• Nenhum resultado encontrado

FORNECIMENTO DE AGUA CABIMENTO CULPA DA REOUERENTE IMPROCEDÊNCIA

3.8 Restrições ao condômino nocivo ou antissocial

3.8.3 A posição da doutrina, diante da omissão legislativa

Autorizada doutrina entende não ser possível a expulsão do condômino antissocial, exatamente em virtude da omissão da legislação condominial, entendimento que pode ser sintetizado nas lições do eminente advogado Nelson Kojranski374:

Diante desse vigoroso obstáculo legal, a exclusão do condômino nocivo, à moda suíça, depende, necessariamente, de uma revolucionária alteração constitucional legislativa, restrita, porém, à seara do condomínio edilício. Até a suspensão temporária do exercício da posse direta (equivale à expulsão espanhola durante longo período), não tem, entre nós, previsão legal. Daí se constatar ser bastante vulnerável a proteção do condomínio ao defrontar a utilização de unidade condominial, de forma agressiva aos bons costumes.

371 RACCIATTI, Hernán. Manual de la Priopiedad Horizontal, p. 138. 372 HIGHTON, Elena I. Propiedad horizontal y prehorizontalidad, p. 338. 373 ELIAS FILHO, Rubens Carmo. As despesas do condomínio edilício, p. 121.

374 KOJRANSKI, Nelson. Condomínio Edilício, p.160. No mesmo sentido, SARTORELLI, Renato Sandreschi.

A exclusão do condômino nocivo perante a legislação de condomínio, Condomínio Edilício, aspectos relevantes, aplicação do novo Código Civil, p. 233.

Analisando o tema em comento, J. Nascimento Franco também concluíra de que a Lei nº 4.591/64 não autorizava a expulsão do condômino antissocial, assinalando, porém, a inexistência de óbice a que a lei ordinária viesse a dispor nesse sentido.

Contudo, para os abusos reiterados a punição eficaz é a exclusão definitiva do condômino ou, pelo menos, com condenação de mudar-se para outro local, pois não é justo que o edifício seja afetado em seu bom nome e seus moradores forçados a suportar a presença de alguém cujo mau comportamento seja incompatível com a moralidade e os bons costumes. O preceito constitucional que assegura o direito de propriedade não conflitará com a lei ordinária que prescrever a interdição temporária do uso, ou a alienação compulsória do apartamento cujo titular cause intranqüilidade à vida condominial. Isso porque aquele direito tem de ser exercido visando ao bem-estar social, nunca para prejudicá-lo na sua realização prática.375

Nessa direção, Américo Isidoro Angélico376 escreveu excelente estudo interpretando o parágrafo único do artigo 1.337 do Código Civil. Nesse estudo, sustenta que o juiz pode aplicar conjugadamente com o mencionado dispositivo os artigos 273, e 461, §5º, do Código de Processo Civil para determinar a remoção do condômino que, embora punido com multa, continue mantendo comportamento agressivo com a coletividade condominial.

Pode o juiz, então, ante a evidência dos fatos, da prova inequívoca e do convencimento da verossimilhança, decidir pela exclusão do co-proprietário da unidade condominial, continuando este com seu patrimônio, podendo locá-lo, emprestá-lo ou vendê-lo, perdendo, porém, o direito de convivência naquele condomínio.

Outrossim, cumpre observar as lições de Silvio de Salvo Venosa:

Nossa conclusão propende para sentido de que a permanência abusiva ou potencialmente perigosa de qualquer pessoa no condomínio deve possibilitar sua exclusão mediante decisão assemblear, com direito de defesa assegurado, submetendo-se a questão ao Judiciário. Entender-se diferentemente na atualidade é fechar os olhos à realidade e desatender ao sentido social dado à propriedade pela própria Constituição. A decisão de proibição não atinge todo o direito de propriedade do condômino em questão, como se poderia objetar; ela apenas o limita, tolhendo seu direito de habitar e usar da coisa em prol de toda uma coletividade. Quem opta por residir ou trabalhar em um condomínio de edifícios ou comunhão

375 FRANCO, J. Nascimento. Condomínio, 5 ed. , ed. rev. dos Tribunais, p. 247.

376 ANGÉLICO, Américo Isidoro. BDI, outubro 2003, n. 29/3 – Exclusão do condômino por reiterado

comportamento anti-social à luz do novo Código Civil No mesmo sentido, Condomínio no Novo Código Civil, p.47- 48.

condominial assemelhada deve amoldar-se e estar apto para a vida coletiva. Do contrário, deve estabelecer-se ou residir em local apropriado conforme sua condição, estado e personalidade. A situação no caso concreto, contudo, exigirá o diligente cuidado do julgador, pois estão em jogo dois interesses de elevado grau axiológico, quais sejam, o direito individual do proprietário e o direito do corpo coletivo condominial377.

Não é outro o entendimento de Ênio Zuliani378:

Não se ignora a força do princípio nulla poena sine lege e urge reverenciá-lo para o bem da legalidade da ordem constitucional. Ocorre que a ordem de expulsão do condômino não é, em verdade, uma pena civil que o juiz aplica sem ter norma que o autorize a isso, mas, sim, uma solução prevista no ordenamento para adequar os interesses conflitantes dos proprietários. Não se engessam as mentes dos juízes ou imobilizam suas canetas com o frágil discurso de que a lei não autoriza determinado julgamento, bastando recorrer ao disposto no art. 126, do CPC, para se afastar tal argumento. O condômino desafia a ordem jurídica e a convenção, pouco se importando com as regras institucionais e morais, prejudicando, com isso, direitos de ordem pessoal e reais dos demais proprietários, o que autoriza criar o título coercitivo da saída forçada do conjunto de apartamentos (art. 461, § 5º, do CPC), devido ao não cumprimento da obrigação prevista no art. 1336, IV e 1337, do CC. O direito dos demais condôminos é prioritário e resulta da necessidade de ser combatido o abuso de direito (art. 187, do CC) e o desvio da função social da propriedade (art. 5º, XXIII, da CF) que o lesante reiteradamente pratica, bem como para permitir qualidade de vida digna aos vizinhos (art. 1º, III, da CF). Evidentemente, esse direito poderá ser exercido somente quando as infrações reiteradas atingirem um patamar de insuportabilidade, grau de insatisfação que se reconhece em se constatando que nada mudou mesmo depois do exaurimento das providências previstas (as multas). Não é preciso que exista cláusula na convenção autorizando que se peça a expulsão do condômino nocivo, embora fosse salutar que existisse essa regulamentação, mas a falta de inserção de uma ocorrência dessa ordem no estatuto não poderá impedir que o grupo recorra ao Judiciário para pleitear o cumprimento da convenção e da lei. É indispensável, contudo, que se delibere a respeito em assembléia designada especificamente para esse fim, cientificando o infrator para que exerça seus direitos, na forma do art. 5º, LV, da CF.

A matéria ainda não se encontra consolidada na jurisprudência, existindo, todavia, decisões que acolheram o afastamento do condômino antissocial, para a preservação da

377 Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil. Direitos Reais, p. 305; No mesmo sentido, Alvaro Villaça de Azevedo,

O Condomínio, p. 1033.

378 Ênio Santarelli Zuliani, O que fazer com o condômino antissocial que não muda o comportamento nocivo,

apesar das multas aplicadas?Disponível em:

http://www.tj.sp.gov.br/EstruturaOrganizacional/SegundaInstancia/OrgaosJulgadores/SecaoDireitoPrivado/Dout rina/Doutrina.aspx?Id=637), Acesso em: 15/01/2012.

segurança e sossego da coletividade379, enquanto outras decisões desacolheram a pretensão diante da ausência de norma legal (nulla poena sine lege)380.

379 ―EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. CONDOMÍNIO. DIREITO CIVIL. COISAS. PROPRIEDADE. Exclusão

do condômino nocivo. Impossibilidade convivência pacífica ante a conduta anti-social do condômino. APELO NÃO PROVIDO. UNÂNIME‖. (Apelação Cível Nº 70036235224, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Bernadete Coutinho Friedrich, Julgado em 15/07/2010). Segue abaixo transcrição de pequena parte do acórdão que bem elucida a proposta apresentada:

―[...] Na hipótese dos autos, muito embora tenha-se presente que nenhum direito fundamental é absoluto, há que se adotar a teoria da ponderação dos bens. Vale dizer, as normas constitucionais possuem idêntica hierarquia, mas os valores derivados dos princípios diferenciam-se, observado o peso desses valores e as circunstâncias do caso‖.

E entre os valores jurídicos postos em jogo, indubitável que a segurança e a dignidade humana devem ser resguardadas, de modo a serem impostas restrições ao direito de propriedade, já que o interesse coletivo detém supremacia em relação ao individual.[...]

Assim, em que pese não haja previsão expressa a amparar a pretensão de exclusão do réu do condomínio autor, uma vez que o art. 1337 do CC/2002 não contempla tal possibilidade, pode o magistrado, verificando que o comportamento anti-social extravasa a unidade condominial do ―infrator‖ para as áreas comuns do edifício, levando o condomínio à impossibilidade de corrigir tal comportamento mesmo após a imposição do constrangimento legal – multa -, decidir pela exclusão do proprietário da unidade autônoma, continuando este com seu patrimônio, podendo ainda dispor do imóvel, perdendo, entretanto, o direito de convivência naquele condomínio. [...]

Ressalte-se que, em se tratando de medida judicial restritiva ao direito de propriedade, mais especificamente no que diz com a fruição do respectivo bem, é de ser adotada em caráter excepcionalíssimo, tal como espelha o caso dos autos, já que em risco o sossego, a integridade física e até mesmo a própria vida dos demais condôminos.

Aliás, o que deflui do processado é que o demandante está a carecer de tratamento médico-psiquiátrico, voluntário ou compulsório, já que suas atitudes denotam acentuados desvios de comportamento, o que está a reclamar atitude de algum familiar seu ou de quem eventualmente por ele se responsabilize.[...]

No mesmo sentido: ―Condomínio edilício - Situação criada por morador, sargento da Polícia Militar, que, reincidente no descumprimento das normas regulamentares, renova condutas anti-sociais, apesar da multa aplicada e que não é paga, construindo, com isso, clima de instabilidade ao grupo e uma insegurança grave, devido ao seu gênio violento e ao fato de andar armado no ambiente, por privilégio profissional - Adequação da tutela antecipada emitida para obrigá-lo a não infringir a convenção, sob pena de multa ou outra medida específica do § 5º, do art 461, do CPC, inclusive o seu afastamento - Interpretação do art. 1337, do CC - Não provimento (TJ/SP. 994071089530 (5139324300). Relator(a): Enio Zuliani. Data de registro: 21/08/2007. Quarta Câmara de Direito Privado. ―APELAÇÃO CÍVEL. CONDOMÍNIO. PEDIDOS DE CONDENAÇÃO A PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO. MULTA CONDOMINIAL E EXPULSÃO DE CONDÔMINO. SENTENÇA QUE INDEFERIU A INICIAL POR FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL E IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. DECISÃO QUE MERECE REFORMA. AS CONDIÇÕES DA AÇÃO DEVEM SER EXAMINADAS CONFORME AS AFIRMATIVAS DO AUTOR NA PETIÇÃO INICIAL, DE ACORDO COM A "TEORIA DA ASSERÇÃO". RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. [...] Da mesma forma, a avaliação da possibilidade jurídica do pedido quanto à expulsão do primeiro réu também deve ser verificada segundo as suas asserções, as quais indicam a sua admissibilidade com respaldo de interpretação doutrinária, ainda que somente em situações extremas em que a progressão da multa não se revelou eficaz a ilidir a ameaça à tranqüilidade ou à segurança dos demais moradores.‖ (TJ/RJ. 0089754-33.2009.8.19.0001 - APELACAO - 1ª Ementa. DES. MARCIA ALVARENGA - Julgamento: 30/04/2010 - TERCEIRA CAMARA CIVEL).

380―Ementa: Mandado de Segurança. Decisão judicial que, em antecipação de tutela, determina a expulsão da

impetrante e sua família do condomínio e do imóvel de sua propriedade. Embora cabível recurso ordinário, aliás interposto e não conhecido por intempestivo, o Tribunal conhece do Mandado de Segurança por se tratar de decisão que alcança direitos elementares como os de propriedade, do idoso, da dignidade humana. O Código Civil permite no art 1.337 a aplicação de multas que podem ser elevadas ao quíntuplo e ao décuplo em circunstâncias semelhantes, mas não prevê, pelo menos especificamente, a possibilidade de expulsão. Segurança concedida para revogar a antecipação de tutela e condicionar uma nova apreciação ao final da dilação probatória.‖ (TJ/SP. Mandado de Segurança 994071158974 (5506874500). Relator(a): Maia da Cunha. Comarca: Barueri. Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado. Data do julgamento: 24/07/2008. Data de registro: 29/07/2008) ―Ementa: Apelação - Cautelar para impedir condômino de usufruir de seu apartamento - Mau uso do bem e penhora - Indeferimento da petição inicial - Pedido juridicamente

3.8.4. A aplicação dos princípios gerais do direito e a função social da