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Diferentes propostas para o ensino da Capoeira

Capítulo I – Capoeira e Educação Física: relações possíveis

1.2. Diferentes propostas para o ensino da Capoeira

De acordo com o que foi explicitado anteriormente, as primeiras obras que iniciaram uma sistematização do ensino da Capoeira datam do início do século XX e foram formuladas por pessoas ligada às Forças Armadas e à sociedade civil. A Educação Física, por sua vez, só se propôs a pensar em pedagogizar a Capoeira, em 1945, com a obra de Inezil Penna Marinho, intitulada Subsídios para o estudo da metodologia do treinamento da

capoeiragem50.

Cabe contextualizar que a Educação Física chegou ao Brasil, no início do século XX, com os métodos ginásticos europeus. Logo, foi adotado nas escolas o método francês, através das aulas de ginástica, fato que não foi bem recebido pelos intelectuais da época, como Rui Barbosa, que defendia a criação de um método ginástico brasileiro para a valorização do Brasil.

Com base nas obras de Castellani Filho (1991) e (1993), que tratam da Educação Física no Brasil e das mudanças que ela sofreu no decorrer do século XX, tal como na Europa, os métodos ginásticos51 vieram atender às demandas que surgiam com a implantação do capitalismo no Brasil. Dessa forma, os exercícios ginásticos deveriam formar brasileiros fortes, sadios, com caráter e nacionalistas e serviram para o treinamento militar e para uma política higienista e eugenista.

A política higienista visava a suprir a carência de infra-estrutura de saneamento básico e atendimento médico da recém inaugurada República e valia-se da ginástica como meio profilático para evitar doenças e criar bons hábitos de saúde. “Essa política, aliada à eugenia, proporcionou a configuração de uma classe social pautada nos ideais burgueses e

50 Trata-se da obra de MARINHO, Inezil Penna. Subsídios para o estudo da metodologia do treinamento da capoeiragem. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1945.

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racistas, que deteve o poder político e econômico no Brasil do século XIX ao início do XX.” (SILVA, 2002, p.69)

Por sua vez, a política eugenista, tinha uma como finalidade o embraquecimento da

raça. Este mecanismo, lançado pelo governo, buscava equilibrar e fazer prevalecer na

sociedade brasileira os descendentes de origem branca em detrimento daqueles de origem negra (ex-escravos). É com esse discurso que o mestiço, o mulato, passa a ter um valor social maior do que o negro, pois é fruto de um processo de “ocidentalização à brasileira”.

Todo esse esquema voltado à consolidação de uma raça brasileira irá se refletir também na busca de elementos constituintes de uma cultura

brasileira. Por isso, no início do século XX, há a preocupação de

intelectuais de variados setores da sociedade em legitimar a produção cultural nacional, uma vez que o país não possuía autonomia em diferentes campos e sofria uma série de influências culturais estrangeiras [...] Neste contexto, a Capoeira passa a ser apontada como uma solução na busca de um método ginástico nacional ou mesmo um Esporte de procedência tupiniquim. Porém, para inseri-la de maneira ideal no sistema, ela não poderia ser aquela praticada pelas camadas mais baixas da sociedade, vinculada às raças “inferiores”, como a negra, desafiando a ordem pública e exercendo pressões políticas diante do aparato governamental e policial. Ela tinha que ser modificada, regrada, metodizada, higienizada, elitizada. (SILVA, 2002, p.71)

Entretanto, essa iniciativa não adveio primeiramente da Educação Física, mas do meio militar (ODC, 1907) e civil (BURLAMAQUI, 1928).

Cabendo à Educação Física pensar sua disciplinarização, sistematicamente, a partir do trabalho do Prof. Inezil Penna Marinho (1945) que tinha como objetivo torná-la uma luta

nacional de defesa pessoal, vinculando-a ao caráter esportivo. Foi em 1944, ainda sob a

ditadura de Vargas52, que Inezil Penna Marinho foi premiado pela monografia Subsídios

para o estudo da metodologia do treinamento da capoeiragem através de um concurso

promovido pela Divisão de Educação Física, do Departamento Nacional de Educação, do

Ministério da Educação e Saúde.

Este trabalho apresenta a sistematização de um treinamento para a Capoeira visando ao aprimoramento dos seus golpes e contragolpes. Nesse caso, o autor não tinha a intenção

52 Neste contexto histórico-social, o da ditadura de Vargas, a Educação Física tinha os objetivos de formação dos homens para as fábricas e combate aos inimigos externos, treinando os soldados enviados à II Guerra Mundial e a tropa policial para o combate aos inimigos internos que eram os comunistas. Para se obter mais

de desenvolver uma metodologia de ensino-aprendizado da Capoeira, mas de treinamento, e a conceituação que dava a esta manifestação era a de uma luta, um meio de defesa pessoal criado no Brasil, e que poderia ser compreendida como um esporte genuinamente brasileiro.

Inclusive o autor apropria-se da obra de Annibal Burlamaqui (1928) e ilustra sua monografia com as figuras apresentadas neste livro.53 Vale dizer que:

[...] o Método Zuma em muito se assemelha ao boxe e, dessa maneira, sem muitos pontos contrários, Inezil Penna Marinho adaptou sua proposta. Utilizou-se das mesmas ilustrações da obra de Annibal Burlamaqui para descrever os golpes e contragolpes e somente acrescentou o ato de peneirar, talvez recuperando este termo das colocações realizadas por O.D.C. (1907), em Guia do Capoeira ou

Gymnastica brazileira. Neste caso, o ato de peneirar era descrito por

Inezil Penna Marinho como o jogo de corpo que teria uma importância fundamental, tal como a posição de guarda. Mas apesar de se referir à

peneiração, em nenhum momento ele se refere à música ou canto no

momento de realização da luta. (SILVA, 2002, p.136)

Percebe-se no trabalho do Prof. Inezil a busca em desvincular a Capoeira de sua origem escrava e negra, considerando-a uma prática corporal que deveria ser ensinada, através da perspectiva de treinamento esportivo, pela educação física. Nesse caso o autor defendia que seus treinamentos deveriam ser ministrados pelos professores de educação física, ignorando, nesse caso, a figura dos mestres de Capoeira, principalmente, os mestres baianos. É claro que a luta pela valorização da Capoeira por parte da educação física ensejada pelo autor é repleta de interesses corporativistas. Entretanto, ele não foi o único a defender uma proposta com essas idéias.

Outro propositor de um método de ensino da Capoeira na Educação Física foi o 1º tenente Lamartine Pereira da Costa, que publicou em 1962, a obra Capoeira Sem-Mestre.

Esse autor chegou a treinar Capoeira na academia de Mestre Bimba, como pode ser constatado na leitura de sua obra, entretanto formulou uma metodologia de ensino da luta Capoeira no qual qualquer pessoa poderia aprendê-la a partir de 37 movimentos ilustrados,

informações a esse respeito indico a leitura do livro de: CASTELLANI FILHO, Lino. Educação Física no Brasil: a história que não se conta. Campinas: Papirus, 1991.

53 Em minha dissertação de mestrado abordo o Método Zuma e inclui nesse trabalho as ilustrações dessa obra. Para vê-las indico: SILVA, Paula Cristina da Costa. A Educação Física na roda de Capoeira: entre a tradição e a globalização. Dissertação (Mestrado em Educação Física), Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, 2002, pp.82-84.

sem necessidade de um mestre de Capoeira. Para isso, o “futuro capoeirista”, precisaria de um saco de areia para treinar os golpes e de uma cadeira para simular o adversário.

Seu método já havia sido implantado nas Forças Armadas junto aos seus alunos e tinha o intuito de formar soldados com uma “arma” a mais, pois a Capoeira, em seu entender, seria uma excelente luta de defesa pessoal criada no Brasil.

Pela análise das últimas duas obras:

[...] percebemos que o Prof. Inezil Penna Marinho e o 1º tenente Lamartine Pereira da Costa propunham a metodização desta prática para servir a um só propósito, o de preparação dos homens brasileiros para o engrandecimento da Nação, indo ao encontro dos desejos dos detentores do poder e procurando manter a ordem e a paz social. Além disso, eram também unânimes em subjugar a capacidade de pessoas que não haviam freqüentado o curso de educação física, que eram as detentoras do saber da arte da capoeiragem. (SILVA, 2002, p.153)

Outro aspecto a ser lembrado é que no período em que a obra de Costa (1962) foi publicada, o Brasil passava por uma fase de instabilidade política que culminou com o golpe militar de 1964. Dessa forma, é provável que o apoio às ações do tenente Lamartine P. da Costa e a publicação de seu livro tenha tido o apoio das instâncias da Marinha e repercutido positivamente naquele ambiente militarizado.

Com os militares no poder a Educação Física passou por modificações no que se refere ao seu papel na sociedade. Se antes, cabia à ela a formação da tropa, a manutenção de corpos saudáveis, a regeneração da raça brasileira, com o regime militar somou-se a tudo isso a responsabilidade de formar atletas para engrandecer a nação.

Em 1969, ela teve sua obrigatoriedade implantada no ensino de 3º grau, através do Decreto-lei nº 705/69, que de acordo com Castellani Filho (1991, p.121)

[...] coube à Educação Física o papel de, entrando no ensino superior, por conta do Decreto-lei nº 705/69, colaborar, através de seu caráter lúdico-esportivo, com o esvaziamento de qualquer tentativa de rearticulação política do movimento estudantil. Evidenciando-se dessa forma, os traços alienados e alienantes absorvidos pela “personagem” vivida pela Educação Física.

Sua inserção na escola ocorreu através de matéria curricular a ser trabalhada na forma de atividade que, “isenta de reflexão teórica sobre sua ação”, justificava-se não como um campo de conhecimento dotado de um saber próprio, mas sim como uma “[...] mera

experiência limitada em si mesma, destituída do exercício da sistematização e compreensão de seu conhecimento” (CASTELLANI FILHO, 1991, p.108).

E o caráter adquirido pelas atividades físico-esportivas do período em questão veio ao encontro da ideologia imposta pelo governo militar, seja através do estímulo do esporte de massa, representado pelo movimento de Esporte para Todos, o EPT, ou através do destaque da participação nacional em eventos esportivos de competição, como o caso da seleção brasileira de futebol (vitoriosa) na Copa de 1970.

A partir da década de 1980 a Educação Física, paulatinamente, sofreu alterações em sua configuração. De acordo com Castellani Filho (1993) estas mudanças ocorreram “de dentro pra fora” e de “fora pra dentro” 54 ou seja, de maneira dialética, pelo olhar daqueles que pertenceram (e pertencem) ao campo de atuação dessa área e que viveram (e ainda vivem) intensamente suas transformações, como o repensar das teorias com ênfase na biomedicina e nas ciências biológicas buscando-se novas matrizes teóricas nas Ciências Humanas para pensá-la na sociedade e a abertura de cursos de pós-graduação strictu sensu na área. O outro diz respeito ao processo no qual essas mudanças estavam inseridas pelo olhar “de fora pra dentro”, ou melhor, a conjuntura na qual a sociedade estava inserida nessa época, que era a da abertura democrática.

Mas, mesmo com esses novos olhares, ainda permaneceu na Educação Física uma visão conservadora55 na qual a busca pela construção de corpos produtivos para indústria, incentivados pelo regime do Estado Novo, cede lugar a produção de corpos mercador e

mercadoria que de acordo com Castelanni Filho (1993) são:

[...] corpos que duplamente se mercantilizam, seja como porta-vozes da indústria cultural corporal, assumindo o papel de camelô vendendo – através do mote da atividade física enquanto elemento de saúde – ‘Taffmam-e’, ‘Vitassay’, ‘Gatorade’, ‘Topper’, ‘Rainha’, ‘Penalty’,

54 Esta interpretação das mudanças ocorridas na Educação Física, a partir da década de 1980, é realizada no artigo de CASTELLANI FILHO, Lino. Pelos meandros da educação física. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v.14, n. 3, maio/1993. Nele, o autor se vale de um processo de análise complementar e dialético pelo qual nos mostra as transformações ocorridas na sociedade (de fora pra dentro) e na Educação Física (de dentro

pra fora).

55 Nesse estudo compreendo os termos conservador e progressista como aqueles que expressam visões diferenciadas de mundo. O termo conservador representa os grupos da Educação Física e da Capoeira que mantém e perpetuam práticas sociais e ações para a manutenção do status quo. Já o termo progressista representa os grupos da Educação Física e da Capoeira que propõem novas práticas, ações e discussões acerca de outras possibilidades para construir a área acadêmica Educação Física, sua prática pedagógica, bem como, a prática da Capoeira e sua inserção social.

‘Adidas”, [...], seja revestindo-se ele mesmo da condição de mercadoria, reificando-se [...] (CASTELLANI FILHO, 1993)

Nota-se, dessa forma que apesar das mudanças, a Educação Física ainda permanecia “a mesma”, ou seja, em parte sintonizada com aqueles que detinham o poder e defendiam seus interesses ligados ao capital. A própria Capoeira também foi influenciada por essa nova concepção de corpo, emanada do novo sistema social, e acompanhou a tendência de valorização dos corpos mercador e mercadoria para sua inserção cada vez maior no mercado de atividades corporais. Pode-se citar como exemplo a “Revista Capoeira” que publicou seis capas, entre os anos de 1998 e 2000, nas quais a imagem principal feminina é de uma artista ou símbolo sexual, como as atrizes Fernanda Maria Cândido e Paula Burlamaqui e as personagens “Tiazinha”, “Feiticeira”, “As Ronaldinhas” e a dançarina Sheila Mello, do grupo “É o Tchan”.56

Essa estratégia da Revista Capoeira serviu para aumentar a vendagem das revistas e incutir a idéia que a Capoeira é uma atividade física como outra qualquer no mercado consumidor. Esse modo de se valer da imagem de mulheres famosas reafirma o viés corpo mercadoria discutido acima e também mostra um caráter misógino atribuído à participação feminina na Capoeira. Esse fato fez com que alguns setores do mundo capoeirístico manifestassem-se contrários a esse tipo de abordagem feita pela Revista Capoeira, através de cartas e mensagens eletrônicas à sua redação.

Entretanto, apesar dessa perspectiva ligada ao mercado consumidor das atividades físicas, no qual a Educação Física faz-se presente, é importante retomar a discussão das novas propostas de metodologias e concepções para a educação física que foram feitas a partir de 1980. Estas sofreram fortes influências advindas do campo das Ciências Sociais, uma vez que, vários estudiosos da Educação Física debruçaram-se sobre os estudos da área da Educação e de linhas de pesquisa nas quais se privilegiava a Filosofia e Sociologia da Educação, pautadas no marxismo. De acordo com Bracht (1999, p.78):

56 A respeito desse assunto recomendo a leitura do trabalho: SILVA, Paula Cristina da Costa. Imagens da mulher na Capoeira. In: Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte e Congresso Internacional de Ciências do Esporte, 2007, Recife/PE. Anais..., v. 15, 2007. Disponível em: <http://www.cbce.org.br/cd/resumos/087.pdf>. Acesso em: 26 dez. 2008. no qual analisei quarenta e oito publicações para ver de que forma a mulher é representada nas reportagens e fotos veiculadas nas revistas: Capoeira e Praticando Capoeira, especializadas em Capoeira.

Toda a discussão realizada no campo da pedagogia sobre o caráter reprodutor da escola e sobre as possibilidades de sua contribuição para uma transformação radical da sociedade capitalista foi absorvida pela Educação Física. A década de 1980 foi fortemente marcada por essa influência, constituindo-se aos poucos uma corrente que inicialmente foi chamada de revolucionária, mas que também foi denominada de crítica e progressista. Se, num primeiro momento – digamos, o da denúncia –, o movimento progressista apresentava-se bastante homogêneo, hoje, depois de mais de 15 anos de debate, é possível identificar um conjunto de propostas nesse espectro que apresentam diferenças importantes.

Bracht (1999) apresenta um quadro de propostas pedagógicas para a educação física que engloba a abordagem desenvolvimentista, construtivista, aptidão física, crítico- superadora, aulas abertas à experiência, crítico-emancipatória e elabora uma discussão e crítica sobre a constituição teórica de cada uma e as propostas que fazem à educação física.

Entretanto, Castellani Filho (1999), em sua tese de doutorado, apresenta e explicita um quadro, por ele estruturado, no qual relaciona as teorias da Educação Física e as tendências e metodologias de ensino derivadas das diferentes vertentes teóricas que surgiram nesse mesmo período histórico. Mesmo ponderando que qualquer classificação corre o risco de “rotular” as diferentes propostas e limitar as relações existentes entre elas, considero interessante trazer a esse estudo o quadro por ele estruturado. De acordo com o autor, foram elaboradas no âmbito da educação física:

- abordagens não-propositivas, divididas nas vertentes fenomenológica, sociológica e cultural. Nesse caso ele esclarece que a adoção do termo abordagem para essas metodologias leva em consideração que: “Em comum, abordam a Educação Física escolar sem contudo estabelecerem parâmetros ou princípios metodológicos ou, muito menos, metodologias para o seu ensino, daí serem caracterizadas como abordagens.” (CASTELLANI FILHO, 1999, p.154)

- metodologias propositivas não-sistematizadas que se dividem em concepção desenvolvimentista, concepção construtivista, concepção crítico-emancipatória, educação física plural e aulas abertas à experiência. Com relação a essas metodologias esclarece que:

Todas essas, para além do posicionamento em torno da prática pedagógica hoje configurada, concebem uma outra configuração de educação física escolar — daí derivando a expressão concepção —, definindo princípios identificadores de uma nova prática, sem todavia

sistematizarem-nos na perspectiva metodológica acima enunciada. (CASTELLANI FILHO, 1999, p.155)

- e metodologias propositivas sistematizadas que englobam a concepção crítico-superadora e a aptidão física. Para o autor a expressão concepção é o termo que traduz os “[...] princípios identificadores de uma nova prática metodológica na educação física escolar” (CASTELLANI FILHO, 1999, p.155). Dessa maneira, diante do que ele explica sobre as metodologias propositivas não-sistematizadas, pode-se apreender que concepção crítico- superadora pode ser considerada como uma concepção propositiva sistematizada, no âmbito progressista. Esta, por sua vez, foi escrita em um momento histórico em que era necessário o rompimento com o que a educação física havia produzido até aquele momento. Já a aptidão física é também considerada uma abordagem propositiva sistematizada entretanto, sua origem e matriz epistemológica concentra-se na área das ciências da saúde que, por sua vez, predominou durante todo o século XX, na educação física, configurando-se dessa forma como uma proposta que vem sendo desenvolvida pela educação física há anos, não apresentando um caráter progressista.

A concepção crítico-superadora encontra-se alicerçada em três pontos que fundamentam a sua reflexão pedagógica que são: a análise diagnóstica da realidade, encabeçada pelo professor que indaga aos alunos quais os conhecimentos empíricos sobre o tema a ser abordado na aula; a capacidade judicativa da realidade, realizada coletivamente nas aulas; e a perspectiva teleológica do conhecimento, que buscaria a superação da realidade apreendida a partir da percepção da sociedade de classes, na qual os alunos encontram-se inseridos (COLETIVO DE AUTORES, 1992). Para os autores dessa concepção:

A Educação Física é uma disciplina que trata, pedagogicamente, na escola, do conhecimento de uma área denominada aqui de cultura

corporal. Ela será configurada com temas ou formas de atividades,

particularmente corporais, como as nomeadas anteriormente: jogo, esporte, ginástica, dança ou outras, que constituirão seu conteúdo. O estudo desse conhecimento visa apreender a expressão corporal como linguagem. (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 62 – grifo da autora)

Na obra, os autores trabalham com a idéia de currículo ampliado que deve ser capaz de proporcionar “[...] uma reflexão pedagógica ampliada e comprometida com os interesses

das camadas populares (que) tem como eixo a constatação, a interpretação, a compreensão e a explicação da realidade social complexa e contraditória” (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p.28). E adotam a abordagem da cultura corporal na escola pautada nos ciclos de escolarização, rompendo com a concepção etapista do processo de ensino-aprendizado, buscando tratar os conteúdos de maneira dialética e fomentando a ampliação das reflexões dos alunos. O objetivo central dos ciclos é transformar a visão sincrética de realidade para uma visão sintética e elaborada.

- Primeiro ciclo (pré-escola até a 3ª série): ciclo de organização da identidade dos dados da realidade.

- Segundo ciclo (4.ª à 6.ª séries): ciclo de iniciação à sistematização do conhecimento.

- Terceiro ciclo (7.ª à 8.ª séries): ciclo de ampliação da sistematização do conhecimento.

- Quarto ciclo (se dá na 1.ª, 2.ª e 3.ª séries do ensino médio): ciclo de aprofundamento da sistematização do conhecimento. (COLETIVO DE AUTORES, 1992)

Entretanto, essa concepção de educação física na escola é historicamente recente e suas experiências vêm ainda sendo sistematizadas por alguns professores de educação física. Atualmente, no Laboratório de Estudos sobre Arte, Corpo e Educação (LABORARTE)57, grupo de pesquisa que participo, há a discussão do “estudo da expressão corporal como linguagem” no intuito de compreender a expressão corporal como parte constituinte e inseparável da linguagem58.

Para a metodologia de ensino crítico-superadora, a Capoeira deve ser abordada