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A “invasão” do aborto na cobertura jornalística do segundo turno

Capítulo 3. O aborto na agenda eleitoral de 2010

3.3 A entrada do aborto na agenda jornalística

3.3.3 A “invasão” do aborto na cobertura jornalística do segundo turno

A análise quantitativa dos textos que compõem o corpus desta pesquisa, assim como a observação da presença dessas menções entre o primeiro e o segundo turnos, demonstra a transformação da agenda: houve um crescimento na intensidade de textos com referências ao aborto a partir do segundo turno eleitoral. Essa intensidade associada à saliência permite identificar com precisão a mudança no comportamento jornalístico em relação à abordagem do aborto nas eleições de 2010.

Gráfico 1. Menções acumuladas em textos no primeiro e no segundo turnos eleitorais em 2010*

*Total de 504 textos com menções ao aborto encontrados nos jornais Folha de S.Paulo, O Estado de S. Paulo e O

Globo no período de 11 de julho a 31 de outubro de 2010.

Primeiro turno - período: 11/07 a 3/10, data da eleição em primeiro turno em 2010. Segundo turno - período: 04/10 a 31/10, data da eleição em segundo turno em 2010. Fonte: a autora.

O cruzamento entre o total de textos com menções ao aborto – 504 textos presentes no escopo da pesquisa –, e o período eleitoral dividido entre o primeiro e segundo turnos revela

0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 1º turno 2º turno 100 404

a presença maciça de textos tratando da polêmica do aborto no segundo turno e leitoral. Os 404 textos encontrados no segundo turno (ver gráfico 1) representam 80% do total de textos encontrados nesta pesquisa. Isso demonstra a extrema concentração na abordagem do assunto a partir de outubro, considerando o início do segundo turno no dia 4 de outubro, um dia após a eleição em primeiro turno, até o final do período em 31 de outubro, data da eleição em segundo turno.

A maior parte da cobertura jornalística do primeiro turno nunca deu relevância para o aborto. Isso só vai ocorrer a partir dos dias 29 e 30 de setembro, conforme já referido, quando a situação muda drasticamente e, então, o aborto assume preponderância e grande saliência na capa dos jornais, conforme demonstra o gráfico 2, abaixo, com a comparação por mês dos destaques ao aborto na capa dos jornais:

Gráfico 2. Menções ao aborto nas capas dos jornais, 11 de julho a 31 de outubro de 2010*

*Total de referências ao aborto nas capas: 79

As capas observadas se referem aos 74 dias em que o tema aborto esteve presente no interior das edições, dentro do universo de 112 dias observados, que vai de 11 de julho a 31 de outubro de 2010.

Em alguns casos, o aborto foi referido mais de uma vez na mesma capa/edição. Fonte: a autora. 0 5 10 15 20 25 30

Ago Set Out

N úme ro de m ençõe s ao abort o O Globo FSP OESP

Conforme o gráfico 2, acima, das 79 referências ao aborto presentes na capa dos jornais observados, onze delas (14%) foram ainda no primeiro turno das eleições27, considerando-se o dia 2 de outubro, véspera da eleição, como último dia do primeiro turno. A baixa intensidade de referências ao aborto na capa dos jornais no primeiro turno demonstra que o assunto não era motivo de atenção dos jornais, embora estivesse presente em textos identificados nesta pesquisa desde o dia 11 de julho, data de início da coleta do material.

A mudança no comportamento da mídia ocorre exatamente no final de setembro (dias 29 e 30). Conforme o gráfico 2 demonstra, das 79 referências ao aborto na capa dos três jornais, 86% delas (68 referências) ocorreram a partir do mês de outubro. Ao analisar a temática do aborto na capa dos jornais, é possível perceber que as manchetes sobre os escândalos políticos deram lugar à polêmica do aborto, a partir da constatação pelo campo jornalístico dos efeitos da polêmica no processo eleitoral e, sobretudo, da “explicação” para a queda das intenções de voto na candidata petista, o que teria “valor notícia” para incorporar o tema à agenda jornalística.

As referências ao aborto na capa foram quantitativamente diferenciadas em cada um dos jornais. A Folha de S.Paulo foi o jornal que mais registrou o termo na capa, com 32 referências (40,5%), seguida de O Globo, com 27 menções (34,2%), e O Estado de S. Paulo com 20 registros (25,3%).

Tabela 1. Menções ao aborto nas capas dos jornais por jornal

Jornal N. de citações na capa Frequência de citações

O Globo 27 34% Folha de S.Paulo 32 41% O Estado de S. Paulo 20 25% Total 79 100% Fonte: a autora.

27 As seis referências na capa no primeiro turno foram as seguintes. Em O Estado de S. Paulo: “Antiaborto e a favor

da união gay” (18/08/10); “Dilma combate boato sobre aborto e faz reunião com igrejas” (29/09/10); “Polemica do aborto faz Dilma se explicar a líderes cristãos” (30/09/10); “Dilma perde votos entre os evangélicos” (02/10/10). Em

O Globo: “De olho no segundo turno Marina ataca Dilma e Serra” (27/09/10); “Aborto opõe Marina e Dilma e

esquenta guerra de candidatas” (30/09/10); “Debate sem polêmica fecha a campanha presidencial” (01/10/10); “Na TV Serra canta e Dilma exibe Lula” (01/10/10); “Dilma vai à igreja, Marina canta e Serra dança” (02/10/10). Na

Folha de S.Paulo: “Dilma tenta frear perda de voto com apela à militância” (29/09/10); “Após critica dos religiosos,

A observação por editoria permite identificar outro aspecto interessante: os textos com menções ao aborto nas capas dos jornais estavam concentrados nas editorias de política e de cobertura da campanha eleitoral, conforme a tabela 2.

Tabela 2. Menções ao aborto na capa X editoria/seção do jornal*

Editoria/seção do jornal Citações/menções Frequência

O País/Poder/Nacional 60 76%

Cadernos especiais Eleições 2010 11 14%

Opinião (colunas, artigos, editorial, entrevistas) 7 9%

Rio/Cotidiano/Metrópole 0 0%

Segundo Caderno/Ilustrada/Caderno 2 1 1%

Saúde/Ciência/Vida 0 0%

Total 79 100%

*Os textos registrados nesta tabela são exclusivamente aqueles dos quais houve menção na capa dos jornais. Fonte: a autora.

Na tabela 2 podemos identificar que os textos com menções ao aborto na capa dos jornais estavam concentrados no primeiro caderno, na cobertura política, com 60 referências (76%) e no caderno especial, destinado à cobertura eleitoral, com 11 (14%) referências. Os textos de opinião mereceram sete registros na capa (9%). Com esse dado é possível identificar o uso estratégico do enquadramento do aborto na cobertura política. Ou seja, 90% dos registros sobre o aborto na capa dos jornais durante as eleições de 2010 consistiram em abordagens vinculadas à disputa eleitoral.

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