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Capítulo II – O curso de Capoeira para os professores

2.6. A rotina das aulas

Desde a terceira aula até o final do curso, a presença do Mestre Tulé foi assídua e foi ele quem coordenou os trabalhos cabendo a mim, pesquisadora, a filmagem e a colaboração naquilo que se fazia necessário, como uma auxiliar didática.

A rotina das aulas seguia um ritual que se iniciava com o exercício de tocar os instrumentos musicais da Capoeira e cantar as ladainhas, cantos corridos e chulas. Nesse momento, os professores-alunos eram orientados a revezarem-se no aprendizado dos instrumentos, de modo que todos vivenciassem um pouco cada instrumento. O mestre demonstrava como deveria ser tocado cada um, o ritmo de cada “toque”93, explicava o significado dos “toques”, realizava exercícios de cantos: como por exemplo o de cada aluno “puxar”94 o canto sozinho durante a execução do “toque” e o dele próprio cantar diferentes cantigas de Capoeira para os professores conhecerem um pouco desse repertório (vide anexo 6 – partituras de toques de berimbau).

A aula continuava com a vivência da gestualidade que englobava o ensino dos diferentes golpes, contragolpes, defesas e acrobacias. Nessa parte, as estratégias de ensino utilizadas pelo Mestre Tulé pautavam-se na demonstração dos gestos e imitação destes pelos professores. Inicialmente, o mestre ensinava os golpes, contragolpes, defesas ou acrobacias, fora do contexto de jogo, para que os professores pudessem perceber a técnica da gesto e executá-lo.

À medida que o repertório gestual dos professores era ampliado, a complexidade da demonstração e dos exercícios a serem executados era aumentada, como por exemplo, a do

93 No mundo capoeirístico denomina-se “toque” a melodia de cada tipo ou modalidade de jogo da Capoeira. Por exemplo: o “toque” da Capoeira Angola é diferente do “toque” da Capoeira Regional. Mas, existem variações de jogos que fazem parte da manifestação Capoeira como um todo, independente da modalidade, como o “toque”de Iúna, que é uma melodia que se aproxima do canto de uma ave chamada iúna e o seu jogo é repleto de elementos acrobáticos. Outro exemplo interessante é o “toque” de Cavalaria, no qual os sons do berimbau imitam os galopes de cavalos e os instrumentos de percussão acompanham esse ritmo, de acordo com a história oral dos velhos mestres, o “toque” de Cavalaria era usado pelos capoeiras, na época em que ela era proibida, para avisar aos jogadores a chegada da polícia.

94 Outra expressão bastante usada no meio capoeirístico é o de “puxar o canto”, “puxar uma ladainha”, “puxar um canto corrido”. Esse termo é usado recorrentemente para se referir à ação da pessoa cantar na roda de Capoeira. Penso que, talvez, seja porque essa pessoa que “puxa o canto” é responsável por animar o coro dos que estão assistindo o jogo da roda. Por sua vez, o “puxador”, deve saber o que cantar, pois cada canto deve ter relação com o jogo que está ocorrendo, como também, deve ter um ritmo de canto que acompanhe o “toque” e entonação, para que a roda tenha “axé”, que, nesse caso, significa energia positiva.

mestre demonstrar um golpe e eu um contragolpe ou defesa. Essa lógica de ensino prosseguia com a execução de um golpe (realizado por mim ou pelo mestre), uma defesa, um contragolpe, outra defesa ou uma acrobacia. Os professores, ao verem a execução dos gestos, no caso das interações gestuais, como perguntas e respostas, tentavam, em duplas, reproduzir o que viram. Enquanto os professores exercitavam-se, o mestre acompanhava-os e corrigia a execução dos exercícios das duplas. Esse exercício das interações gestuais é um dos caminhos possíveis para o aprendizado do jogo da Capoeira, pois a partir de algumas seqüências, predeterminadas pelo mestre, os professores-alunos percebem que se pode combinar os diferentes gestos e elaborar jogadas. Nesse caso, pode-se comparar a Capoeira a um jogo de xadrez, no qual existem várias peças e, de acordo com as jogadas realizadas pelo adversário, escolhe-se a peça favorável e o caminho a ser seguido visando a uma boa jogada e desencadeando novas respostas, continuamente, até o final do jogo.

Para ilustrar de um modo geral a rotina que descrevi, irei apresentar os detalhes do terceiro encontro no qual os professores tiveram contato com a metodologia de ensino do Mestre Tulé.

A aula começou com o mestre apresentando aos professores os instrumentos musicais. Eu e ele havíamos providenciado os instrumentos da charanga para que os professores conhecessem. Havia berimbaus de diferentes sons (grave, médio e agudo), atabaques, pandeiros e agogô. Muitos instrumentos eram do mestre e alguns eram emprestados da FEF. Os instrumentos foram espalhados na roda do garrafão de basquete da quadra. O primeiro instrumento apresentado foi o berimbau. À medida que o mestre ia montando esse instrumento, ele ia detalhando suas características95.

O berimbau é feito de um pedaço da madeira chamada biriba, geralmente um dos galhos de sua árvore, essa madeira tem uma boa maleabilidade porque sustenta o arame que une as extremidades desse pau e faz com ganhe um formato de arco (a esse processo, dá-se o nome de envergadura). A medida da biriba é de aproximadamente um metro e vinte centímetros e o arame que faz sua envergadura é, geralmente, retirado de pneu velho, que deve ser limpo com palha de aço. Após feita a envergadura, é colocada a cabaça, oca, sem sementes e limpa, com um corte em uma extremidade formando um círculo por onde o som é

95 Para se obter mais informações sobre o berimbau recomendo a leitura da obra de SHAFFER, Kay. O berimbau- de-barriga e seus toques. Brasília: Instituto Nacional do Folclore/FUNARTE/MEC, 1977.

propagado. Essa propagação deve-se à baqueta de madeira (que é uma vareta fina) que quando bate no arame produz variados sons. Além da baqueta, o som é modulado pelo “dobrão” que pode ser uma pedra ou uma grande moeda que ao tocar o arame gera diferentes modulações sonoras. Para complementar, juntamente com a baqueta, o capoeirista segura o caxixi, que é um pequeno chocalho, com uma alça em sua extremidade superior, na qual os dedos são encaixados e à medida que a pessoa faz os movimentos com a baqueta o caxixi produz sons.

O mestre explicou essas características, de maneira informal e com uma linguagem mais simples. Optei em fazer a descrição mais detalhada para que se tenha uma idéia geral desse instrumento, uma vez que ao longo da transcrição dos diálogos aparecerão alguns desses elementos.

Assim, através de uma conversa, o mestre ia explicando aos professores que estavam em pé, em um círculo, como fazer para limpar o arame, para envergá-lo e prendê-lo na extremidade do berimbau. Ensinou que quando o arame arrebenta e se está tocando é necessário segurar a cabaça senão ela quebra-se. Contou “causos” em que o berimbau virou uma arma, em brigas entre grupos de Capoeira rivais, nas quais alguns mestres desarmando- o utilizaram-no para acertar seus adversários. Ensinou também a afiná-lo, através do processo no qual o som é regulado pela envergadura do arame com a altura na qual a cabaça é colocada. Mostrou o dobrão do berimbau e falou: “Alguém sabe por que chama dobrão96?” (Mestre Tulé) Enquanto isso, o mestre ia afinando o berimbau e falando: “Mais grosso, mais

grave, (tocou o berimbau)... a gente adapta o dobrão que são essas pedras que se acha na rua ou em jardins. Esse berimbau aqui pode ser chamado de médio porque tem o som médio...” (Mestre Tulé)

Continuou tocando diferentes toques, Angola, São Bento Pequeno, São Bento Grande e ia explicando: “Berimbau de barriga? Já ouviu falar disso? Porque o som é controlado na

barriga, sua modulação.” (Mestre Tulé) E mostrou as diferenças do som. Olhando para a professora Mainha que estava grávida, com uns seis meses de gravidez disse: “Sua barriga tá avantajada, você vai levar vantagem nisso.” (Mestre Tulé) Todos riram. Então, ele

96 Nessa aula, ele não explicou o porquê do nome “dobrão”, ele o fez em outro momento, mas vale esclarecer que o nome dobrão advém das antigas moedas do período imperial que eram maiores do que as atuais e eram usadas pelas pessoas que tocavam berimbau para modular o som da baqueta quando percutia o fio de tripa (hoje arame).

segurou outro berimbau, que já estava armado e disse: “Esse é outro som, mas é mais

pesado, é um violinha, mais agudo.” (Mestre Tulé) E mostrou o som. Pegou outro berimbau

e disse: “Esse é mais leve, é também médio. O peso do berimbau deixa o dedo mindinho

meio amortecido, é normal. Por isso acho que vai ter disputa por esse daqui.” (Mestre Tulé)

Mostrou um berimbau menor do que os outros e, aparentemente, mais leve. Todos riram. “Esses pandeiros eles fogem um pouco do padrão da capoeira, os pandeiros de Capoeira

são mais leves, não são tão barulhentos como esses.” (Mestre Tulé)

Em seguida, pegou um pandeiro para mostrar o “toque” da Capoeira Angola, enquanto tocava ia explicando, variando os sons e dizendo: “Tem um jeitinho de manipular,

dói a mão. Meu Deus do céu! Mas vamos ver se a gente consegue uns mais leves.” (Mestre

Tulé) Devolvendo o pandeiro ao chão disse: “O agogô...” (Mestre Tulé) E mostrou o som do agogô, tocando com uma baqueta de madeira e ensinou a controlar o som, grave ou agudo, dependendo de onde segura-se no agogô. Ao mesmo tempo foi dizendo que: “Eu não uso o

reco-reco na banda, mas uso o agogô.” (Mestre Tulé) Recolocou o agogô no chão e

aproximando-se do atabaque disse: “Esse é o atabaque de cunha.” (Mestre Tulé) E mostrou que as cunhas eram os tocos que esticavam as cordas para afinar o som do couro do atabaque. Pegou uma madeira e foi batendo nas cunhas para esticar mais o couro e afinar o instrumento. Tocou um pouco o atabaque, ao mesmo tempo dizia que além do “toque” da Capoeira o atabaque tem inúmeros outros “toques”.

Após realizar essas explicações, pediu para que os professores se reunissem em pequenos grupos e escolhessem um instrumento para tentar tocar.

Os grupos foram divididos por instrumentos musicais. Havia o grupo só do pandeiro, o grupo só de berimbaus, em suas diferentes afinações (agudo, médio e grave), o grupo dos atabaques (eram três). O mestre acompanhava cada grupo, um de cada vez, para auxiliar as primeiras tentativas dos professores-alunos.

A balbúrdia musical começou, num primeiro momento sem nexo, mas logo, depois de uns minutos, os professores conseguiram entrar no ritmo da Capoeira Angola. Os que sabiam mais eram os que davam o tom para aqueles que não estavam conseguindo entrar no ritmo. Depois de um tempo de exercício, os grupos foram aproximando-se e formou-se um só grupo, tocando no mesmo ritmo.

O mestre, então, em meio a todos, cantou um trecho de ladainha, mas não explicou nada sobre o cântico. Fizeram esse exercício por uns dois minutos e logo o mestre interrompeu e disse para descansarem. Muitos já mostravam uma “cara de dor” por causa do peso dos instrumentos.

Depois da pausa, todos voltaram ao seu grupo de origem, que era dividido pelos instrumentos musicais, o mestre voltou a auxiliá-los e eu, estava filmando as cenas e ajudando dentro do possível. Passado um tempo, alguns professores formaram um grupo maior para experimentar novamente o “toque” da Capoeira Angola. Entretanto, o grupo do berimbau mantinha-se organizado, ignorando os demais que já tinham se remodelado. O mestre auxiliava os professores do grupo do berimbau que se esforçavam para conseguir tocar.

Esse exercício com os instrumentos musicais durou cerca de 30 minutos.

Nessa noite, a chuva ameaçava cair e tínhamos receio de termos que interromper e atrasar o que havíamos planejado. Além disso, eu tinha a preocupação em não deixar molhar a filmadora.

O mestre propôs uma nova configuração do grupo para continuar o exercício de ensino-aprendizado dos instrumentos musicais, cuja proposta era de todos numa só roda.

Mostrou novamente o ritmo e as batidas do “toque” de Angola no berimbau. Demonstrou os diferentes tipos de toque do atabaque como: ijexá, barravento e as variações de “toques” da Capoeira. Em seguida, pediu para que cada um tocasse um instrumento que tivesse se familiarizado mais e, que tentasse, mesmo diante das dificuldades, entrar no ritmo. Numa roda, ele organizou um espaço só para os professores-alunos que estivessem tocando berimbau, outro só para os pandeiros e outro para os atabaques e agogôs. Naquela noite, havia instrumentos para quase todos os quinze professores presentes, mas três ficaram sem instrumentos. Antes de iniciar o ensino do responsório do coro das músicas da Capoeira, o mestre explicou qual o momento que cada instrumento é executado durante o canto na roda. De acordo com ele, a ordem é a seguinte: o primeiro instrumento que inicia o som na roda de Capoeira é o berimbau e, em seguida, o pandeiro, então, o responsável pela ladainha inicia seu canto. Após todo o canto da ladainha - que foi acompanhado somente pelos berimbaus e pandeiro – quem canta dá prosseguimento ao ritual anunciando o primeiro refrão para o responsório dos demais participantes que são as frases como: - Iê, viva meu

Deus! Ou então: Iê, salve Zumbi! Ou qualquer outra frase que comece com o “Iê” e que faça

saudações a pessoas, ídolos, deuses, locais, enfim, aquilo que seja de valor para o capoeirista e para a Capoeira. A primeira frase de saudação é como uma senha para a entrada na música do atabaque e o agogô. Nessa parte do responsório da ladainha, o coro sempre repetirá a frase dita pelo “puxador” do canto, acrescida pela palavra “camará” ao final. Por exemplo, se a pessoa que canta a ladainha diz: - Iê, viva meu Deus! O coro responde: - Iê, viva meu Deus,

camará! E assim por diante. De acordo com o mestre, a explicação para a entrada dos sons

do atabaque e agogô, somente no momento do responsório, deve-se ao fato que enquanto se canta a ladainha deve-se tocar os instrumentos que não são tão barulhentos para que se possa ouvir o que se está cantando, pois toda ladainha tem algo a ser ensinado aos capoeiristas. Assim que a ladainha inicia a fase final, a do responsório, aí sim, pode-se introduzir a percussão mais alta que é a do atabaque e agogô.

Então, ele começou a tocar o berimbau e a cantar a ladainha. Nesse momento, passei a ajudá-lo na execução dos instrumentos e comecei a tocar o pandeiro, juntamente com uns cinco professores que também tocavam pandeiro e passamos a aguardar o instante de responder o coro. Quando ele cantou o primeiro refrão do coro, os professores responderam e uma das professoras, responsável por tocar o atabaque, executou a entrada do toque do instrumento na música, que é uma das professoras que pratica Capoeira há algum tempo. Ao mesmo tempo que o atabaque começou a soar, outra professora começou a tocar o agogô e, num passe de mágica, a impressão era a de estarmos em uma roda de Capoeira. Porém, bem maior que a normal, um pouco desafinada e insegura, mas o som inconfundível da Capoeira, com o canto, os berimbaus, atabaques e pandeiros passou a tomar conta do ambiente. A expressão no rosto dos professores era um misto de alegria e insegurança, pois muitos não sabiam se estavam executando de forma correta o instrumento escolhido, mas apesar disso, a satisfação de cada um fazia-se presente.

Os professores-alunos que tocavam o berimbau tentavam acompanhar o ritmo do mestre e, por ser a primeira vivência musical daquele grupo, considero que todos se saíram muito bem dada a dificuldade em tocar os instrumentos musicais e cantar concomitantemente. Esse exercício durou em torno de uns 10 minutos e, nesse tempo, o mestre cantava diferentes cantos corridos e os professores respondiam e exercitavam o toque do instrumento musical que escolheram. Alguns revezavam o instrumento já que as mãos

doíam na hora de segurar o berimbau ou o pandeiro, pois ambos são instrumentos que pesam um pouco. Nesse momento, os que estavam de fora iam assumindo a vez daqueles que estavam cansados.

Ao final do exercício, o Mestre Tulé conversou um pouco com os professores sobre o significado dos cantos. Disse que às vezes o jogo começa na hora do canto, da ladainha, porque o capoeirista faz uma provocação para o parceiro. De acordo com suas palavras: “Você canta no pé do berimbau e dá oportunidade pro outro responder, se ele não

responder então joga. É bom saber disso pra vocês não reproduzirem qualquer coisa.”

(Mestre Tulé)

Continuou falando e mostrando as diferenças entre alguns toques do berimbau: “Esse

toque é de São Bento Pequeno (mostrou o som) e esse de São Bento Grande de Angola, mas é bastante usado pelo pessoal da Contemporânea (mostrou o som).” (Mestre Tulé) Na

seqüência, demonstrou o “toque” e o canto corrido da Regional, que é bem marcado, com quadras curtas, menos fluido do que o canto da Angola.

Ao final, avisou aos professores que é bom desarmar o berimbau para que a tensão não estrague a biriba. Enquanto demonstrava o processo de desmontar o berimbau, ia contando aos professores “causos” e histórias de sua vida capoeiristíca. Quando retirou a cabaça do berimbau foi dizendo:

“- E se vocês acharem alguma purunga97, cabaça, por aí, vocês guardam... Quando

forem viajar pra casa da avó em Minas.” (Mestre Tulé)

"- Ah! Mas não é essa cabaça normal, aquela com pescocinho?” – perguntou a

Profa. Estrela-do-mar.

“- É!” – respondeu o Mestre Tulé.

“Aí, corta?” – perguntou a Profa. Estrela-do-mar.

“- É corta. E aquelas que não tem “pescoço” o fundo serve pra fazer o caxixi” – respondeu o Mestre Tulé.

Outra professora perguntou:

“- Mestre tem um número certo de instrumentos para ficar na roda ou é quanto eu

quiser?” (Profa. Bela)

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“- Boa questão... se alguém chegar e ver todos esses instrumentos na roda pode se

espantar, isso não está errado, cada um pode organizar como acha melhor, viável. Mas, se tiver esse tanto, causa uma grande confusão. Eu acredito...” – respondeu o Mestre Tulé.

E passou a falar como ele organiza a bateria nas rodas em que fica responsável. Nesse caso, ele compõe a charanga com três berimbaus (um de afinação grave que se chama “berra- boi”; outro que é o médio e tem som no nível médio; e um de afinação aguda, chamado violinha), além de um atabaque, um pandeiro e um agogô. Cada berimbau tem sua afinação característica e desempenha um papel no “toque”. O violinha faz o som repicado e improvisa durante todo o tempo da música; o berra-boi é o grave e marca o ritmo, geralmente é tocado pelo mestre mais velho, responsável em manter a integridade do ritmo; o médio faz a variação entre a improvisação e a marcação. Já, na Capoeira Regional, ele ensina que se usa dois pandeiros, um berimbau e palmas. Diz ele: “Eu particularmente não gosto de palmas na

minha roda, até porque ... tem alguns momentos que o pessoal empolga e até fica natural. Na Capoeira Angola não faz muito sentido, mas cantar é importante.” (Mestre Tulé)

E propôs um exercício de ritmo para os professores que era o de bater palmas, no ritmo da Capoeira e cantar um trecho de um canto corrido. Todos sentados em círculo começaram o exercício juntamente com o mestre:

“Ô lá, lá, ê, lá lá ê lá, Ô lá, Lá, ê, lá lá ê lá, Ô, lê lê, Lá, lá ê lá, (coro) Ô, lá, ê, Lá lá ê lá, (coro) Ô, lê lê, Lá, lá ê lá, (coro) Ô, lá, ê, Lá lá ê lá. (coro)”98

(canto executado no ritmo de São Bento Grande – vide anexo 6)

Durante a execução do exercício, as risadas e as piadas eram constantes, criou-se um clima de bastante descontração, a maioria teve dificuldade em conciliar as palmas com o

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canto. O mestre então falou: “Bem, comecei assim de propósito. Agora vocês vão esperar eu

começar e vão entrar no meu ritmo.” (Mestre Tulé)

Recomeçou batendo palmas no ritmo e “puxou” o canto. Os professores aguardaram- no começar e seguiram seu ritmo. Ele parou de bater palmas e só cantava observando os professores e estimulando-os, até o grupo começar a alterar o ritmo.

Então uma professora anuncia em meio ao canto que estava desafinando: “Ih! Mudou

o ritmo!” E, aos poucos, o grupo foi parando.

Mudou-se o exercício e a proposta era a de bater palmas no ritmo da música e, ao invés de cantar, dizer seu nome ou então o nome da escola em que trabalhava. Todos enfrentaram o “desafio” e foram muitas risadas pelas desafinadas e confusões.

O mestre falou que esse exercício poderia ser feito no cotidiano das aulas de Capoeira e que as crianças adorariam.

Encerrada a parte de iniciação musical, os professores foram tomar água e assim que voltaram começou a vivência corporal da Capoeira.

O primeiro exercício era de perceber o andar de cada um. Em uma roda, todos posicionados em pé, o mestre solicitou que um professor atravessasse a roda e enquanto ele caminhava o mestre dizia: “Olha o ritmo dele.” (Mestre Tulé) Depois pediu para uma professora atravessar a roda andando. “Veja o ritmo dela.” (Mestre Tulé) Continuou o exercício dizendo: “Agora todos andando, ocupem todo o local (uma parte da quadra

próxima ao garrafão do jogo de basquete), sinta seu ritmo, observe o ritmo do outro. Quando eu avisar todos vão parar.” (Mestre Tulé) Todos caminhavam e depois de um