• Nenhum resultado encontrado

A presença do anim us da teoria de Savigny

2 TRANSMISSÃO DA POSSE E SEU PAPEL NA TUTELA DO PROMITENTE COMPRADORTUTELA DO PROMITENTE COMPRADOR

2.2.1 A presença do anim us da teoria de Savigny

M an u el R O D R IG U E S leciona que, segundo a teo ria savigniana, a posse é um fato, p o r isso a sua perturbação não pode ser considerada com o violação de um d ireito .44 É ato de vio lência todo aquele que rom pe a sua relação com a coisa, com lesão à pessoa do possuidor, m otivo pelo qual a tu tela da posse busca a salvaguarda da dignidade da pessoa hum ana, na probabilidade ou suposição de que o possuidor tem d ireito a ela. A sua proteção se justifica, então, pela necessidade de defender in stituto s, que ,sem isso, não se poderiam tu te lar em toda a plenitude.

Sav ign y teve o m érito de analisar a posse sem relacioná-la com o d ireito de propriedade. A sua teoria foi considerada expoente exatam ente p o r co n ferir independência à noção de posse, relativam ente à propriedade. C om o in stitu to não sujeito à concepção de propriedade, de caráter e significado ju ríd ico p ró p rio , a posse foi analisada sem negar que se pode apresentar com o um prolongam ento do d ireito de propriedade. O m érito da teoria em apreço está em reconhecer direitos exclusivos e estritos da posse resultantes, direitos esses que, se estiverem configurados na posse do prom itente com prador, m erecem ter reconhecida um a

44 RODRIGUES, Manuel. A posse : estudo de direito civil português. 3. ed. Coimbra : Almedina, 1980.

p. 26.

tutela ju ríd ica à parte, independente de qualquer referência à propriedade do prom itente vendedor.

N o desenvolvim ento da teoria subjetiva de Savigny, destacam-se, então, dois com ponentes. O prim eiro , denom inado corpus, é representado pelo poder físico sobre a coisa. E o elem ento m aterial, que consiste no exercício efetivo ou na possibilidade do exercício físico de poderes m ateriais dem onstradores do controle do possuidor sobre o bem, o seu predom ínio im ediato sobre a coisa, excluindo assim toda a influência estranha.

O segundo com ponente é o anim us, elem ento psicológico que representa a intenção de ter a coisa como sua, qualidade que revela o propósito de exercer sobre a coisa, como seu titu lar, o direito real correspondente àqueles poderes m ateriais.

Para a teoria subjetiva, esses dois elem entos, corpus e anim us, não são aptos a caracterizar a posse isolada e independente. É a vontade de possuir para si, segundo Savign y, que dá origem à posse ju ríd ica. A quele que possui p o r outro sujeito de direito, para essa teoria, é m ero detentor. Essa circunstância explica por que, para a teoria savigniana, o locatário é considerado m ero detentor; um a vez que reconhece em outrem , especificam ente no locador, a vontade de possuir.

A p artir desse pressuposto da teo ria subjetiva, é perfeitam ente possível questionar se o prom itente com prador é titu la r de um a posse direta diante de um a posse indireta do prom itente vencedor. M as a teoria subjetiva não explica satisfatoriam ente a bipartição da posse, já que para a sua existência deve haver no possuidor a m esm a vontade que há no p ro p rietário . Em verdade, a teo ria subjetiva se apresenta incom patível com a noção de concorrência de posses sobre um a m esm a coisa, ou desdobram ento da posse, prim eiram ente porque é im possível haver dois possuidores com anim us dom ini, requisito do qual depende a configuração dessa concepção possessória. P or ser im possível haver o anim us de ser dono na pessoa do locatário, do usufrutuário, do depositário, titulares da posse em função da relação ju ríd ica obrigacional que dá origem ao desdobram ento, não há como enquadrá-los com o possuidores na perspectiva da teo ria subjetiva, aspecto que a torn a criticável.

De outro lado, a noção de posse com anim us dom ini é in co n ciliável com o requisito da tem porariedade, já que posse com essa qualificação deve ser d efinitiva.

P ara essa dou trina, posse é o poder de dispor fisicam ente da coisa, com o ânim o de considerá-la sua e desse modo defendê-la contra a intervenção de terceiros.

P or esse m o tivo é fundam ental p erq u irir a intensidade da vontade de possuir. A p a rtir desse pressuposto em pírico possibilitar-se-á verificar a existência do anim us dom in i e, conseqüentem ente, aferir se de posse efetivam ente se pode cogitar.

C onsoante as ponderações de C ló vis B E V IL Á Q U A e de G O N D IM N E T O , é im p o rtan te realçar que o anim us dom ini do possuidor, ou a intenção de possuir com o p ro p rietário , não se confunde com a opinio dom ini, que caracteriza pala convicção que alguém tem ser pro p rietário , pela crença de ser dono. O anim us d om ini se apresenta com o posse com a intenção de ter a coisa com o própria, quando se possui com a ciência de que não se é titu la r do d ireito real correspondente, em bora o seu com portam ento seja a ele equivalente, revelando-se num a aparência.

Para C ló vis B E V IL Á Q U A , o anim us dom ini tam bém não se confunde com o anim us possidendi, nom eadam ente no instante em que a posse é alienada independente da propriedade. C onform e G O N D IM N E T O , “o anim us possidendi consiste na intenção de exercer as relações ju ríd icas indicadas na lei com o causae

5 5 4 5

possessionis .

A p a rtir da noção de anim us é possível d istin gu ir a posse que pode ser causa da propriedade da coisa, nom eadam ente aquela que pode levar a usucapião, daquelas outras sem qualificação para configurar a “prescrição aq u isitiva”. N a perspectiva da teo ria em análise e para o deslinde da proteção possessória do com prom issário, percebe-se que é relevante analisar a n atureza ju ríd ica da relação obrigacion al em virtu d e da qual se possui e a posição do p ro m iten te com prador no desenrolar dessa m esm a relação ju ríd ica, de m odo que seja possível avaliar ou estabelecer a qualificação do anim us da sua posse.

45 BEVILÁQUA, p. 23; GONDIM NETO, p. 75.

A causa da posse do prom itente com prador é o rigin ária do con trato com prom isso de com pra e venda, que tem po r finalidade ú ltim a a transm issão da titularid ad e do direito de propriedade, o que revela a existência, em tese, do anim us de possuir a coisa em caráter definitivo desde a sua im issão na posse, com o se já fosse sua, em bora form alm ente ainda não seja o titu la r do dom ínio. P o r outro lado, ante a possibilidade de inadim plem ento de sua parte, com o retorn o da posse ao prom itente vendedor, não se pode afirm ar que tenha a posse de m odo concludente.

A apreciação da tu tela possessória do com prom issário deverá necessariam ente considerar esses aspectos, que serão aqui oportunam ente analisados.

A teoria savigniana contrapõe-se a teoria objetiva de Iherin g, cuja contribuição será objeto de estudo a seguir.