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A inclusão digital e o kit escolar e literário

Dois programas desenvolvidos pela atual gestão da educação do município se destacaram com o argumento de que melhoraram a materialidade nas escolas e qualificam a educação na Rede: a inclusão digital e a distribuição aos alunos do kit escolar e literário no início de cada ano letivo.

O programa de Inclusão Digital, segundo a Smed-BH, está presente em todas as escolas e tem como objetivo ampliar o acesso de alunos, professores e comunidade às tecnologias de informação e comunicação, garantindo assim o direito essencial do cidadão. A Prefeitura informa no seu Portal que o acesso das escolas à Internet em banda larga é

permanente. “Isto significa atendimento a cerca de 180 mil alunos e mais de 10 mil professores”, de acordo com o site da Smed-BH.

A Inclusão Digital na RME-BH, de acordo com os gestores do município, tem dois eixos: a gestão da informação e o trabalho pedagógico.

[...] O primeiro refere-se à garantia de uma infraestrutura tecnológica e sistema de informação integrados. O segundo eixo busca colocar a tecnologia da informação a serviço do processo educativo, com o foco no trabalho pedagógico com o aluno, na formação dos profissionais da educação e no acesso à informação e serviços à comunidade. A implantação dessa infraestrutura contribui significativamente para o combate à exclusão digital em nossas comunidades (BELO HORIZONTE, 2008).

Não há dúvida sobre a importância da tecnologia da informação nas escolas e sobre seu potencial pedagógico. As escolas da RME-BH estão equipadas com uma ou duas salas onde funcionam os laboratórios de informática. Secretarias, bibliotecas, salas de coordenação, da direção e dos professores também têm pelo menos uma máquina conectada à internet em banda larga. Nas salas dos professores, por exemplo, os equipamentos estão quase sempre em uso. É possível presenciar professores elaborando atividades, apropriando-se de textos e materiais dos sites educativos, colhendo informações sobre cinemas, teatros, parques e museus.

Apesar do avanço, é perceptível que a utilização dessa tecnologia está muito distante do desejado e do anunciado. É comum encontrar as máquinas ociosas devido a defeitos ou a lentidão do sistema de banda larga disponível. Há profissionais que não usam a tecnologia na escola de maneira alguma porque preferem usar em casa, pelas razões acima citadas, pois não receberam formação suficiente ou não têm o hábito de fazer uso dessa tecnologia.

A prática de usar o Laboratório de Informática, como meio para criar as condições necessárias para os alunos aprenderem os conteúdos das disciplinas, é quase inexistente, como poderemos ver nos apêndices “O ensino regular na Emag – os trajetos intraescolar” e “Os programas educacionais e as trajetórias de vidas truncadas”. Na maior parte do tempo, as aulas nos laboratórios são ministradas pelos monitores30 que atendem aos alunos do Projeto

Escola Integrada, assunto do próximo capítulo. Os demais alunos da escola, que, na época da pesquisa, eram a maioria, raramente se utilizavam dessa tecnologia. Em 2010 e 2011, o

30 Os monitores são alunos do Ensino Médio de escolas públicas, contratados como estagiários para conduzir e

Laboratório ficou ainda mais restrito à Escola Integrada. Os alunos da “escola regular” poderiam utilizar o laboratório na primeira hora de aula no turno da manhã e na última no turno da tarde.

O Kit Escolar e o Kit Literário se caracterizam pela distribuição no início de cada ano de uma mochila ou caixa de papelão contendo cadernos, lápis de cor, lápis de escrever, borracha, régua e um conjunto de livros de literatura.

Há um reconhecimento geral, inclusive entre os professores, da qualidade do kit literário, que segundo o site da Smed-BH trata de “diferentes gêneros literários abordando temas como solidariedade, cultura, arte, questões étnico-raciais, meio ambiente, cidadania e clássicos da literatura”.

Quando o Kit Literário começou a ser distribuído na Rede, algumas escolas procuraram desenvolver projetos pedagógicos com os livros, visavam cultivar entre os alunos o hábito de leitura. Houve escolas que apresentavam peças teatrais, outras que faziam programações de leituras, encontros com os autores, atividades de narração e reconto de histórias. Algumas escolas distribuíam os livros aos alunos à medida que eles eram utilizados na sala de aula. Essa última prática gerou algumas denúncias ao Alô Educação31. A partir de então, segundo depoimento colhido na escola onde a pesquisa se realizou, a Smed-BH orientou as escolas a entregarem o Kit Literário completo no início do ano, diretamente à família do aluno ou ao próprio, quando autorizado pelos pais por escrito.

Além de gerar toda uma burocracia, que ocupa uma grande parte do tempo das direções e coordenações (algumas direções de escola têm receio de delegar essas tarefas a outros profissionais e ocorrer desvios do material ou dos comprovantes da entrega), observa- se que, de acordo com alguns docentes, os projetos pedagógicos elaborados pelas escolas a partir do Kit Literário, no mínimo, reduziram-se bastante. Esses profissionais se sentiram desencorajados. O movimento poderia ter sido outro; a Secretaria poderia assimilar os projetos dos docentes e legitimar a entrega paulatina dos livros, à medida que fossem utilizados em favor da aprendizagem e do bem-estar do aluno. Ou criar outro projeto que explorasse a riqueza do material. Mas não foi isso que aconteceu.

Esses dois programas são bastante divulgados na mídia mineira. A prefeitura municipal procura demonstrar que, por meio da publicidade, a educação no município é

31 Alô Educação é uma gerência da Smed-BH que funciona à semelhança de uma ouvidoria, recebendo

tratada com seriedade e que os recursos públicos são bem gastos. Em geral, os programas são bem vistos pelos cidadãos da capital. No entanto, nota-se que o seu impacto sobre a qualidade do ensino é reduzido devido à falta de articulação com a política mais global de educação; trata-se de iniciativas pontuais, com pouco poder de alterar a prática educativa nas escolas.