• Nenhum resultado encontrado

3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE INFORMAÇÃO E A CONSTRUÇÃO DE

3.1 NOÇÃO GERAL SOBRE O OBJETO INFORMAÇÃO

PORTAIS DOS MUNICÍPIOS

Neste capítulo, o percurso inicia pela abordagem da informação como objeto de estudo da ciência e como um direito fundamental. Posteriormente, será abordado o surgimento do Governo Aberto no Brasil e as políticas de acesso à informação entre elas a construção dos portais municipais.

O que é informação? O que compreende o direito à informação? O acesso à informação pública é um direito a acesso aos números do governo? As políticas públicas voltadas à informação pretendem a construção de uma democracia participativa ou de um banco de serviços ao cidadão?

A informação é um elemento presente em todos os espaços sociais, e os discursos em torno da era informacional salientam que o domínio das tecnologias de informação fornece uma nova forma de poder. Para Castells (2015, p.86-87), testemunha-se a “transformação do Estado nação em Estado em rede, que tem como característica a soberania e a responsabilidade compartilhada, flexibilidade de procedimentos e governança”. O autor afirma que, embora mais eficiente, este Estado enfrenta problemas de legitimidade política. Pela maior facilidade de acesso a diversos discursos, com uma profusão de informação circulando nas redes, entende que é difícil compatibilizar um conjunto de valores comuns com a regulação de mercado; a política ambiental com as diversas visões de desenvolvimento sustentável; a prioridade dos direitos humanos e as questões de segurança.

Para Castells, há uma redefinição do poder a partir da dinâmica de dominação em rede. Os conflitos sociais são travados em rede, pois tanto os mercados financeiros globais como os sistemas transnacionais de produção, as forças armadas, os movimentos sociais estão na rede, e através dela buscam atingir seus objetivos. “O poder governa, os contrapoderes lutam. As redes processam seus programas contraditórios enquanto pessoas tentam encontrar sentido nas fontes de seus medos e suas esperanças.” (CASTELLS, 2015, 95). A seguir, ver-se-á qual o significado da informação.

3.1 NOÇÃO GERAL SOBRE O OBJETO INFORMAÇÃO

A palavra informação, embora presente tanto no cotidiano das conversas informais como no discurso das ciências, se apresenta como um termo complexo. Não existe uma noção

única de informação na medida em que este termo pode referir-se a uma teoria, um conjunto de dados ou acontecimentos (LOGAN, 2012).

O termo informação tem origem greco-romana. Eidos, mofphé e typos, do grego, são expressões utilizadas por Platão e Aristóteles com o significado de modelo e representação.

Informo e informatio tem origem latina, que implica no ato de moldar a mente.

Partindo destes eixos, primeiramente a informação possuía um sentido ôntico – um dar

forma, seguiu-se um sentido orgânico – o formar-se; e, um sentido ontológico – o da forma como princípio de ser e, por fim, o epistemológico – o informar como conhecimento – dar forma a mente (CAPURRO, 2003).

O avanço técnico científico presente no fim do século XIX e início do século XX faz despertar os estudos sobre a informação sob dois prismas: a pesquisa no desenvolvimento nas estruturas e mecanismos de transmissão da informação – correios, telégrafos, telefones, rádios, televisões, etc.), e outra, na perspectiva do interesse humano e social.

Em 1948, Shannon26 apresenta a Teoria Informacional, cuja ênfase está mais na questão física da transmissão do que propriamente na mensagem, na medida em que ele separa a informação do conteúdo semântico.27 Ele define informação como a transmissão de uma mensagem de um emissor a um receptor. Essa definição, segundo o próprio autor, não tem relação com seu sentido ou significado, pois o significado não é condição necessária para haver informação. A teoria preocupa-se em obter a máxima economia de tempo, de energia e de recursos financeiros nos processos de transmissão de informação. A informação é vista como um sinal sujeito à codificação e decodificação.

A proposta do conceito de informação colocada por Shannon, que privilegia os aspectos físicos da transmissão, não envolvem as questões relativas ao significado, ou seja, os efeitos e impactos na mente de quem recebe (HAYLES, 1999, p. 69).

Essa carga de subjetividade e a dificuldade de sua análise pela ciência positivista da época implicaram em fazer prevalecer, inobstante as críticas, a definição de Shannon, que acabou influenciando o desenvolvimento da ciência da informação, na medida em que ele conseguiu matematizar a informação com teoremas gerais que se sustentavam independentemente do meio que venha carregar a informação.

26 Claude Shannon é matemático e sempre esteve interessado nas questões comunicacionais e sua tese leva o título de Mathematical Theory of comunication, publicada em 1948.

27 Para Shannon (1948, p. 379-423, 623-656), “o problema fundamental da comunicação é reproduzir exatamente ou aproximadamente em um ponto uma mensagem selecionada em outro ponto. Frequentemente as mensagens têm um significado, isto é, referem-se ou então estão relacionadas a algum sistema com certas entidades físicas ou conceituais. Esses aspectos semânticos da comunicação são irrelevantes para o problema da engenharia. O aspecto significativo é que a mensagem real é selecionada de um conjunto de mensagens possíveis”.

A estruturação da informação nos moldes técnico-científicos despertou o interesse da filosofia na investigação deste fenômeno, na medida em que são diversas as respostas possíveis, dependendo de quem responde às perguntas: o que é informação? Qual o significado do conteúdo informacional? O que é ciência da informação? (CAPURRO, 2003). Capurro enfatiza a busca do conceito de informação em diversos pensadores, como Gregory Batenson (diferença que faz diferença); Popper (conceito de fulguração); Luhmann (diferença entre sistemas físicos e sociais); e Habermas (teoria da ação comunicativa). Fica evidente, portanto, as diversas tensões entre abordagens, física, biológicas e sociais da informação.

Capurro (2003) coloca que a ciência da informação e sua busca por uma definição de seu objeto nascem em meados do século XX, com um paradigma físico, questionado por um enfoque cognitivo idealista e individualista que, por sua vez, é substituído por um paradigma pragmático e social.

De certo modo, o caso da informação ambos os paradigmas − físico e cognitivo − persistem, posto que ainda se está no que se pode colocar como momento de transição paradigmática28, em que existem diversos desafios a superar e um aprendizado a realizar no contexto da realidade transformada pelo avanço das tecnologias, o que impõe a utilização de diversas abordagens e perspectivas teóricas.

A ciência da informação ainda se utiliza de abordagens centradas na teoria matemática da informação, buscando aprimorar a forma de transmissão, a qualidade e velocidade de recepção. Ao mesmo tempo, outra corrente tem se ocupado de estudar a informação como um problema social concreto a partir da análise dos processos de construção e utilização da informação. Trata-se de uma área interdisciplinar, uma vez que se utiliza de elementos de outras ciências para a compreensão de seu objeto.

Araújo (2010), analisando os trabalhos apresentados durante os congressos da Associação Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (ANCIB), a partir dos paradigmas colocados por Capurro (físico, cognitivo e social), verificou que não há exclusão de um em face de outro, mas sim uma complementariedade, o que implicaria na necessidade de enxergar os paradigmas não como concorrentes, mas sim inter-relacionados.29

28 O momento de transição paradigmática, de acordo com Kuhn (1987), é aquele em que os problemas ora são resolvidos pelo paradigma antigo, ora pelo novo.

29 Nesse mesmo sentido, no posicionamento de Matheus (2005), ao invés de se considerarem paradigmas que se excluem, deve-se entender que são dimensões que se complementam.

Em uma revisão de literatura, pode-se fazer um apanhado das acepções correntes do termo informação, o que pode demonstrar a inexistência de uma definição consolidada e unívoca.30

Lyotard (1990) aborda a informação sob as vertentes sistêmica, em que a informação se apresenta como garantia de estabilidade para o sistema social; e pós-moderna, em que a informação se apresenta com uma função mediadora dos processos de apreensão da realidade e como mercadoria, reconhecendo que é elemento indispensável para a força produtiva na contemporaneidade.

Le Codiac (2004, p.8) preocupa-se em fazer a distinção entre informação, dado, conhecimento e comunicação. O termo dado implica em “uma representação convencional, codificada de uma informação em uma forma que permita submetê-la a processamento eletrônico”. Conhecimento é o ato pelo qual o sujeito apreende alguma ideia ou saber. Comunicação é um processo intermediário que permite a troca de informações entre pessoas. A comunicação é um ato, um processo ou um mecanismo e a informação é a matéria, o produto, a substância. Assim, para o autor, informação é um conhecimento inscrito em um suporte (2008, p. 10).

A corrente social do estudo da informação31 se aterá às práticas de sua produção e aos usos sociais da informação, no interesse na divulgação, nas formas de apropriação.32

Gonzáles de Gomes (2002) aponta três linhas de estudo da informação presentes a partir da década de 70: a linha das ciências cognitivas, que entende a informação como um elemento da esfera de cognição, tais como a psicologia; a linha linguística que considera a informação sob a ótica da produção de sentido na linguagem; e a linha social onde a informação se apresenta como produto das ações de práticas sociais.,

A autora critica a abordagem da informação centrada apenas nos meios de captura e armazenamento tal como se fosse mero produto da indústria da informação. Salienta a importância do valor da informação, a partir de contextos da prática, voltado à percepção dos consensos e da validação.33

30 Capurro e Hjorland (2007), em artigo público, retomam o trabalho de Schrader (1983), o qual teria relacionado cerca de 700 definições para o termo informação, no período compreendido entre 1900 e 1981.

31 O desenvolvimento da visão social da informação é visível nos cursos de mestrado do IBICT cujas linhas do programa eram a informação a cultura e a sociedade.

32 Gomes e Marteletto se destacam na análise do contexto social na informação e da informação no contexto social. A primeira autora aponta a importância da elaboração pública da informação baseada na concepção de Jurgen Habermas; já a segunda autora centra-se na importância política da informação com aportes teóricos em Gramsci e Bourdieu.

33 “[...] as novas manifestações da comunicação e da informação constituem práticas substanciais da linguagem intensa e amplamente ancoradas nas relações sociais, culturais, econômicas e políticas; as tecnologias de informação e comunicação são assim constitutivas não só dos espaços sociais de discurso e memória, mas de

Marteletto (2004) propõe uma visualização da informação como produtos simbólico, ou seja, como mercadoria de sentido já fornecido por uma esfera técnica e institucional ou como plano da apropriação em contextos socioculturais. A informação simbólica é vazia de significado informacional, pois a significação é construída quando os sujeitos vivenciam a informação como prática, na produção de sentido.

Este trabalho não pretende se aprofundar no ponto de vista das correntes matematizantes da informação34, mas sim no aporte social.

O estudo da informação, sua produção circulação e seu consumo é objeto de estudo em diversas áreas do conhecimento, motivo que explica a complexidade da abordagem deste tema, e ressalta também a relevância social, política e econômica de seu estudo.

A informação deve ser vista, pois do ponto de vista dinâmico, de forma que a qualidade, a distribuição e o acesso sejam tratados como questões sociais e políticas. Para analisar a questão do acesso à informação, em especial a informação pública, passar-se-á a verificar a forma de regulação deste acesso como um direito fundamental do cidadão.