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A relação entre passado, memória e imaginação

3 FICÇÃO, AUTOBIOGRAFIA, DIÁRIO E REPRESENTAÇÃO DA

3.1 A representação da memória em O amanuense Belmiro

3.1.3 A relação entre passado, memória e imaginação

Outro ponto a ser apresentado e que faz parte do processo constitutivo desse narrador-personagem, relaciona-se ao seu caráter onírico. Belmiro não apenas oscila entre a narrativa de sua realidade cruel e de seu passado, como é acometido por fantasias. Logo, seus relatos, tanto os relacionados ao presente quanto os relacionados ao passado, são afetados por sua imaginação. Diante disso, a narrativa estabelece uma relação intrínseca entre a memória, o passado e a imaginação, sobretudo, tendo em vista às referências ao mito Donzela Arabela e ao Problema Fáustico. Esses dois conceitos fazem parte de um imaginário construído pelo próprio narrador e se entrelaçam às lembranças de seu passado em Vila Caraíbas. Esse imaginário não afeta apenas suas lembranças, mas também, sua relação com o tempo presente, principalmente sua vida amorosa. A primeira referência ao Problema Fáustico surge no capítulo 20, quando Belmiro relata uma determinada noite em que resolve ir à casa de Silviano e na ausência deste, acaba lendo seu diário por acaso. Nele, constam suas anotações sobre o problema fáustico. Neste diário, Silviano tece seus comentários acerca desse problema, que consiste no “amor (vida) estrangulado pelo conhecimento” (ANJOS, 2001, p. 67). Mais tarde, já na presença de Silviano, os dois amigos travam uma conversa sobre as inquietações faústicas, que estariam presentes na forma do mito Donzela Arabela, confidenciado pelo amanuense.

De acordo com Silviano, o mito Donzela Arabela é um símbolo fáustico que configura a “aspiração do imaterial (insubstancial) e do intemporal feminino” (ANJOS, 2001, p. 70), ou melhor, a aspiração daquilo que não é material e que está fora do tempo, de tornar- se material e inserir-se nesse mesmo tempo, representando “a vida que foge diante do asceta!” (ANJOS, 2001, p. 71). Dessa forma, o mito que tanto preenche a vida de Belmiro, constitui um símbolo fáustico do asceta – daquele que renuncia ao prazer. Esse símbolo é fruto do que a imaginação do asceta cria e representa a irrealização do seu desejo. Nesse caso, o mito Donzela Arabela é a vida que foge, estrangulada pelo conhecimento – é o fantasma do desejo a que ele renuncia, mas que está a assombrá-lo. Porém, o mito Donzela Arabela não é o único símbolo fáustico apresentado pela narrativa, pois constantemente há referências às moças em flor. Estas também entrariam nesse conceito, posto que representem, de alguma forma, essa vida que foge. Assim sendo, as moças em flor também se configuram aspirações atemporais, como Jandira bem nota, ao lamentar-se pelo fato de ela mesma ser o oposto desse símbolo fáustico, já que essas moças estão sempre protegidas por um sistema que as torne impossíveis para os homens. Impossibilidade esta que gera todo um mundo de doces fantasmas, desencadeando o sentimento amoroso.

Um exemplo dessa referência encontra-se no capítulo 18, em que Belmiro é levado por Glicério para um jogo de pôquer na casa do Senador Furquim. Lá, depara-se com um baile repleto de jovens rapazes e moças em flor. Belmiro permanece a um canto da casa a observar o baile e volta ao passado, relembrando os bailes e as moças de Vila Caraíbas. Surge um desconforto perturbador que o faz sentir a necessidade de fugir das moças em flor, sobretudo de Carmélia, pois este contato deixa ainda mais evidente a passagem do tempo. Para o amanuense: “Receber o calor dos novos e sofrer-lhes o contato ainda é pior que o frio de uma velhice que nos espreita” (ANJOS, 2001, p.63), por essa razão, é melhor refugiar-se no passado – onde o tempo não passa, está estático. “A quem vai passando, o melhor é esconder-se nas cavernas do peito e nelas procurar o panorama do seu tempo” (ANJOS, 2001, p. 63), e criar fantasmas que o façam esquecer-se das ideias cruéis que o amofinam.

A primeira referência ao mito “Donzela Arabela” aparece no capítulo 7 do romance, quando na terceira noite de Carnaval, Belmiro desce à Avenida para observar o movimento. Ao analisar as colombinas da Praça Sete, o narrador-personagem é conduzido por um cordão de foliões até um baile de carnaval, em um clube da cidade. A certo momento, uma moça o pega pela mão e junto a outros foliões rodopiam pelo salão. Assim, é nesse baile que ele se depara com o amor, pois esta linda jovem lhe roubará vários momentos de delírios. Futuramente, Belmiro até vem a conhecer seu nome, Carmélia, mas nada mais que isso.

Carmélia exercerá tal fascínio em Belmiro, que ele acabará relacionando-a ao mito da Donzela Arabela, que tem origem em sua infância, nas noites da Fazenda, onde contava-se a história de Arabela, uma linda donzela que morrera de amor e entoava tristes canções na torre de um castelo. Durante todo o baile, permanece nessa divagação, fora do tempo e do espaço e só dá conta de si ao raiar do dia seguinte. O mito passa a preencher sua vida, fazendo com que se entregue às emoções e devaneios, em busca de sua conciliação com o mundo.

O Belmiro que sucumbe ao mito é o Belmiro patético e obscuro, que se entrega ao mundo de sensibilidade – evocando o passado – em detrimento do Belmiro sofisticado e racional – que se atém ao relato do presente. Para o amanuense, o mito é o alimento para os homens e com propósito, é desse alimento que sua vida irá se nutrir ao longo de toda a narrativa. A partir desse episódio, Belmiro passa a criar toda a sorte de fantasias em torno de Carmélia, que tem sua imagem real associada à figura da Donzela Arabela. Em alguns momentos da narrativa, Belmiro procura analisar com objetividade o que se passara no Carnaval. Sob sua perspectiva, é essencial para sua vivência buscar dentro de si material para suas “combustões interiores” (ANJOS, 2001, p. 40), pois são essas que, de certa forma, acalmam seu espírito. Contudo, há momentos em que a realidade se impõe e o obriga a retornar de seus passeios interiores. Mas, a alma não satisfeita e a vida que “não se conforma com o vazio” (ANJOS, 2001, p. 41) criam uma armadilha contra si mesmo – a qual o amanuense explica da seguinte forma:

Para iludir-lhe o espírito vaidoso, oferecem-lhe o presente sob aspectos enganosos, encarnando formas pretéritas. Trazem-lhe uma nova imagem de Arabela, humanizando o “mito da donzela” na rapariga da noite de carnaval. Foi hábil o embuste, e o espírito se deixa apanhar na armadilha... (ANJOS, 2001, p.40).

Preso nesse “embuste”, põe-se a procurar a Donzela por todos os lugares, com o espírito inquieto e atordoado pelo fenômeno de humanização do mito. Esse mito representa a associação entre a lembrança de uma lenda do passado e a figura real do presente. Ricoeur, ao estudar a relação entre lembrança e imaginação, tem como ponto chave a seguinte indagação: “Como explicar que a lembrança retorne em forma de imagem e que a imaginação4, assim

mobilizada, chegue a revestir-se das formas que escapam à função do irreal?” (RICOEUR, 2007, p. 66). Para desatar esta questão, Ricoeur recorre, como possibilidade de trabalho, a Bergson e à sua concepção da passagem da lembrança pura à lembrança-imagem. Dessa _____________

forma, existiria uma lembrança pura, ainda não travestida em imagem, que passaria desse estado puro a uma forma imagética. A lembrança-imagem seria uma forma intermediária, resultante da união entre a memória que revê e a memória que repete. Essa união ocorreria no fenômeno do reconhecimento, portanto, a recordação também conteria a chave da transformação da lembrança pura em imagens. O trabalho da memória, desse modo, traduz-se em tornar uma lembrança virtual em uma imagem presente. Contudo, esses dois pontos do processo, o estado virtual e a imagem, são distintos, destacando a seguinte ressalva:

Imaginar não é lembrar-se. Uma lembrança, a medida que se atualiza, provavelmente tende a viver numa imagem; mas a recíproca não é verdadeira, e a imagem pura e simples só me levará de volta ao passado se eu realmente tiver ido busca-la no passado, seguindo assim o progresso contínuo que a trouxe da obscuridade para a luz (RICOEUR, 2007, p. 68, grifos do autor).

Retomando a narrativa, depois de andar em busca da sua própria criação, Belmiro confessa que essa ideia se dissipara. No entanto, as divagações não cessam e mesmo quando descobre algumas informações mais contundentes a respeito de Carmélia, sua existência real não se desvincula da mítica Arabela. Com isso, Belmiro oscila entre enxergar Carmélia como figura humana de um mundo real – e nesses momentos afirma que seu desejo é da pessoa e não do mito que ela representa –, e inter-relacionar essas duas figuras de sua esfera amorosa. No segundo caso, Belmiro se rende ao mundo da imaginação e concebe maneiras de encontrar e se apresentar à moça, salvando a família de qualquer infortúnio. O amanuense permanece oscilando entre reagir e entregar-se aos devaneios e evocações do mito. Em seus momentos de reação, filosofa sobre o mito que criara que, segundo o próprio, se deve ao luar caraibano e reconhece que seus sentimentos não estão direcionados à figura real de Carmélia:

E criei um ser fantástico, onde só entram tênues traços da moça; o mais, já se sabe, é contribuição do luar caraibano, das noites ermas, de todo o monstruoso romantismo, secreção mórbida da fazenda e da Vila.

Pura imaginação: tudo se resume nisso e nada há além disso. A Carmélia que amei não existe. (ANJOS, 2001, p. 78).

Logo, a partir de uma imagem nebulosa de uma Carmélia real, Belmiro uniu o mito de sua infância, numa atitude de humanização do símbolo fáustico que criara. A sua imaginação se empenha em torno da criatura. No entanto, a figura de Carmélia associa-se não somente ao mito infantil, mas também à imagem de Camila – seu amor de infância que

morrera em Vila Caraíbas. As lembranças de Camila e todo o sentimento amoroso que se associa a ela, subsistem no adulto e unem-se à imagem da Carmélia real, a ponto de Belmiro confessar a si mesmo: “Por que te deixei, Camila? Na verdade, eu te amava. O que eu amo nessa Carmélia, que não atinjo, é, talvez, apenas a tua imagem” (ANJOS, 2001, p. 118).

Já no capítulo 54, o amanuense parece, enfim, optar por uma direção. Já não reage contra o romantismo que o invade, posto que este seja terno e a fuga é inútil. A escolha por tornar-se um ser onírico o leva a tramar um arranjo, para o entendimento de seu símbolo fáustico. Nele, a Carmélia construída por si mesmo, em detrimento da Carmélia real, será sempre dele, ao menos em suas visões e jamais sofrerá a ação desagregadora do tempo. Esta Carmélia, ora assume seu aspecto real, ora assume o aspecto de Camila. Por esse viés, Carmélia seria apenas um momento da atemporal Arabela, uma lenda criada por ele mesmo que se relaciona, também, às lembranças de Camila. Belmiro está certo de que a convivência viria a destruir a lenda, fruto de sua solidão e da distância decisiva entre a Carmélia que aspira e a Carmélia real. Seria uma lenda criada pela necessidade de dar sentido a uma vida sem sentido. O sentimento amoroso de Belmiro está associado à tentativa de dar significado, de florear e criar habitantes ou seres que preencham sua sensação de vazio.

Não obstante, vemos que o sentimento amoroso do narrador-personagem revela-se apenas como elemento mediador do conflito entre o mundo real e o mundo imaginário. E o princípio em que jaz e se fortifica um mito é o fato da impossibilidade de viabilizá-lo. Desse modo, o amor é impraticável e inviável, sendo assim, o mito permanecerá sempre vivo. A realização do amor, a configuração do mito, seria uma profanação. Portanto, ama-se pela simples contemplação do amor, pois o sentimento amoroso nutre-se dele mesmo. Ama-se aquilo que jamais poderá realizar-se, como o narrador mesmo afirma:

Mesmo que, algum dia, Carmélia a mim viesse, as bodas seriam impossíveis. O sistema Carmélia e o sistema Borba se repelem. [...]

E, ai de mim, estou que o casamento não baniria os mitos. Mito tocado é mito morto, e a imaginação busca outros, sentindo-se ludibriada. Fique Arabela no seu nicho. (ANJOS, 2001, p.120).

Dessa forma, embora Belmiro desista do seu livro a propósito de seu passado e passe a concentrar-se no seu presente, há aqueles aspectos do passado que persistem no seu presente. Um exemplo bem nítido é o que se pode chamar de sua idealização da mulher e do amor5. As lembranças da figura feminina do passado, Camila, associam-se à figura mítica de _____________

5 A esse respeito, cabe ressaltar que no capítulo precedente, seção 2.2 “Os perfis femininos e a

Arabela, representando a inviabilidade de realização de seu desejo – uma vez que Camila morrera ainda jovem, impossibilitando qualquer relacionamento futuro entre ambos. Por conseguinte, da impossibilidade de viabilização é que se nutre a permanência das lembranças deturpadas de Camila ainda no adulto – pois, nesse caso, Camila não é menos mítica do que a Donzela Arabela, tendo em vista que a timidez de Belmiro e a morte precoce da moça não promoveram mais que uma idealização da mulher e do amor.

A presença imaginária de Arabela, pertencente ao seu mundo infantil, aliada à figura construída de Camila, continuam presentes na vida do adulto, travestindo-se em Carmélia. Consequentemente, a lembrança que Belmiro associa ao passado infantil “se produz no terreno do imaginário. Resulta daquilo que podemos chamar de a sedução alucinatória do imaginário” (RICOEUR, 2007, p. 69). Esse ato imaginativo que deturpa a lembrança rompe com a distância temporal, transformando o passado num dado-presente. Isso se deve ao fato de a imaginação ser associada por Sartre a um ato mágico, que consiste em materializar, através da imagem, aquilo que pensamos, anulando a sua ausência e a sua distância, como se tratasse de uma simulação. Desse modo, “O ‘não estar ali’ do objeto imaginado é recoberto pela quase-presença induzida pela operação mágica. A irrealidade se encontra conjurada por essa espécie de ‘dança do irreal’ (RICOEUR, 2007, p. 69). Assim sendo, a cilada do imaginário alimenta o que Sartre denomina como a “patologia da imaginação”, ancorada na alucinação, ou ainda, um modo patológico de inoculação do passado no presente, com o intuito de assombrá-lo. De acordo com Sartre, a mudança da imaginação para a alucinação, origina uma correspondência entre a fenomenologia da memória e a da imaginação, em que a lembrança-imagem equivale a uma forma intermediária entre a ficção e a alucinação.

Desse modo, a idealização da mulher e do amor, simbolizadas através do mito Donzela Arabela, se estende às lembranças que Belmiro cultiva de Camila, afetando a construção de sua imagem, que permanece no presente e se associa à Carmélia – que, assim como as duas figuras míticas, é o símbolo do desejo inviável. Desse modo, a imagem de Carmélia é afetada pela transfiguração do mito Donzela Arabela e das lembranças deturpadas de Camila. Por essa razão é que podemos entender a permanência do passado de Belmiro em seu presente.

Outro importante aspecto a ser abordado, refere-se à relação vislumbrada pelo narrador-personagem entre o fenômeno da recordação e a criação literária. No capítulo 8, Belmiro admite o caráter sentimental de seu diário: “Não farei violência a mim mesmo, e estas notas devem refletir meus sentimentos em toda a sua espontaneidade” (ANJOS, 2001, p. 40). A partir disso, o amanuense tece algumas reflexões sobre o efeito que as paixões exercem

e sobre a estilização desse efeito, produzida pela literatura. Essas reflexões revelam-se substanciais para entendermos o funcionamento de sua escrita, tendo em vista que seus apontamentos prezam pela abundância sentimental. De acordo com Belmiro:

As modificações que a paixão determina em nossa substância e a diversa visão, que ela nos proporciona, dos seres e das coisas, poderão vir lucidamente, mais tarde, ao plano de nossa análise, quando, tudo já serenado, o espírito calcula e mede – mas certamente não são suscetíveis de registro, no instante em que devastam nossa sensibilidade. E ninguém o ignora: a literatura das emoções é feita a frio, e a

memória ou a imaginação é que reproduz ou cria as cenas passionais. No momento da devastação, alma e corpo se solidarizam. (ANJOS, 2001, p. 41, grifo nosso).

Segundo a perspectiva do amanuense, no exato momento em que as emoções tomam conta de nosso espírito, a razão não encontra meios para exprimi-las em palavras. Nossa sensibilidade ocupa-se unicamente da vivência desses sentimentos. Assim sendo, qualquer literatura pessoal que verse sobre o mundo sensível, recorre ao processo de rememoração para recriar esses momentos e, dessa maneira, transformá-los em anotações. Ao atentarmos para a oração em destaque, consideramos que Belmiro aponta para a impossibilidade de tomar nota das emoções, sem que estas sejam afetadas pela imaginação, no momento em que tentamos relembrá-las. Por esse viés, o próprio narrador lança dúvida sobre a veracidade de sua escrita, em razão de seu caráter emocional. Mais adiante, no capítulo 32, o narrador-personagem volta a esse raciocínio, acrescentando-lhe uma nova dimensão, ao comparar a estrutura de sua literatura sentimental à estrutura de um romance. Apesar de, num primeiro momento, não admitir que se tome uma pela outra, logo em seguida, assume que ambas bebem de uma mesma fórmula – a fusão entre vida e literatura6:

Não se trata, aqui, de romance. É um livro sentimental de memórias. Tal circunstância nada altera, porém, a situação. Na verdade, dentro do nosso espírito, as recordações se transformam em romance, e os fatos, logo consumados, ganham outro contorno, são acrescidos de mil acessórios que lhes atribuímos, passam a desenrolar-se num plano especial, sempre que os evocamos, tornando-se, enfim, romance, cada vez mais romance. Romance trágico, romance cômico, romance disparatado, conforme cada um de nós, monstros imaginativos, é trágico, cômico ou absurdo (ANJOS, 2001, p. 95).

Dessa forma, o amanuense parece dizer que não há possibilidade de recordação ou rememoração verídica, já que, dentro do nosso espírito, as recordações são acrescidas de _____________

6 Essa discussão se aprofundará, sob outro viés, no item 3.3 “A dupla inscrição ou o diário dentro do romance”,

nossa imaginação e se transformam em romance. Nesse sentido, as memórias que Belmiro escreve – seja as que remetem ao passado, ou as que se dizem o relato do presente – assinalam-se um romance engendrado pelos preceitos imaginativos do próprio narrador. O passado, em forma de lembranças, associa-se à imaginação e volta ao presente em sua forma escrita, ajudando a construí-lo. Nesse caso, como o Belmiro-autor é um ser que sofre, assim como o memorialista de A menina do sobrado, de “superabundância sentimental” (ANJOS, 1979, p. 253), sua literatura não poderia tomar outra direção. Sob tais aspectos, podemos concluir que o romance se constrói partindo das recordações, que são adicionadas ao imaginário do autor. Portanto, o processo romanesco consiste em tematizar a vida, aliando intrinsicamente recordação e imaginação.