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3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.1. A organização e a segurança do trabalho

Como mencionado anteriormente, o mundo presencia hoje um alto número de acidentes de trabalho das mais diversas ordens e gravidades, nos quais milhares de vidas são ceifadas e nunca poderão ser contabilizados os danos por tais fatalidades, seja para uma organização, seja para familiares e parentes destas vítimas.

De acordo com a OIT (2004), anualmente morrem mais de um milhão de pessoas, vitimadas de algum tipo de acidente ou mesmo de doença relacionada à atividade de trabalho. Tal número se mostra maior do que a média anual de mortes ocasionadas por trânsito em estradas e ruas, que é da ordem de pouco mais de novecentos e noventa mil, chegando a ser maior do que o dobro de mortes provocadas por violência, que é na margem de quinhentos e sessenta mil, e sem falar com relação ao quase cinqüenta mil ocasionados por guerras. Os dados sobre acidentes no Brasil apresentam que em média, a cada dez mil acidentes de trabalho mais de cem são fatais, ao passo que países como México e EUA estes não passam de 37 e 22 ocorrências, respectivamente (MENDES, 2001).

Não é nenhuma novidade o fato de que os acidentes oriundos da atividade laboral em indústrias e empresas das mais variadas representam um grande prejuízo para toda a sociedade, sendo a sua redução e extinção um anseio de todos, mesmo que ainda utópico. A diminuição dos acidentes tem a capacidade de fazer com que haja um aumento significativo relacionado às forças produtivas, seja por fatores cognitivos, seja por fatores organizacionais, e uma redução de despesas, como por exemplo, nos pagamentos de benefícios

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previdenciários, nos dias fora da empresa, na contratação temporário de auxiliares e sobrepostos, entre outros. Tais recursos poderiam ser canalizados a outras políticas, mesmo aquelas de responsabilidade social tão em pauta.

Para Mullen (2004), as abordagens tradicionais sobre manutenção à segurança no ambiente de trabalho e em seus postos têm sido alvos muitas vezes de apenas re-desenhos ou re-projetos do trabalho e, quando muito, de aspectos técnicos de sistemas da engenharia. Mais recentemente, entretanto, alguns investigadores vêm adquirindo uma visão diferenciada que comuta com a do presente autor, no que tange que uma maioria de acidentes nos locais de trabalho estão atribuídos às práticas inseguras do trabalho de funcionários mais do que às próprias condições de insegurança.

Quando os acidentes ocorrem no local de trabalho, as investigações são geralmente conduzidas para determinar apenas as causas subjacentes, e não necessariamente descobrem as verdadeiras causas dos problemas. Hofmann e Stetzer (1998) sugerem que as investigações acerca de acidentes devam focalizar mais a culpa destes aos fatores subjacentes que levaram ao incidente e as suas causas, e não diretamente a um indivíduo, como comumente é feito. Isto sugere que os fatores organizacionais, somados aos sistemas de projeto de trabalho e aos sistemas de engenharia, podem ser negligenciados quando na identificação das causas de acidentes e que os empregados podem não ser inteiramente responsabilizados pelos acidentes.

Ao se confrontar Griffith e Neal (2000 a) com outros autores, percebe-se que estudos têm examinado os mecanismos através de que os fatores organizacionais influenciam o comportamento individual de segurança no trabalho O que ainda se demonstra como sendo uma total e completa falta de consideração com relação ao ser humano no ambiente de trabalho. A exemplo, Zohar (2002) e Cox e Cox (1991) com publicações com mais de uma década de intervalo, examinaram os fatores associados com o clima de segurança dentro das organizações e afirmam que existe uma necessidade preeminente sobre a mudança fundamental na compreensão de um modo geral de como os aspectos relativos a segurança devem ser controlados. Mullen (2004) demonstra, através de uma apreciação de análises in loco, que uma liderança específica em segurança afeta diretamente o clima percebido de segurança, no qual influencia significativamente o desempenho dentro desta área.

Em outras palavras, as ações gerenciais afetam diretamente o clima percebido da segurança por um indivíduo a tal ponto que se a gerência for comprometida com a segurança

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é muito mais provável que os trabalhadores se sintam também compromissados com esta. Segundo Coutinho e Ferraz (1995) as grandes transformações que ocorrem diariamente nos processos produtivos, em particular os processos industriais, cabem também para os serviços, e impõem grandes desafios para a atividade laboral. As mudanças no ramo da tecnologia são desafios permanentes que devem ser lidados com cautela e rigor ao mesmo tempo, tanto pela rapidez com que surgem, tanto pela capacitação que exigem.

Há algumas décadas atrás esse processo era lento, os sistemas mudavam de forma lenta e gradativa e dessa forma, eles conseguiam acompanhar as habilidades e limitações dos trabalhadores. Os autores citam ainda que:

“Atualmente, em face das novas tecnologias e da rapidez das transformações que elas

acarretam, assim como da necessidade crescente de qualidade, o sistema produtivo tem que ser capaz de dar respostas rápidas e aprimorar-se constantemente. Isto tem inúmeras exigências sobre cada um dos atores e, em especial, sob a sua interação”

(COUTINHO E FERRAZ, 1995, p.66).

Muitas vezes esses avanços são responsáveis por inúmeras falhas tidas como humanas, pois “errar é humano” e junto com este ditado vêm as implicações ligadas as faltas de conformação que muitas vezes podem ser relacionadas a falta de capacitação adequada frente a uma tecnologia diferenciada ou mesmo inovadora que está ainda arraigando-se dentro de uma sociedade industrial e de consumo. As ocorrências de acidentes dentro da indústria podem ser consideradas como fortes fontes de informação que podem e devem ser aproveitadas para a melhoria nas atividades de prevenção de riscos e acidentes, porém, devem ser minuciosamente investigadas, em especial, suas causas.

Esses dados quando bem trabalhados demonstram duas vertentes de informações, como a freqüência e a gravidade das ocorrências e as causas diretas (e indiretas) destas. Isto serve de subsídio para uma melhoria das atividades prevencionistas quando levado em conta o que está junto aos trabalhadores nos mais diversos aspectos, como fatores trabalhistas, sociais, familiares, etc. Claramente deve ser evidenciado que estas informações não podem ser deixadas de lado, mesmo que, como dito anteriormente, alguns dados sejam mascarados e muitas das informações perdidas (ZOCCHIO, 2000).

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devendo ser tratada com maior ênfase e respeito. Para se entender melhor os acidentes, deve ser dito que a legislação vigente ainda é muito escassa e ausente. Segundo os Planos de Benefícios da Previdência Social - PBPS (1991), o artigo 19 da lei nº 8.213, de 25 de julho de 1991 explica que:

“Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa

ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”

O que, segundo alguns autores, se demonstra apenas preocupada com as conseqüências humanas dos acidentes, porém, não se preocupa no que discerne sobre estes propriamente ditos. As atividades prevencionistas não são referendadas nestas leis, o que deixa a margem da obrigação os empresários sobre tais. O artigo 20 sobre a mesma lei, ainda esclarece o que pode ser considerado ou não como acidente do trabalho, descrito da seguinte forma:

“Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo

exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função

de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

Obs.dji.grau.2: Agentes Patogênicos Causadores de Doenças Profissionais ou do Trabalho -

Anexo II - RPS - Regulamento da Previdência Social - D-003.048-1999

Obs.dji.grau.3: Art. 336, Disposições gerais - Regulamento da previdência social - D-

003.048-1999

§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho: a) a doença degenerativa;

b) a inerente a grupo etário;

c) a que não produza incapacidade laborativa;

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desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho” (PBPS, 1991).

Deve ser dito que dentre os agentes patogênicos que causam algum tipo de doença profissional ou do trabalho, constante no Anexo II da lei relacionado ao artigo acima descrito apresenta diversos fatores relacionados ao trabalho, a exemplo da indústria de vidro, onde estão presentes agentes químicos, havendo uma preocupação com relação a tais agentes na produção de vidro pelo arsênio, na produção de vidros especiais e de porcelana para isolantes térmicos pelo berílio, foscamento de vidros com jatos de areia e a moagem com manipulação de sílica na qual é muito comum na indústria vidreira e ceramista pela sílica livre.

O que deve ser atentado é para o fato de que a indústria de vidro apresenta-se como fonte de uma série de doenças e agentes patogênicos que podem levar a algum tipo de acidente de trabalho.

Segundo Zocchio (2000), uma atividade integrada de segurança e saúde no trabalho deve possuir algumas prioridades seguidas a través do desenvolvimento de um ideograma, como apresentado na figura 3.2. Desta forma os pontos fundamentais para o autor, em prol de uma política e saúde no trabalho são organização e responsabilidade (pelo lado administrativo), ocorrências de acidentes, incidentes e doenças do trabalho e controle de riscos (no âmbito técnico), instruções e treinamento, divulgação e promoção (do ponto de vista logístico). Porém como o próprio autor menciona, estas diretrizes ainda precisam de mais trabalho e reflexão, especialmente por se tratar de áreas tão complexas.

O ideograma a seguir (figura 3.2) desenvolvido e apresentado por Zocchio (2000) possui alguns pontos que devem ser chamados a atenção, sobretudo com relação à política em si de normatização. O autor faz referencias apenas às NR’s, que ainda são falhas em diversos pontos quando não conseguem transpassar o ideal de atividade laboral para determinadas situações. A própria NR 17 que trata do tema da Ergonomia, peca em diversos aspectos. Em sua apresentação ela diz:

“17.1. Esta Norma Regulamentadora visa a estabelecer parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente”

Figura 3.1 - Ideograma de uma política de segurança e saúde no trabalho

Fonte: Adaptado de Zocchio (2000)

Segundo o Manual de Aplicação da NR-17 (2002, p.16) a palavra que se destaca no texto acima é “parâmetros” pois esta criou uma falsa expectativa de que a NR 17 poderia fornecer valores precisos, normatizando toda e qualquer situação de trabalho, o que não acontece em cada um dos subitens da norma. A intenção de abraçar todos os aspectos de ordem ergonômica seria louvável se não apresentasse itens como os que seguem, a exemplo no item

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“Para avaliar a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, cabe ao empregador realizar a análise ergonômica do trabalho, devendo a mesma abordar, no mínimo, as condições de trabalho conforme estabelecido nesta NR.”

Este pode ser considerado como sendo o tópico mais polêmico da NR 17, pois ainda de acordo com o referido manual de aplicação ele foi colocado para fazer-se exercer a função de um ergonomista dentro da organização e em situações de alta complexidade de entendimento de auditores fiscais. Fica claro e evidente que em casos como esse, todo e qualquer ônus com tal análise deve ser arcado pelo empregador. O que se tem visto no mercado é que pedidos de análises ergonômicas estão ocorrendo de uma forma rotineira cada dia mais. Segundo o subitem 17.3.3, tem-se que:

“Os assentos utilizados nos postos de trabalho devem atender aos seguintes requisitos

mínimos de conforto: a) altura ajustável à estatura do trabalhador e à natureza da função exercida (...)”

Tem-se que estes itens e indicações são muito vagos, e sem uma orientação de um ergonomista capacitado e experiente, as normas poderão ser seguidas erroneamente, causando malefícios a saúde e segurança do trabalhador. Segundo Barbosa (2001) existe uma grande problemática com relação à questão de normas e legislação vigentes já no princípio de formação de uma empresa, pois como ele afirma, não existe uma atribuição formal de se ter nos quadros de trabalho de uma indústria a formação de serviços relacionados à segurança do trabalho e à saúde do trabalhador, quando o número de empregados não é igual ou superior a 50, quando há a obrigação da formação de SESMT - Serviços Especializados em Segurança e em Medicina do Trabalho, e CIPA - Comissão Interna de Prevenção de Acidentes. Se existe ou não uma visão prevencionista por parte da sociedade e por parte de alguns órgãos responsáveis por tais atividades, ainda são casos omissos em determinado grau.

De acordo com Iyer, Haight, Del Castillo, Tink e Hawkins (2005), um adequado programa de segurança e de saúde no trabalho pode ser descrito como sendo um cenário dinâmico de atividades intervencionistas implementadas em um local de trabalho para impedir ou evitar incidentes, a sua probabilidade de ocorrência ou até mesmo a severidade das suas

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conseqüências. Estas intervenções incluem atividades como as de treinamento de segurança, verificação junto a equipamentos, inspeções das tarefas de manutenção, reuniões de segurança, observações sobre comportamento seguro dentro da empresa e assim por diante.

Segundo ainda o autor, caso sejam necessários mais esforços para melhorar a taxa de incidentes, a gerência requisita freqüentemente mais inspeções ou mais treinamento e reuniões de segurança, e assim por diante. Dessa forma, a porcentagem do tempo disponível sobre o recurso humano usado para executar o programa é feita como uma medida quantificável e variável do esforço aplicado, e sendo assim, deve ser mensurada para os programas de segurança e de saúde desenvolvidos como um fator incluso ao processo.Deve ser exemplificado que apesar do autor não deixar isso claro ou explicito em seu artigo, um forte fator individualista deve ser levado em consideração na hora de se começar a ter consciência sobre as atividades prevencionistas, e a capacidade de cognição de cada funcionário deve ser levada em consideração neste momento.

Isto por que, como mencionado anteriormente, se um sistema de gestão em segurança e saúde do trabalho não for bem direcionado, tendo as suas atividades em prol, e isto deve ser bem frisado, de um bem de seus clientes internos, mesmo levando em consideração o aspecto de responsabilidade social, ele tende a não ser aceito pelo corpo de funcionários com tanta facilidade e seu retorno será tardio ou ineficiente.