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2 PRINCÍPIOS, INTERPRETAÇÃO E DIREITOS FUNDAMENTAIS

2.4 DIREITOS FUNDAMENTAIS

2.4.8 A questão da eficácia dos direitos fundamentais: terminologias e concepções de

50. Primeiramente, cabe delimitar o que se entende, para os efeitos deste estudo,

por validade, vigência e eficácia.

Para que uma norma seja considerada válida ela deve estar “integrada” na ordem jurídica. Com efeito, para que isso ocorra há de ser observado o processo de produção normativa, respeitando-se os procedimentos específicos previstos no próprio ordenamento. Então, quando forem obedecidos os requisitos haverá uma norma jurídica válida223.

A vigência, por sua vez, concerne à “exigibilidade” de uma conduta, o que ocorre desde um determinado momento até a revogação da norma jurídica. Geralmente, ocorre com a publicação da lei, contudo, ela poderá ser postergada. Assim, a norma pode ser válida, mas não vigente, sendo este o caso em que a lei passa a ter vigência após o decurso de algum tempo da data de sua publicação. Esse tempo é chamado pela doutrina de vacatio legis224.

Nesse sentido, o artigo 1º, do Decreto-lei n. 4.657, de 04 de setembro de 1942 (antiga Lei de Introdução ao Código Civil, que passou a ter a epígrafe “Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro” a partir da Lei n. 12.376, de 30 de dezembro de 2010), dispõe que “salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada” 225. Entende-se, assim, que a lei é válida com a sua promulgação e publicação, mas geralmente passa a ter vigência tão-somente quarenta e cinco dias após a sua publicação, exceto se houver disposição em sentido diverso na própria lei.

Há, todavia, na doutrina, quem identifique a vigência com a existência da norma. Com efeito, a vigência, então, diria respeito à característica da norma que a faz existir no mundo jurídico, o que ocorreria com a sua promulgação e publicação, sendo a vigência considerada como pressuposto da eficácia226.

223 FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. Op. Cit. p. 196.

224 Ibid., p. 196-197.

225 BRASIL. Decreto-lei n. 4.657, de 04 de setembro de 1942. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657.htm>. Acesso em: 29 nov. 2012, 15:07:26. Id. Lei n. 12.376, de 30 de dezembro de 2010. Altera a ementa do Decreto-Lei no 4.657, de 04 de setembro de 1942. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007- 2010/2010/Lei/L12376.htm#art2>. Acesso em: 29 nov. 2012, 15:06:45.

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Já a eficácia se desdobra em eficácia jurídica e eficácia social (ou efetividade). A primeira delas condiz com a possibilidade de a norma válida e vigente estar apta a produzir efeitos na esfera jurídica das pessoas, podendo ser aplicada aos casos concretos. A eficácia social, por sua vez, concerne à efetiva aplicação da norma à situação fática227.

51. A doutrina norte-americana, partindo da noção de eficácia, distinguia as normas

constitucionais em normas constitucionais autoexecutáveis (self executing provisions) e não autoexecutáveis (non self executing provisions). As primeiras são aptas a gerar efeitos desde sua entrada em vigor, não dependendo de ulterior atuação do legislador para ter plena eficácia. As normas constitucionais não autoexecutáveis, por seu turno, são aquelas que necessitam da intervenção legislativa para a propagação de seus efeitos228.

Não se pode, entretanto, aceitar essa concepção. Isto porque não existe norma constitucional vigente que seja destituída de eficácia. No mínimo, a norma estabelece diretrizes para o legislador exercer sua atividade legislativa concretizadora. Ou seja, a lei a ser editada pelo legislador deve observar as disposições constitucionais, mesmo que se entenda que a norma constitucional tenha caráter meramente programático, o que não é o presente caso, mas, ainda que assim o fosse, essa vinculação do legislador ao texto constitucional denota que a norma constitucional tem um mínimo de eficácia229.

Acerca da eficácia das normas constitucionais, ressalta-se, dentre as mais citadas teorias, aquela que foi desenvolvida por José Afonso da Silva. Trata-se da teoria tricotômica da eficácia, que subdivide as normas constitucionais em normas de eficácia plena, contida e limitada.

Segundo tal teoria, as normas constitucionais que possuem eficácia plena são aptas a produzir todos os seus efeitos essenciais desde sua entrada em vigor, independendo de

fundamentais na perspectiva constitucional. Op. Cit. p. 236. Vide, ainda: TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso

de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 282-285; BARROSO, Luís

Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas: limites e possibilidades da constituição brasileira. Op. Cit. p. 78-82.

227 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Op. Cit. p. 240; FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio.

Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. Op. Cit. p. 197-198; BARROSO, Luís

Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas: limites e possibilidades da constituição brasileira. Op. Cit. p. 82-87. A respeito da eficácia das normas constitucionais, vide: SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. Op. Cit. p. 208-251.

228 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Op. Cit. p. 242-243; COOLEY, Thomas McIntyre. A treatise on

the constitutional limitations which rest upon the legislative power of the states of the American union.

6ª. Ed. Boston: Little, Brown, and Company, 1890. p. 89-101.

229 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Op. Cit. p. 245. No mesmo sentido, vide: TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de Direito Constitucional. Op. Cit. p. 299-316.

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qualquer intervenção legislativa para gozarem de plena operatividade230.

Já a concepção de eficácia contida concerne à possibilidade de as normas que possuem aplicabilidade imediata e direta terem seus efeitos restringidos por meio da atuação do legislador, que poderá, por meio da lei, definir, de forma mais restrita, os contornos dos direitos enunciados pela disposição constitucional231.

Enfim, a eficácia dita limitada é inerente às normas cuja aplicabilidade é indireta ou reduzida, não tendo o constituinte estabelecido normatividade suficiente para que elas sejam, desde sua edição, aptas a gerarem todos os efeitos, necessitando, destarte, de atuação legislativa ulterior para sua concretização. São as normas de princípios programáticos ou criadoras de instituições ou órgãos232.

Na doutrina percebe-se que, há, no mínimo, a classificação em dois tipos de normas: as que geram os efeitos essenciais desde a sua edição e as que dependem de intervenção do legislador para operarem de forma completa. Pode-se dizer, ainda, que há a possibilidade de restrição de direitos, sem que se refira, no caso, às normas de eficácia contida. Nesse contexto, preferir-se-á falar, para os efeitos deste estudo, em normas de “alta densidade normativa”, referindo-se àquelas que possuem aptidão para, diretamente e sem a necessidade de atuação legislativa, gerar os efeitos essenciais, e normas de “baixa densidade normativa”, que possuem um mínimo de eficácia jurídica, mas que dependem de intervenção do legislador para a produção em plenitude de seus efeitos essenciais233.

2.4.9. Aplicabilidade imediata e plena eficácia das normas de direitos