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3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE INFORMAÇÃO E A CONSTRUÇÃO DE

3.4 O DIREITO DE ACESSO À INFORMAÇÃO PÚBLICA NO BRASIL

3.4.3 A norma federal de acesso à informação – Lei 12.527-2011 Um início de

A Lei 12.527-2011 foi editada em novembro de 2011, mas somente entrou em vigor em maio de 2012. Foi regulamentada em nível Federal pelo Decreto n.º 7.724-2012. O objetivo da lei é regulamentar o acesso a todas as informações consideradas públicas, tanto as disponíveis nos órgãos públicos como também em entes privados que recebem recursos públicos.

O artigo 3º coloca diretrizes essenciais ao consecução do objetivo, quais sejam: a) observância do princípio da publicidade como regra e do sigilo como exceção; b) divulgação de informações independentemente de solicitação (transparência ativa); c) utilização de meios de comunicação variados em especial as tecnologias da informação; d) fomento ao

cidadãos não confiam nos partidos políticos, e mais de dois terços não confiam no seu governo nacional. Na América Latina, 77% dos entrevistados da pesquisa Voz do Povo acharam que seus líderes políticos eram desonestos (World Economic Forum, 2008)”.

desenvolvimento da cultura de transparência na Administração Pública; e) desenvolvimento do controle social da Administração pública.

Essas diretrizes deixam evidente que a norma tem como foco fomentar a cultura da transparência no poder público. Determina que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem disponibilizar, em meio eletrônico e em tempo real, as informações detalhadas acerca das suas ações e programas e de sua execução orçamentária e financeira.

Apresenta duas vertentes da transparência: a ativa, pela divulgação espontânea das informações, e a passiva, que implica em atender as solicitações por acesso. Todos os entes federativos são obrigados a seguir estas determinações, à exceção dos municípios com menos de 10 mil habitantes (BRASIL, 2011).

A partir da edição da norma, a Controladoria Geral da União se dedicou a estudos visando incentivar a aplicação da lei nos diversos entes públicos. Elaborou, em 2013, um manual para orientar a construção dos portais de acesso, elencando parâmetros que devem ser disponibilizados, havendo monitoramento constante da implantação.6970

Nesse interstício (2011 a 2013), cada órgão publicou acabou por elaborar o seu próprio portal, o que implicou em uma série de modelos com visões particulares da aplicação da lei (ROWER, 2011).

Do ponto de vista formal, os órgãos públicos apresentam o portal de acesso, contudo, seu conteúdo pode não atender às expectativas colocadas pela norma. A evolução dos meios de comunicação, embora contribuam para a disseminação de informação, não estão isentos de manifestação estratégica com vistas a dirigir a agenda política a partir de grupos de interesse. A efetivação da política pública de informação depende de uma escolha política voltada para motivar o interesse do cidadão para se envolver nas questões públicas.

Não se pode confundir a política de informação com política de transparência, embora sejam ambas interligadas. Quando maior o interesse do poder público em ser transparente, maiores a possibilidades de o cidadão ter conhecimento das ações do poder público. Todavia, a transparência efetiva implica em possibilidade de compreensão do que é mostrado, sob pena de provocar distanciamento e desmotivação.

69 Monitoramento pela CGU vide relatório disponível em: http://www.cgu.gov.br/assuntos/transparencia- publica/escala-brasil-transparente

70 Monitoramento pelo MPF vide ranking, disponível em:

http://sig.mpf.mp.br/MicroStrategy/servlet/mstrWeb?evt=3140&src=mstrWeb.3140&documentID=CD5BD3 BA11E621B2E4D90080EFC54015&server=SFLP-MSTR10-01.PGR.MPF.MP.BR&

O avanço das tecnologias de informação, especialmente as diversas plataformas hoje existentes que captam os dados dos diversos setores administrativos e os organizam na forma exigida pela lei, tem aumentado a disponibilidade de informações sobre a gestão pública em portais do governo na internet. Em tese, estes sítios teriam o potencial de explorar diversas modalidades de comunicação visando dar a conhecer as ações dos governantes, os programas existentes aumentando o acesso a direitos fundamentais e permitindo a avaliação pelos cidadãos das políticas públicas implementadas pelos diversos setores do governo. Ocorre que as informações contábeis, a folha de pagamento e as inerentes aos atos oficiais são captadas automaticamente, sem esforço pelo próprio sistema informatizado. Outras informações, como avaliação de programas de governo, auditorias, informações sobre composição de tarifas de transporte, que exigem pessoal habilitado para separar e apresentar o conteúdo nos portais, são raras.

O fato de ser possível a visualização e a utilização de informações da administração pública pelas pessoas pode contribuir para que estas possam cobrar direitos, exigir serviços ou simplesmente informar-se sobre o local onde vivem e suas potencialidades.

As dificuldades de acesso à informação perpetuam o distanciamento entre o Estado e a sociedade, o que contribui para que o cidadão não perceba a política como algo significativo para sua vida cotidiana, provocando uma desconexão entre a esfera que toma a decisão política e os afetados por ela (GOMES; MAIA, 2008, p.296).

Também do ponto de vista do governo, verifica-se que muitas decisões são ainda baseadas em interesses corporativos, manipulações da opinião pública, ou, ainda, fruto de percepções pessoais dos governantes. Talvez por este motivo, sob as vestes de suposta transparência, ainda exista o jogo de esconde-esconde, em que somente alguns fatos vêm a lume, a depender de interesses não publicitados. Isso pode se observar já nos programas de governo apresentados pelos candidatos, cujas propostas não vêm acompanhadas de informações consistentes sobre a necessidade ou utilidade daquela ação, ou nas denúncias de descumprimento das normas fiscais que atingem somente este ou aquele político, embora sejam práticas disseminadas em diversos órgãos públicos.

De acordo com Canela e Nascimento (2009, p. 12), as informações de qualidade são essenciais para o resultado eficientes de uma determinada ação política. Por este motivo, a Lei de Acesso à informação pontua que este acesso deve ser objetivo e ágil, disponibilizando a informação de forma transparente e clara e em linguagem de fácil compreensão (Artigo 5º da Lei).

Ora, o acesso objetivo e ágil visa facilitar a busca por aqueles que não possuem experiência com o trato da administração pública. O legislador reconhece que a disponibilização de informações determinadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LC101- 2000) ou pela Lei de transparência (LC131-2009) é muito técnico, na medida em que se disponibilizam dados orçamentários e financeiros cuja compreensão exige formação específica. Disso decorre que não basta disponibilizar números relativos a créditos e débitos, mas sim explicar qual o gasto em determinada escola no que se refere aos materiais, à mão de obra, ao mobiliário, de forma a viabilizar a compreensão da dimensão do gasto e sua adequação ao objeto.

A ordem do artigo 5º requer, para sua construção, não apenas os profissionais da área financeira, mas principalmente os da área da comunicação e das ciências sociais. No artigo 6º, a norma coloca três tarefas para a administração pública: a gestão transparente da informação, propiciando amplo acesso; a proteção da informação, que garanta sua disponibilidade, autenticidade e integridade; e a proteção da informação sigilosa. Essas tarefas impõem cuidado na divulgação, impedindo, por exemplo, a divulgação de relatórios incompletos, de dados sem procedência, ou manipulados para evidenciar os aspectos que interessam ao administrador apenas.

Cabível também o cuidado com a informação caracterizada como sigilosa, como dados pessoais dos usuários do sistema de saúde, das famílias inscritas cadastro único ou de todas aquelas classificadas na lei como sigilosas

O artigo 7º da lei apresenta como obrigação da administração pública divulgar a forma de implementação dos programas, suas ações e projetos, a satisfação das metas e indicadores, contratos, entre outros. Em primeiro lugar, a norma aponta que devem ser fornecidas informações sobre as formas de obter o acesso, bem como a origem destas informações (incisos I, II, II, IV). Posteriormente, elenca a necessidade de divulgar as atividades exercidas por cada um dos órgãos, sua política e a organização de seus serviços (inciso IV), o que fornece ao interessado a possibilidade de verificar antecipadamente se está buscando a informação no local correto, ou seja, o adequado para processá-la e divulgá-la posto que inerente à sua competência. Segue no inciso V a determinar a exposição da situação do patrimônio público, ou seja, a situação dos bens imóveis, dos veículos e máquinas; da utilização dos recursos, licitações e contratos administrativos. Neste item, especificamente, os órgãos têm se limitado a reproduzir editais e contratos administrativos, atas de licitação, bem como fornecer as informações contábeis da receita e da despesa pública. Ora, a publicidade destes itens já está prevista na lei de licitações e na lei de transparência (LC131-2009). Não haveria necessidade de repetir a regra

apenas com o intuito de reforçá-la ou apenas de exigir que estas informações estivessem, com as demais colocadas na lei, inseridas em um mesmo portal e não dispersas na página do Município.

Entende-se que informar a respeito do patrimônio e dos recursos públicos vai além de fornecer dados contábeis, mas também explicar a real situação deste patrimônio – se está deteriorado, se todos os veículos estão em funcionamento, se o custo com manutenção ainda recomenda seu uso ou se é mais vantajoso sua troca. As razões da existência dos contratos etc.. O inciso VII, na letra “a”, avança no sentido de impor a publicidade dos resultados dos programas, projetos e ações do ente público, assim como as metas e os indicadores propostos inicialmente para os referidos atos. Novamente a norma exige que o poder público se descortine frente ao cidadão, apresentando que ações estão sendo realizadas, quais os motivos, quem são os beneficiários, quais são as metas esperadas, que avaliações foram ou estão sendo feitas. Ora, para isso é necessário que o poder público tenha um planejamento e que as ações não decorram de “insights” do governante, mas sim de um processo de construção baseado em análises das necessidades, dos recursos disponíveis etc.

Já a letra “b” determina a publicidade do resultado das inspeções, auditorias, prestações e tomadas de contas realizadas tanto por órgãos de controle interno com externo. O cumprimento desta exigência permite à sociedade controlar o controlador, impedindo que os órgãos encarregados da verificação e correção das ações administrativas escondam da sociedade os erros cometidos pelos administradores, ou que tais erros somente venham à tona quando a situação se agrava de tal forma que venha a atingir a prestação dos serviços.

É importante que o administrador não se apresente apenas como o herói-local, mas que se possam demonstrar os erros praticados e as medidas realizadas para sua correção, contudo, o medo da apropriação política da divulgação de falhas coibido esta divulgação.

Heinen (2015, p.136) entende inclusive que os inquéritos civis públicos promovidos pelo Ministério Público para apurar irregularidades no que se refere ao patrimônio público sejam divulgados.

Os parágrafos do artigo 7º preocupam-se em resguardar os processos em que o sigilo é necessário para a segurança da sociedade ou do Estado, mas ao mesmo tempo determinam a disponibilização das partes não sigilosas. O artigo 8º elenca as informações mínimas que devem ser divulgadas independentemente de solicitação: I- registro das competências e estrutura organizacional, endereços e telefones das respectivas unidade e horários de atendimento ao público; II- registros de quaisquer repasses ou transferências de recursos financeiros; III - registro de despesas; IV-informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os

respectivos editais e resultados, bem como os contratos celebrados; V- dados gerias para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras de órgãos ou entidades; e VI- respostas a perguntas frequentes da sociedade.

Estas informações devem ser passíveis de acesso e também de gravação ou transporte para outros sistemas, de forma que aquele que busca a informação possa utilizá-la com maior facilidade.

Além da forma passiva de divulgação, a administração pública deve estar disponível no caso de requerimento direcionado à administração, ocasião em que não poderão ser exigidas justificativas do requerente para o recebimento das informações (Artigos 9º e 10º da Lei). No artigo 9º, consta que as informações podem ser obtidas junto a um órgão específico com local e condições apropriadas, onde se pode obter informações sobre como realizar o pedido de informação, verificar a tramitação dos pedidos protocolados, protocolar pedidos de acesso. Além disso, reconhece que a realização de audiências pública, consultas públicas podem ser um meio de assegurar o acesso à informação, todavia não detalha como se deve dar este acesso nas referidas audiências.

Outrossim, qualquer pessoa pode se utilizar da autorização legal para solicitar informações seja a respeito de interesse seu como da coletividade sem necessitar justificar o motivo.71 O pedido de informação pode ser apresentado por qualquer meio legítimo, seja por via de requerimento verbal ou escrito junto às repartições públicas, seja através dos sítios na internet. Muitos órgãos possuem o sítio da internet, todavia não constituíram um órgão ou responsável para verificar o que está sendo solicitado, instruir o pedido de informação e devolver a resposta. Embora se exija a identificação do interessado, não é possível fazer exigências relativas à motivação da solicitação.

O Poder Público deverá responder às solicitações no prazo de 20 dias, prorrogáveis por mais 10 dias. O legislador preocupou-se inclusive em colocar respostas possíveis para serem fornecidas no prazo legal (Artigo 11 da Lei e artigo 15 do Decreto). Caso o pedido de acesso seja negado, é necessário que o poder público forneça as razões da negativa, a possibilidade e o prazo para recurso, possibilidade de apresentação de pedido de desclassificação da

71 Art. 10 – Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso à informação aos órgãos e entidades referidos no artigo 1º desta lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida.

§1º - Para acesso à informação de interesse público, a identificação do requerente não pode conter exigências que inviabilizem a solicitação.

§2º - os órgãos e entidades do poder público, devem viabilizar alternativa de encaminhamento de pedidos de aceso por meio de seus sítios oficiais na internet

§3º- São vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público.

informação, no caso de ser classificada. O fornecimento de informação é gratuito, salvo quando for necessária a reprodução de documentos pelo órgão público, situação que admitira a cobrança limitada ao ressarcimento dos custos.

No caso de indeferimento do pedido de acesso à informação, o interessado pode recorrer da decisão no prazo de 10 dias a contar do indeferimento. As razões do indeferimento devem ser fornecidas ao interessado, bem como indicar a autoridade competente para apreciação do recurso. A autoridade superior, ao receber o pedido de recurso, deve se manifestar no prazo de cinco dias. No âmbito federal, o órgão recursal é a Controladoria Geral da União, hoje denominada Ministério da Transparência e combate à corrupção e Controladoria Geral da União.

O Decreto 7.724-2012 especifica a forma de classificação das informações ficando a Controladoria Geral encarregada de revisar periodicamente esta classificação. A Controladoria ainda efetua um relatório das solicitações por órgão.72 No Estado do Paraná, o Decreto Estadual 10.285 de 2012 regulamenta a forma de acesso à nível Estadual. No âmbito Municipal, cada Município deve regular por decreto a forma de acesso.

A divulgação da Lei de Acesso à Informação nasce, pois, ancorada nos temas da transparência e controle social, direcionados à função fiscalizatória. Disso resulta que a percepção dos portais de acesso pode ser prejudicada no que se refere ao conteúdo emancipatório pela representação social posta.

3.4.4 Uma crítica – o foco da utilidade da lei de acesso à informação – a criação do cidadão