois ele era responsável por tudo, desde a diagramação, passando pela montagem da página, até as fotografias de suas reportagens. Então, ao mesmo tempo ele desenvolvia a sua formação jornalística e o seu estilo, que caminhava para um jornalismo parresiastico mais nas suas cartas, que às vezes eram irônicas, em outras, cheia de humor, e noutras tomadas de fúria, mas que sempre tinham a característica de relatar como estava a vida dele e o que ele pensava. Como ressalta Douglas Brinkley, editor dos dois volumes de cartas que foram publicados em forma de livro, Hunter sempre fazia cópias de carbono de suas cartas, o que demonstrava a sua intenção, já em 1955, de que ele gostaria de publicar o que ele pensava sobre o que ele via e vivia. Conforme Brinkley, a primeira carta guardada por Thompson data de 1947, ou seja, quando ele estava com dez anos. Nela, Hunter escreveu para o jornal Courier-Journal, para oferecer as suas histórias, feita para o jornal rudimentar que ele e seus amigos haviam inventado, o já mencionado The Southern Star.

Em uma dessas cartas, escrita quando Hunter tinha 18 anos, ele expôs as suas ideias sobre o que ele considerava ser o seu bem mais precioso: a liberdade. E, assim, ele escreveu para o The Spectator um texto chamado Security, em que ele criticava aquelas pessoas que optavam pelo caminho mais estável e mais cômodo em nome da segurança. Essa ideia demonstra como seria a sua filosofia de vida. Falando sobre o homem que opta pelo segurança, ele escreveu:

Se ele pensa que isso tudo está bem e bom, legal, mas pense na tragédia de um homem que tem sacrificado a sua liberdade pelo altar da segurança, e deseje que ele pudesse voltar atrás colocando as suas mãos no tempo. Um homem é digno de pena se não teve a coragem de aceitar o desafio da liberdade e afastar-se da almofada da segurança e ver a vida como ela é, ao invés de vivê-la de segunda mão (THOMPSON, 1998, p. 4-5).

Em outra carta, escrita da base na Flórida para o amigo Gerald Tyrrel, ele abre o texto com um sonoro “AALLLLLLOOOOOOOOO...!” (THOPSON, 1998, p. 11). Nessa mesma carta, como em outras, escritas para pessoas como a mãe Virgínia Thompson, ele

demonstra intensa empolgação por ingressar no jornal. Porém, em determinado trecho ele comenta sobre a pressão da função: “embora creio que agora tenho o melhor trabalho que eu poderia ter na Força Aérea, fazendo o papel do experiente e competente jornalista, isso está sendo uma pressão sobre o meu sistema nervoso” (THOMPSON, 1998, p. 12).

Foi a partir dessa experiência que Hunter começou a criar um estilo próprio para fazer as suas reportagens, não ficando apenas no jornalismo convencional. Hunter criou uma coluna própria, que se chamava The Spectator, em que ele fazia um texto opinativo escrevendo sobre o assunto que lhe agradasse. Além disso, ele começou a usar uma técnica que seria comum em seus textos gonzos: a falsa nota do editor. Também foi nesse período que ele perdeu pela primeira vez em anos um Kentucky Derby, evento de turfe de Louisville, que seria o tema da cobertura de sua primeira matéria gonzo, conforme abordado mais adiante.

Então, nesse período, Thompson passou a conciliar o curso de literatura e o trabalho no jornal, aperfeiçoando o seu estilo. “A rotina semanal lubrificou a prosa de Hunter, e em breve ele começou a cortar o grosso das sentenças e as estruturas estranhas. Clichês eram cortados e raramente ele omitia a sua opinião em suas colunas” (MCKEEN, 2008, p. 29). Já em carta ao seu irmão Jack Thompson, escrita em 24 de outubro de 1956, ele narra como era a sua rotina na Flórida:

Ontem eu fui trabalhar as 7:15, e fiquei até às 5:00; com uma hora de folga de meio dia para o almoço. Eu perdi a janta e tive que correr para fazer a aula de Discurso das 6:00. Eu tive que perder a aula de Psicologia para poder ir cobrir as partidas de luta livre, que iam das 8:00 até às 10:00. Às 10:00 eu voltei para o escritório e comecei a história sobre as lutas, terminando isso por volta da meia- noite. Nessa hora o meu fotógrafo chegou com as fotos, e eu gastei mais uma hora cortando e legendando elas (THOMPSON, 1998, p. 17).

Na mesma carta ao irmão, Hunter também se queixava dos prazos para fechar as edições do jornal, perdendo peso e tomando cerca de 20 copos de café por dia. Mas, a liberdade que ele passou a adquirir, compensava todo o esforço, pois não havia ninguém por perto para dizer “faça isso Hunter, faça aquilo Hunter, comporte-se Hunter” (THOMPSON, 1998, p. 18).

Jerry Hawke, que serviu na força aérea de junho de 1955 até maio de 1957, assinando para a Informação Pública Oficial do Campo Eglin, na Flórida, por sua vez explica em depoimento a Wenner e Seymour (2007) que Thompson colaborava clandestinamente para um jornal civil local, o Fort Walton Playground, que era um

semanário de Fort Walton Beach, onde ele escrevia aquilo que não lhe era permitido no jornal militar.

O período em que esteve na Força Aérea também é abordado brevemente em um de seus textos publicados em Reino do Medo, intitulado Sally, em que o jornalista conta sobre o caso que teve com a filha de um coronel. Certa vez, após fazerem sexo na prancha de uma piscina, Thompson foi trabalhar com os joelhos sangrando. O que inicialmente virou motivo de riso aos outros editores causou a ira do chefe, um coronel chamado Evans. Para não contar a verdade, ele inventou que se machucou jogando futebol americano, aumentando ainda mais a ira de seu superior.

“A meu Deus!”, ele gritava. “Você é burro pra cacete, heim! Por que Merda você

está tentando jogar futebol americano nesta época do ano? Você tem merda no lugar de cérebro, é? [...]. Estamos na porra da temporada do beisebol [l...] você é idiota demais pra saber que é temporada de beisebol? [...] Você é alguma espécie

de ASNO HUMANO?”

“Não”, eu dizia. “Sou editor de Esportes”. (O que era verdade.) O coronel

detestava isso, mas estava de mãos amarradas (THOMPSON, 2007, p. 88).

Nos depoimentos colhidos por Wenner e Seymour (2007), Gene McGarr, que viveu e trabalhou com Thompson pouco antes dele ter saído da Força Aérea, conta que desde o início o jornalista mesclava realidade com ficção em suas matérias, quebrando completamente as normas da profissão ao inventar uma reportagem sobre um suposto motim na base de Eglin. Na narrativa, Thompson relatava que os alistados teriam roubado bebidas, ficando embriagados, além de que teriam batido nos oficiais e atacado suas mulheres. Em outro texto, ele apresentou um colega seu de base, Gene Espeland, como reforço do time de baseball Boston Celtics. Hunter apresentou o colega como: “um dos mais coloridos atletas a vestir o uniforme Eglin, Gene é o que eles chamariam na França „un type‟” (MCKEEN, 2008, p. 30).

Apesar dos textos ousados, e possivelmente por escrever sobre esportes, Hunter era popular entre a maioria dos colegas e superiores. Mas não entre todos. Um colega no jornal da base, Joe Gonzalez, conta:

Eu não gostava dele. Ele era um egoísta. Ele sempre dizia para você: “Em 20

anos, você ainda estará escrevendo para o jornal da base, e eu estarei escrevendo Best-sellers”. Esse era o tipo de pessoa que ele era. Ele era uma espécie de sanguessuga. Ele sempre estava pedindo dinheiro emprestado para os outros e fazendo viagens com esse dinheiro, e ele nunca pagava ninguém de volta (MCKEEN, 2008, p. 30).

Aliás, as possibilidades de se conquistar antipatia quando se opta pela fala franca, é alta. Afinal, “o dizer-a-verdade do parresiasta assume os riscos da hostilidade, da guerra, do ódio e da morte” (FOUCAULT, 2011, p. 24). A queixa do colega também revela algo que esteve presente em boa parte da vida de Hunter Thompson: a falta de dinheiro. Nesse período, ele chegou a escrever para o irmão, Jack Thompson: “A pobreza ainda me rói. Estou indo ver um homem amanhã para ver se consigo um emprego como vendedor de aspirador de pó” (THOMPSON, 1998, p. 21). Já em outra carta datada de três de fevereiro de 1957, enviada para uma ex-namorada, Judy Stellings, ele escreveu: “Eu tenho agora a grande soma de 4 dólares que devem me durar até o dia 15 de fevereiro, mas eu estou consideravelmente melhor do que o meu fotógrafo, que tem apenas dez centavos. É uma vida agitada” (THOMPSON, 1998, p. 40).

Enquanto isso, as notícias falsas, a rebeldia e outros descumprimentos de normas da base, passaram a irritar cada vez mais o seu superior, Coronel Evans. Em pouco tempo, Evans escreveu a carta de dispensa de Thompson, justificando no texto a decisão tomada: “De vez em quando sua rebeldia e atitudes de superioridade parece influenciar os outros membros da base. Ele tem pouca consideração pela vida e uniforme militar e parece não gostar do serviço, querendo sair o mais breve possível” (MCKEEN, 2008, p. 34). Assim, em novembro de 1957 ele estava fora das Forças Armadas. No entanto, antes de partir, ele escreveu o seguinte texto, que foi publicado no Command Currier:

Em um ato iconoclasta aparentemente incontrolável, Thompson recebeu alta hoje depois de apresentar uma das carreiras mais agitadas e incomuns na história recente da Força Aérea. De acordo com o Capitão Munnington Thurd... „Eu quase tive um acidente vascular cerebral ontem quando eu ouvi que ele estava sendo dispensado honrosamente. Isso é terrível – simplesmente terrível (MCKEEN, 2008, p. 34-35).

Terminado o serviço militar na Força Aérea, Hunter foi procurar emprego na única coisa que ele sabia fazer: escrever. Foi então que, em dezembro de 1957, ele respondeu a um anúncio que divulgava uma vaga para editor de esportes em uma pequena cidade chamada Jersey Shore, na Pennsylvania, com pagamento de 325 dólares por mês. Entretanto, ao chegar lá, ele se deparou com uma cidade antiga e tomada de pó de carvão pelo ar, que, conforme o depoimento do amigo Gene McGarr era “terrível, e não havia nenhuma mulher na cidade que valia a pena olhar” (WENNER; SEYMOUR 2007, p. 25). O jornalista alugou um quarto em um bar e começou a trabalhar para o jornal descrevendo corridas de cavalo, lutas e outros esportes menos populares. Para driblar a monotonia de

suas pautas, ele aumentava os acontecimentos, descrevendo, por exemplo, que um lutador saiu do ringue com as costas arrebentadas ou com o pescoço quebrado em três lugares. “O Herald era um jornal que saía de tarde, então ele trabalhava das sete da manhã e terminava por volta das duas da tarde” (MCKEEN, 2008, p. 37). Porém, ter que se submeter a ordens e a um chefe, fazia com que ele não gostasse do trabalho. Em carta escrita para a sua mãe no final de 1957, ele disse: “Francamente, o jornal não é bom. O estresse aqui está voltado para a velocidade e eficiência, ao invés de qualidade” (THOMPSON, 1998, p. 77).

Após dois meses, a filha do editor do jornal foi para a cidade para passar o Natal e, então, Thompson a conheceu e se envolveu amorosamente com ela. Certo dia, após levar ela de carro para um lugar isolado para namorar, Thompson atola o veículo do chefe às duas da manhã. Depois de caminhar um pouco, ele encontra uma casa de campo com um trator do lado de fora que está com a chave na ignição. Então, o jornalista encontra uma corrente, que amarra em torno do para-choque do carro, e liga o trator para desatolar o carro, porém, com o impacto, ele acaba arrancando o amortecedor. É então que a narrativa se torna mais dramática e cômica, ao melhor estilo Thompson, conforme é relatado por de Gene McGarr:

A essa altura, o fazendeiro já está correndo ladeira abaixo com uma espingarda. Hunter explica tudo para o agricultor, que se acalma, e decide ajudá-lo. Ele lhe

mostra, basicamente, como você não pode colocar a corrente no “para-choque,

seu idiota, você deve colocá-la no eixo”. Assim, ele coloca no eixo e os reboca. Hunter está no banco do motorista e tem a porta aberta e está olhando para trás para ver para que lado dirigir, mas não percebe que há uma árvore. Ele bate a porta na árvore, que dobra completamente para a frente. Agora ele tem uma porta e um para-choque pendurados no carro (WENNER; SEYMOUR, 2007, p. 26).

Conforme o mesmo relato dado aos autores, ao chegar na casa do editor com sua filha assustada e o carro completamente destruído, Thompson vai para o jornal, recolhe suas coisas, e ao ouvir um barulho de raspagem horrível descendo a rua, ele saí porta afora, pega o seu carro, e segue imediatamente para Nova York. “Esse foi o fim da sua experiência em Hersey Shore, Pennsylvania” (WENNER; SEYMOUR, 2007, p. 26).

Depois dessa experiência, ele foi para Nova York, na seguinte condição, descrita em carta: “Eu tenho 119 dólares, uma caixa de comida, um carro arrebentado, e um quarto temporário em um apartamento decadente” (THOMPSON, 1998, p. 85). O quarto no apartamento decente era do amigo e ex-colega da Aeronáutica, Jarryt Hawke, que o recebeu em Nova York. Ficou estabelecido que Thompson não precisaria pagar o aluguel, mas ficaria como responsável por manter a casa em ordem e cozinhar. Hawke conta que, ao

chegar na cidade, Thompson se matriculou em alguns cursos na Faculdade de Estudos Gerais da Universidade de Columbia. O prédio era próximo à universidade, ficando localizado em Morningside Drive, no Harlem, norte da ilha de Manhattan. Além disso, Hunter começou a procurar emprego partindo dos principais jornais, como o New York Times, Herald Tribune, e assim por diante. Como rapidamente ele ficou sem dinheiro, ele aproveitava o tempo livre para ler e escrever.

Imagem 10: O prédio número 110, em Morningside Drive, no Harlem, em Nova York, primeira moradia de Thompson na cidade.

Fonte: arquivo pessoal do autor.

Ao seu colega de quarto, John Clancy, ele explicou qual era o seu plano. Clancy, em depoimento a Wenner e Seymour, assim comentou:

Hunter costumava nos falar que ele iria se tornar um ótimo escritor – ele mencionaria Hemingway e Fitzgerald na mesma sentença – mas que ele teria que fazer algum tipo de jornalismo para ganhar a vida. Ele não gostava muito disso, mas percebi que se Hemingway conseguiu, ele também conseguiria (WENNER; SEYMOUR, 2007, p. 28).

De fato foi o que Thompson procurou fazer, até criar o jornalismo gonzo. Porém, antes disso, logo depois de Hersey Shore, Thompson foi trabalhar como copyboy na revista Time, onde foi colega de Gene McGarr. O amigo descreve como era esse trabalho: “Você entrega jornais de manhã e deixa uma cópia na sala do editor e do escritor, uma para o escritor e outra para o editor e assim por diante. Um trabalho de bajulação” (WENNER; SEYMOUR,

2007, p. 29). O trabalho lhe renderia 200 dólares por mês. Nesse período ele se muda para a 113 Street, em West Side Highway, ainda próximo a Columbia, aonde ele chegou a começar a estudar.

Imagem 11: O prédio no cruzamento da 113 Street com a Brodway, ainda no Harlem, em Nova York. Nesse período ele intensificou as suas leituras.

Fonte: arquivo pessoal do autor.

Pegando livros na biblioteca da universidade, ele começou a ler uma série de clássicos, como Norman Mailer, Jean-Paul Sartre, Thomas Jefferson, Aldous Huxley, Hemingway e Fitzgerald, autor do seu livro favorito. Ele dizia para os amigos “Eu quero aprender com os melhores” (MCKEEN, 2008, p. 42). McGarr, por sua vez, acrescenta que a