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A implementação e a avaliação do projeto político-pedagógico

CAPÍTULO 3 O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO COMO ESTRATÉGIA DE

3.6 A implementação e a avaliação do projeto político-pedagógico

Tal como a elaboração do projeto político-pedagógico, a fase de implementação constitui-se em um processo complexo que requer reflexão, diálogo, intercâmbio e disposição para promover contínua redefinição nas concepções e nas ações conforme as vivências dos sujeitos. Isso porque o contexto escolar é dinâmico, influenciado pela sociedade e pelo sistema educacional, pela diversidade de valores históricos e pelas motivações dos sujeitos escolares que tornam impossível, na elaboração do projeto, a previsão das variáveis que interferem na realização do que é planejado. Portanto, conferir vida ao projeto requer contínuas adaptações e reformulações.

No que se refere à complexidade dessa fase, Pressman e Wildavsky (1998, p. 55) advertem que a implementação do planejado em circunstâncias comuns apresenta sérios obstáculos, sendo custoso apreciar a dificuldade de fazer com que o ordinário aconteça. Os autores consideram a implementação como “[...] um proceso de interacción entre la fijación de metas y las acciones engranadas para alcanzarlas”. Subirats (1994) entende que o ato de implementar coloca-se para além de executar um programa, visto que o termo executar traz uma conotação de automatismo distante do que acontece na realidade. Assim, a implementação não se reduz ao alcance de objetivos, vez que está sujeita às situações que distanciam os sujeitos daquilo que programaram.

Entendemos que a implementação do projeto político-pedagógico é um contínuo processo de reflexão e de ação dos atores escolares orientados por objetivos, por políticas e por estratégias que norteiam a atuação sobre a realidade escolar. Conceber a implementação como um processo implica reconhecer que as reflexões e as ações dos sujeitos se sucedem e se interconectam para alcançar os fins propostos. Nesse particular, Pressman e Wildavsky (1998) admitem que estudar a implementação “[...] exige compreender el hecho de que secuencias de acontecimientos aparentemente sencillas dependem de cadenas complejas que ejercen una interacción recíproca. Por tanto, cada parte de la cadena debe construirse teniendo las demás a la vista” (PRESSMAN; WILDAVSKY, 1998, p. 58).

Essa interação em cadeia complexa dos acontecimentos implica a necessidade de coordenar as ações, cabendo ao coordenador impulsionar e articular as pessoas no desenvolvimento de tarefas de modo que as ações sejam orientadas para um mesmo fim. Pressman e Wildavsky (1998) consideram que a implementação de um programa ou de uma política requer sempre uma coordenação porque é necessário que alguém propicie aos atores reconsiderarem as suas diferenças, negociarem acordos, mesmo que isso implique alterações no que foi planejado. Nessa percepção dos autores, coordenar significa conseguir o que não se tem a priori, criar unidade entre as pessoas, fazer com que cumpram as suas tarefas. Significa ainda impulsionar as partes para que atuem da forma desejada, e no tempo conveniente, tendo em vista os propósitos que foram definidos.

No que se refere ao projeto político-pedagógico, entendemos que cabe tanto à direção escolar quanto à equipe de coordenação pedagógica exercer a função de coordenar o esforço humano coletivo para consolidar os objetivos, as políticas e as ações previstas por meio de um processo de gestão democrática na escola. Esses profissionais precisam desenvolver o seu plano de trabalho em conformidade com o projeto e levar os diversos segmentos com os quais trabalham diretamente a também fazê-lo. Também precisam promover contínuo processo de reflexão e de avaliação das ações para que aquelas já realizadas não se distanciem das concepções e dos métodos definidos coletivamente. Devem, ainda, impulsionar as pessoas a realizarem as tarefas previstas no momento apropriado, prestando o suporte necessário para isso.

Implementar o projeto político-pedagógico, tendo a gestão democrática como princípio, requer que os profissionais construam espaços de diálogo, de investigação da realidade, de trabalho coletivo e de formação continuada. Apesar de as ações desempenhadas pelos profissionais e demais membros da comunidade escolar se apoiarem reciprocamente, elas guardam especificidades. Padilha (2005) lembra que cabe à direção criar os mecanismos

e as condições para envolver a todos na elaboração e na implementação dos objetivos e estratégias previstos; ao coordenador pedagógico cabe organizar sua equipe para cumprir, da melhor forma, o que foi estabelecido no projeto, articulando o seu desdobramento em planos de curso, plano curricular e plano de ensino, bem como executar e avaliar o processo de planejamento.

Padilha (2005) também apresenta o papel dos demais membros da comunidade interna e externa à escola na implementação do projeto, sugerindo a participação dos pais de alunos na programação de eventos, no estudo da realidade assim como se vinculando aos colegiados existentes na escola; os alunos devem ser ouvidos nos assuntos que lhes dizem respeito; as associações de bairro e entidades comunitárias podem contribuir como parceiras nas atividades curriculares e extra-escolares; os professores implementam o que definiram, elaboram os planos curriculares, de curso, de ensino e de aula tendo o projeto como referência e comprometendo-se com a sua execução.

Dar vida ao projeto da escola requer uma ação articulada entre a organização escolar e o órgão administrativo a que está vinculada. Assim, os técnicos da Secretaria de Educação devem conferir condições e prestar o suporte necessário para que as organizações escolares desenvolvam o horizonte educacional que se propõem. Conforme Padilha (2005), compete aos membros da equipe técnica da Secretaria de Educação fazer a ponte entre as diretrizes do sistema e o projeto da escola, capacitar os diferentes segmentos para participarem do planejamento escolar, criar as condições institucionais para a construção e o desenvolvimento do projeto político-pedagógico.

É dessa forma que tanto o sistema quanto a escola devem estar voltados para a melhoria da qualidade do trabalho educativo e para o atendimento às necessidades do educando. Na escola, a coordenação do projeto é responsável por criar sinergias de modo que não haja distanciamento entre o que é planejado, executado e avaliado nas ações orientadas pelo projeto político-pedagógico, sob pena de as pessoas não se comprometerem com a sua efetivação. Nesse sentido, Villas Boas (2006, p. 181) considera que planejar o trabalho pedagógico para que outra pessoa o realize retira “[...] do executor suas possibilidades de domínio sobre o processo de trabalho, de comprometimento com o mesmo e de senti-lo como algo prazeroso e gratificante”.

As mesmas pessoas que, exercitando sua relativa autonomia, planejam uma proposta de intervenção na realidade escolar devem continuar exercendo a capacidade de decidir coletivamente. As dificuldades suscitadas por aspectos do cotidiano escolar (falta de tempo, imprevistos, trâmites burocráticos, cansaço causado pelo prolongamento das jornadas de

trabalho) e por práticas culturais que não se coadunam com o trabalho coletivo (individualismo, comodismo, imediatismo, centralização de poderes, hierarquização) devem ser superadas coletivamente, possibilitando, assim, o desenvolvimento de novas aprendizagens. Para isso, tanto o processo discursivo quanto o apoio teórico-metodológico auxiliam na superação das contradições que afetam as pessoas e o grupo.

É preciso que, no processo de planejar, executar e avaliar suas ações, os sujeitos escolares identifiquem as razões que os levaram aos resultados obtidos na intervenção sobre a sua realidade, de modo que não repitam os equívocos, e os pontos positivos sejam ressaltados para melhorar as futuras ações. Avaliando os seus êxitos, as suas dificuldades e os seus fracassos, as pessoas tornam-se aptas a (re)definir novos objetivos e planejar as ações subseqüentes, aprendendo, assim, com as suas vivências.

Segundo Browne e Wildavsky (1998), a implementação e a avaliação do planejado são complementares: a avaliação tem por função mostrar, da forma mais ampla possível, os objetivos alcançados, o porquê disso e as conseqüências das ações desenvolvidas. Portanto, a avaliação refere-se à causa dos resultados, e a implementação à utilização do conhecimento causal para guiar as ações futuras. A avaliação do projeto político-pedagógico tem por fim orientar o processo decisório no que se refere às próximas ações dos sujeitos escolares. Assim, a implementação do projeto se constitui em um processo dinâmico e permanente de “[...] diagnosticar, planejar, repensar, começar, recomeçar, analisar e avaliar” (VILLAS BOAS, 2006, p. 182).

Esse processo é permeado pelas pautas culturais existentes na organização e na sociedade, pelas opiniões e pelos valores dos sujeitos, pelas demandas sociais que influenciam as negociações e os resultados obtidos. Nesse (re)pensar da prática educativa, os sujeitos estarão também se (re)pensando e, dessa forma, (re)construindo suas subjetividades, suas identidades e a cultura da escola.

Distante dessa perspectiva, a concepção burocrática de avaliação tem como objetivo medir, comparar, classificar e hierarquizar as pessoas e as suas ações. Avaliar reduz-se, então, a verificar se as ações programadas foram realizadas conforme as orientações, constituindo-se em um exercício autoritário de poder. Contrapondo-se a essa concepção de avaliação, Afonso (2003, p. 44-45, grifo do autor) explicita que, sendo a escola uma organização educativa complexa, e, como tal,

[...] norteada pelos valores do domínio público e prosseguindo ideais democráticos, a avaliação não pode ser um instrumento de controlo ou uma mera fonte de poder, como se a avaliação visasse apenas objectivos administrativos e gerencialistas, ou,

ainda, objectivos de regulação social e de controlo político-burocrático. Ao contrário, a avaliação educacional (seja a avaliação pedagógica das aprendizagens dos alunos, a avaliação profissional dos professores, a avaliação institucional das escolas ou, mesmo, a avaliação das políticas educacionais) deve visar sobretudo objectivos de desenvolvimento pessoal e colectivo, ou seja, deve estar prioritariamente ao serviço de projectos de natureza mais emancipatória do que regulatória.

Nessa perspectiva emancipatória, a avaliação do trabalho educativo orientado por um projeto político-pedagógico (planejado e desenvolvido) marcado pelo trabalho coletivo de sujeitos autônomos está para além do controle das ações e da reprodução da realidade. Deve possibilitar o incremento da qualidade do trabalho escolar assim como reforçar a participação e a autonomia dos sujeitos, requerendo, portanto, uma compreensão de avaliação compatível com esses fins. Tal como pensa Villas Boas (2003, p. 186), compreendemos que a avaliação formativa48 corresponde a um paradigma que tem por fim promover a ação avaliativa “[...] mediadora, emancipatória, dialógica, integradora, democrática, participativa, etc. [...]”, capaz de subsidiar a implementação do projeto político-pedagógico das escolas.

Essa avaliação apóia o desenvolvimento escolar em todas as suas dimensões e abrange todos os sujeitos escolares contribuindo para o desenvolvimento tanto do educando quanto do educador. Está pautada em um processo de reflexão sobre a aprendizagem, seja dos profissionais da escola na implementação do projeto educativo, seja do professor e do aluno na sala de aula, considerando os objetivos definidos, a situação atual e o progresso grupal ou individual em várias circunstâncias.

Conforme Villas Boas (2003), a opção pela avaliação formativa expressa-se no projeto educativo, justificando a sua adoção, definindo as tarefas e as pessoas a serem avaliadas, as finalidades e os procedimentos adotados, assim como a forma como os resultados serão registrados e utilizados. Por isso, é preciso avaliar se a própria avaliação está cumprindo os seus propósitos de contribuir para o desenvolvimento do trabalho educativo, pautada em objetivos claros e desdobrando-se em outros planos devidamente registrados, analisados e reformulados.

Partindo também desse ponto, Afonso (2005) ressalta a importância da explicitação dos critérios de avaliação para que essa modalidade de exame da realidade não funcione em prejuízo dos alunos e das classes sociais mais vulneráveis. Esse tipo de avaliação pauta-se no recolhimento de informações utilizando uma pluralidade de métodos: observação do cotidiano escolar, entrevistas, provas, auto-avaliação, trabalho em grupo além de outros procedimentos. Dessa forma, procura-se analisar a realidade sob diversos ângulos, buscando compreender as

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suas possibilidades e fragilidades para, então, aprendendo com as próprias ações, traçar estratégias de enfrentamento dos problemas desencadeados no desenvolvimento do trabalho educativo.

No que se refere a esses problemas, Perrenoud (1999) considera que, no processo de avaliação do trabalho escolar, os sujeitos podem se deparar com uma série de obstáculos que comprometem as aprendizagens efetuadas, tais como: quantidade insuficiente de informações; descontinuidade e inadequação da regulação das ações; objetivos das ações e das intervenções não explicitados; falta de tempo para resolução dos problemas; acúmulo de microdecisões e dispersão contínua dos profissionais entre diversas questões. Situações dessa natureza comprometem não só as aprendizagens efetuadas pelos sujeitos como também os resultados obtidos na execução nos demais planos que se desdobram a partir do projeto político- pedagógico da escola.

Esse projeto deve ser cumprido em médio prazo e traz as linhas gerais do trabalho escolar. Deve ser desdobrado em outros planos, nos diversos setores de trabalho, a serem cumpridos em médio e em curto prazo. Conforme Gandin (1983), normalmente todos os setores da escola são norteados pelo marco referencial do projeto político-pedagógico, mas cada um deve realizar o seu próprio diagnóstico para determinar as necessidades específicas. A partir daí, cada grupo de trabalho desenvolve uma programação condizente com essas necessidades. Como revela Veiga (2006, p. 12),

[...] compete aos docentes, à equipe técnica (supervisor, coordenador pedagógico, diretor, orientador educacional) e aos funcionários elaborar e cumprir o seu plano de trabalho, também conhecido por plano de ensino e plano de atividades. É por esse caminho que vamos construindo o planejamento participativo e a estratégia de ação da escola.

Construindo ações planejadas pela escola como um todo, em particular as de cada setor, refletindo e aprendendo com suas próprias ações, os sujeitos tornam-se capazes de mudar a realidade escolar e, aos poucos, reconstruir a cultura da organização. É planejando, implementando e avaliando as suas ações que eles refletem sobre a sua realidade e desenvolvem novos sentidos para orientar a ação educativa. Modificar as práticas, os valores e as crenças estabilizados e consagrados pelos costumes no cotidiano escolar e lançar-se à construção de novas concepções culturais requer coragem e determinação para, nas palavras de Gadotti (2001, p. 37), arriscar-se na construção “[...] da promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente”. Isso implica romper com o instituído de tal modo que as pessoas da escola se tornem “[...] atores e autores [...]” dos seus próprios caminhos.

No contexto das políticas educacionais para a América Latina, o projeto político- pedagógico, longe de ser considerado um instrumento de transformação da realidade escolar, é concebido como uma forma de mobilizar a comunidade escolar para executar um projeto de educação globalizado, proposto por instâncias transnacionais de poder, adequando-o às especificidades locais. O referencial de planejamento utilizado para pensar o trabalho escolar pode inserir os sujeitos na lógica de manutenção de relações históricas de dominação ou possibilitar a construção de mudanças na prática educativa, marcadas pela participação e pela conquista da autonomia escolar.

Em contraposição a esse projeto de educação global, que visa modernizar as práticas educativas conforme as atuais necessidades do sistema econômico capitalista, o projeto educativo que os educadores brasileiros progressistas almejam deve ser produto de uma ampla discussão nacional desenvolvida por diferentes setores organizados da sociedade. Pauta-se em práticas democráticas e transformadoras que atendam às demandas culturais, sociais, políticas e econômicas da maioria da população do País. Consideramos que o referencial do planejamento participativo é o que melhor responde a esses anseios, pois se sustenta na ampla participação dos sujeitos nas decisões, possibilitando a construção de sentidos comuns que conferem um norte à ação coletiva.

A construção do projeto político-pedagógico, nesses moldes, ao possibilitar o desenvolvimento de sentidos comuns e pensar sistematicamente as estratégias para alcançar os fins propostos, torna-se um instrumento capaz de transformar a realidade escolar. A concretização desse processo de transformação idealizado coletivamente esbarra em dificuldades de diversas ordens (política, cultural, econômica, pessoal) por parte daqueles que o vivenciam. Apesar disso, refletindo, (re)planejando, executando e avaliando as próprias ações e concepções, os sujeitos podem efetuar as aprendizagens necessárias para alcançar os seus objetivos, assim como construir/reforçar a autonomia escolar.

CAPÍTULO 4 A ESCOLA MUNICIPAL PROFESSOR ASCENDINO DE ALMEIDA: AS MULTIFACES DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO

No âmbito do Município de Natal – RN, o sistema educacional e as escolas articulam- se para implementar as reformas educativas propostas para os países da América Latina a partir da década de 1990. Tal como previsto no Plano Nacional de Educação, foi elaborado o Plano de Educação do Município de Natal seguindo os preceitos nacionais. Além disso, como parte desse conjunto de reformas, foi promulgado o Plano de Carreira, Remuneração e Estatuto do Magistério, que estabelece para os educadores novos parâmetros de atuação. Entretanto, a implantação das políticas educacionais serão confrontadas por pressões populares e dos educadores.

Como parte integrante do Sistema Municipal de Ensino, os profissionais da Escola Municipal Professor Ascendino de Almeida procuram adequar-se às modernizações propostas para as escolas da rede. Ao responder a tais modernizações, consideram tanto o sujeito concreto com o qual trabalham quanto as suas próprias necessidades. De modo que a cultura construída na organização mediará esse processo e as relações que acontecem nesse meio, interferindo, inclusive, nos usos que os sujeitos fazem do espaço escolar.

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